Segundo a organizadora Cleide Fernandes, após a reabertura das bibliotecas será promovida uma exposição itinerante nos centros culturais da capital mineira
Quando se fala em espaço de leitura, o que vem logo à mente são as bibliotecas. Apesar de cumprirem um papel fundamental para a disseminação do interesse pelos livros, elas não são as únicas a entrar no imaginário da população, como prova “História Afetiva de Leitores e Bibliotecas em Belo Horizonte”, publicação que está sendo disponibilizada de forma gratuita.
Organizadora do livro ao lado de Fabíola Farias e Maria da Conceição Carvalho, a bibliotecária Cleide Fernandes ressalta o papel dos professores neste fomento. “A sala de aula é um importante espaço de acesso à leitura. Pelo depoimento das pessoas, estes professores que liam para os alunos ficaram gravados na memória afetiva de várias delas”, registra.
O livro traz relatos de 20 entrevistados com atuação na cena literária de BH, como a poetisa e professora Ana Elisa Ribeiro, a contadora de histórias Aline Cântia, o ilustrador Nelson Cruz e o ator Odilon Esteves, criador do projeto “Espalhemos Poesia”. Somam-se outros 42 depoimentos de pessoas anônimas, colhidos após solicitação nas redes sociais.
Apesar de o livro contemplar uma diversidade de regiões, Cleide salienta que não se trata de um mapeamento dos locais de maior acesso à leitura. “É complicado usar este termo porque nunca tivemos essa pretensão. Nossas escolhas foram baseadas em pessoas que, pela trajetória, poderiam ter algo a contribuir”, explica.
Leia a matéria completa publicada pelo Hoje em Dia
Ou, na verdade, de palavras-borboletas, como lembra Cezar Motta no recém-lançado livro que conta a história do dicionário famoso e de seu autor
Texto por Marcello Rollemberg
Fotomontagem: Camila Paim/Jornal da USP com imagens de Arquivo e Freepik
Um caçador de borboletas, a correr com uma rede em busca das palavras que voavam. Era assim que Aurélio Buarque de Holanda – criador do mais prestigioso dicionário brasileiro, aquele que leva seu nome e, mais do que isso, o define, substantivo absoluto – conceituava seu trabalho de dicionarista. Escritor talentoso que poderia ter ido longe na literatura se não houvesse sucumbido ao prazer de caçar palavras com uma rede metafórica para, então, dissecá-las em verbetes, hedonista, inquieto, grande conversador e contador de histórias, Aurélio também acumulava outros predicados menos abonadores e bem complexos: desorganizado, descumpridor de prazos e um tanto desleixado. Esse rápido retrato pessoal pode ser a síntese daquele intelectual que queria criar um dicionário para chamar de seu e que por décadas deu com os burros n’água – muito devido às características listadas há pouco, muito também por causa de um mercado editorial reticente. E, no final, o livro, o “pai dos burros” definitivo acabou saindo e se tornou o maior sucesso editorial do País, com mais de 15 milhões de exemplares vendidos em pouco mais de 25 anos desde que foi lançado, em 1975. O dicionário – uma proeza – ficou 42 semanas seguidas na lista dos mais vendidos da revista Veja, isso quando tanto listas quanto a publicação tinham bem mais prestígio. Mas a história não é tão simples assim – nunca é.
A capa do livro de Cezar Motta – Foto: Reprodução
E esse axioma, por assim dizer, pode ser agora comprovado com o lançamento de Por Trás das Palavras, do jornalista Cezar Motta. Lançado pela recém-criada editora Máquina de Livros, a obra conta as aventuras e desventuras que marcaram a criação e edição do Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Quem? Pode esquecer o nome pomposo e oficial. É só chamá-lo de “Aurélio” – no final das contas, o título acabou sendo Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa.
Mas não adianta procurar essa definição – “Aurélio” – de dicionário no próprio. Ela não está lá. Nunca esteve e, provavelmente, nunca estará. “Seria pernóstico e pretensioso”, explicou – talvez com falsa modéstia – o “Mestre”, como amigos e discípulos chamavam Aurélio Buarque de Holanda. Ou, como definiu certa vez Mauro de Salles Villar, braço direito de Antônio Houaiss – o autor da obra que compete com o “Aurélio” pelo lugar mais alto no pódio da lexicografia em português, apesar de, como diz Motta, ser mais “rebuscado”: “O uso de ‘Aurélio’ como significado de dicionário é, na verdade, uma metonímia”.
Antônio Houaiss e Aurélio Buarque de Holanda – Foto: Arquivo pessoal de Aurélio Baird Buarque Ferreira/ Extraída do livro Por Trás das Palavras
Figuras de retórica à parte, o livro de Cezar Motta conta de forma instigante todas as idas e vindas que envolveram a edição do dicionário, tendo, obviamente, como ator principal o seu criador. O trabalho de Motta – oficialmente equilibrado em seis capítulos, sem sumário – pode também ser dividido em duas partes: a primeira, marcada por descumprimentos de prazos, fracassos, frustrações e pela incansável e conturbada busca por um mecenas, aquela figura patrocinadora generosa, protetora das artes e das letras – como bem define, claro, o “Aurélio”. A segunda, com o estrondoso sucesso após o lançamento, em 1975, e as subsequentes e intestinas disputas judiciais pela coautoria e por direitos autorais que levaram anos para serem dirimidas. Está tudo lá. Contar histórias da confecção de dicionários pode ser muito mais eletrizante do que imagina a vã filosofia do leitor menos atento – ainda mais quando fala-se de um que, ao sair à luz, pesava pouco mais de três quilos, custava o equivalente hoje a R$ 120,00, tinha 1.536 páginas em papel-bíblia e apresentava 120 mil verbetes.
Dr. Johnson, Webster e Oxford
Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (1910-1989) nasceu em Passo do Camaragibe, no interior de Alagoas, e aos 13 anos foi viver com a família em Maceió. Adolescente de fartos cabelos avermelhados, alto e inquieto, Aurélio não era necessariamente um aluno exemplar, mas chamava a atenção. Mas, por mais que se esforçasse, quem atraía mesmo a atenção entre os colegas de classe era um tal de Pelópidas Guimarães Brandão Gracindo, que a dramaturgia brasileira passaria a conhecer décadas mais tarde como Paulo Gracindo. “Logo de início, o novato se mostrara inquieto e insubordinado. Ele era de natureza um tanto avessa a quanto lhe limitasse os impulsos”, o descreveu um outro colega de turma no liceu alagoano, Arnon de Mello, que viria a ser governador de Alagoas e pai de Fernando Collor de Mello.
Depois que saiu da escola aguentou empregos burocráticos no governo alagoano até 1938, quando surgiu uma oportunidade de se mudar para o Rio de Janeiro, então Distrito Federal. Foi trabalhar na Revista do Brasil, dirigida pelo historiador Octávio Tarquínio de Sousa e, aos poucos, foi angariando prestígio junto à intelectualidade da então capital federal, até estrear como ficcionista com o livro Dois Mundos, lançado em 1942.
Ele começou a ganhar fama como dicionarista nos anos 1950, quando assumiu a condição de revisor principal do Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, editado pela Civilização Brasileira. “Mas o cargo não era suficiente para Aurélio, que mais tarde renegaria o Pequeno Dicionário e passaria a sonhar com um de sua autoria exclusiva”, conta Cezar Motta. Isso, mesmo ele sabendo que a vida de dicionarista nunca foi nada fácil, como bem definiu o dr. Samuel Johnson, grande lexicógrafo inglês do século 18, ele mesmo autor de um dos primeiros dicionários na língua de Shakespeare. Para ele, com certa rabugice, quem se dedicava a essa atividade era “um burro de carga, um inofensivo trabalhador de uma tarefa inglória, exaustiva e sem nenhum reconhecimento da sociedade”.
Correções feitas no “Aurélio” – Foto: Arquivo pessoal de Nélida Piñon/ Extraída do livro Por Trás das Palavras
O próprio Aurélio tinha uma outra definição para dicionarista. Quem quisesse trabalhar com dicionário deveria ser “muito vivo, inteligente; e um bocado burro”, afirmou ele em uma entrevista ao Pasquim em 1975, na época do lançamento do seu dicionário. “Se você for violentamente inteligente, parte com muita sede ao pote e não faz nada. As palavras são muito ariscas”, continuou ele na entrevista reproduzida no livro de Motta. Buscar o sentido das palavras não é algo simples e tudo muda com o tempo. Para se ter uma ideia, a primeira edição da histórica Enciclopédia Britânica, de meados do século 18, trazia esta definição para mulher: “female of the man”. Nada mais. Lacônica, reducionista e machista até as polainas do rei Jorge III. Mas era o retrato de sua época. No “Aurélio”, verbetes de outros dicionários ganharam, às vezes, dezenas de definições a mais.
Para fazer seu dicionário, Aurélio tinha em mente duas grandes obras: o Webster americano e o Oxford inglês. O primeiro, publicado desde 1828 e que estabeleceu um padrão para o inglês falado nos Estados Unidos, é criação do advogado, professor, jornalista e lexicógrafo Noah Webster. Chamava-se An American Dictionary of the English Language. Ok. Vá procurá-lo por esse nome. Nada feito. Mas se pedir um “Webster”… Pois é, cada língua com seu Aurélio. Quando foi lançado, o dicionário foi um fracasso editorial, vendendo apenas 2.500 exemplares. Mas a história se encarregou de consertar esse deslize.
Já o Oxford tem uma história um pouco mais curiosa. Em 1878, a Sociedade Filológica da Inglaterra decidiu fazer o seu próprio dicionário, uma obra definitiva que abrangesse não só o inglês falado na Grã-Bretanha, mas também nos Estados Unidos e nas colônias, como Canadá e Austrália. E escolheram, por óbvias razões acadêmicas e financeiras, a Universidade de Oxford para cuidar da empreitada. E os acadêmicos da prestigiosa universidade elegeram o professor escocês James Murray para pilotar o projeto. Murray não se fez de rogado e colocou anúncios em jornais ingleses, americanos e das colônias pedindo ajuda voluntária com palavras de toda e qualquer especialidade. O mais prolífico colaborador de Murray era um camarada chamado William Chester Minor, que toda semana enviava cem páginas caprichosamente manuscritas com sugestões de léxicos sobre história, medicina e guerras. Curioso, Murray decidiu finalmente conhecer seu assíduo colaborador. E descobriu que ele era, na verdade, um médico veterano da guerra civil americana internado em um asilo para loucos nos arredores de Londres. Dado a surtos psicóticos, Minor havia matado um operário a tiros. Essa história é muito bem contada no livro O Professor e o Demente, de Simon Winchester – e virou um filme interessante, estrelado por Mel Gibson e Sean Penn.
Bem se vê, a tarefa de dicionarista não é fácil, nem deve ser solitária – Aurélio Buarque chegou a ter cerca de 120 colaboradores para pesquisar palavras as mais diversas e criar seus verbetes. E é mais séria ainda quando não se tem nem dinheiro nem editora. E quando se tem as duas coisas, não se cumpre os prazos.
Sucesso e brigas judiciais
Marina Baird, Aurélio e Margarida dos Anjos – Foto: Arquivo pessoal de Nélida Piñon/ Extraída do livro Por Trás das Palavras
Essa era, na verdade, a cornucópia de problemas que rondavam Aurélio Buarque de Holanda e seu dicionário. Claro que sua fama de intelectual só fez aumentar ao longo dos anos – ao ponto de ele ser eleito para a Academia Brasileira de Letras em 1961. Mas sua fama de desorganizado e descumpridor de prazos também era uma constante. E os colaboradores mais próximos, de primeira hora, como Joaquim Campelo – guardem esse nome – e Margarida dos Anjos (filha do poeta Cyro dos Anjos), além de sua mulher, Marina Baird, viam como era difícil conseguir uma editora. Mas estavam todos dedicados a editar “o dicionário”, aquele que desbancaria qualquer outro, principalmente o Caldas Aulete, o, digamos, “Aurélio” do Brasil de finais da década de 1950.
Aurélio Buarque de Holanda ao tomar posse como membro da Academia Brasileira de Letras, em 1961 – Foto: Reprodução/ Extraída do livro Por Trás das Palavras
“No fim dos anos 50, todos os principais editores do País já acreditavam que seria Aurélio Buarque de Holanda o autor do grande dicionário da língua portuguesa que o mercado editorial tanto esperava. Mas Joaquim Campelo via um grave problema: na confluência da busca da perfeição com a realidade prática do trabalho, Aurélio se perdia”, escreve Cezar Motta, citando Joaquim Campelo, que passou a colaborar diretamente com Aurélio desde meados dos anos 1950 e ficou ao seu lado por três décadas. Foi Campelo, mais prático, que ficou encarregado de conseguir possíveis financiamentos para viabilizar o dicionário e também tentar tornar o trabalho mais objetivo. Isso, sem nunca ter recebido um tostão de Aurélio – o dicionarista considerava que a experiência e os conhecimentos que passava ao auxiliar eram pagamento suficiente, conta Cezar Motta. Durante muito tempo, esse trabalho foi um insucesso só. E a culpa era do Mestre. “Disciplinado, Campelo estranhava os hábitos de Aurélio, que acordava às 10 ou 11 horas, era desorganizado e caótico. O Mestre, segundo ele, era um pesquisador brilhante, leitor compulsivo, mas preguiçoso à sua maneira; fazia anotações de forma desconexa, acumulava papéis com novas palavras e definições nos bolsos, baús e gavetas”, afirma Motta em seu livro. Isso, sem se falar em outra característica de Aurélio: ser centralizador.
Em todas as tentativas de levar o dicionário adiante, a equipe – seguindo uma rotina de trabalho, buscando ideias e palavras em outros dicionários para aprimorar e aumentar seus significados em novos verbetes e preparando abonações (as citações literárias que referendam a definição dada) – se via paralisada justamente por quem menos deveria impedir o trabalho de caminhar. “A coisa empacava justamente no Mestre Aurélio, que retinha o trabalho pelo seu natural perfeccionismo. Era comum que verbetes simples ganhassem mais de cem acepções diferentes. Aurélio não tinha qualquer disciplina ou compromisso com prazos”, escreve Cezar Motta. Isso aconteceu nas várias vezes em que houve a tentativa de se tirar o dicionário do mundo das ideias. Foi assim com a revista O Cruzeiro, nos anos 1950, e com a Editora Delta, nos anos 1960, para ficarmos em apenas dois exemplos. Em ambos os casos, a situação foi a mesma: interesse grande na obra, entusiasmo inicial e depois… nada mais. Nas duas situações, Aurélio recebeu adiantamentos ou salário mensal, repassou trabalho para a equipe e prometeu entregar os verbetes. E fez como se a expressão “cumprimento de prazo” não estivesse entre eles – Cezar Motta afirma em seu livro que havia a desconfiança de que Aurélio atrasava propositadamente a entrega de originais para continuar recebendo seu salário. Para a revista, não entregou uma página sequer dois anos depois de assinar o contrato – e o acordo foi encerrado. Com a Delta, do empresário Abrahão Koogan, a mesma coisa: dois anos depois de assinado o contrato, nada feito. Resumindo: todos os editores e possíveis financiadores estavam agora escaldados e ninguém queria embarcar em uma barca lexicográfica furada. Mas Joaquim Campelo, que trabalhava também no Jornal do Brasil, continuava tentando – mesmo com dinheiro curto ou sem nenhum. Até o ex-presidente Juscelino Kubitscheck, então dono de uma financeira, foi procurado, mas educadamente declinou da proposta.
Até que a editora Regina Bilac Pinto, dona da Forense, fez uma sugestão: que tal Carlos Lacerda, dono da Editora Nova Fronteira? Campelo foi à editora – Aurélio não sabia negociar nada além de palavras -, falou com executivos da Nova Fronteira e com o próprio Lacerda, que, em um primeiro momento, não gostou da ideia. Mas acabou convencido pelo escritor e jornalista João Condé: “Foi Condé que convenceu Carlos Lacerda de que a Editora Nova Fronteira daria um passo histórico com a publicação do dicionário ‘Aurélio’”, escreve Cezar Motta. E, finalmente, a coisa andou. O contrato foi firmado em 17 de abril de 1974.
Em um ritmo frenético de entrega de originais, da letra A até a Z, o “Aurélio” ganhou forma e foi lançado no Rio de Janeiro, com toda a pompa e circunstância, no dia 11 de julho de 1975, “o ponto mais alto da carreira de um dos grandes filólogos brasileiros”, como atesta Motta. Mas o cartapácio de mais de 1.500 páginas já estava nas livrarias desde março, com uma tiragem inicial de 18 mil exemplares – e com cerca de mil erros, corrigidos nas reimpressões seguintes. O livrão não parou mais de vender. Em 11 anos, o “Aurélio” venderia o triplo de toda a obra reunida de Jorge Amado. E a disputa legal por seus direitos autorais começou.
Joaquim Campelo – Foto: Arquivo pessoal de Joaquim Campelo/ Extraída do livro Por Trás das Palavras
Isso porque Campelo, o fiel escudeiro que entrara na página de rosto do dicionário como colaborador, havia sido excluído de novos contratos de edição e reimpressão tanto do “Aurélio” quanto de seu filhote, o Minidicionário Aurélio, uma ideia que Sérgio Lacerda, filho do dono da Nova Fronteira, teve em 1977. A relação de Campelo e Aurélio já tinha azedado ainda em 1974, quando o ainda amigo achou que o Mestre estava pedindo dinheiro a Lacerda à sua revelia. O colaborador ameaçou colocar fogo nos originais do dicionário, mas a situação amainou – mas não cicatrizou. Com a nova perspectiva sobre os direitos autorais, Campelo processou Aurélio e a Nova Fronteira, mas perdeu todas as disputas, até no STF. A pendenga só acabou em 1985, mas a mágoa de Campelo permaneceu – até porque Aurélio, no prefácio à primeira edição, cita 43 nomes de pessoas que foram determinantes para a confecção da obra. Joaquim Campelo não está entre eles.
O “Aurélio” teve outros filhotes além do Minidicionário: o Aurélio escolar, o Mini Aurélio Infantil – com ilustrações de Ziraldo – e suas versões eletrônicas, primeiro ainda com a Nova Fronteira, depois com a Editora Positivo, detentora de seus direitos desde o começo do século 21. A concorrência aumentou muito nos últimos anos, mas a obra continua uma referência essencial – e é atualizado periodicamente pela lexicógrafa carioca Renata Menezes.
Aurélio Buarque de Holanda morreu no dia 27 de fevereiro de 1989, dois meses antes de completar 79 anos, depois de padecer por oito anos do mal de Parkinson. Morreu em casa, já que nos últimos tempos se recusava a ir a hospitais. Em sua última internação, porém, ele ainda conseguiu dar uma mostra de como, mesmo doente, ainda tinha uma ligação intensa com as palavras e com a língua portuguesa, como conta Beto Sales, filho do escritor Herberto Sales, no prefácio de Por Trás das Palavras:
“Na última vez que vi o Mestre, fui com meu pai visitá-lo no hospital, sua derradeira internação. Minado pela luta contra o mal de Parkinson, o Aurélio que estava ali na cama em nada lembrava a vibrante presença do homem que aproximou o brasileiro de sua língua. Mal balbuciava muxoxos guturais. De súbito, entra no quarto a médica que vinha acompanhando seu delicado quadro naqueles dias, e triunfalmente cumpre à risca o rito de mostrar bom humor diante da nossa patética impotência: ‘Grande mestre, vim aqui só para lhe ver!’. Aquele uso errado da transição do verbo ‘ver’ era a centelha para saber se de fato o Mestre ainda guardava com o nosso mundo algum elo. Olhei para a cama e vi Aurélio se retorcer com incrível dificuldade, seu tronco e braços enrijecendo como a preceder um movimento brusco que lhe seria impraticável, sua boca abrir além do que a letargia da doença permitia, e num esforço brutal sussurrar: ‘Vê-lo, vêêê-lo’”.
Por Trás das Palavras, de Cezar Motta, Editora Máquina de Livros, 192 páginas, R$ 49,00 (impresso), R$ 32,00 (e-book).
Cezar Motta lança, pela Máquina de Livros, de Bruno Thys e Luiz André Alzer, Por trás das palavras – As intrigas e disputas que marcaram a criação do dicionário ‘Aurélio’, o maior fenômeno do mercado editorial brasileiro. E tenta explicar como um livro de referência transformou-se no maior best seller brasileiro de todos os tempos, com mais de 15 milhões de exemplares vendidos.
O personagem central do livro é o Dicionário Aurélio e os bastidores da obra, revelados em detalhes pelo autor. Num trabalho de reportagem minucioso, Motta descreve a dinâmica de produção da mais ambiciosa obra de referência do País. Ele colheu depoimentos de quem esteve na linha de frente do dicionário e construiu uma narrativa que lembra o romance, não fossem reais os personagens. Foram escritores, acadêmicos, editores, jornalistas, políticos e empresários – um painel da intelectualidade do País – que participaram ou testemunharam os momentos determinantes de Aurélio Buarque de Holanda e sua equipe.
Cezar Motta é formado em Jornalismo pela UFF, trabalhou nas rádios Nacional e JB, na TV Globo, na revista Veja, e nos jornais O Fluminense, O Globo, Jornal do Brasil, Folha de S.Paulo, Correio Braziliense e Zero Hora. Passou ainda pela Comunicação Social do Senado Federal. É autor de Até a última página: uma história do Jornal do Brasil, de 2018.
Elena Brugioni fala sobre pós-colonialismo e pós-modernismo na perspectiva da literatura comparada, vertente que guia sua pesquisa em crítica literária em busca de caminhos não-hegemônicos
Texto por Luisa Ghidotti Souza
Literaturas africanas comparadas é um livro da professora Elena Brugioni que traz à área da crítica literária uma proposta de análise pouco explorada no Brasil. A autora chegou à Unicamp em 2016 para ministrar disciplinas em literatura africana na graduação dos cursos de Letras e Estudos Literários. A obra oferece grande contribuição, não só para a formação dos estudantes, mas também para as discussões sobre literatura comparada e estudos pós-coloniais, que vêm alcançando maior visibilidade no Brasil. Como nos mostra Brugioni, as pesquisas sobre esse tema vêm sendo conduzidas, em todo o mundo, com especial atenção ao tema do pós-colonialismo.
A recente obrigatoriedade do ensino de cultura e literatura africanas nas escolas brasileiras amplia o interesse pelo assunto. Como nos mostra Brugioni, as pesquisas em literatura africana vêm sendo conduzidas por pesquisadores, em todo o mundo, com especial atenção ao tema do pós-colonialismo, e discorre sobre alguns pontos relevantes para a esse tipo de análise aplicada aos romances históricos africanos. Literaturas africanas comparadas é finalista na categoria Línguas, Letras e Artes, do Prêmio ABEU 2020, da Associação Brasileira de Editoras Universitárias.
Editora da Unicamp: Para além do amparo teórico para a sala de aula da graduação, quais outras contribuições Literaturas africanas comparadas pode oferecer à área de crítica literária no Brasil?
Elena Brugioni: O livro é fruto de um percurso de estudo que tenho desenvolvido nos últimos anos, e a ideia principal foi reunir trabalhos e reflexões que pautam minha trajetória acadêmica no âmbito da pesquisa e da docência. As obras literárias analisadas no livro, bem como os tópicos críticos e as problematizações teóricas abordadas, pretendem estabelecer um diálogo com os debates que configuram os campos das Literaturas Africanas, da Literatura Comparada e dos Estudos Pós-coloniais em diversos contextos acadêmicos e institucionais, não apenas de língua portuguesa. Neste sentido, penso que a contribuição do livro, além de trazer para a sala de aula alguns dos mais canônicos e recentes debates críticos que pautam estes campos de estudo, é apresentar discussões e propostas que estabelecem um diálogo com problematizações teóricas matriciais que configuram as críticas literárias contemporâneas no âmbito dos estudos recentes sobre romance africano, do debate crítico comparatista sobre sistemas literário e literatura-mundial e das cartografias teóricas pós-coloniais, dentro e fora do Brasil. A literatura como sistema e alegoria nacional, ou ainda, como registro social e político, a relação da escrita literária com a modernidade e o capitalismo global, os temas da oposição e da resistência às narrativas coloniais e imperiais que pautam o romance africano contemporâneo, a relação entre escrita literária, história, memória e futuro em diversos contextos e situações pós-coloniais são algumas das questões desenvolvidas no livro. O contraponto entre línguas e tradições intelectuais, áreas de estudo, campos disciplinares e geografias críticas distintas são algumas das diretrizes teóricas e metodológicas que procurei seguir neste ensaio cujo objetivo primordial é o de pensar as literaturas africanas e suas possíveis cartografias críticas por meio de perspectivas conceituais e teóricas de matriz transacional. Por fim, pensando na contribuição que o livro pode dar ao campo da crítica literária no Brasil, não quero dizer que tentei fazer algo novo, pois não tenho grande simpatia por novidades — sobretudo quando se trata de crítica literária —, mas certamente procurei ensaiar leituras teóricas menos desgastadas e trazer alguns repertórios bibliográficos menos comuns.
Pesquisadores de grupo da pós-graduação publicam trabalhos orientados pela professora Lígia Dumont; prefácio é de Roger Chartier
Toda leitura, dos romances populares aos clássicos, é boa, e o contexto e a vivência de quem lê determinam, de forma decisiva, o sentido extraído. Essas são apenas algumas das convicções consolidadas ao longo da trajetória do Grupo de Pesquisa Informação e Leitura, vinculado ao Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação da UFMG. Formalizado no CNPq em 2007 e dedicado à investigação da introjeção do conhecimento por parte do leitor, o grupo acaba de publicar alguns de seus estudos no livro Leitor e leitura na Ciência da Informação, organizado pela professora Lígia Maria Moreira Dumont e editado pela Escola de Ciência da Informação (ECI) da UFMG.
O volume reúne trabalhos de ex-orientandos de Lígia, hoje pesquisadores, bibliotecários ou professores em instituições pelo Brasil. Segundo a organizadora do livro, que coordena o grupo Informação e Leitura, os oito capítulos da obra refletem a valorização de teorias que substanciam a visão do foco no leitor com base nos preceitos da Ciência da Informação. “Valorizamos também os diálogos com teorias e metodologias diversificadas, o que tem muito a ver com a complexidade do objeto de estudo”, afirma Lígia. Nas pesquisas do grupo, a ciência da informação conversa com teorias da recepção, sociologia das representações, etnometodologias, antropologia simbólica e história cultural, entre outros campos disciplinares.
Os autores tratam da experiência de grupos de leitores diversos, como amantes das histórias em quadrinhos, universitários que buscam conhecimento acadêmico e profissional, adolescentes beneficiados pela mediação da biblioteca da escola, crianças em situação de risco e frequentadores de bibliotecas públicas de Belo Horizonte e do Vale do Jequitinhonha.
Lígia Dumont ressalta que os interesses de seu grupo têm recaído, em boa parte, sobre os estratos sociais que mais precisam de leitura e conhecimento. Ao apresentar o livro, ela diz que as pesquisas têm em comum a certeza de que a leitura deve ser uma forma de garantir a todos o acesso à informação, o que é cidadania. “Os conhecimentos adquiridos, acrescidos de novas leituras, vão se modificando, se complementando e interagindo, a fim de transformar o ato de ler em uma ação verdadeiramente significativa”, escreve a organizadora.
Servidor da biblioteca da UFJF-GV, Allan Julio Santos assina capítulo que trata dos desafios em atuar e gerenciar essas unidades. (Imagem: Divulgação)
Quer conhecer um pouco a realidade das bibliotecas universitárias dos campi avançados? Então vale a pena dar uma conferida no livro “Leitura, acessibilidade e atuação d@s Bibliotecári@s”. A obra conta com a participação do servidor da Universidade Federal de Juiz de Fora em Governador Valadares (UFJF-GV), Allan Júlio Santos, que assina um capítulo que trata dos desafios em atuar e gerenciar essas unidades.
De acordo com Santos, o principal objetivo da obra é “a disseminação de ideias e ações no campo científico e acadêmico que fogem do lugar comum, com ideias inovadoras e apresentação de cenários factíveis de implementação” e fomentar discussões na área da biblioteconomia.
Na avaliação do servidor, o livro é relevante para a comunidade acadêmica porque destaca as soluções adotadas pela Biblioteca da UFJF-GV, onde ele atua, para superar dificuldades como o compartilhamento do espaço com outra instituição de ensino e a necessidade de adaptação dos produtos e serviços oferecidos às especificidades do campus.
Outra contribuição da obra é “apresentar temas correlatos que acrescentam na formação universitária, ao discutir a organização e disseminação da informação científica de forma acessível, utilizando para isso os canais das tecnologias da informação de modo prático e crítico”, frisa Santos.
Além do servidor da UFJF-GV, outros profissionais ligados à área contribuem com a publicação abordando temas como a atuação do bibliotecário escolar em rede, informática para pessoas com deficiência intelectual e informações acessíveis para usuários surdos em repositórios digitais.
“A Marca do Editor” é uma edição de escrita magnética, que acaba de ser publicada pela editora mineira Ayné
Texto por Claudia Costa
Na coluna Bibliomania desta semana, a professora Marisa Midori fala sobre o livro A Marca do Editor, de Roberto Calasso, escritor prolífico e editor de larga experiência, internacionalmente reconhecido. Segundo ela, “uma edição elegante e coroada por uma escrita magnética, que acaba de ser publicada pela Editora Ayné, de Belo Horizonte”.
“Para Roberto Calasso, o ofício do editor está muito próximo ao de um barqueiro e de um jardineiro”, diz a professora, citando um trecho do livro: “Tanto o barqueiro quanto o jardineiro aludem a algo que preexiste: um jardim ou um viajante a ser transportado. Todo escritor possui em si mesmo um jardim a ser cultivado e um viajante a ser transportado” (página 134).
A professora ainda fala do que pensa o editor sobre as obras digitais. Segundo ela, a promessa de uma biblioteca digital de acesso amplo e irrestrito soa-lhe tão ameaçadora quanto a substituição dos livros impressos por e-readers. Calasso afirma: “A questão é que a digitalização universal implica uma hostilidade contra um modo de conhecimento – e apenas em segundo momento para o objeto que o encarna: o livro”.
Qual a incidência de estudos de mulheres negras em Biblioteconomia e Ciência da Informação? Quantas epistemólogas negras conhecemos e referenciamos no campo? Quais as reflexões epistêmicas que mulheres negras latino-americanas têm realizado para pensar bibliotecas, ensino e prática em bibliotecas?
Natália Duque Cardona, bibliotecária e docente da Universidade de Antioquia, e Franciéle Garcês, bibliotecária e pesquisadora de doutorado na Universidade Federal de Minas Gerais, acabam de lançar a pré-encomenda do livro “Epistemologias Latino-americanas na Biblioteconomia e Ciência da Informação: contribuições da Colômbia e do Brasil”, publicado pelo Selo Nyota. O propósito da obra é apresentar discussões a respeito do significado da Biblioteconomia e Ciência da Informação na América Latina, a partir de reflexões e questões que incitem ao desenvolvimento epistemológico insurgente no campo, dando origem a uma “’epistemologia do sul’ que dê credibilidade às novas experiências sociais e contra-hegemônicas e aos pressupostos epistemológicos alternativos que estas experiências constroem e marcam.
O prefácio foi escrito pela Diretora da Escola Interamericana de Biblioteconomia da Universidade de Antioquia, Dorys Liliana Henao, e o livro foi elaborado com quatro capítulos, nos quais são abordadas reflexões críticas sobre interculturalidade no campo biblioteconômico-informacional, a dependência epistêmica e a colonialidade do saber na Biblioteconomia, os movimentos críticos contra-hegemônicos dentro da área, entre outros enfoques.
O lançamento está previsto para o início de novembro de 2020, a pré-encomenda do livro impresso (edição de impressão limitada) pode ser realizada até dia 10 de outubro de 2020. O sumário está disponível aqui:https://cutt.ly/tfIaf80e o formulário de encomenda aqui:https://cutt.ly/dfFKitK
Acontece com todo leitor. Às vezes olho para um livro, olho para outro, tento ler alguma coisa, mas bate um bode. Tem horas que o prazer pela leitura some e Graciliano Ramos algum é capaz de me segurar em suas páginas. Sem dramas. Jogo um videogame, passo raiva com o São Paulo, fico perdido com “Dark”… Logo a vontade de ler volta. Mas nem sempre.
Começo a me preocupar se a relação com os livros fica estremecida por mais de um dia. Até pelas obrigações, sem chances de ficar muito tempo longe de contos, romances, biografias e afins – e ler algo com má vontade só não é pior do que ler o Menino do Acre. Nesses momentos, no meu caso, um tipo específico de obra funciona que é uma maravilha para reavivar a paixão: justamente livros que falam sobre livros.
Passei por isso tem pouco tempo. Foi a chance para, com uma cerveja por perto numa tarde de preguiça, passear por alguns títulos bem interessantes lançados recentemente. O grandalhão “William Morris – Sobre as Artes do Livro” é lindo. Faz parte de uma coleção que a Ateliê Editorial vem publicando sobre precursores e nomes relevantes da história da editoração. Neste volume, óbvio, temos o trabalho de William Morris, designer dos mais famosos do século 19. Quem cuidou da edição, que faz um bom apanhado da história do livro na Inglaterra, foi Gustavo Piqueira, artista que vem se destacando há algum tempo em nosso mercado editorial.
Livro compila exaustivamente os artigos jornalísticos deste que foi um dos principais intelectuais do século 19
Texto por Folhapress
Luiz Gama – Foto: Divulgação
No largo do Arouche, em São Paulo, há um monumento em bronze com o busto de Luiz Gama. Numa de suas passagens pela estátua, imperiosa e monolítica, a professora Ligia Ferreira refletiu. Por que Gama precisa ficar ali, calado, deixando os outros falarem por ele?
Epifanias como essa motivaram a publicação, pelas Edições Sesc, de “Lições de Resistência”, livro que compila exaustivamente os artigos jornalísticos deste que foi um dos principais intelectuais do século 19.
O lançamento de um volume graúdo com quase tudo o que escreveu na imprensa esse pensador negro e autodidata, que se libertou da escravidão para se tornar uma das principais vozes do abolicionismo brasileiro, vem afinado à onda dos movimentos que procuram resgatar figuras apagadas por uma história escrita por homens brancos.
Não é como se Luiz Gama fosse um desconhecido, como atestam o monumento no Arouche e relatos da enorme comoção pública em seu funeral. Mas é muito menos frequente na bibliografia de cursos de letras e direito que o trabalho de uma gama de pensadores brancos -Silvio Almeida, que se tornou presidente do Instituto Luiz Gama, afirmou em entrevista à Quatro Cinco Um que não ouviu falar dele durante toda sua formação acadêmica.
Os objetivos deste Guia são elucidar dúvidas sobre o uso no ensino on-line do material protegido por direitos autorais e, ao mesmo tempo, tratar da proteção das gravações das aulas, com foco neste período excepcional e emergencial causado pela pandemia. Versões novas do Guia poderão ser lançadas com novas perguntas e respostas.
A Agir, braço editorial da Ediouro, está lançando a biografia em quadrinhos Miss Davis – A vida e as lutas de Angela Davis(formato 20,5 x 27,5 cm, 196 páginas, capa cartonada, R$ 59,90).
O roteiro é da francesa Sybille Titeux de la Croix, com arte do também francês Amazing Ameziane. Negra, ativista e revolucionária. Angela Davis é uma das maiores ativistas do nosso tempo. Sua história de vida e sua luta pelos direitos civis nos Estados Unidos a converteram em um símbolo do movimento negro e do feminismo.
Leia a matéria completa publicada peloUNIVERSO HQ e saiba mais sobre esse lançamento.
Livro reúne textos que contextualizam e explicam a trajetória de sucesso da Editora Brasiliense nos anos 1980
Texto por Marcello Rollemberg
Caio Graco Prado – Fotomontagem: Vinicius Vieira/Jornal da USP
Em finais dos anos 1970, a Editora Brasiliense estava em situação quase falimentar. Fundada em 1943 pelo intelectual Caio Prado Júnior e pelos empresários Arthur Neves e Leandro Dupré como polo de oposição ao Estado Novo de Getúlio Vargas, a editora ganhou muito prestígio ao editar as obras completas de Monteiro Lobato – que se associaria à editora em 1944 – e assim se manteve até o Golpe de 64, quando o governo militar recém-empossado passou a perseguir todos aqueles que tivessem discursos com tonalidades avermelhadas. Caio Prado Júnior e seu filho Caio Graco Prado ficaram uma semana presos em 1964, com base na Lei de Segurança Nacional. A partir daí, a editora começou a claudicar de vez e a cassação de Caio Prado Júnior, em 1969, não ajudou em nada na tentativa de reverter esse quadro. Quando Caio Graco Prado assumiu a Brasiliense em 1975, a situação parecia irreversível. Então, em 1979, ele teve um insight: por que não deixar de lado os livros massudos que a Brasiliense publicava e investir em um novo público, aqueles jovens universitários que começavam a respirar um pouco mais de liberdade depois do “verão da anistia”? Com esta visão e muita disposição para virar o jogo, criando coleções inéditas no mercado até então, Caio Graco Prado transformou a Editora Brasiliense em um ícone editorial dos anos 1980.
É justamente esta trajetória que é contada a partir de 13 textos curtos – escritos por professores e pesquisadores do mercado editorial – no livro Caio Graco Prado e a Editora Brasiliense (Publicações BBM), organizado pela professora Sandra Reimão, da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, e pela pesquisadora Gisela Creni. São testemunhos de como Caio, em pouquíssimo tempo, transformou uma editora pré-falimentar na maior produtora cultural da década de 1980, investindo em textos e formatos diferenciados e em novos autores, tendo sempre o público jovem como alvo. “[Caio Graco Prado] Foi o último dos editores da linhagem de José Olympio, Jorge Zahar, Alfredo Machado, Ênio Silveira e Jacó Guinsburg. Estes são editores históricos porque colocaram suas utopias políticas acima do projeto editorial. Ao mesmo tempo, como editor, Caio fica como uma lição de modernidade”, afirmou o editor Pedro Paulo de Senna Madureira, citado no livro. Nada mais correto.
“Agitador cultural”
Na verdade, o que Caio Graco promoveu naquele começo de anos 1980 foi uma pequena revolução ao fazer sua “opção preferencial pelos jovens”. Ao mesmo tempo que queria formar novos leitores, o editor também queria fustigá-los, aproveitando o momento de reabertura política que o País vivia. Mas Caio queria oferecer algo novo. E este novo surgiu como livrinhos em formato de bolso – uma ousadia naqueles tempos – e com títulos instigantes como O que é Socialismo, O que é Capitalismo ou O que é o Anarquismo. Era a coleção Primeiros Passos, surgida, na verdade, de um quase equívoco editorial. Explica-se.
Livros da coleção Primeiros Passos da Editora Brasiliense – Foto: ReproduçãoCaio Graco Prado e a Editora Brasiliense
Caio Graco sabia que queria falar com os jovens universitários de uma forma mais leve, mas também com substância, mas não tinha ideia exatamente de como fazê-lo. Então pensou em comprar os direitos de uma coleção espanhola chamada “Que es…”. Só que esta coleção estava voltada para o público interno da Espanha, não tendo nada a ver com o Brasil que surgia. Coube a um editor iniciante, chamado Luiz Schwarcz, alertar ao chefe do problema e sugerir – cheio de dedos – que a Brasiliense produzisse sua própria coleção, com títulos próprios e autores pouco conhecidos do público, professores universitários jovens ou não. Caio topou na hora e a Primeiros Passos nasceu. E cresceu – muito. O sucesso foi imediato. Entre 1980 e 1989, foram mais de 200 títulos e cinco milhões de exemplares vendidos. Somente nos primeiros quatro anos da coleção, a Brasiliense publicou mais do que em toda sua história anterior.
“Ao publicar esses títulos a editora cumpria o papel de ligar assuntos da conjuntura nacional com temas universais. Ou seja, tratava das questões internas a partir do estímulo às leituras temáticas mais amplas, oferecendo ao leitor, indiretamente, um determinado instrumental para análise da política do período”, escreve Andrea Lemos, professora da UERJ. Aquela primeira experiência fez o editor ousar ainda mais, criando novas coleções que capturaram corações e mentes com a mesma rapidez. Tudo é História, Cantadas Literárias, Circo de Letras, Encanto Radical traziam tanto informação e conhecimento como também investiam em uma literatura ficcional nova, diferente, com autores como Marcelo Rubens Paiva e seu Feliz ano velho – o livro mais vendido no Brasil nos anos 1980 –, Jack Kerouac e todo o panteão beatnik, Bob Dylan. É bem provável que não haja leitor, na faixa dos 50 anos de idade hoje, que não tenha sido seduzido pelos títulos da Brasiliense e formado seu gosto literário a partir daí.
Livros da Editora Brasiliense – Foto: Reprodução
Em uma palestra na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP em 1986, Caio Graco definiu seu papel de editor como sendo o de um “agitador cultural”. E lembrou aos alunos o lema da editora: “Dividir opiniões, multiplicando cultura”. Essa agitação toda e a multiplicação cultural duraram praticamente a década inteira – Caio Graco ainda encontrou tempo para sugerir a cor amarela como símbolo para a campanha das “Diretas Já”. Mas no começo dos anos 1990, a Brasiliense começou a claudicar novamente: a concorrência ficou pesada – outras editoras descobriram o filão e investiram nele – e Caio Graco fez apostas empresariais que se mostraram erradas. Mas o grande baque para a editora se deu no dia 18 de junho 1992: ao fazer uma trilha de moto – uma de suas outras paixões – no interior de Minas Gerais, Caio Graco Prado sofre um acidente e morre. O editor e agitador cultural estava com 60 anos. A partir de então, a Brasiliense passou a viver em um ostracismo que direções sucessivas tentam reverter até hoje. Mas a grande fase da editora ficou cravada nos anos 1980 – justamente essa que o livro organizado por Sandra Reimão e Gisele Creni resgata em boa hora.
Não há dúvida de que a leitura dos grandes clássicos da literatura universal seja um meio privilegiado para o nosso desenvolvimento intelectual e cultural. Mas e se nos dissessem que, além disso, esta leitura pode nos curar de muitas doenças da alma? Baseado numa experiência desenvolvida originalmente numa escola de medicina, este livro fala sobre um experimento (o Laboratório de Leitura) que, partindo da leitura e discussão coletiva dos clássicos, tem propiciado um poderoso efeito humanizador e terapêutico que vem transformando a vida de muitas pessoas.
Para quê mais um trabalho sobre leitura na escola fundamental da rede pública no Brasil, tendo por centro de interesse a camada da população cuja preocupação primeira é com a sobrevivência diária, em condições precárias de vida? Quem conhece o poder da leitura sabe que ela nos permite ler mais do que palavras. Através dela podemos ler o mundo. Desenvolver a prática literária em escolas públicas significa reconstruir a história junto a uma nova geração de alunos, oriundos de diferentes estratos sociais. O exercício da leitura é uma ferramenta de transformação e socialização, especialmente para crianças e pré-adolescentes. Neste livro, a autora aposta, ainda, na necessidade dos educadores se enxergarem como uma ponte entre o livro e o aluno. Conscientes, devem rever a importância do ato de ler nas escolas, bem como o papel dessa prática na constituição de cidadãos.
Práticas de leitura de histórias em quadrinhos no ensino fundamental apresenta sugestões de práticas de leitura realizadas com o gênero história em quadrinhos (HQ), tendo como base teórica os autores Vygotski (aprendizagem), Bakhtin (linguagem), Marcuschi (gêneros textuais), Soares (letramento) e Solé (habilidades de compreensão leitora), entre outros. O leitor encontra nestas páginas atividades de leitura com o gênero HQ elaboradas com base em estratégias de compreensão de texto sugeridas por Solé. As autoras também propõem o uso do conceito de sequência didática (Dolz) para organizar as atividades propostas – atividades que possibilitam a interação entre os indivíduos, para que eles possam socializar o conhecimento na compreensão de que a linguagem ocorre em função de relações interpessoais, por meio dos enunciados produzidos pelos indivíduos durante as situações comunicativas.
Entrevista com Lisa Krolak, do “Instituto para a Aprendizagem ao Longo da Vida” da UNESCO
Sem dúvida, as prisões são alguns dos ambientes mais difíceis nos quais as bibliotecas podem ser encontradas, trabalhando com leitores que enfrentam problemas complexos. No entanto, ajudando a desenvolver novas habilidades e a preparar apenados para a vida do lado de fora, elas podem ter um grande impacto. Para descobrir mais, trazemos a entrevista feita com Lisa Krolak, bibliotecária-chefe do Instituto para a Aprendizagem ao Longo da Vida da UNESCO na Alemanha.
1) Por que focar nas bibliotecas prisionais em particular?
De acordo com padrões internacionais, os presos têm o direito de acesso à educação e informação, incluindo serviços de bibliotecas de qualidade. No entanto, na realidade, a maioria das bibliotecas prisionais não possui recursos suficientes e trabalha isoladamente. A opinião pública geralmente não é a favor de tratar bem os prisioneiros e vê o encarceramento como punição ou dissuasão. No entanto, um dia, a maioria dos prisioneiros é libertada e deve ser do nosso interesse que eles possam viver vidas livres de crimes depois. É mais provável que os presos venham de grupos e comunidades pobres, discriminados e marginalizados, e é mais provável que tenham tido uma experiência educacional limitada ou inexistente do que o resto da sociedade. Muitos têm dificuldades em ler e escrever e provavelmente nunca ou raramente usaram uma biblioteca antes. Oferecer oportunidades educacionais, incluindo serviços de biblioteca de qualidade, é uma maneira de apoiar sua reabilitação.
2) Que diferença as bibliotecas prisionais podem fazer?
O acesso à educação e, mais especificamente, bibliotecas e materiais de leitura podem ajudar a quebrar o ciclo de desvantagens educacionais, pobreza, violência e crime. Além de apoiar a aprendizagem ao longo da vida e a oportunidade de melhorar os níveis educacionais, as bibliotecas prisionais podem fornecer serviços que ajudem os prisioneiros em suas vidas diárias e os auxiliem em planejar sua liberação. Fornecer materiais para a leitura de prazer e outras oportunidades de entretenimento é uma maneira construtiva de passar o tempo livre e pode ser um meio de distração e fuga das preocupações diárias. As bibliotecas prisionais também apoiam a coesão social, atuando como locais de encontro com um ambiente calmo, descontraído e seguro, além de espaços para leituras, debates e cultura. Além disso, há o potencial transformador de participar de atividades de alfabetização (como círculos de leitura ou oficinas de escrita criativa), que propiciam o pensamento crítico e permitem que os apenados reflitam sobre sua vida. Usar os serviços da biblioteca da prisão é uma das poucas oportunidades nas quais os presos têm autonomia e responsabilidade de fazer suas próprias escolhas, selecionando o que ler e como se informar.
3) Que fatores os impedem de conseguir isso?
Pouquíssimos países têm sistemas bem estabelecidos de bibliotecas prisionais administrados por bibliotecários profissionais. Na maioria dos lugares, elas são administradas por funcionários designados da prisão, com a ajuda de reclusos ou voluntários da comunidade que não receberam ou receberam pouco treinamento em biblioteconomia prisional.
4) Que escopo existe para a aprendizagem e o intercâmbio mútuos entre bibliotecários penitenciários e outros bibliotecários?
As bibliotecas prisionais fazem parte da comunidade mais ampla de bibliotecas. Idealmente, os presos devem receber os mesmos serviços de biblioteca que as pessoas que vivem fora da prisão. Existem sistemas em que as bibliotecas prisionais são ramificações da rede de bibliotecas públicas locais. Isso garante padrões profissionais e a chance de introduzir prisioneiros em um serviço público que, esperançosamente, eles continuarão usando quando forem libertos. Em outros países, o sistema de bibliotecas públicas fez um esforço organizado para modernizar as bibliotecas prisionais de acordo com seus padrões. De qualquer forma, bibliotecários públicos e prisionais devem se conectar e trabalhar juntos. Eles podem se reunir regularmente, compartilhar materiais e planejar atividades comuns, como leituras de autores dentro e fora das prisões. As bibliotecas prisionais também podem participar de atividades culturais da comunidade em geral, como noites de leitura ou eventos de leitura em voz alta, que podem servir como uma ponte perfeita entre os dois mundos.
5) Que medidas você planeja tomar para garantir que os tomadores de decisão compreendam o valor de bibliotecas prisionais eficazes? O que você espera que eles façam?
No meu Instituto, o Instituto para a Aprendizagem ao Longo da Vida da UNESCO, publicaremos em março um resumo de políticas sobre bibliotecas prisionais destinadas a tomadores de decisão. Ele será distribuído no próximo Congresso do Crime da ONU em abril de 2020, alcançando autoridades penitenciárias de todo o mundo. Este mês, meu livro sobre bibliotecas prisionais foi publicado em alemão. Enviaremos para todas as prisões de língua alemã na Alemanha, Áustria e Suíça. Duas cópias cada, uma para a administração penitenciária e uma para o serviço de biblioteca da prisão. Além disso, forneceremos a todos os ministros federais alemães e senadores da Justiça uma cópia gratuita.
Para enfatizar ainda mais o potencial transformador das bibliotecas prisionais precisamos realizar e coletar mais pesquisas sobre os benefícios e os impactos das bibliotecas prisionais e encontrar maneiras de compartilhar essas descobertas com os tomadores de decisão. Os documentos de políticas internacionais já pedem o estabelecimento de bibliotecas prisionais, mas não fornecem diretrizes ou padrões de qualidade, particularmente sobre financiamento. Os tomadores de decisão podem ter a melhor intenção e consultar as políticas mais bem escritas, mas se no final do dia eles não fornecerem orçamento suficiente para materiais, atividades e treinamento contínuo para os funcionários da biblioteca da prisão, o serviço da biblioteca simplesmente não alcançará seu potencial.
6) Como você planeja levar esse trabalho adiante na IFLA?
No Congresso Mundial da IFLA em Atenas, em agosto de 2019, iniciamos um Grupo de Trabalho sobre Bibliotecas Prisionais. No momento, compreendemos cerca de 40 bibliotecários penitenciários e bibliotecários públicos, acadêmicos e pessoas que trabalham em organizações da sociedade civil com foco em apoiar as bibliotecas penitenciárias. O grupo já forneceu informações valiosas para o as políticas acima mencionadas para as bibliotecas prisionais. Em uma próxima etapa preencheremos a página do projeto recém-criado das bibliotecas prisionais, localizado no site da Seção da IFLA sobre Serviços de Biblioteca para Pessoas com Necessidades Especiais (LSN), com informações relevantes.
No início do verão, começaremos a atualizar e revisar as Diretrizes da IFLA para a prestação de serviços de biblioteca para apenados, pois as atuais diretrizes datam de 2005. As novas Diretrizes serão apresentadas em uma sessão sobre bibliotecas prisionais, que ocorrerá no Congresso Mundial da IFLA em Roterdã em agosto de 2021, onde esperamos também poder visitar uma biblioteca prisional.
A maioria das bibliotecas prisionais enfrentam desafios significativos. Elas geralmente são insuficientemente financiadas, não são muito atraentes e estão localizadas em locais inadequados e inacessíveis. Além disso, elas geralmente precisam contar com materiais doados e frequentemente desatualizados que não refletem os interesses, níveis de leitura, habilidades linguísticas ou necessidades da população carcerária. Em muitas bibliotecas prisionais um foco especial deve ser dado aos prisioneiros com baixos níveis de alfabetização e com formação em idiomas não nativos. Isso pode ser feito fornecendo materiais fácil leitura e em vários idiomas, mas esses materiais específicos não estarão disponíveis em muitas bibliotecas prisionais.
Entrevista originalmente feita pela IFLA (Federação Internacional de Associações e Instituições Bibliotecárias).
Tradução: Anderson Santana, Bibliotecário, Chefe Técnico do Serviço de Biblioteca e Documentação do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (USP).
Especialista em estudos sobre mídias sociais, Pollyana Ferrari traz reflexões sobre como a tecnologia transformou a sociedade, principalmente na pandemia
Texto por Graziela Salomão (@GRAZISALOMAO)
A realidade anda parecendo surreal demais, né? Pandemia, isolamento social, fake news, discussões sobre fascismo. “A desinformação é o parasita do século 21”, afirma a jornalista e pesquisadora de mídias digitais Pollyana Ferrari. Depois que tudo isso passar (vai passar, acredite!), qual será o novo presente que construiremos?
Como a tecnologia é responsável por termos chegado até aqui e o que podemos esperar dela nesse futuro a curto prazo? “Ninguém veio a passeio, é preciso entender o que temos para hoje, respirar, fazer a leitura do contexto e seguir”, diz Pollyana, uma das mais destacadas estudiosas brasileiras na pesquisa das relações criadas entre homens e redes sociais, tema abordado na coletânea Nós – tecnoconsequências sobre o humano (Editora Fi) em versão totalmente digital e gratuita (para baixar, cliqueaqui).
Nos 10 capítulos, Pollyana e um grupo de pesquisadores do Comunidatas, liderado por ela na PUC-SP, trazem reflexões sobre nosso modo de viver, sobre fake news na política, apps de relacionamento (será que eles foram bons para os relacionamentos mesmo?), influência do Instagram e do Twitter, além de provocações sobre o que estamos construindo para nosso futuro. E a cada capítulo, uma proposta de trilha sonora para acompanhar. “Vivemos com música. Por que não nos livros também? Cada tema tem uma sequência que, sinestesicamente, foi pensada para embalar aquela discussão”, explica.
O título homenageia o romance distópico Nós, do escritor russo Ievguêni Zamiátin. Escrito em 1924, o livro serviu de inspiração para o clássico 1984, de George Orwell – tão falado nesses tempos pandêmicos – e mostra uma sociedade na qual o Estado exerceria um controle único sobre uma população totalmente vigiada por ele. Era a tecnologia a serviço do poder. E será que podemos usá-la de uma forma positiva na realidade de hoje? “Com fake news, manipulamos a população e distorcemos a história. Estamos num momento crucial, de virada. É urgente. Ou entendemos que precisamos das redes sociais, dos bots, dos APPs, dos celulares para incluir cidadãos ou perderemos o trem para sempre”.
Acesse a matéria completa publicada pela Revista Glamoure leia a entrevista da autora sore o livro.
A edição tem tradução assinada por Monteiro Lobato
O livro reúne alguns dos famosos textos desses mestres em uma edição cuidadosa | Foto: Divulgação
Charles Perrault, Hans Christian Andersen e os irmãos Jacob e Wilhelm Grimm se tornaram nomes de referência para a literatura infantojuvenil em todo o mundo e criaram histórias que encantam ainda hoje nosso imaginário popular. O livro de ouro dos contos de fadas, da Nova Fronteira, reúne alguns dos famosos textos desses mestres em uma edição cuidadosa, que promete fazer a alegria de leitores de todas as faixas etárias.
Para evidenciar a universalidade e atemporalidade dessas narrativas, artistas brasileiros contemporâneos foram convidados a preparar ilustrações inéditas para o livro, que ganhou ares de item de colecionador. Alexandre Camanho foi o escolhido para transformar em imagens as cenas pungentes de Perrault; Lelis, com suas aquarelas, deu forma ao universo de Andersen; e Renato Moriconi emprestou seus traços aos personagens sombrios dos Grimm.
Acesse a matéria completa publicada no Em Tempo e conheça mais sobre o livro “O Livro de ouro dos contos de fadas”.
Miles, R.A., Konkiel, S. and Sutton, S., 2018. Scholarly Communication Librarians’ Relationship with Research Impact Indicators: An Analysis of a National Survey of Academic Librarians in the United States. Journal of Librarianship and Scholarly Communication, 6(1), p.eP2212. DOI:http://doi.org/10.7710/2162-3309.2212
Con frecuencia se espera que los bibliotecarios universitarios, especialmente en el campo de la comunicación académica, comprendan e interactúen con los indicadores de impacto de la investigación. Sin embargo, gran parte de la literatura actual especula sobre cómo los bibliotecarios universitarios están utilizando e implementando indicadores de impacto de investigación en su práctica.
Este estudio analizó los resultados de una encuesta de 2015 realizada a más de 13,000 bibliotecarios universitarios en Estados Unidos. La encuesta se concentró en la familiaridad de los bibliotecarios universitarios y el uso de indicadores de impacto de la investigación.
Este estudio descubrió hallazgos relacionados con los diversos niveles de familiaridad de los bibliotecarios universitarios con los indicadores de impacto de la investigación y cómo implementan y usan los indicadores de impacto de la investigación en su desarrollo profesional y en sus tareas laborales en la biblioteca.
En general, los bibliotecarios uniuniversitarios con tareas regulares de apoyo a la comunicación académica tienden a tener mayores niveles de familiaridad con los indicadores de impacto de la investigación. En general, los bibliotecarios universitarios están más familiarizados con el recuento de citas y las estadísticas de uso y menos familiarizados con las métricas alternativas. Durante las consultas con el profesorado, es más probable que se aborden el Factor de impacto de la revista (JIF) y los recuentos de citas que el índice h del autor, las métricas alternativas, las medidas cualitativas y las revisiones de expertos por pares. Los resultados de la encuesta también apuntan a un creciente interés en la métrica alternativa entre los bibliotecarios académicos por su avance profesional.
Los bibliotecarios universitarios tienen el desafío constante de seguir el ritmo del panorama cambiante de las métricas de impacto de la investigación y los modelos de evaluación de la investigación. Al mantener el ritmo e implementar indicadores de impacto de la investigación en sus propias prácticas, los bibliotecarios académicos pueden proporcionar un servicio crucial a la comunidad académica en general.
Publicação recém-lançada sobre o processo de musealização de coleções em distintos contextos, sob visões teóricas e práticas. Disponível para download gratuito!
Ao lançarem obra sobre a Educação dos Sentidos e das Sensibilidades, três autores refletem acerca da importância de resistir ao produtivismo acadêmico e valorizar – em vez da mera publicação de artigos em revistas herméticas – as obras coletivas
Texto por Katya Braghini, Kazumi Munakata e Marcus Taborda
Por que, a essa altura do campeonato, publicar um livro? Certamente, não um livro cuja leitura é interdita – um livro inacessível não porque tenha sido censurado, mas por ocultar segredos, acessíveis apenas aos iniciados. Esse pode ser o caso do livro de receitas em que as avós ocultavam os misteres de seus quitutes, mas pode também ser a Bíblia, cuja leitura, segundo a denúncia protestante, a ortodoxia católica teria proibido, embora, na verdade, apenas tivesse condenado a leitura “sine glossa”, isto é, sem o esclarecimento dos intérpretes autorizados – o que, afinal, equivale à censura. Há também o livro proibido imaginado por Umberto Eco, em O nome da rosa, que matava quem se atrevesse a lê-lo.
É óbvio que todos os livros são proibitivos se as pessoas não souberem ler. Isso institui na sociedade a divisão entre letrados e iletrados e, nas religiões baseadas no Livro, entre sacerdotes e leigos. Os que sabem ler (e escrever) constituem uma casta, como na China e no Egito antigos, cujos membros tornam-se zelosos guardiães do sistema da escrita, cuja complexidade lhes assegura o monopólio do ofício. Nesse sentido, a invenção da escrita alfabética, com reduzida quantidade de letras, abriu a possibilidade de uma difusão mais ampla e democrática da cultura, embora isso também significasse maior vigilância sobre os livros que não podiam ser lidos.
Em todo caso, o livro de que se trata aqui é de outra ordem. É o livro iluminista, que se torna suporte e veículo de difusão das ideias, embora possa conter em si a maldição, proferida por Adorno e Horkheimer, da “indústria cultural”. Impressos em série e em grandes quantidades graças à invenção de tipos móveis para impressão, a tipografia de Gutenberg (c. 1439), os livros tornam-se, de fato, mercadoria. A Reforma protestante vai, de certo modo, assegurar-lhes a legião de consumidores, já que o preceito luterano de “sacerdócio universal” obriga que todos devam ler e interpretar a Bíblia.
A Bíblia impressa foi de fato um grande sucesso. O Novo Testamento, traduzido para o inglês por Tyndale e publicado em 1526 a preços “populares”, vendeu, nos três anos seguintes, 18 mil exemplares, em seis edições – muitos dos quais comprados e queimados pelas autoridades religiosas… O próprio Lutero tornou-se verdadeiro best-seller: Eisenstein relata que as famosas 95 teses se sua autoria, que teriam servido de estopim para o movimento de Reforma, em 1517, foram vertidas de latim para alemão e depois para outras línguas vernáculas, tornando-se “o artigo mais vendido em toda a Europa Central”.
Esse mercado, obviamente, cresceu sobretudo nas regiões protestantes. Em lugares onde o catolicismo dominava, a Bíblia em vernáculo passou a constar do Index Librorum Prohibitorum (Índice de Livros Proibidos), instituídos em 1559 no Concílio de Trento. Paradoxalmente,
(…) Index fornecia publicidade gratuita para os livros nele arrolados. (…) Desse modo, as decisões tomadas pelos censores católicos acabavam, sem o querer, desviando as publicações protestantes em direção a novas tendências estrangeiras heterodoxas, libertinas e inovadoras.i
Não que os leitores protestantes tivessem passado a adquirir literatura de toda a espécie, nem que o mercado fora abarrotado de ilicitudes. O lema luterano de “sola scriptura” (uma única escritura) podia significar interdição de ler outros livros que não a Bíblia. Mas a possibilidade de novas experiências de leitura, aberta com a tipologia, ensejava “tendências tolerantes ‘erasmianas’, chegando a um nível mais elevado de crítica e modernidade”.ii
Essas duas posturas em relação à leitura remetem às atitudes denominadas por “leitura intensiva” e “leitura extensiva”.iiiA primeira maneira de leitura, a intensiva, é a dos sectários, dogmáticos e ortodoxos, que leem e releem sempre o mesmo Livro (sola scriptura), de seu guru ou, como dizem os franceses, “maître à penser”; recitando sempre os mesmos extratos, impondo a mesma análise para as mais diversas situações, além de manifestar desprezo por outras obras. A extensiva, ao contrário, é a que não se contenta com poucos livros: busca sempre novas perspectivas e abordagens, ideias inusitadas e heterodoxas, o que propicia comportamento bibliófilo e consumista, para a alegria dos editores. Foi graças ao crescimento dessa modalidade de leitura que tornou possível, por exemplo, que as regras de arquitetura clássica propostas por Vitrúvio (século I a.C.) fossem amplamente conhecidas por meio de livros impressos; e que Kepler realizasse seus cálculos astronômicos utilizando as tábuas de logaritmos de Napier, já publicadas, em vez de refazer as mesmas operações. Mais do que isso, a leitura extensiva se efetiva, no entanto, quando as ideias podem ser amplamente divulgadas.
O presente livro supõe essa leitura extensiva. Aqui não cabem posturas de seita e de ortodoxia, mas a abertura para o novo. Reunião de vários autores, distintos e díspares, o livro também se assemelha de certo modo a uma biblioteca, como espaço de saber coletivo, de espaços e tempos utópicos.
No Brasil, em maio de 2020, estamos pensando se vale a pena produzir livros… Vemos que esse ceticismo percebido como o “mal das bibliotecas”, sejam elas o espaço de guarda ou a representação de uma leitura extensiva, pareceestar causando mal-estar em um agrupamento de temerosos e um tanto ressentidos por livros. Não se trata apenas de restrição aos conhecimentos que eles podem trazer. Ao anular a ideia de coletâneas vemos um rancor inconfesso contra a possibilidade de agremiações. Pensando a administração da pesquisa acadêmica, há contradições entre as determinações que visam o seu desaparecimento e os e os critérios de avaliação que, segundo consta, existem para bem nos qualificar. Fazer uma coletânea é uma das ações do ofício e ao impingir a sua desvalorização, não estamos apenas diminuindo o valor de um objeto, estamos cerceando as ações de pessoas que, de tempos em tempos, se unificam para expor conhecimentos.
Os fatores que colaboram para o declínio das coletâneas são apresentados de maneiras variadas. Mas, não sejamos vítimas. Não nos esqueçamos de que um livro é um objeto de consumo, fruto do interesse de mercado, que diz respeito aos seus produtores e seus leitores. Também é ampla a discussão sobre a valoração e a manutenção de livros como base física para guarda de conhecimentos e informações.
Tratemos da pauta sobre a pertinência da publicação de livros. As agências de fomento à pesquisa vêm diminuindo o valor atribuído a este tipo de produção intelectual, o que afeta a avaliação e consequente classificação de programas de pós-graduação, professores e pesquisadores e seus projetos de pesquisa. Há também a disseminação, em especial em uma área como a Educação, a publicação de coletâneas sem qualquer tipo de cuidado, com um mínimo de organicidade, unidade, coerência. Em relação a este aspecto, muito motivado por um mercado editorial e por uma compulsão pela publicação, com tudo que daí advém (visibilidade, status, reconhecimento), com frequência as coletâneas em formato de livros reúnem textos díspares, sem conexão entre si, sem uma problemática comum. Mais ainda em um momento em que também está disseminado o autofinanciamento, que não raro significa um acordo tácito entre autores e editores, de que qualquer coisa pode ser publicada, desde que haja dinheiro para isso. Este caso trata mais de um apelo mercadológico do que propriamente acadêmico, principalmente considerando que não é possível medir com facilidade o impacto dessas coletâneas e, menos ainda, dos seus capítulos individualmente. Mesmo assim, em muitos casos elas fazem todo o sentido, quando se trata de disseminar o trabalho de alunos, por exemplo, uma vez que eles também estão premidos pela lógica do “publica ou desapareça”.
Sobre as avaliações, o problema maior da tendência a diminuir o valor dos livros tem a ver com a negação de formas tradicionais de criação de conhecimento, ao menos no âmbito das humanidades, bem como com a dificuldade de acesso de um público mais amplo ao que é produzido na universidade. Claro está que as mutações das formas de comunicação, hoje, em tese, disponibilizam um acesso mais livre e direto ao conhecimento. Mas em vez de tratar a telemática como uma ampliação das oportunidades de acesso, isso tem sido usado como argumento para desestimular a produção de livros. Ainda se tem em conta que, afora um público muito especializado – portanto, restrito – pouca gente acessa as plataformas dos periódicos acadêmicos para acompanhar o desenvolvimento de um tema. Portanto, já se tornou uma ladainha a ideia que o acesso virtual à leitura, ou ao conhecimento produzido, substituirá este produto cultural chamado livro.
Os livros em geral, são um verdadeiro repositório da cultura. Seja pelo seu propósito, pelo seu formato e suporte ou pela possibilidade da sua preservação, as Humanidades sempre se valeram dos livros para disseminar o conhecimento, seja aquele filosófico, histórico, sociológico ou científico. Reside aí um sentido comum do livro como suporte. E uma vez publicado, um livro pode permanecer depositado em uma biblioteca por séculos de existência. Logo, é um tipo de produto que se perpetua tanto pela sua materialidade, quanto pelo seu objetivo de atualizar a tradição. Como se pode esperar o mesmo das tais “nuvens”, ou de repositórios on line? Fica a pergunta se nos vale mesmo as balizas de publicação de artigos em revistas em detrimento de publicação de livros? Uma revista pode não ter suporte em papel e ter o seu conteúdo guardado em algum lugar. Mas como disponibilizar o acesso no caso de tais nuvens serem apagadas e se tais aparelhos on line desaparecerem? E mais: quem, efetivamente, tem acesso a endereços eletrônicos tão específicos que são acessados por códigos, senhas e, em muitos casos, mediante pagamento?
Um exemplo dessa perspectiva pode ser oferecido pelos trabalhos de muitos livros ditos clássicos que circulam entre os acadêmicos. Obras de autores importantes do século XVIII, XIX e XX, chegaram ao público brasileiro não raro da forma de compilação de textos publicados como folhetins, artigos em revistas, livros em outros países e línguas etc. Não é demais lembrar que muitos textos importantes podem ser encontrados pelo leitor não especializado em gôndolas de supermercado no formato de livro, ainda que não se aprofunde a discussão sobre o alcance da indústria cultural. Não fosse a possibilidade que os livros oferecem, certamente conheceríamos muito menos do que conhecemos sobre a produção humana, inclusive a científica.
Do ponto de vista do mercado e do seu consumo, é claro que os livros também devem ser considerados rigorosamente como um produto. Mesmo os chamados livros autorais poderão ter sucesso ou não, vender muitas edições ou não. O que dizer de um trabalho como O queijo e os vermes, de Carlo Ginzburg? Ou de alguns títulos da obra filosófica de Friedrich Nietzsche? Os usos que podem ser feitos de trabalhos deste quilate são os mais diversos, indo desde o deleite literário até a banalização da autoajuda. Mas é fato que o suporte facilita a disseminação de ideias e tem um alcance bastante amplo, se considerarmos os aspectos restritivos dos periódicos acadêmicos. E no sentido da disseminação de ideias, não se trata mais de apresentar a produção de livros ou artigos em periódicos, mas de circulação, recepção, apropriação, se quisermos. E para isso há toda uma dinâmica material que permitirá a sua disseminação. E os periódicos acadêmicos? Salvo em situações muito precisas, restritas, através dos meios de divulgação científica de apelo popular, raramente alguém travará contato com o material ali publicado, que normalmente requer algum grau de especialização para ser acessado.
Além disso, há uma progressiva diminuição dos espaços para divulgação de ideias em periódicos, outra exigência de indexadores pretensamente “universais”, o que pode gerar a apresentação de um elenco fragmentado de investigações. Já um bom livro nos faz conhecer um trabalho na sua inteireza: acompanhamos o pensamento de um autor sobre determinado assunto ou argumento, aprofundamos o conhecimento sobre um tema qualquer. Algo impossível em artigos com 15 páginas, formatados para ter objetividade, e não, necessariamente, densidade ou amplitude. Pode ser uma lógica mais adequada a determinados campos de conhecimento que têm na fungibilidade uma característica, até pela velocidade com a qual se produz um determinado tipo de ciência e tecnologia. Mas no atual caso das humanidades, é pouco provável que qualquer obra densa possa advir de algumas poucas páginas, ou mesmo ser expressa por elas.
Portanto, os livros cumprem, ainda, um papel fundamental na produção de conhecimentos que podem levar anos, além de poder alcançar um público muito mais amplo como professores, pais e, a depender do tema, até mesmo leitores não partícipes do campo.
Voltemos ao valor das coletâneas de textos, já representadas em alguns livros ditos autorais, como no exemplo dos “estudos reunidos”, das “obras escolhidas” etc. Mas mesmo aquelas coletâneas que articulam autores com graus de desenvolvimento diferentes, mais ou menos experimentados, além de orbitarem em torno de temas, problemas, bases teóricas ou empíricas, são importantes por disseminar, de uma maneira mais ampla, o que de novo tem sido publicado pelo mundo acadêmico.
Ora, se parece um problema publicar coletâneas “sem pé nem cabeça”, devemos crer que o “tribunal de recursos” de cada área de conhecimento julgará a sua pertinência, relevância, pregnância. Pensando a contrário, uma coletânea de textos projetada como uma unidade, a despeito da pluralidade de autores, cumpre o papel de oferecer aos leitores um balanço do que se produz sobre um tema específico, bem como as múltiplas formas de abordar um objeto de estudos.
Nenhum periódico, hoje, salvo em situações muito especiais, normalmente comemorativas, publica coletâneas de textos sobre um mesmo tema com mais de sete ou oito artigos, quando muito. Em um livro, é possível juntar dezenas de autores que se ocupam de problemas comuns, com lentes diversificadas, de contextos diversos, oferecendo um mosaico do estado do conhecimento sobre um tema específico. Mais, uma obra com tais características pode acolher desde pesquisadores reconhecidos, promessas jovens, alguns anônimos, fomentando um diálogo que é, também intergeracional, o que é outro indicativo da atualização das tradições de pesquisa em um campo qualquer. Logo, os livros são, ainda, veículos importantes para a disseminação de um conhecimento mais amplo, que não seja aquele produzido apenas pelos “ícones” famosos de cada área de conhecimento.
São, portanto, mais democráticos na produção e no acesso, e mantêm a tradição de pensamento que marcou diferentes culturas ao redor do mundo. Uma possível crítica à promiscuidade na sua produção, sobretudo na forma de coletâneas, não pode ignorar o seu papel na produção e disseminação da cultura. Então, trata-se de refinar as formas de avaliar a sua pertinência e qualidade, não simplesmente contrapondo-os às publicações em revistas, pois se trata de formas diferentes e não equivalentes de disseminação do pensamento, e não podem ser tratados com as métricas reducionistas e quantitativas das agências de fomento e dos indexadores internacionais. Daí o nosso entendimento que a organização de coletâneas é, também, um trabalho intelectual fundamental para o amadurecimento de um campo de conhecimento que não se limite a pôr em diálogo apenas a torre de marfim dos especialistas.
Podemos pensar um livro no formato de coletânea como um encontro de ideias, à maneira extensiva de ler, que diz respeito à metáfora da biblioteca e aos embates que podem ser promovidos. Foi dessa forma multirrelacional que este novo Diálogos sobre a história da educação dos sentidos e das sensibilidades foi pensando e criado. Esse tema tem sido apresentado de variadas formas em diferentes sistemas de pesquisas e tradições acadêmicas, estando em diálogo intelectual com um longo histórico de pesquisa, ao menos no campo da história. Também podemos entender os interesses em torno do tema, pelos contatos que ele gera, sejam eles pessoais, sejam investigativos. Diz respeito ao trabalho de diferentes grupos de pesquisa no Brasil e em outros países, todos ocupados em pensar a história da educação de maneira menos preocupada com posições generalizantes e abstratas.
Esse livro registra a confluência de interesses de três pesquisadores que, cada um à sua maneira, teoriza sobre as formas como os sujeitos se constituem e se orientam no mundo, sabendo que a nossa existência é possível pelas experimentações advindas dos sentidos; que sendo guiadas por uma determinada abordagem educacional, acabam convertidas em diferentes sensibilidades. Além disso, por se tratar se “sentidos” e “sensibilidades” fazemos um convite à compreensão de diferentes percepções sobre os fenômenos sociais observados nas documentações de maneira sensível. Solicitamos um risco criativo, inclusive sensorial, durante a análise crítica de toda a materialidade da qual somos produtores e tributários. Uma história da educação dos sentidos e das sensibilidades segue a linha das novas abordagens, novas perguntas e novos objetos no plano da produção de conhecimento.
Finalizamos com os seguintes pensamentos: Não é crível que o livro desapareça por conta dos suportes virtuais. Sabe-se, inclusive, que as duas bases oferecem diferentes formas de acesso ao conhecimento ainda que o conteúdo seja o mesmo, inclusive estimulando o sistema cognitivo de maneira diversificada. Coletâneas ruins, sem coerência, podem passar pelo crivo da avaliação pública. A diminuição do valor de coletâneas é um ataque ao sentido de coletividade, esta prática fundamental, de base histórica, que dá significado ao que é fazer ciência. Não estamos passando simplesmente por um momento de remodelação das avaliações de livros.
Os membros dessa coletânea são pessoas de carne e osso. Os questionamentos desse livro são o resultado de trabalho: planejado, sistemático, ele testemunha a formação de novos pesquisadores, é uma associação de investigações, de grupos de pesquisa. Esse livro é um registro interinstitucional, feito em rede, nacional e internacional. O tanto que se pede por internacionalização, como fica neste caso? Diz respeito ao cumprimento de uma função social pública. Lembrando que toda forma de trabalho intelectual é necessariamente uma aposta na sensibilidade, uma vez que se trata de “intercambiar experiências”, de compartilhar, de andar junto e andar com, fazer junto e fazer com”.ivE para além de palavras bonitas, os organizadores do livro são amigos. Portanto, rusticamente, falam da diminuição de valor de uma coisa chamada livro. Socialmente, vemos a repressão da constituição de um território intelectual, feito coletivamente. Historicamente, percebemos como pensam os autores da tosa. Então, sim! Ainda vale a pena produzir livro
iEisenstein (1998, p. 193) EISENSTEIN, Elizabeth L. A revolução da cultura impressa: os primórdios da Europa moderna. São Paulo: Ática, 1998, p. 193.
iiiCHARTIER, Roger. Textos, impressos, leituras. In CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1990, pp. 121-139, p. 131.
ivTABORDA DE OLIVEIRA, Marcus A. Educação dos sentidos e das sensibilidades: entre a moda acadêmica e a possibilidade de renovação do âmbito das pesquisas em história da educação. Revista História da Educação. Porto Alegre: ASPHE, v. 22, n. 55, maio/ago., 2018, p. 116-133, p. 123.
Todas as crianças têm o direito de entrar em contato com os mais variados gêneros literários e tipos de livros. É a partir deste encontro que elas poderão desenvolver o gosto genuíno pelos livros. Além de aproveitar integralmente os benefícios que os livros tem as oferecer. Por isso, nós da Curadoria da Leiturinha temos como objetivo propiciar o encontro dos nossos pequenos leitores, e sabemos a importância da leitura na primeira infância, com essa variedade presente na literatura mundial. Modéstia à parte, nosso país, o Brasil, possui como uma de suas grandes riquezas, a literatura e ilustração destinadas aos livros infantil. Poderíamos passar aqui horas apenas citando grandes nomes como Ruth Rocha, André Neves, Nelson Cruz e, claro, Marilda Castanha. Mas, antes de falar da grande autora que assina este livro, quero introduzir o objetivo do envio desta grande obra para nossos pequenos leitores.
Nós, pais, não temos a pretensão de nos tornar especialistas em tudo que fazemos com os pequenos
Mas, quando, por exemplo, vamos começar aintrodução alimentar, pesquisamos ao máximo sobre o assunto para propiciar aos nossos filhos as melhores primeiras impressões e experiências com comida. Isso porque temos o objetivo que ele goste de comer e criebons hábitos alimentares. O mesmo deveria acontecer com os livros.
O mesmo deveria acontecer para a leitura!
Por mais que não compreendamos totalmente osbenefíciosde alguns tipos de leituras, é inegável que entrar em contato com elas trará boas consequências para odesenvolvimento dos nossos pequenos. Concordamos que, pode ser que uma criança não goste de uma verdura ou um legume de primeiro. Ou então, não entenda a importância de comer aquilo. Mas, mesmo assim, não deixamos de incentivar o hábito de comê-los, porque sabemos que será bom para nossos filhos. A dica que aqui deixo é: faça o mesmo com os livros! Tenho certeza que a médio prazo você conseguirá entender a importância que aquela obra teve no crescimento e construção da infância do seu pequeno.
Voltando à história… ou a autora. Antes da obra, vem a criadora, e essa criadora tem uma grande importância para nós daLeiturinha. Por isso não poderíamos exitar em fazer uma produção Original Leiturinha para a primeira infância com ela.
Sobre a autora
Marilda Castanha, mãe de dois filhos já adolescentes, começou a ilustrar livros infantis na década de 1980, enquanto era estudante de artes plásticas. Afirmando o quanto desenhar é coisa séria, Marilda coleciona prêmios e fãs fiéis. Não há um que arrisque um traço para criança no papel que não conheça a riqueza da sua obra. Marilda é a cara do valor da nossa cultura. Tanto que foi até para a Coréia do Sul, no Nami Concours, contar pro mundo como consegue atingir tanta gente às vezes sem usar muita palavra. Como uma boa mineira, com seu traço brasileiro repleto de significado.
Sobre a obra
Mas, Pode? Por ser um livro ilustrado, ilustrações, texto e projeto gráfico têm que fazer sentido para formar um conjunto harmonioso.
“Daí a importância de todos os elementos do livro, inclusive as abas, (ou dobraduras internas) que se abrem em determinadas páginas. Elas não estão ali por acaso. A narrativa do texto e das imagens pediam que a surpresa contida, nas imagens e no texto, fosse ora resguardada, ora revelada. A escolha do formato do livro também tem um porquê. Por ser um livro para crianças (sendo elas alfabetizadas ou não), escolhemos um formato que, mesmo com as abas abertas não ficasse exageradamente grande e ainda coubesse no colo. Ou nas mãozinhas de uma criança pequena.”, diz Marilda.
Ao receberem o Mas, Pode? Marilda espera que as crianças possam, com a ajuda dos pais e da leitura compartilhada, perceberem novas formas de entender e nomear. Não só as cores, mas também o mundo.
Nas palavras da autora…
Perguntamos a autora como ela acredita que esta obra chegará na casa dos pequenos. Ela deixou a seguinte mensagem:
“Eu gosto muito de observar como as crianças se expressam, como elas lidam com o imaginário e – principalmente – como elas se organizam para se expressar através da linguagem. Quando meus filhos eram bem pequenos eu comecei a anotar as inúmeras frases que revelavam como eles definiam e apreendiam os diferentes conceitos de mundo. Pela observação e/ou por ideias concretas, muito visuais, eles iam me mostrando como estavam entendendo o mundo.
Ouvi então frases extremamente poéticas. Mais recentemente, quando pensava nas primeiras ideias para fazer o livro, fui ler, por acaso, um catálogo de tintas. Aí percebi como que alguns nomes que damos às cores lembram aquela forma poética das crianças pequenas. Por exemplos, nomes como: branco geada, amarelo fogo, vermelho amora, vermelho rubi ou verde topázio, além de serem muito poéticos nos sugerem imagens. Ou seja, quando lemos podemos “ver” a cor.
Para a criança muito pequena isto é importante, porque ela terá dados concretos. Tanto para fazer comparações quanto para entender melhor o mundo que ela está descobrindo. Sei que muitos destes termos do livro talvez serão novidade para as crianças. Por isto a importância da leitura compartilhada, da presença dos pais, que podem ser os melhores mediadores da leitura de um livro. Juntos, adultos e crianças verão formas inusitadas – ou não – de entender e nomear, não só as cores, mas também o mundo.”
A Comissão Local de Enfrentamento da CoVid-19 do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) divulga o e-book “Estratégias para profissionais de saúde manejarem a ansiedade dos usuários dos serviços de saúde na pandemia”. A obra, no formato e-book, objetiva ajudar os profissionais de saúde no enfrentamento à pandemia, e apresenta discussões sobre medo, ansiedade, e estratégias práticas de intervenção.
A iniciativa partiu do Serviço de Psicologia que adaptou textos da professora Jeane Sakya Campos Tavares e do estudante de medicina, Carlos Antônio Assis de Jesus Filho. A publicações está disponível para leitura online e download gratuito na página do CCS.
“Educação em Tempos de Covid19” – O livro “Educação em Tempos de Covid-19: reflexões e narrativas de pais e professores”, lançado pela Editora Dialética e Realidade, tem a contribuição do professor Eniel do Espírito Santo (CECULT) da UFRB. O docente escreveu em coautoria com a professora Sara Dias-Trindade (Universidade de Coimbra) o capítulo 19 denominado: “Educação a distância e educação remota emergencial: convergências e divergências”.
Segundo Eniel, a obra é uma resposta imediata às transformações ocorridas num breve espaço de tempo, que alterou o status quo da atuação educacional de professores e pais. “O capítulo apresenta os principais fundamentos da educação a distância (EaD), correlacionando-os com a educação ou ensino remoto emergencial, mesmo considerando-se as limitações de se construir uma narrativa concomitante a sua construção”, afirmou.
Lançamento do livro “Gestão Editorial de Periódicos Científicos: Tendências e Boas Práticas”, organizado por Lúcia da Silveira (BU/UFSC) e Fabiano Couto Côrrea da Silva (UFRGS).
O livro e a exposição “Brasiliana Itaú — uma grande coleção dedicada ao Brasil” merecem ser lido e visto — nada ficam a dever aos melhores museus e raisonnés
Jales Guedes Coelho Mendonça e Nilson Jaime
Especial para o Jornal Opção
Em 1969, Olavo Setubal, principal acionista do Banco Itaú, adquiriu, com o aval da diretoria da corporação, um quadro a óleo (“Povoado numa Planície Arborizada”) executado pelo artista holandês Frans Post. Considerado o primeiro pintor da paisagem brasileira, e domiciliado em Pernambuco entre 1637 e 1644, Post integrou a comitiva de Maurício de Nassau no Brasil. Essa valiosa aquisição representou o primeiro passo para a edificação, nas décadas subsequentes, de um notável acervo de obras de arte, documentos, mapas, peças iconográficas e livros, que hoje formam a Coleção Brasiliana Itaú.
Exatos quarenta anos depois da primeira importante compra, foi publicado o livro “Brasiliana Itaú — uma grande coleção dedicada ao Brasil” (Capivara, 2009, 707 páginas), de autoria de Pedro Corrêa do Lago, que retrata essa verdadeira arca de tesouro. A obra, uma produção luxuosa de capa dura com aproximadamente 2.500 imagens, pesa espantosos quatro quilogramas e nada fica a dever aos sofisticados trabalhos da editora alemã Taschen Books. As apresentações de sobrecapa e interna são da lavra de Olavo Setubal, escritas pouco antes de seu falecimento, ocorrido no dia 27 de agosto de 2008. A publicação estrutura-se em seis partes: a) obras de arte; b) livros e impressos; c) documentos manuscritos; d) cartografia; e) economia e finanças, e f) paulistana.
Em 2014, diante das novas aquisições incorporadas ao acervo, surgiu a necessidade de uma segunda edição. O lançamento da obra ampliada coincidiu com a inauguração do Espaço Olavo Setubal, localizado no prédio do Itaú Cultural, situado na Avenida Paulista, centro da capital bandeirante, depositário dos dois acervos, quais sejam, a Coleção Brasiliana e a Coleção Numismática (alusiva a moedas). A entrada na exposição permanente é gratuita e o seu percurso constitui-se num mergulho instrutivo nos cinco séculos da memória histórica e visual brasileira. A variedade e a riqueza do catálogo talvez sejam apenas inferiores ao da Biblioteca Nacional e do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB).
De acordo com Milú Villela, presidente do Itaú Cultural, o espaço não apenas homenageia o mecenas da cultura como projeta o aludido instituto como “um relevante protagonista na democratização do acesso e no fomento à cultura e à arte brasileiras.” Além disso, agrega à imagem da instituição financeira, com todos os méritos, um poderoso “soft power”. A exposição, uma fração dos 12 mil itens que compõem as coleções, restou formatada em nove módulos: a) o Brasil desconhecido; b) o Brasil holandês; c) Brasil secreto; d) o Brasil dos naturalistas; e) o Brasil da capital; f) o Brasil das províncias; g) o Brasil do Império; h) o Brasil da escravidão; e i) o Brasil dos brasileiros.
O Brasil desconhecido
O primeiro módulo da exposição aborda um período pouco documentado da história do país, sobretudo em razão de o território brasileiro ser ainda desconhecido do colonizador europeu. Segundo o prospecto e guia de visitação distribuídos na mostra, “nenhum artista visitou o Brasil nesse período. As imagens existentes foram criadas na Europa com base em relatos de descrições escritas. O tema dominante era o canibalismo, protagonista de grande parte das gravuras que descrevem o país. Os povos indígenas também são retratados vestidos à moda europeia ou em modelos atléticos imaginados pelos artistas europeus, que nunca os haviam visto.”
“Índios”, uma das 77 belíssimas gravuras coloridas sobre peixes e silvícolas pescadores, do zoólogo bávaro Spix, par com o botânico Martius, seu conterrâneo, na Viagem ao Brasil | Foto: Reprodução
É dessa fase o raríssimo “Mapa do Almirante” (Estrasburgo, 1522), de Lourentz Fries (1490-1522), que delineia parte do litoral brasileiro, então chamado de “Terra Papagalli”, em latim, ou seja, “Terra dos Papagaios”. Nesse precioso documento, revisam-se as cartas que Martin Waldseemüller (1475-1522) incluíra como suplemento em uma das edições da “Geografia de Ptolomeu”, primeiro “’atlas geográfico’ comentado” da história, confeccionado no segundo século da era cristã. Frise-se que o citado Martin, na primeira versão de seu “Cosmographiae introductio” (sem local, 1507), de forma pioneira, denominou o continente recém-descoberto de “América” – em alusão ao navegante Américo Vespúcio. Segundo Pedro Côrrea do Lago, mais tarde, ele explicaria que a escolha de um nome feminino harmonizar-se-ia com o mesmo gênero dos nomes de Europa, Ásia e África.
O autor de “Brasiliana Itaú” chama a atenção igualmente para um aspecto pouco observado e relacionado especialmente a esse período do “Brasil desconhecido”: os mapas a respeito do país eram impressos em várias nações, menos em Portugal e no Brasil. No afã de decifrar o enigma, Lago assinala: “A ausência do primeiro se explica pela opção política de ocultar as riquezas do Brasil, dificultando-lhe ao máximo o acesso. A inexistência de mapas brasileiros deve-se obviamente ao fato de a imprensa só ter sido autorizada no país a partir do início do século XIX, quando a cartografia de tema brasileiro impressa no exterior já acumulava quase trezentos anos de esplêndidas realizações.”
Guia de visita e prospecto da Coleção Brasiliana Itaú, visitada pelos autores deste artigo em três ocasiões | Foto: Reprodução
Com efeito, salta aos olhos o esforço despendido pelos arquitetos da coleção Brasiliana para reconstituírem o mosaico da legislação luso-brasileira vigente durante os mais de trezentos anos da era colonial (1500-1822). Por tal razão, além de documentos relativos à nossa formação territorial, como o Tratado de Madri (1750), que revogou o Tratado de Tordesilhas (1494), o catálogo ostenta, entre outros, os originais das Ordenações Manuelinas (Lisboa, 1565), do rei Dom Manuel (1496-1521) e da primeira edição do Código Filipino (Lisboa, 1603), conjunto de normas que praticamente regulamentaram a vida privada no Brasil até 1917, data da promulgação do Código Civil elaborado pelo jurista Clóvis Bevilácqua.
O Brasil toma forma ainda em dois atlas clássicos: a “Cosmografia Universal” (Basileia, 1540), do geógrafo alemão Sebastian Münster e a “Delle Navigationi et Viaggi” (Veneza, 1556), do italiano Giovani Battiste Ramusio, considerado por John Locke um “trabalho perfeito”. Ademais, cumpre salientar a mais famosa gravura quinhentista sobre os brasileiros. Inserta no livro de Jean e Robert Dugord (Rouen, 1551), a representação artística retrata uma festa em homenagem aos reis Henrique II e Catarina de Médicis, na qual foram exibidos ao público cinquenta índios Tupinambá e Tabajara numa taba simulada. “O espetáculo marcou as imaginações daqueles que assistiram e dos muitos que viram a gravura, intitulada ‘Festa dos brasileiros’, uma das mais ricas e ambiciosas imagens até então publicadas de uma representação teatral”, consignou Lago.
O Brasil holandês
Os profícuos quase oito anos passados por Maurício de Nassau no Brasil, a serviço da Companhia das Índias Ocidentais, inspiraram bastante os artistas e cientistas de sua comitiva, que divulgaram em livros ilustrados todas as imagens e informações colhidas no país. A presença holandesa ocorreu de 1624 a 1654, destacando-se dessa fase, o já mencionado quadro de Frans Post, que reproduz um pitoresco povoado do Nordeste brasileiro.
A produção bibliográfica associada à ocupação neerlandesa é relativamente extensa e inclui o “Novus Orbis” (Amsterdã, 1633), de Joannes de Laet, uma publicação escrita originalmente em latim e que contém os melhores mapas do Brasil antes da vinda de Nassau. Do mesmo autor, é também a “História da Companhia das Índias Ocidentais” (Leiden, 1644).
Merece realce, de igual modo, a ilustradíssima “Historia Naturalis Brasiliae” (Amsterdã, 1648), de Willem Piso e George Macgraf, considerada a primeira enciclopédia da flora e da fauna do Brasil, primorosamente aquarelada à mão. A obra é tida como um dos maiores tesouros da Brasiliana Itaú e foi produzido sob os auspícios de Maurício de Nassau, “que desejava oferecer à comunidade culta europeia um relato das pesquisas científicas nas áreas de botânica e zoologia promovidas por ele no Nordeste brasileiro. Durante quase duzentos anos essa obra não só foi a principal fonte da história natural brasileira, como praticamente a única até a década de 1820, quando foram publicados os trabalhos do Príncipe de Wied-Neuwied (Príncipe Maximiliano) e dos sábios bávaros Spix e Martius”, pontua Pedro Lago.
Por último, seria uma lacuna imperdoável a omissão do “Atlas Blaeu”, no justo conceito de Lago “o maior e mais belo atlas de todos os tempos.” Expressão maior da pujança da República Unida dos Países Baixos no século XVII, o “Grande Atlas Blaeu ou Cosmografia Blaviana” foi editado em 1662 pela editora holandesa Blaeu (Amsterdã) e impresso em sete língua, chegando algumas versões a alcançar doze volumes encadernados em pergaminho e decorados com filete de ouro, o que fazia seu preço equivaler a uma boa casa da cidade neerlandesa. O compêndio buscava consolidar todo o conhecimento da humanidade até então existente. As gravuras de Fran Post e Marcgraf sobre o Brasil e o saber legado pela missão de Nassau, sem dúvida ajudaram a robustecer ainda mais a monumental obra de Joan Blaeu, que frequentemente era usada pelas autoridades holandesas para fins diplomáticos. Nessa direção, consta que o sultão da Turquia ofertou-a ao imperador da Áustria, Leopoldo I.
O Brasil secreto
Após a expulsão dos holandeses do Brasil, o governo português proibiu a entrada de visitantes estrangeiros em sua colônia americana por mais de 150 anos. O “Brasil secreto” adveio da preocupação em manter o país fechado a possíveis exploradores, sobretudo após a descoberta de grandes jazidas de ouro e diamantes, por volta de 1700, em Minas Gerais, e posteriormente em Mato Grosso e Goiás. Por isso, talvez a imagem que melhor simbolize esse obscuro momento repouse na aquarela “Vistas da baía do Rio de Janeiro”, de T. Sydenham (1795). Isso porque o artista foi obrigado a retratar a cidade maravilhosa da perspectiva do navio inglês, uma vez que as embarcações estrangeiras eram proibidas de atracarem no território brasileiro.
Embora não mencionado por Lago, um grande prejuízo à então inexistente ciência nacional foi o veto à presença do naturalista alemão Alexander Von Humboldt (1769-1859). A despeito de ter viajado pela América do Sul entre 1799 e 1804, percorrendo a Venezuela, Colômbia e Peru, o maior cientista daqueles tempos — precursor de Charles Darwin e influenciador de Simon Bolívar, Thomas Jefferson, Goethe, Ernst Haeckel e Henry David Thoreau — não pôde conhecer o Brasil. Em sentido contrário, seus patrícios Spix e Martius e outros naturalistas visitariam demoradamente o país mais tarde, após a chegada da família real, expulsa pela invasão napoleônica.
Ao longo do importante ciclo econômico da mineração (século XVIII), grandes talentos poéticos se manifestaram, a exemplo de Tomás Antônio Gonzaga e Cláudio Manuel da Costa, expoentes da Inconfidência Mineira. Na mesma Minas Gerais, Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, surge como um mito das artes nacionais, produzindo “Nossa Senhora das Dores”, imagem de cedro policromado.
“O primeiro livro impresso no Brasil, quase 300 anos após o primeiro livro europeu, a Bíblia de Gutenberg” | Foto: Reprodução
É desse período o primeiro livro impresso no Brasil, quase 300 anos depois da Bíblia de Gutemberg, a primogênita publicação europeia. Trata-se do livro “Relação da entrada do Bispo do Rio de Janeiro” (Rio de Janeiro, 1747), de Luiz Antônio Rosado da Cunha, editado na Segunda Officina de Antonio Isidoro da Fonseca. Como a existência de tipografia na colônia era terminantemente proibida pelo rei de Portugal, o aparecimento do citado opúsculo é creditado a um cochilo das autoridades portuguesas. Corrobora a interpretação o fato de Dom João V, ao tomar ciência do acontecido, ter determinado o confisco do prelo e a apreensão da obra. Aliás, o mesmo destino sucedido com “Cultura e Opulência do Brazil”, de autoria do padre Antonil, impressa no exterior em 1711 e só republicada no país 126 depois.
Em relação ao pioneirismo do livro de Luiz Antônio Rosado Cunha, sublinhe-se que houve uma polêmica bibliográfica envolvendo a obra do brasileiro José Fernandes Pinto de Alpoym, intitulado “Exame dos Artilheiros” (Lisboa, 1744). Malgrado na capa constar a cidade portuguesa como o local da edição, especialistas advogavam que a impressão ocorrera no Brasil. No século XX, entretanto, várias investigações refutaram a suspeita.
Algumas peças da coleção Brasiliana merecem destaque. A primeira delas é “Governo de Mineiros” (Lisboa, 1770), de Jozé Antônio Mendes, raríssima publicação de um brasileiro na área médica. Segundo Lago, o autor “redigiu um manual para pessoas que, sem formação médica e distantes das cidades com hospitais, precisavam cuidar de seu empregados e escravos.” A outra refere-se ao “Diccionario portuguez, e brasiliano” (Lisboa, 1795) do frei franciscano José Mariano da Conceição Velloso, criador de um léxico português-brasileiro, sendo brasileira a língua Tupi-Guarani.
O Brasil dos naturalistas
O módulo 4 da exposição apresenta a “era das luzes”, iniciada com a chegada da família real e a abertura dos portos, em 1808. O Brasil “foi finalmente revelado ao mundo e, nas décadas seguintes, receberia centenas de artistas e cientistas determinados em registrar o território, seus costumes, sua flora e sua fauna, movidos pela enorme curiosidade represada nos 150 anos em que o país ficou fechado”. É a parte mais pujante da mostra. O colorido das telas e as gravuras de animais, plantas, florestas, flores e habitantes do Brasil encantam o visitante.
Logo nos albores desse ciclo, o país ganhou uma obra que se tornaria a mais famosa de sua historiografia produzida por um estrangeiro: “History of Brazil” (Londres, 1810), do inglês Robert Southey. Pedro Lago explica que Southey viveu sua juventude em Lisboa e planejava escrever uma história de Portugal, mas “julgando o projeto ambicioso demais, voltou-se para uma História do Brasil, que lhe pareceu mais fácil de realizar, mas que evoluiu para tornar-se uma obra monumental em três volumes”. Seu trabalho, republicado pelo consórcio das editoras Itatiaia e Edusp, na Coleção “Reconquista do Brasil”, constitui até hoje um estudo de referência e essencial para a compreensão de nosso passado.
A “Brasiliana Itaú” possui os originais de quase todos os relatos de viajantes que singraram o país nessa fase, a exemplo de “Travels in the interior of Brazil” (Londres, 1812), de John Mawe; “Travels in Brazil” (Londres, 1816), de Henry Koster; “Reise in Brasilien” (Munique, 1823), de Martius e Spix; “Journal of a Voyage to Brazil” (Londres, 1924), de Maria Graham e “Voyage Pittoresque au Brésil” (Paris, 1835), de Johann Rugendas.
É na secção de fauna e flora que são localizados os mais belos livros e gravuras da coleção. Da série constam os seguintes títulos: “Histoire Naturelle des Tangaras, des Manakins et des Todiers” (Paris, 1805), de Anselme Desmarest, o primeiro álbum de pássaros do Brasil; “Simiarum et vespertilionum Brasiliesium species novae” (Munique, 1823), de Spix, catálogo de todos os macacos brasileiros conhecidos à época no país; “Genera et species Palmarum” (Munique, 1823-1831) de Martius, impressionante realização gráfica entre os álbuns dedicados à vegetação brasileira no século XIX; além do clássico de Saint-Hilaire, “Plantes usuelles des Brasiliens” (Paris, 1824).
Ainda sobre a fauna e flora, calha ressaltar que os naturalistas trataram os índios como “parte da fauna” brasileira, nos termos da mentalidade então prevalecente. Os intelectuais devotavam tanto interesse pelos povos indígenas que Spix e Martius chegaram a levar para a Alemanha um casal de índios (Miranha e Iuri ou Puri), que pouco depois faleceu por não suportarem “a mudança de clima,” de acordo com Martius.
“Negros no porão do navio”, de Rugendas, é o mais icônico retrato de 300 anos da escravidão no Brasil | Foto: Reprodução
O Brasil da Escravidão
A escravidão, nódoa que maculou quase quatrocentos anos da vida brasileira foi retratada por uma série de artistas viajantes, como o inglês Henry Chamberlain, que visitou o Rio de Janeiro em 1817 e, em 1822, lançou em Londres a primeira coleção de gravuras focada na mão de obra servil. Esse capítulo determinante da história do Brasil é esquadrinhado no módulo 8 da exposição e permeia grande parte do livro “Brasiliana Itaú”.
Os trabalhos do alemão Rugendas e do francês Debret “mostram cenas da escravidão em contextos diferentes – o rural e o urbano, o cotidiano de trabalhos forçados e os raros momentos festivos.” Publicado no mesmo ano em alemão “Malerische Reise In Brasilien” (Paris, 1835) e em francês “Voyage Pittoresque au Brésil” (Paris, 1835), o livro do pintor Johann Moritz Rugendas — traduzido no Brasil como “Viagem Pitoresca Através do Brasil” (Belo Horizonte: Editora Villa Rica, 1994) —, “ampliou a repercussão da descoberta das novas imagens autênticas do Brasil pelo público culto europeu, que agora chegavam a mais de trezentas se adicionadas as gravuras dos dois álbuns.”
Capa original do livro que seria traduzido como “Viagem ao Brasil”, de Debret, rico repositório das paisagens urbanas e rurais oitocentista no país | Foto: Reprodução
Destaca-se em seu trabalho gravuras que se tornaram conhecidas de todos os brasileiros através dos livros de História, como nas imagens de “negros no porão do navio”, “capitão do mato”, e “punições públicas”, em que um escravo é chicoteado por um feitor, também negro, observado pelo senhor e pessoas do povo.
O mais famoso álbum de gravuras de um artista viajante, “Voyage Pittoresque et Historique au Brésil” (Paris, 1835), do francês Jean-Baptiste Debret, no dizer de Lago, “merece sua reputação por todos os títulos: a precisão e acuidade da observação, a qualidade do desenho, a excelência da técnica litográfica e a variedade de temas que abrange, desde os grandes eventos políticos, aos utensílios indígenas, passando pelas roupas, da flora e da fauna brasileiras, enfim, tudo de curioso que o artista pode observar nos quase quinze anos que passou no Rio de Janeiro, com algumas incursões pelas províncias”.
É de Debret a conhecida gravura “sapataria”, na qual dois negros trabalham em seus ofícios enquanto um terceiro é castigado com “bolos” de uma palmatória pelo senhor. Também “aplicação do castigo do açoite”; “pequena moenda portátil”; “o regresso de um proprietário de chácara” e diversas outras imagens de “negros de ganho” em seus afazeres, vendendo arruda, capim, leite, cabra, cavalo, tabaco e milho, em cenas urbanas que são verdadeiros retratos do Brasil antes do advento da fotografia.
Goiás e o Brasil das Províncias
As províncias foram menos retratadas pelos artistas viajantes do que a capital, Rio de Janeiro, mas diferentes regiões do Brasil foram episodicamente documentadas. Um exemplo é “Panorama da Cidade de São Paulo”, de A. J. Pallière, encomendada pelo imperador Dom Pedro I e considerada a obra mais importante da iconografia paulistana anterior à fotografia. O folder da exposição informa que “o óleo sobre tela desapareceu ao ser vendido após a Proclamação da República e ficou esquecido por 110 anos, até ser redescoberto em 2001, quando foi integrado à Coleção Brasiliana Itaú.”
Destacam-se ainda, no “Brasil das províncias” (módulo 6 da exposição) a “Vista de São Luís do Maranhão”, pintada por volta de 1860, bem como a “Vista Panorâmica da Baía de Belém do Pará”, de 1870, ambas de autoria de J. L. Righini, obras de escol da iconografia pátria.
Algumas das duzentas gravuras magnificamente coloridas presentes em “Plantarum brasiliae” (1827), obra-prima de Pohl | Foto: Reprodução
Embora prestes a completar 300 anos, Goiás tem pouca visibilidade tanto no livro quanto na exposição. Na mostra, aparece mencionada apenas uma vez, notadamente quando da divulgação da gravura de Thomas Ender (“Vista da Serra das Figuras do Rio Maranhão”), presente no livro “Reise in innern von Bresilien” de Emanuel Pohl (Viena, 1827).
No livro, por sua vez, são somente três remissões iconográficas. A primeira delas, já mencionada acima, refere-se ao Rio Maranhão. A segunda também encontrada na mesma obra de Pohl — publicada no Brasil como “Viagem no Interior do Brasil” (Itatiaia/Edusp, 1976, 417 páginas) — que retrata com certa verossimilhança a Cidade de Goiás, antiga capital, inclusive mostrando a Igreja de Santa Bárbara, construída no cume de um morro vilaboense.
A terceira abriga-se no bojo do livro “Expedition dans les parties centrales de l’Amerique du Sud” (Paris, 1850), de François Louis de Castelnau, integrante da grande expedição científica francesa que explorou e estudou o interior do Brasil em meados do século XIX. A gravura “Praça do Palácio de Goiás” retrata uma paisagem urbana de Vila Boa, onde se vê uma centena de escravos ajoelhados, vigiados por militares, em frente à Catedral de Sant’Ana.
“Praça do Palácio em Goiás” (1850), de Castelnau | Foto: Reprodução
Pedro Corrêa do Lago apresenta gravuras não existentes na versão em português da obra de Castelnau (“Expedições às Regiões Centrais da América do Sul”, editora Itatiaia Edusp, 448 páginas), traduzido a partir do original citado, como o desenho colorido de “Chiotay”, chefe dos Xerentes (hoje habitantes de Tocantínia, Estado do Tocantins, na ocasião província de Goiás)
Naturalistas viajantes que passaram por Goiás, como Saint-Hilaire, Aires de Casal e Louis D’Alincourt têm pouca ou nenhuma visibilidade na mostra, assim como Louis Cruls, ausente, o que colabora para a pequena presença de Goiás na exposição e no livro. Os relatos de viagens dos aludidos autores primam pela descrição, sem inserção de imagens.
Rugendas, que nunca esteve no Estado cerratense, dá notícias do comércio entre esta capitania e Minas Gerais em pelo menos duas ocasiões em seu livro “Viagem Pitoresca Através do Brasil”, supra mencionado. Chega a inserir a colorida litografia “Habitans de Goyaz”, mas vê-se claramente que se trata de uma idealização do alemão, já que o vaqueiro retratado lembra mais um gaúcho com espécie de túnica árabe cobrindo a cabeça. Bem diferente do estereótipo do vaqueiro goiano daqueles tempos e de hoje.
“Cidade de Goiás” de Johan Emanuel Pohl, faz parte das gravuras de mais esmerado acabamento | Foto: Reprodução
A respeito da exposição e do livro Brasiliana Itaú pode-se escrever um tratado ou uma tese de doutorado. Devido ao ancho espaço que isso demandaria, deixamos de descrever o módulo sobre o “Brasil do Império” que abrangeria esse importante período da história brasileira, bem como o “Brasil da Capital”, com dezenas de trabalhos iconográficos e históricos sobre a cidade maravilhosa. “O Brasil dos Brasileiros”, que aborda a consolidação republicana no país, a literatura brasileira e a Semana de Arte Moderna exigiriam outro artigo, que pretendemos escrever em breve.
Em resumo, a “Brasiliana Itaú — uma grande coleção dedicada ao Brasil”, o livro e a exposição, merecem ser lido e visto, pois nada ficam a dever aos melhores museus e raisonnés do mundo.
Jales Guedes Coelho Mendonça é promotor de justiça, doutor em História (UFG), membro do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás (IHGG) e do Instituto Cultural Bernardo Élis para os povos do Cerrado (Icebe). É colaborador do Jornal Opção.
Nilson Jaime é mestre e doutor em Agronomia, membro do IHGG, das Academias Goianiense de Letras (AGnL) e Pirenopolina de Letras e Artes (Aplam), vice-presidente do Icebe, presidente da Academia Palmeirense de Letras, Artes, Música e Ciências (Aplamc) e colaborador do Jornal Opção.
Em época de pandemia e mudanças do nosso fazer profissional em diferentes ambientes informacionais, é necessário reinventar-se e desenvolver novas competências para continuar atendendo as demandas sociais. Dessa forma, eu e Professora Daniela Spudeit estamos organizando uma obra para evidenciar as práticas informacionais e também estudos teóricos acerca da atuação dos profissionais de informação em época de pandemias. Os textos serão avaliados de acordo com o rigor metodológico e devem ter entre 10 e 20 páginas. Os textos selecionados comporão um ebook de acesso gratuito. Prazo para envio: 01 de junho para email ebookpandemia@gmail.com.
Ibirapuera, Pinacoteca, Masp e muitos outros pontos fazem parte desse passeio virtual
Por: Fabiano Antunes
São Paulo. Foto: Fabiano Antunes/Rota 1976
Com o propósito de tornar o isolamento social mais leve e de conscientizar a população o quão importante é ficar em casa, a startup GoGuidia elaborou um eBook gratuito que reúne uma série de locais importantes da cidade de São Paulo, – como o Masp, Pinacoteca, Museu da Imigração, MIS e outros – e que têm tours virtuais. Assim, o turista conhece o ponto turístico, mas de forma segura, sem sair de casa. É também um convite pra reunir a família no sofá e mostrar curiosidades e fatos que fizeram dela a maior cidade
do Brasil.
Em alguns cliques, é possível “caminhar” pela Avenida Paulista inteira, “respirar” um pouco do ar puro do Parque Ibirapuera, e ver os interiores da Catedral da Sé. É possível ainda visitar exposições, museus e galerias de arte tão presentes na capital. Para saber mais sobre este tour virtual é só clicar AQUI.
Eu começo a resenha reafirmando uma das frases do livro “Meu mundo é pequeno diante dessa imensidão de falas” (FREITAS, 2019, p.101).
Da mesma forma que a profissão do bibliotecário em torno da informação ampliou significativamente o seu alcance em diferentes mercados profissionais, a biblioteca, como equipamento cultural extrapolou seus limites físicos e leva os mediadores de leitura para diferentes espaços e ambiências.
O livro “Mediação da Leitura Literária em Bibliotecas” é um desses grandes presentes que os bibliotecários merecem receber e devem divulgar para que se entenda de maneira bastante efetiva o alcance verdadeiro da atuação do bibliotecário como profissional a serviço das pessoas, em primeiro lugar. Organizada em 15 capítulos, a partir da curadoria de Jorge do Prado, a obra apresenta interlocuções atuais sobre diferentes aspectos em torno da mediação da leitura literária em bibliotecas, todas elas pautadas em um objetivo: o “acesso democrático e igualitário à literatura de qualidade” (PRADO, p.15). Cada capítulo é um recorte cuidadosamente registrado por um bibliotecário diferente, de várias regiões do país.
Quero apenas sinalizar inicialmente a minha felicidade ao ver tantos textos de uma escrita excepcional. Eu, que amo escrever, sempre presto muita atenção nisto, embora não seja uma nobel da literatura e esteja a anos luz de distância disto. Mas destaco o texto conciso, embora extremamente rico pelos termos escolhidos, pelas construções lindíssimas de frases que buscaram poesia em diferentes momentos e pelas referências trazidas.
Outro presente desta obra: para compreender o conceito de mediação de leitura, o professor, Mestre e Doutor em Ciência da Comunicação Oswaldo Francisco de Almeida Junior, retrocede até o início dos primeiros grupos de estudos sobre o tema, até que possamos conhecer a origem do termo e quais relações estabelece, desde sua origem, com a mediação cultural e da informação.
A mediação da informação seria “Toda ação de interferência – realizada em um processo, por um profissional da informação e na ambiência de equipamentos informacionais – , direta ou indireta; consciente ou inconsciente; singular ou plural; individual ou coletiva; visando a apropriação de informação que satisfaça, parcialmente e de maneira momentânea, uma necessidade informacional, gerando conflitos e novas necessidades informacionais”. (ALMEIDA JÚNIOR, p. 18)
Entendendo que o profissional da informação não pode agir com neutralidade, que a “mediação da informação exige um entendimento da informação como tendo uma existência em um processo. Ela já é gerada com significados e vai recebendo inúmeros outros no transcorrer de seu ciclo de vida”. O contexto de cada ambiência na qual ocorre a mediação da leitura proporcionará diferentes formas de apropriação informacional e essa apropriação terá continuidade a partir da interação com outras informações também apropriadas pelo sujeito, permanecendo como informação e ao mesmo tempo integrando para tornar-se conhecimento. E a leitura? “A leitura está no cerne da apropriação da informação”. A partir daqui, é que se pode iniciar uma leitura com um embasamento adequado para seguir caminho pelas experiências nas próximas páginas.
Mozilene Neri, no capítulo “Da palavra ao gesto: o ato de ler literatura”, resgata Humberto Maturana com a frase “O viver humano se faz no conversar”. Ela, como educadora, relata suas experiências com o projeto Rodas Literárias enquanto nos convida a refletir sobre a relação das mediações literárias e o fomento à leitura a partir de quatro questões fundamentais: 1. “[…] somos autores de nossas leituras e o que dizemos e construímos no coletivo tem imenso valor”; 2. As relações humanas não podem ser excludentes, precisam basear-se na aceitação do outro e na convivência; 3. A escuta é peça fundamental na relação entre o texto e o leitor; 4. A questão de ordem estrutural que permite a continuidade dos projetos e os vínculos entre os leitores e a leitura.
O segundo capítulo trata da leitura amorosa proposta por Rubem Alves e do tempo necessário para a sua fruição. Aqui temos Regina Garcia Brito, contextualizando brilhantemente nossa sociedade da informação e o mediador de leitura literária que não pode abster-se planejar a mediação “[…] à luz de conhecimentos específicos, dado que não se constitui como simples transmissão ou mera permissão de acesso aos bens culturais […]”, mas sim no ato de criação de vínculos simbólicos a partir de ambientes e dispositivos informacionais pensados para tal fim.
Regina relaciona a Sociedade da Informação em uma definição, que não pode restringir-se apenas às TICs, mas sim aproximar-se cada vez mais aos processos necessários na realização de troca de saberes e conhecimentos (o que transcende aparatos tecnológicos), do tempo necessário para isso e do estado mental necessário para se realizar “boas perguntas”. Esse tempo é fundamental para termos consciência da contextualização de cada informação disponível por aí, para que haja efetiva “ruminação intelectual” diante do compartilhamento de conhecimentos que hoje ocorre em velocidade surpreendente.
A autora do capítulo nos fala da importância da leitura como experiência singular e irrepetível e como os mediadores estão envolvidos no processo de criação de leitores autônomos e conscientes de suas opções, diante de acervos que devem ser diversificados para garantir o pertencimento. Quem é que pode nos dizer o que devemos ler? Talvez seja o mediador como alguém que escute verdadeiramente, que reconheça, valorize e incentive a fala dos leitores.
Maria Cristina Palhares e Lorisa Hermínia Pinolevi nos apresentam inúmeras iniciativas espontâneas de acesso ao livro em um capítulo que apresenta projetos realizados por pessoas comuns ou coletivos populares, com o intuito de incentivar e promover a leitura de fato, sem burocracias e sem constrangimentos, com simplicidade e utilizando espaços alternativos informais. Não bibliotecários que atuaram como agentes coletivos diante de práticas sociais que verdadeiramente intervieram em suas comunidades de forma transformadora.
Neste capítulo, as autoras nos alertam para a parte mais humana de nossa profissão: as pessoas, principalmente aquelas em situação de vulnerabilidade social. “A realização profissional de um bibliotecário não deve implicar em estantes cheias de livros organizados, livros que voltam intocáveis, sem riscos, amassados, isto não corresponde à realidade, a realidade precisa ser vivida e vivenciada”. (PALHARES; DIAS; 2019, p. 64).
As autoras Fabíola Ribeiro Farias e Cleide Aparecida Fernandes tratam das atividades lúdicas ou que muitas vezes não estabelecem relação entre o que é desenvolvido e o texto literário em si, em bibliotecas públicas, atividades estas que podem afastar os leitores da verdadeira experiência de contato com a atividade intelectual, confiscando o tempo necessário para a reflexão a partir do conteúdo escrito. Texto bastante interessante e que nos traz trechos da obra magnífica de Ítalo Calvino, “Um general na biblioteca”. Também aqui se fala, dentre outros pontos, da importância do tempo para pensar, do silêncio, da introspecção e da observação atenta quanto às ações que podem acabar tratando a literatura como mera mercadoria e não como suportes que “carregam em si discursos políticos, econômicos, de raça, de classe, de gênero e, principalmente, um ideal de homem educado”. (FARIAS; FERNANDES; 2019, p. 75).
No capítulo 5, temos vários exemplos práticos de planejamento de mediação de leitura na biblioteca escolar, de atividades realizadas ao longo de 2018 e 2019 no Colégio Marista Santa Maria. As autoras Cristina Troller e Marina Marostica Finatto propõem atividades e ações de baixo custo, com aproveitamento dos recursos da escola. Sendo o mediador um agente que possui responsabilidade social, o objetivo dessas ações é transformar, intervir na realidade da comunidade escolar promovendo o encantamento pela leitura.
Deixarei o sexto capítulo para o início e para o final.
Carla Souza apresenta a Biblioterapia no capítulo sete e apresenta relatos de profissionais que atuaram com atividades biblioterapêuticas. Aqui também se fala em afeto, de como a biblioterapia desenvolve a mediação afetuosa da leitura literária e a sensibilização dos envolvidos, no acolhimento de diferenças, para que essas ações e transformações transcendam até o coletivo, permitindo que todos aprendam a conversar, a ouvir e que “faz bem fazer o bem”.
O capítulo “Mediação da leitura literária na biblioteca escolar: um relato de experiência sobre a implementação da Lei n. 10.639/2003” trata de um relato de experiência realizado no Colégio Dom Pedro II, no Rio de Janeiro. As autoras Daviane da Silva e Patrícia Vargas Alencar tratam da escola como o lugar para legitimação e transmissão da nossa verdadeira cultura nacional, em contraponto ao embranquecimento europeu que estruturou nossas relações sociais desde o colonialismo. A lei que obriga a inclusão da temática da História e Cultura Afro-Brasileira no currículo oficial da Rede de Ensino é tema de interesse de todos os bibliotecários, profissionais que poderão encontrar neste texto diversas propostas para ações relevantes a serem realizadas em bibliotecas escolares.
Aqui temos o oitavo capítulo com Evandro Jair Duarte. Ele trata da leitura na infância, da importância dos momentos lúdicos e prazerosos em torno da leitura ou da mediação, pela qual a experiência estética da arte da leitura encontra formas para ocorrer e revelar as relações de autores e leitores com o mundo enquanto se encontram na escrita e leitura da mesma obra. O autor fala sobre a leitura de fruição e da motricidade na leitura, na qual nosso corpo não toma as decisões para trocar de página ou ajeitar-se em melhor posição, uma vez que está imerso na história. Um dos pontos que mais me tocou na leitura deste capítulo foi quando o autor fala sobre a criança criar sua própria biblioteca interior, cujo acervo é formado pelas recordações de obras que a tocaram, as quais ela pôde identificar, imaginar e interpretar… jogar e recriar.
Pensando nas crianças e jovens acabamos por lembrar que muitos consideram uma guerra entre esse público e o contato digital que erroneamente pode parecer nocivo e inimigo da leitura ou do estudo. No entanto, Gabriela Bazan Pedrão traz em seu texto dados sobre a atual realidade sobre os novos caminhos para a dinâmica da leitura que convivem com os modos tradicionais, se é que podemos dizer desta forma. Com o advento da internet surgem comunidades virtuais nas quais as pessoas, além de produzir conteúdos, compartilham e se aproximam de seus interesses com velocidade e facilidade surpreendentes. Idealizadora do Canal do Youtube “É o último, eu juro!”, a autora nos contextualiza sobre o início dos blogs literários e de como as discussões literárias em texto migraram dos blogs para o formato de vídeos na plataforma Youtube, ao final traz um pouco de sua própria experiência com a mediação de leitura literária digital a partir deste projeto iniciado em 2014. Aqui o leitor pode entender as características dessa nova forma de mediar a leitura literária e sobre o comportamento dos leitores diante de um formato que assemelha-se a uma “recomendação de amigo”, uma vez que elimina barreiras diversas e não constrange o leitor a partir de uma visão duramente crítica ou especialista.
Ciro Monteiro é autor do capítulo “Clube de leitura na prisão: a prática transformadora do ato de mediar”. O texto traz relatos emocionantes sobre atividades educacionais e a experiência de mediação de leitura literária a partir de um Clube de Leitura em uma unidade prisional no interior de São Paulo. Aqui o mediador também atua fortemente no letramento e do incentivo do desenvolvimento das habilidades dos educandos/leitores e da sua reintegração social.
Você saberia dizer o que é uma fanfic e sabia que elas são citadas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC)? O capítulo de Eliana Andressa Martins Gomes e Nanci Oddone nos apresenta as características e o contexto em torno das fanfictions e fandoms e de que forma podem ser utilizadas como instrumentos de aprendizagem em escolas e também em bibliotecas. O texto cerca o tema de forma bastante elucidativa sobre o que são essas comunidades, qual o conteúdo gerado em sua produção cultural, sua linguagem multimidiática e como se estabelece a dinâmica desses agentes ativos em todo o processo inovador, proporcionado pela web, de interação com conteúdos lidos ou assistidos.
Um ponto importantíssimo trazido pelo texto é a preocupação com o desenvolvimento da prática da argumentação em debates e como respeitar o ponto de vista dos colegas, discussão atualíssima diante da intensa utilização das redes sociais por este público.
A mediação da leitura pode ser estratégia para a promoção da saúde? Sim, da mesma forma que a Biblioterapia promove o bem-estar entre outros benefícios. Poliana Fragatti e Noely Santos escrevem sobre o projeto Promovendo a Vida, de parceria entre a biblioteca de uma Instituição de Ensino Superior e o curso de Enfermagem para atuarem na promoção da saúde de crianças sobreviventes do câncer, cujas repercussões físicas, psíquicas e emocionais causadas pelo tratamento tornam necessárias ações multiprofissionais para promover a ressignificação de suas existências.
E a leitura está sempre em torno de histórias que se escrevem e histórias vivenciadas, ainda que na própria prática de ler. Felícia Fleck vem falar sobre a contação de histórias como prática ancestral de experiência estética, literária e de fabulação. Seu texto traz os relatos e as reflexões de contadores de histórias atuantes em Santa Catarina e em Barcelona.
O último capítulo, das autoras Paula Renata Mariano e Tatiana Soares Brandão apresenta a mediação da leitura por meio de tecnologias assistivas e sinalizam as competências e habilidades que o profissional bibliotecário precisa desenvolver para atuar na democratização do acesso à informação e autonomia aos deficientes visuais. Especificamente, a pesquisa das autoras elenca serviços, opções de tecnologias assistivas, atividades e acervos especiais a partir da experiência da Biblioteca Pública Municipal de Lagoa Santa, em Belo Horizonte (Minas Gerais) que desde 2011 oferece o serviço de acesso à informação para deficientes visuais.
Felínio Freitas traz no sexto capítulo (agora sim, trago o sexto capítulo para a conversa) um dos textos que mais me encantou sobre este tema. Tanto que o deixei para o final. Logo de cara nos encanta com uma frase de Carlos Bernardo Skliar sobre o momento da leitura, conexão singular que nos detém no presente de cada frase sendo lida. O autor do capítulo observa o mundo e as pessoas a sua volta, em suas relações solitárias com aparelhos de celular, e se pergunta sobre quem são essas pessoas e qual a relação de cada uma com a leitura, como chegaram até a leitura se é que chegaram… e que leituras são essas? Felínio aproxima a mediação da leitura ao conceito de mediação cultural e nos fala sobre uma narrativa-mediadora como estratégia para gerar diálogos. Diálogos que poderão incentivar ou permitir processos a partir dos livros, para criar vínculos e conexões. “A preparação para a mediação começa na escolha do livro (objeto gráfico, ilustrações, as relações entre texto e imagem, metáforas que podem ser criadas por aquelas obras), passa por pensar no perfil do público leitor e na preparação para o encontro com o público leitor. O principal, neste encontro, é ouvir as falas, desejos e gestos.
Palavras que observei em todos os textos que tratam da mediação da leitura literária e cada vez que se repetiam me tocavam um sino na mente por criar automaticamente uma conexão com o que eu já havia lido ou estudado há pouco: escuta, vínculo, tempo, fruição, literatura, social, cultural, encanto, histórias, pessoas, planejamento ou preparação, amor, leitura, oralidade, comunidade, silêncio, apropriação, interferência, sentimento, informação, conhecimento, processo, alternativo, mediador, troca, velocidade, autonomia, coletivo, tecnologia, vivência, aprendizado, experiência, escrita, escritor, leitor… mundo.
A palavra biblioteca ou bibliotecário apareceu também, inúmeras vezes, mas me fez pensar que trata-se de ambiente, nada determinante para que o processo da mediação da leitura literária de fato possa acontecer. O ambiente é o mundo e o cada um dos envolvidos neste propósito. Portanto, um presídio, uma geladeira, um ônibus, uma sala, uma biblioteca ou uma caixa, um pedaço de chão podem permitir a mediação e o vínculo em processos de leitura literária.
Então é isso? Não é, vai sendo, vai se construindo… o vínculo e o amor se constroem, se estabelecem nas relações entre livros, autores, mediadores e vivências pessoais e coletivas… A mediação da leitura literária é processo incansável porque se reinventa a partir da ambiência na qual está envolvida e se propõe a atuar.
Quando lemos algo nossa voz é quem narra o escrito do outro, nossa voz se “submete ao escrito, une-se a ele”, como bem diz Cavallo e Chartier (1998, p. 49) citado por Felínio Freitas. Então nesse momento singular da leitura somos narradores também, a história que lemos rumina conhecimentos, lembranças e vivências em nós, e nesse momento único em que conversam o escritor, a história e o eu, acabamos por ser autônomos de nossos próprios pensamentos, sentimentos e conexões que se criam a partir das leituras de fazemos.
Se você trabalha com dados, tenho certeza que esses livros ajudarão você a se manter ativo e aprendendo. Mesmo em tempos de Covid-19.
Ninguém gosta da quarentena e o transtorno é para todos, mas não podemos ficar paralisados. A Pandemia vai passar e o mundo estará bem diferente depois dela. Para se manter competitivo em um mundo onde automação e trabalho remoto se tornarão a regra, é preciso manter-se em “modo de aprendizado”.
E, se possível, você pode reservar um tempo na quarentena e adquirir uma nova habilidade ou desenvolver algum skill. Isso não significa apenas fazer cursos ou estudar assuntos técnicos, mas sim estar em constante movimento. Você pode desenvolver habilidades em uma área de negócio ou adquirir habilidades de liderança e comunicação. E um bom livro pode ajudar você.
Aqui estão algumas dicas de livros não apenas para Cientistas de Dados, mas para qualquer profissional interessando em desenvolver habilidades adicionais. Alguns livros são mais técnicos, enquanto outros são mais divertidos, mas tenho certeza que você encontrará o seu livro ideal aqui. Os livros são excelentes e são todos em inglês. Ahh, não sabe inglês? Ok, aproveite a oportunidade e estude o idioma também.
Mas se preferir títulos em português, na seção de referências ao final do post tem algumas dicas para você.
Artificial Intelligence: A Guide for Thinking Humans
Eu recomendo este livro não apenas para Cientistas de Dados, mas para qualquer pessoa interessada em IA e em seus resultados futuros. Para um livro voltado para o público em geral, ele dedica muito tempo aos detalhes da visão computacional e como os computadores “pensam”, fornecendo uma visão clara e ampla sobre o assunto. Ele também aborda as perspectivas da IA para o futuro e o que você pode esperar para os próximos anos. O potencial da IA às vezes pode nos assustar, mas também tendemos a superestimar seu progresso nos últimos anos.
Statistics: a Very Short Introduction
Este livro é especialmente útil se você é um Cientista de Dados com experiência em TI ou negócios e deseja entender os conceitos básicos de técnicas estatísticas sem entrar em detalhes. Abrange o básico, desde distribuições de probabilidade até análise de regressão e árvores de decisão. Como o nome diz, é bastante curto e você deve levar poucos dias para ler.
Lean Analytics
Este livro é especialmente recomendado se você começou a trabalhar com dados bem recentemente, ou ainda está iniciando o seu aprendizado e deseja desenvolver seu potencial em relação aos dados. Ele ajuda a definir as métricas mais importantes para sua empresa, dependendo do modelo de negócio e como otimizá-las, sem se afogar em uma pilha de métricas não usuais.
The Man Who Solved the Market
Um livro não técnico, conta a história de Jim Simons, um matemático que começou a usar estatísticas para negociar ações, em uma época em que todo mundo no mercado usava apenas instintos e análises fundamentais tradicionais. Obviamente, todo mundo ficou cético em relação a seus métodos, mas depois de anos gerenciando seu fundo de investimentos e obtendo resultados surpreendentes, as pessoas acabaram cedendo e começaram a reconhecer o poder dos chamados quant hedge funds, que desempenham um papel enorme no setor financeiro nos dias atuais.
The Business Forecasting Deal
Uma cartilha sobre a arte da previsão de negócios, uma das maneiras mais tradicionais de usar dados e estatísticas em aplicativos de negócios. Realmente ajuda se você tem algum conhecimento sobre estatísticas e séries temporais e precisa fazer previsões no trabalho, como prever receita. Abrange o básico e os mitos, com uma abordagem muito prática (embora as técnicas apresentadas possam ser consideradas antiquadas, elas geralmente funcionam surpreendentemente bem nesse domínio, em comparação às técnicas de aprendizado de máquina).
Storytelling with Data
Um item obrigatório para quem precisa usar números no trabalho para vender uma ideia, apresentar resultados ou contar uma história. É mais adequado para analistas de negócios, mas os Cientistas de Dados também podem se beneficiar disso, aprendendo técnicas de visualização de dados que os ajudarão a mostrar os resultados do modelo, visualizar e plotar melhor os dados. Esse é o tipo de livro para o qual você volta o tempo todo para revisar conceitos importantes.
The Book of Why
Muitas vezes nos dizem que “a correlação não implica causalidade”. Quando você pensa sobre isso, no entanto, o conceito de causalidade não é muito claro: o que exatamente isso significa? Este livro conta a história de como vemos a causalidade de uma perspectiva filosófica e, em seguida, apresenta as ferramentas e modelos matemáticos para entendê-la. Isso mudará a maneira como você pensa sobre causa e efeito.
Moneyball
Esta é a história de Billy Beane e Paul DePodesta, que foram capazes de levar o Oakland Athletics, um pequeno time de beisebol, através de uma excelente campanha na Major League Baseball, escolhendo jogadores negligenciados baratos. Como eles fizeram isso? Usando dados. Isso mudou a maneira como as equipes escolhem seus jogadores, o que anteriormente era feito exclusivamente por olheiros e seus instintos. A história também inspirou um filme com o mesmo nome, e ambos são obras-primas.
Data Strategy
Este é um livro mais voltado para o lado comercial, e pode ser útil para gerentes executivos e até pessoas das áreas administrativas entenderem como desbloquear o poder dos dados em uma organização. Vai desde como extrair informações valiosas dos dados até como monetizá-las. Se você é um Cientista de Dados, isso pode ajudá-lo a ter uma visão mais ampla do seu papel na empresa e como você pode ajudá-lo a agregar valor usando os dados.
Feature Engineering for Machine Learning
Embora a Engenharia de Recursos seja uma das etapas mais importantes no fluxo de trabalho da Ciência de Dados, às vezes ela é ignorada. Este livro é uma boa visão geral desse processo, incluindo técnicas detalhadas, advertências e aplicações práticas. Ele vem com a explicação matemática e o código Python para a maioria dos métodos, portanto, você precisa de um conhecimento técnico razoável para seguir adiante.
Si te interesa la literatura y el saber inconmensurable que esconden los libros, te encantará conocer que hay un ejemplar que repasa las bibliotecas más importantes del mundo.
Massimo Listri. The World’s Most Beautiful Libraries Georg Ruppelt, Elisabeth Sladek/Foto: Massimo Listri. The World’s Most Beautiful Libraries Georg Ruppelt, Elisabeth Sladek (nombre del dueño)
En estos días en los que pasamos más tiempo de lo normal en casa, probablemente hayamos vuelto a releer algunos de nuestros libros preferidos o hayamos puesto fin a novelas que hacía tiempo que queríamos acabar. Y es que, para los amantes de la lectura, nada como tener un par de títulos en la mesilla para disfrutar de ellos. Y nada como tener una zona de la casa reservada a los libros. Si te sientes identificado, sigue leyendo porque las bibliotecas que vamos a mostrarte son verdaderos paraísos repartidos por todo el mundo.
Massimo Listri. The World’s Most Beautiful Libraries Georg Ruppelt, Elisabeth Sladek/Foto: Massimo Listri. The World’s Most Beautiful Libraries Georg Ruppelt, Elisabeth Sladek (nombre del dueño)
De la mano de la editorial TASCHEN y a través del libroThe World’s Most Beautiful Libraries de Massimo Listri, recorremos algunas de las bibliotecas más antiguas y apasionantes del mundo. El fotógrafo Massimo Listri ha capturado las bibliotecas más importantes revelando sus secretos arquitectónicos, históricos y novelescos, lugares que alojan el legado del saber como en ningún otro sitio. Un viaje por cuatro continentes que indaga en un buen número de bibliotecas de instituciones medievales a decimonónicas, pasando por bibliotecas privadas, públicas y monásticas, remontándose incluso al año 766. Estos espacios de culto recogen algunos de los documentos más valiosos del pensamiento y las proezas de la Humanidad.
Massimo Listri. The World’s Most Beautiful Libraries Georg Ruppelt, Elisabeth Sladek/Foto: Massimo Listri. The World’s Most Beautiful Libraries Georg Ruppelt, Elisabeth Sladek (nombre del dueño)
Entre los espacios escogidos, podemos encontrar la belleza de la Biblioteca Apostólica Vaticana, la Biblioteca del Trinity College de Dublín, la Biblioteca Laurenciana de Florencia o la Biblioteca del convento franciscano de Lima. Historia y conocimiento impregnado en cada fotografía que ilustra estas salas y cada libro que guardan.
Este libro cuenta con un prestigioso fotógrafo, además de experto bibliófilo y sus autores no iban a ser para menos. Georg Ruppelt estudió Historia, Lengua y Literatura Alemana, Pedagogía y Filosofía. Más tarde, trabajó de bibliotecario y después se convirtió en director de la Biblioteca Gottfried Wilhelm Leibniz de Hannover. Por su parte, Elisabeth Sladek, la segunda autora del libro, cursó Historia del Arte en Viena, además de arqueología clásicos y estudios judaicos. Actualmente es profesora e investigadora en Roma, Viena y Zurich. Tres amantes del saber y la historia concentrada en las Bibliotecas, tanto en sus libros como en los espacios que les dan vida.
Massimo Listri. The World’s Most Beautiful Libraries Georg Ruppelt, Elisabeth Sladek/Foto: Massimo Listri. The World’s Most Beautiful Libraries Georg Ruppelt, Elisabeth Sladek (nombre del dueño)
Criado em tempo recorde pela educadora Mônica Correia Baptista em conjunto com onze ilustradores, livro explica com delicadeza o que é o coronavírus e como as crianças podem se cuidar
Texto por Isabella Von Haydin e Vanessa Lima
Carta às meninas e aos meninos em tempos de COVID-19 (Foto: Divulgação)
Com os impactos do coronavírus, muitos pais se perguntam: como falar com as crianças sobre o que está acontecendo? Quais palavras usar para explicar que, devido a uma pandemia, não se pode mais ir à escola e nem visitar os amigos e os avós? Para ajudar, ilustradores brasileiros se reuniram e criaram o livro Carta às meninas e aos meninos em tempos de Covid-19.
Arquitetada pela pedagoga Mônica Correia Baptista, professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a obra foi inspirada na Carta para los niños y ninãs en este momento de crisis, feito pela educadora chilena Isidora Lobo e pela ilustradora Carla Infante para instruir os pequenos de forma delicada sobre o que estava acontecendo por lá em 2019, quando medidas econômicas do governo geraram uma onda de protestos no país. “Esta carta tinha me tocado muito pelo carinho, pela potência da linguagem para quem precisa de uma mediação para compreender. Até que veio a tragédia do coronavírus e, na minha vivência como mãe, tia e avó, pensei em como é difícil para as crianças verem essa situação e compreenderem. Então, me inspirei nela”, diz a educadora.
Em formato de carta, a narrativa conta de forma delicada o que vem acontecendo no mundo, o que é o coronavírus e o que as crianças podem fazer para se proteger. As páginas trazem até dicas para o novo cotidiano. O intuito do projeto é ter uma distribuição gratuíta para atingir o máximo de pessoas possível. A obra está disponível em PDF e pode ser vista e compartilhada aqui. A ideia é criar também versões em inglês, espanhol e também com audiodescrição, para acolher também crianças deficientes visuais.
Ilustração de Alexandre Rampazo (Foto: Divulgação)
A obra conta com a participação de onze ilustradores, cada um responsável por uma página. Chama atenção também o tempo recorde em que foi produzida: menos de 5 dias. Alexandre Rampazo [vencedor do Troféu Monteiro Lobato de Literatura Infantil de 2019, concedido por CRESCER], responsável pela figura da super-heroína, conta que pensou na imaginação alimentando o real.
Mônica também atua no Fórum Mineiro de Educação Infantil (FMEI) e no Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação e Infância (NEPEI) e conta que os órgãos estão sempre muito atentos para levar em conta o protagonismo infantil. “As crianças não são sujeitos passivos e submissos, que só veem o mundo pela tradução. Essa concepção de infância nos obriga a pensar em produtos culturais que visam esse protagonismo, essa inteligência. Então trazemos a verdade, não escondemos que é um momento difícil. Elas percebem com muita força”, completa.
Este livro é fruto do discurso escrito por José Ortega y Gasset, proferido no Congresso Internacional de Bibliotecários em 20 de maio de 1935, e faz parte da bibliografia básica de muitos cursos de Biblioteconomia, eu li no primeiro ano da graduação e a revisitei agora, pensando no dia 12 de março, dia em que se comemora o dia do Bibliotecário, data instituída pelo Decreto nº 84.631, de 9 de abril de 1980, em homenagem a data do nascimento de Manuel Bastos Tigre, que se formou em engenharia, mas após conhecer Melvil Dewey, durante uma viagem, ficou encantado com a Biblioteconomia e ao retornar ao Brasil se dedicou a estudá-la e a exercer a profissão, além disso, também era escritor e poeta.
Isto posto, voltemos a José Ortega y Gasset e seu discurso, que inicia com o questionamento: o que é missão? Etimologicamente é “aquilo que um homem deve fazer em sua vida”, e citando Descartes, o autor acrescenta “Quod vitae sectabor iter?”: aual caminho de vida escolherei?.
“Missão é isto: a consciência que cada homem tem de seu mais autêntico ser, daquilo que está chamado a realizar. A idéia de missão é, pois, um ingrediente constitutivo da condição humana […] Sem homem não há missão […] Sem missão não há homem.”
Ortega y Gasset discorre ao longo do seu discurso sobre o que ele acredita ser a missão do Bibliotecário e em como essa missão está diretamente relacionada com a evolução da sociedade, o que faz com que a profissão esteja sempre se reinventando, uma vez que está atrelada à necessidade social que o livro representa para esta sociedade.
Discorre ainda sobre a facilidade de acesso ao livro, que em outras épocas não existia, e como estão sendo produzidos sem critérios, em série e como esse fenômeno é prejudicial até mesmo para o “homem de ciência” que está com dificuldades em “orientar-se na bibliografia de seu tema”, fazendo referência a torrente informacional que segundo o autor aflige a humanidade.
Explana acerca da nova missão do bibliotecário, que segundo o autor é o papel de higienista, de abrir caminho em meio ao surgimento de tantos livros, que estão se tornando um perigo para o homem, já que “muitos deles são inúteis ou estúpidos, e sua existência e conservação constituem um lastro a mais para a humanidade, que já anda exclusivamente curvada sob o peso de outras cargas”. Em contrapartida, outros de extrema importância estão escassos.
E finaliza seu discurso expondo a construção da memória que era guardada por meio da memória dos anciãos, ou seja, pela oralidade, e que a invenção da escrita os libertou e as materializou, colocando o conhecimento a disposição de todos. O autor ressalta que somente a escrita e a leitura não bastam, é necessário revisitar o contexto em que o livro foi escrito, se aproximar do autor, fazer o mesmo caminho que ele, demonstrar que “antes de ler o livro pensou por conta própria sobre o tema e conhece suas trilhas”. O autor encerra com uma fala de Platão:
“Confiando os homens no escrito, acreditarão compreender as ideias, e assim as tomam por sua aparência, graças a indícios exteriores, e não a partir de dentro, por si mesmos […] Abarrotados de supostos conhecimentos, que não adquiriram de verdade, julgar-se-ão aptos para julgar tudo, quando, a rigor, nada sabem e, ademais, ficarão insuportáveis porque, ao invés de sábios, como se imaginam, serão apenas carregamentos de frases”.
No posfácio consta a circunstância política e social em que o discurso “Missão do bibliotecário” foi escrito e recebido pelos leitores da época.
Vamos refletir?
Autor: José Ortega y Gasset
Tradução e posfácio: Antonio Agenor Briquet de Lemos
Publicada em uma parceria da Ateliê Editorial e Edições Sesc SP, a ‘Coleção Bibliofilia’ é dedicada à ciência e arte do livro, da ideia na mente do autor à catalogação nas bibliotecas
O livro é um dos mais fascinantes objetos produzidos pelo homem. Mesmo na época atual marcada pelos avanços tecnológicos e novas mídias, o livro permanece sendo um artefato sem igual, e não dá mostras que irá desaparecer. Com três livros, a Coleção Bibliofilia, organizada por Marisa Midori Deaecto e Plínio Martins Filho, a Ateliê Editorial e as Edições Sesc São Paulo se uniram para celebrar o prazer da leitura e a importância social, cultural, econômica e simbólica do livro. No primeiro volume, O que é um livro? (72 pp, R$ 32), João Adolfo Hansen discorre sobre no que consiste um livro, convidando o leitor a refletir sobre seus múltiplos significados. Já o segundo volume, Da argila à nuvem (136 pp, R$ 44), foi concebido para servir de introdução ao catálogo de uma exposição sobre a “arqueologia dos catálogos”, realizada em Paris e Genebra em 2015. O autor Yann Sordet sustenta que a lista catalográfica acompanha os textos desde a invenção da escrita. E no terceiro, A sabedoria do bibliotecário (152 pp, R$ 36), Marcel Melot presta uma homenagem à figura do bibliotecário.
Na coluna Bibliomania, que foi ao ar no dia 6 de março, a professora Marisa Midori apresentou A Sabedoria do Bibliotecário, de Michel Merlot, terceiro título da Coleção Bibliofilia, publicação da Ateliê Editorial, em parceria com Edições Sesc, dirigida por ela ao lado do editor e professor da USP, Plínio Martins Filho.
Segundo a professora, o livro presta homenagem ao bibliotecário, como o próprio autor. Formado pela École Nationale des Chartes, de Paris, com uma carreira dedicada aos livros e ao patrimônio francês, dirigiu por muitos anos a seção de gravuras e de estampas da Biblioteca Nacional da França e atuou no Ministério da Cultura francês, onde cuidou de um levantamento bastante extenso e exaustivo do patrimônio francês, no final do século 20, como relata Marisa. E acrescenta que, atualmente aposentado, se dedica à atividade ensaística.
“Estamos diante de um relato bastante pessoal, em que o nosso autor não apenas reflete sobre sua profissão, mas conta vários casos vividos por ele durante os anos em que atuou como bibliotecário”, conta Marisa. São sete curtos capítulos, o último deles, “talvez a pergunta de todo bibliotecário para o leitor de uma biblioteca: Encontrou o que procurava?”
Ouça no link acima a íntegra da coluna Bibliomania.
Especialistas em literatura avaliam como se deu a formação da sociedade leitora no país
A prática da leitura ainda não está plenamente ativa entre os brasileiros: 44% da população não lê e 30% nunca comprou um livro, de acordo com pesquisa Retratos da Leitura do Instituto Pró-Livro. Nesse cenário, Marisa Lajolo e Regina Zilberman apresentam a edição revista da obra A formação da leitura no Brasil, lançamento da Editora Unesp, originalmente publicada em 1996.
“Apresentamos um traçado consistente do nascimento, da consolidação e das transformações das práticas de leitura da sociedade brasileira, sem ignorar o fato de que cada época, cada obra e cada autor trazem consigo características próprias. Por esse viés, acompanhamos, fascinados, o amadurecimento do leitor – o que, por consequência, também nos esclarece sobre as conexões intrínsecas entre o universo fantasioso (e fantástico) da literatura e o mundo social em que habitamos”, explicam as autoras.
O livro propõe, além da representação da leitura e do leitor nas obras brasileiras dos séculos XIX e XX, uma reflexão sobre o papel do aparelho escolar no âmbito da criação e veiculação da literatura, e a identificação dos processos de remuneração do intelectual, com suas idas e vindas, avanços e recuos ao longo de duzentos anos de história. “Não ignoramos os aspectos próprios ao universo das letras, como a influência escolar na massificação da literatura, os processos de remuneração do escritor e a questão de gênero. Esta ganha especial relevância na análise da formação de um público leitor feminino, na transição entre os séculos mencionados, quando a mulher, ainda que limitada aos afazeres domésticos, acaba por desencadear a popularização de um filão literário mais específico: a prosa de ficção”.
Do primeiro ao último capítulo de A formação da leitura no Brasil, da construção do leitor à leitora no banco dos réus, várias histórias se enovelaram. “A emancipação do leitor encena, de certo modo, o processo de libertação de que se originou a sociedade moderna. Nesse sentido, narrar a formação da leitura no Brasil significa também narrar, sob esse viés, a história da modernização de nossa sociedade. Essa história que parece não ter um final feliz sinaliza que também a outra história, a do leitor, não termina bem”.
Sobre as autoras – Marisa Lajolo é professora da Unicamp e da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Publicou várias obras sobre leitura no Brasil. Em 2009, em parceria com João Luís Ceccantini, organizou a obra Monteiro Lobato, livro a livro: Obra infantil, eleito pelo Prêmio Jabuti o melhor livro de 2009 na categoria não ficção, publicada pela Editora Unesp. Regina Zilberman possui graduação em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1970), doutorado em Romanística – Universidade de Heidelberg (Ruprecht-Karls) (1976), e pós-doutorado no University College (Inglaterra) (1980-1981) e na Brown University (EUA) (1986-1987). Uma das maiores especialistas brasileiras em literatura infantojuvenil.
Título:A formação da leitura no Brasil Autoras: Marisa Lajolo e Regina Zilberman Número de páginas: 468 Formato: 16 x 23 cm Preço: R$ 74,00 ISBN: 978-85-393-0819-4
Assessoria de Imprensa da Fundação Editora da Unesp
imprensa.editora@unesp.br
(11) 3242-7171 ramal 517
Por Jean Pierre Chauvin, professor de Cultura e Literatura Brasileira da ECA-USP
Jean Pierre Chauvin – Foto: Arquivo pessoalPublicado pela primeira vez em 2013, O que é um livro? resulta de conferência homônima ministrada no ano anterior, por João Adolfo Hansen, em uma das unidades do Sesc São Paulo, sob a mediação de Joaci Pereira Furtado. O projeto da nova edição, em capa dura, é assinado por Gustavo Piqueira e Samia Jacintho, da Casa Rex. Para além do rico invólucro, capaz de atrair o leitor, a sobrevoar em livrarias, destaco algumas passagens do volume, de modo que ele experimente partes do todo, digamos, como tira-gosto. De imediato, diga-se que Hansen não aborda exclusivamente o assunto sugerido pelo título. Claro esteja, não se trata de uma monografia ou de um manual tecnicista com linguagem redutora ou simplista, cujo propósito fosse definir estreitamente o objeto do ensaio – o que suporia motivações incompatíveis com o repertório, a lucidez e o posicionamento político de seu autor.Isso posto, o que esperar de um livro que se propõe a falar sobre o livro? Que ele trate não só do valor de troca ou do fim mercante e mercantilizável do artefato; mas sobre um artefato, espécie cultural dentre vários formatos e gêneros. Esse objeto está situado no tempo e no espaço e, como tal, relaciona-se ao suporte material de que se compõe e aos usos que dele se espera ou podem ajuizar: “[…] o livro não é um objeto natural, mas artificial, material e simbólico”. Muito antes de circular entre nobres, filósofos ou padres da Renascença, no formato encadernado – com direito à lombada, capa, folha de guarda, cola, linha, miolo e quarta-capa – o livro, que se conhece desde meados do século XV, foi rolo de esticar e recolher, depois códice para melhor folhear, carregar, manusear. Ele sucedeu o milenar papiro egípcio e o pergaminho (não por acaso, criado em Pérgamo, bem antes de Cristo); adquiriu a forma rústica “[…] no tempo de Cícero e Varrão”, período em que passou a fazer “parte da vida dos homens instruídos”; e chegou à versão industrializada das folhas de papel, produzidas em série, muito antes da autonomização do(a) autor(a), ao final do século XVIII.
Por ser um bem simbólico, o conteúdo que nele mora necessita ser situado, espacial e temporalmente, por aquele que o lê. Matéria de que se compõe, o livro pode se orientar e respaldar por preceptivas retóricas e regras da poética, fruto de mentalidades diversas e respectivos pressupostos, métodos e fins. Sobretudo, ele “[…] é memória porque é seleção do que culturalmente se julga significativo e lembrável”. Muitos homens autorizados (ou seja, alinhados com a auctoritas, imitando modelos da longa tradição que o antecederam) debruçaram-se sobre o livro, embora discorressem a partir de situações, por vezes, muito distintas. Reconstituir a genealogia desse objeto seria tarefa para numerosos volumes a tratar de um fiel depositário da memória: “Vieira diz no século XVII o que disseram no século XX os alemães teóricos da recepção da leitura, como Jauss, Robert Weinmann e Iser: um livro não tem ação em si mesmo, mas causa grandes efeitos porque é lido, sendo por isso mesmo o somatório sempre inacabado de suas leituras”.
Submetido aos dogmas e arbítrios de homens poderosos (discretos ou vulgares), frequentemente a disseminação da leitura foi interpretada como atividade viciosa e, portanto, censurável. Bastaria mencionar o dia 10 de maio de 1933, quando os nazistas promoveram a enorme queima de livros de teor dito “judaizante”. Ou a “limpeza” moral de materiais perniciosos, realizada durante o reinado de Dom José I (conforme os desígnios do Marquês de Pombal), em meados do Setecentos – segundo procedimentos inquisitoriais que, em Portugal, remontavam ao início do século XVI. A esse respeito, lembre-se que uma das 95 teses de Martinho Lutero, afixadas nas portas das igrejas de Wittenberg, em 1517, defendia o estudo particular da Bíblia pelo fiel:
“O Concílio de Trento decretou a tese herética e proibiu a leitura da Bíblia pelos católicos, para impedir o livre-exame. Isso teve consequências que até os reis aliados do papa, como a Espanha e Portugal, escolheram manter as populações dos reinos e as populações pobres, negras e indígenas das colônias da América analfabetas, e a palavra de Deus foi transmitida oralmente a elas pelo padre iluminado pelo Espírito Santo”.
Seria necessário assinalar que “[…] o intervalo cronológico e semântico do livro em relação ao leitor precisaria ser suprido tendo em vista os elementos condicionantes da época em que o texto originalmente veio a público”. Se até o século XVIII o nome de um letrado ou homem de ciência sobrepujava o título dado à “sua” obra, de lá para a frente, “[…] a coisa se inverteu: a autoria dos livros de ciência se dissolveu na generalidade de um campo em que a iniciativa da pesquisa do cientista individual é somente um elemento hiperespecializado de um conhecimento anônimo”. Vivemos em outro tempo, evidentemente. Uma das características mais peculiares, na relação do livro com o público adepto do mundo ciber, é que, por intermédio do espaço virtual, as obras “[…] estão desierarquizadas nessas mídias como as peças de um joguinho Lego”. Para um internauta de nossos dias, desatento às condições de escritura e protocolos de leitura vigentes em outros tempos, Aristóteles valeria tanto quanto uma resenha sobre um filme de ação, feita de bricolagens.
Outra questão: a vigência dos direitos autorais, ao final do século XVIII, em que o escritor passou a ser tratado como um profissional liberal. Um pino a participar, com variável conhecimento da cortesania e da etiqueta, dos trâmites comercializáveis. Algo muito diferente acontecia na Roma antiga, quando “[…] não havia direitos autorais e era costume o autor pedir a amigos que fizessem modificações nos rolos que possuíam com sua obra”. Isso provocou numerosas diferenças entre as versões (simultâneas ou não) de um mesmo texto. Elas foram detectadas “[…] principalmente nos séculos XV e XVI, quando muitíssimos eruditos das cidades italianas passaram a editá-los e, depois, nos séculos XIX e XX, quando especialistas e filólogos fizeram edições críticas”. Não por acaso, o objeto livro também mudou em formato e propósitos. Atribui-se ao tipógrafo italiano Aldo Manuzio (1449-1515) a redução de tamanho, o que favoreceu o deslocamento da palavra impressa por entre pessoas e acervos, ruas, aposentos, ateliês e salões da corte.
Em O que é um livro?, o professor anuncia abordagem complementar, em que o eixo gravita em torno do objeto livro, mas também leva em conta os papéis e lugares do leitor. Alguém menos experimentado poderá não ver que, até recentemente, a expressão de um autor se ligava ao assunto, em adequação decorosa ao gênero discursivo. Nesse caso, poderá denegar as alusões pretendidas pelo autor, no momento da enunciação. Nesse sentido, caberia estabelecer uma analogia do leitor (que ignora ou desvaloriza os códigos de outro tempo) com a figura do louco, em seu eterno presente “[…] assim como a loucura, que ignora sua própria ficção, a alienação é ignorância […] da particularidade histórica da regra culta e dos poderes da regra”. Por que isso acontece? Porque raramente quem lê leva em conta os preceitos e expedientes utilizados em um texto: “[…] a desconsideração do simbólico corresponde à ignorância do artificial do texto e da sua própria ficção como leitor e caracteriza a leitura inepta e insuficiente como ideologia, etnocentrismo ou universalização da particularidade do seu imaginário de leitor”.
Ao ler, há que se preservar algum distanciamento e estipular parâmetros, conforme o recorte temático e a delimitação histórica, sem perder de vista pelo menos uma parcela dos ingredientes que orientam o que, onde, quando e como o texto foi enunciado, mais ou menos entre a Antiguidade e o final do século XVIII: “[Na hiperinterpretação], o leitor, principalmente o leitor escolar, descobre intenções que o autor quis dizer mas não disse, subordinando projetivamente a informação do texto ao seu imaginário, sem observar que sua interpretação deve ter limites determinados pela regulação retórica do gênero e do regime discursivo do texto”. Haveria que se evitar particularizações excessivas e anacrônicas, frente ao que se escreveu com outras premissas, mediante múltiplos procedimentos e objetivando diversos fins. Afinal, a leitura também tem história – por exemplo, aquela reverberada pela sociedade classista e imitadora canhestra de fidalgos, sedimentada no início do século XIX e atomizada, pelo menos desde 1980, graças ao neoliberalismo. É o que Hansen chama de “leitura besta”, pois “[…] faz falar uma vontade obtusa, cheia de si […], impondo-se à força”:
“Como ler textos do Antigo Regime, como os coloniais, que pressupõem outros conceitos de tempo histórico, poder, pessoa, autoria, texto e público, e não conhecem categorias como ‘literatura’, ‘plágio’, ‘direitos autorais’ e os estilos que os classificam unitariamente nas nossas histórias literárias, Classicismo, Barroco, Neoclassicismo etc.?”.
O que é um Livro?, de João Adolfo Hansen, Cotia/São Paulo, Ateliê/Edições do Sesc, 2019, 72 pp.Ilustremos. O primeiro verso de Os Lusíadas – poema épico com 10 cantos, 1.102 estrofes, 8.616 versos –, escrito por um soldado português entre as décadas de 1550 e 1570 – demandaria uma leitura muito bem aparelhada, sob o risco de o texto modelar (e que imita modelos) ser tratado com despeito ou fastio por alguém que sequer compreendeu aquilo que leu, devido a numerosas limitações: “[…] a expressão ‘armas e barões assinalados’ é uma antecipação, uma síntese prévia da matéria, do gênero e do estilo do poema […] o eventual leitor de Camões deve observar que já no primeiro verso o poema fornece o protocolo de leitura adequada”. Pode-se supor que o livro de João Adolfo Hansen contenha “tom” provocativo, especialmente se atentarmos para a hipótese de que “[…] o leitor tem antes de tudo de suplementar a sua própria insignificância, a sua falta de significação”. Mas isso seria dizer óbvio e pouco. Neste livro sobre os livros, Hansen assume a persona do ensaísta que comove, deleita e ensina – segundo os preceitos de Cícero. Sob esse aspecto, O que é um livro? também pode ser entendido como fala forjada com um misto de sabedoria, coerência e inconformismo. Nada mais conveniente, pois, que este pequeno grande livro inaugure a Coleção Bibliofilia, da Ateliê.
Já está disponível no site do Poder Judiciário de Santa Catarina o primeiro Dicionário Jurídico de Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) do Brasil, fruto de uma parceria entre a Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE) e o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC). O acesso ao Dicionário ocorre através de uma plataforma online no site do TJSC contendo vídeos com traduções em LIBRAS de termos jurídicos básicos e pode ser acessadoclicando neste linkou diretamente no site do TJSC nos perfis Cidadão, Advogado e Servidor.
Desde que a proposta de colaboração entre as duas instituições teve início, em agosto de 2015, a FCEE, através do Centro de Capacitação de Profissionais de educação e de Atendimento às Pessoas com Surdez (CAS), passou a realizar pesquisas junto à comunidade surda brasileira para a definição e/ou criação dos sinais em LIBRAS que integrariam o dicionário.
No dia 16 de outubro de 2017, no auditório da FCEE, ocorreu uma cerimônia em que as duas instituições assinaram o convênio que deu início à produção do dicionário. Os vídeos que compõem o Dicionário foram produzidos e gravados pela equipe do CAS entre 2017 e 2019.
A FCEE, através do CAS, é responsável por promover a acessibilidade e a difusão da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), garantindo assim o acesso às informações e a participação efetiva dos surdos na sociedade preservando seus direitos.
Artigo discute como os meios digitais revolucionaram a relação entre os adolescentes e os livros
O senso comum diz que a internet acabou com a leitura entre os adolescentes. O artigo “Adolescentes e o livro: internet como mediadora de novas práticas de leitura” diz o contrário. Escrito pelas pesquisadoras Marina Machiavelli e Liliane Dutra Brignol, o trabalho faz parte da mais recente edição da revista Novos Olhares.
Segundo o artigo, a internet potencializou novas formas de se conectar com o ambiente da leitura. É através dela que os jovens acompanham seus autores favoritos, veem indicações feitas por youtubers – os especializados em livros são chamados booktubers – , compartilham suas leituras e se conectam com outros leitores.
No ambiente digital, nem sempre são os PDFs e eReaders que se sobressaem. Na pesquisa feita por Machiavelli e Brignol, os adolescentes afirmaram preferir o livro impresso à leitura no celular, por exemplo. O celular, na verdade, é mais “o responsável por permitir o compartilhamento de experiências de leitura com os amigos”.
Isso não descarta a leitura em dispositivos como o Kindle ou o Lev, no entanto. Segundo as autoras, “o adolescente pode ser leitor de dispositivos digitais ao mesmo tempo em que lê o livro impresso. Ele vai de um ao outro descobrindo espaços de encontros e interesses.”
O objetivo do artigo era analisar o impacto dos suportes digitais e também como a internet transformou as práticas de leitura. Para isso, as autoras fizeram uma pesquisa com alguns adolescentes leitores na cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. A partir de discussões com seis jovens na faixa etária de 14 a 16 anos, um grupo relativamente homogêneo, foi possível entender mais sobre como esse grupo se relaciona com os livros em um contexto de tanta presença da internet.
A prática de leitura não se resume a simplesmente ler o livro e guardá-lo na estante depois. Na verdade, o que foi percebido é que cada vez mais os leitores se transformam em seguidores, em fãs. Acompanham lançamentos, seguem os autores nas redes sociais, fazem grupos para discussões de livros, criam narrativas alternativas – as chamadas fanfics. No artigo, Machiavelli e Brignol dizem que os jovens “querem se sentir parte, ter a oportunidade de se aproximar não só da obra, mas daquilo que o autor representa.”
De fato, a internet revolucionou a leitura. Mas não necessariamente de forma negativa. O que a pesquisa mostra é que “o adolescente lê, lê do seu jeito, lê aquilo que o faz sentir, faz se emocionar, faz querer compartilhar, faz questionar e faz refletir sobre sua realidade, mas, acima de tudo, o faz constituir-se enquanto leitor.”
Revista Novos Olhares, v.8 n.2 (dez/2019)
Novos Olhares é a revista de Estudos Sobre Práticas de Recepção a Produtos Midiáticos, do Programa de Pós-Graduação em Meios e Processos Audiovisuais (PPGMPA). A publicação semestral, em seu oitavo volume, discute temas variados, envolvendo jornalismo, comunicação organizacional, cinema, literatura e muitos outros.
Rede Nacional de Bibliotecas Comunitárias (RNBC) lançou na 65° Feira do Livro de Porto Alegre dois volumes da Coleção Entre-Redes Percursos Formativos.
As publicações sobre as práticas em Articulação e Comunicação estão disponíveis para download no site da RNBC. (crédito da imagem: divulgação)
RNBC disponibiliza as publicações sobre as experiências em articulação e comunicação no site. Ainda oferece volumes da coleção Entre-Redes com os seguintes temas: Espaço, Acervo, Mediação de Leitura, Gestão Compartilhada, Enraizamento, Comunitário, Articulação, Incidência Política e Mobilização de Recursos – eixos de trabalho desenvolvidos pelo Programa Prazer em Ler no contexto das bibliotecas da RNBC.
A RNBC é um coletivo composto por mais de 110 bibliotecas comunitárias, espalhadas nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Maranhão, Rio de Janeiro, Pernambuco, Bahia, Pará e Ceará. A Rede atua na democratização do acesso ao livro e à leitura, na formação de leitores e na promoção da leitura por meio da incidência em políticas públicas, nos âmbitos municipal, estadual e nacional.
A jornalista e pesquisadora Hérica Lene acaba de lançar o e-book “Jornais Centenários do Brasil” (Labcom-UB, 2020). A obra é resultado de uma pesquisa de pós-doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) sobre os jornais brasileiros que atingiram ou ultrapassaram a marca temporal dos 100 anos.
O Portal IMPRENSA conversou com a pesquisadora sobre os desafios e as estratégias de sobrevivência dos jornais no atual contexto de crise do jornalismo e busca por novos modelos de negócio de produção da notícia.
Hérica realizou 17 entrevistas com dirigentes de jornais (diretores, editores ou chefes de redação). “Nos discursos dos dirigentes dos jornais centenários, a tradição é vista como patrimônio e fortalecimento das marcas e como um elemento importante que contribui, em algum nível, para a manutenção dos periódicos em circulação”, explica.
Crédito:Divulgação Labcom-UB
Portal IMPRENSA – Conta sobre o processo da pesquisa que resultou no livro. Como surgiu a ideia de escrever sobre os jornais centenários?
Hérica Lene – O livro “Jornais Centenários do Brasil” (Labcom-Ubi, 2020) é resultado da minha pesquisa do pós-doutorado em Comunicação e Cultura pela UFRJ, que fiz de 2017 a 2018, mas iniciei essa busca pela trajetória e situação dos jornais centenários bem antes, em 2014, em um projeto do grupo de pesquisa que coordeno na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), onde dou aula. Inclusive, obtive a aprovação de um edital de pesquisa do CNPq para desenvolver esse estudo.
Eu pesquiso na área de História da Imprensa desde que ingressei na vida acadêmica, após ter sido repórter dos jornais capixabas A Tribuna e A Gazeta e da Gazeta Mercantil (caderno regional Espírito Santo).
A crise dos jornais impressos é um tema importante de ser investigado e acompanhado. Muitos jornais tradicionais morreram, como o Jornal do Commercio do Rio de Janeiro, infelizmente. A própria Gazeta Mercantil, onde trabalhei há anos, foi um importante jornal que fechou com pouco mais de 80 anos de circulação. Então, eu queria saber como os jornais centenários estavam enfrentando a situação de convergência e que estratégias estão lançando mão para sobreviverem nesse contexto.
Ao iniciar a pesquisa sobre os jornais centenários, em 2014, eram 28 com mais de 100 anos que constavam na lista da Associação Nacional dos Jornais (ANJ). Até o primeiro semestre de 2019, além do emblemático Jornal do Commercio (RJ), também suspenderam suas atividades na imprensa de São Paulo: Diário de S.Paulo, A Mococa, o Diário do Povo e Comércio do Jahú.
Outro historicamente muito importante para a imprensa brasileira – o Jornal do Brasil – migrou para o on-line em 2010, mas voltou a circular impresso em 2018 no Rio de Janeiro. Foi o único que deixou o corpo “papel” para o digital, mas voltou ao suporte anterior. Conseguiu circular impresso apenas por um ano, até março de 2019, e retomou a ser apenas on-line.
Outros três deixaram de circular impresso e migraram definitivamente para o on-line: O Mossoroense, o Correio Riograndense e o A Cidade. Outros dois centenários, no entanto, sobrevivem circulando somente em versões impressas e não têm edição na internet: O Taquaryense e o Gazeta de Ouro Fino. Outros dois foram adquiridos pelo poder público: A União e a Tribuna do Norte, o que dá fôlego para continuarem circulando em suas versões impressas no que tange ao custo da produção e impressão.
E outros dois atingiram a marca temporal dos 100 anos no primeiro semestre de 2019: Gazeta do Povo, de Curitiba, Paraná, que, a partir de 1º de junho de 2017, passou de impresso para on-line, mantendo a edição impressa unificada apenas no fim de semana; e o Jornal do Commercio, de Recife, Pernambuco, que se mantém nos suportes papel e o on-line.
O desafio da pesquisa foi relacionar o passado (um pouco da trajetória dos jornais) com o presente (as estratégias). Por isso, ele foi feito no formato enciclopédico, com um tópico para cada jornal e um pouco de sua história junto com a entrevista de um representante que falasse dessas ações do presente. A metodologia foi pesquisa bibliográfica e entrevistas com os dirigentes dos jornais (diretores, editores ou chefes de redação).
Portal IMPRENSA – Você fala sobre os desafios e as estratégias de sobrevivência destes jornais nos dias de hoje. Você poderia falar um pouco sobre este tópico? Como os jornais centenários lidam com alguns desafios, como as redes sociais, a desinformação online, etc.?
Hérica Lene – Consegui realizar 17 entrevistas durante o período do pós-doutorado e todos os depoimentos trataram das dificuldades de continuar atraindo novos leitores, que migram para as plataformas móveis. O que a pesquisa mostra é que, de Norte a Sul do país, o jornal impresso está em crise, inserida na conjuntura da crise geral do negócio de jornalismo.
Os jornais têm buscado valorizar a proximidade na abordagem das notícias em busca de atrair os leitores como um valor-notícia fundamental, além do investimento na plataforma da internet e da busca de canais de interação com seus públicos, para receber demandas dos leitores e sugestões de pauta. Em tempos de globalização instantânea das informações, o local e o regional são valorizados.
Resumi em 12 pontos principais os resultados da pesquisa:
1) Dificuldades de sobrevivência para todos, independente do porte do jornal (diário ou semanal, se de regiões metropolitanas ou do interior);
2) Busca de um novo modelo de negócio, de estratégias que ajudem os jornais a se sustentar já que houve queda de publicidade com a circulação de conteúdo informativo e noticioso pela internet;
3) A maioria dos jornais centenários migrou para a plataforma da internet;
4) Equipes reduzidas de profissionais estão produzindo o conteúdo dos jornais;
5) Busca de uma maior interação com seus públicos, via redes sociais;
6) Renovar a carteira de leitores e atrair os jovens é visto como um grande desafio dos jornais atualmente;
7) A tradição é considerada como muito importante para manutenção do jornal;
8) Com relação a abordagem noticiosa, muitos jornais trabalham com “redação integrada”, no sentido de que as equipes trabalham no mesmo espaço físico, mas prevalece o tratamento diferenciado para o impresso (que segue uma linha argumentativa mais fundamentada em opiniões e análises) e no on-line (notícias mais curtas); Uma tendência: o conteúdo do papel ter um tratamento mais analítico, com contextualização, enquanto o digital tem um caráter mais factual e noticioso, e onde se busca experimentação com conteúdos em áudio e vídeo;
9) Os entrevistados dos jornais localizados no interior evidenciam que sofrem mais dificuldades em manter os periódicos em circulação em função da concorrência com o jornalismo veiculado na plataforma de internet;
10) Jornais de médio e pequeno porte adotaram uma “superedição” de final de semana como forma de diminuir custos;
11) Enfoque na cobertura de notícias locais e regionais como um diferencial para enfrentar a concorrência das mídias digitais, onde há rápida circulação de notícias nacionais e internacionais;
12) Crise econômica de 2014 como agravante da crise dos jornais impressos, que perderam anunciantes e assinantes;
Diante do quadro apresentado, observa-se redução de equipes de jornalistas e busca de um modelo de negócio que sustente o jornal. O futuro dos impressos, portanto, segue incerto no contexto de crise do jornalismo.
Há menos leitores do jornalismo impresso, cujas tiragens despencam. E menos anunciantes, que costumavam responder pela maior fatia das receitas. As diferentes mídias se concentram em uma só plataforma, a internet, onde se colhe mais audiência e se busca, com dificuldades, o faturamento publicitário do passado.
Portal IMPRENSA – O que os jornais centenários podem ensinar para as novas produções jornalísticas?
Hérica Lene – Os jornais centenários têm muito a ensinar para o jornalismo atual porque a longevidade lhes trouxe tradição e capital simbólico.
Infelizmente, tudo indica que o jornal impresso em papel como principal produto de um modelo de indústria jornalística consolidado no século XX está morrendo. O jornalismo, no entanto, segue necessário e vivo em muitos lugares. Em processo de mutação, jornais assumem novos “corpos” ao migrarem para o suporte digital, sobretudo, os mais longevos e tradicionais.
A crescente complexidade das sociedades contemporâneas, com a experiência de múltiplos ritmos, extrapola a resposta que um jornal impresso pode dar, já que seu tempo é fixado pela impressão.
Nos discursos dos dirigentes dos jornais centenários, a tradição é vista como patrimônio e fortalecimento das marcas e como um elemento importante que contribui, em algum nível, para a manutenção dos periódicos em circulação.
O próprio alcance de sua permanência em circulação na longevidade dos anos, e nas intempéries dos ciclos econômicos, lhes confere capital simbólico e uma credibilidade que os jornais on-line ainda não conquistaram. Por isso, mesmo, eles continuam sendo importantes referências de jornalismo para as novas produções jornalísticas.
O e-book “Jornais Centenários” está disponível aqui.
Editora UFMG lança livro sobre tensão entre o direito à privacidade e o direito de acesso à informação no uso de documentos públicos
O inciso X do artigo 5º da Constituição Brasileira é claro: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas.” Contudo, é de igual clareza o inciso XIV: “É assegurado a todos o acesso à informação.” A relação conflituosa entre esses dois direitos – o direito de acesso à informação e o direito à privacidade – está no cerne do livro Sem consentimento: a ética na divulgação de informações pessoais em arquivos públicos, que acaba de ser lançado no Brasil pela Editora UFMG.
Publicado originalmente em inglês, em 1992, o livro de Heather MacNeil, professora da Faculdade de Informação da Universidade de Toronto, no Canadá, tem, na tensão entre esses dois direitos fundamentais, o ponto de partida para a sua investigação teórica, que se interessa particularmente pelo papel de guardião que o arquivista exerce – um papel de “arconte”, para citar o termo apresentado pelo professor da Faculdade de Letras Reinaldo Marques, no livro Arquivos literários: Teorias, histórias, desafios.
“Os arquivistas, como especialistas dos arquivos, figuram como mediadores dessa informação, assumindo responsabilidades diante dos produtores de documentos, mas também se apresentando zelosos do direito à privacidade e dos direitos dos cidadãos ao acesso às informações”, escreve a historiadora Georgete Medleg Rodrigues, professora do curso de arquivologia da Universidade de Brasília (UNB), na introdução à versão em português do livro de Heather MacNeil.
Precário equilíbrio
MacNeil trata de temas como a vigilância governamental, a evolução das tecnologias de informação e comunicação, a internet e a captação privada de informações pessoais, as legislações estadunidense e canadense relativas aos arquivos, o “direito ao esquecimento”, as leis de acesso à informação e suas implicações para o direito à privacidade e o papel dos arquivos na defesa dos direitos humanos (transparência administrativa, responsabilidade democrática, preservação das memórias individual e coletiva etc.), entre outros assuntos.
“Parte do preço que pagamos para ser parte da comunidade é o sacrifício de algum grau de privacidade.”
Para a autora, a tarefa de contrabalancear perspectivas contraditórias continua sendo um desafio para o arquivista, considerando o seu papel de custodiador público de documentos. “Os esforços dos arquivistas para desenvolver políticas e procedimentos que reflitam um equilíbrio apropriado entre a privacidade e os interesses de pesquisa têm sido impedidos por vários fatores, entre os quais, estão: a pletora de restrições legais e administrativas que silenciam ou são ambivalentes quanto à questão do acesso para propósitos de pesquisa, a complexidade tecnológica dos ambientes de guarda de documentos e, talvez o mais debilitante, a ausência geral de autoridade do arquivista (tanto autoimposta como determinada externamente) para tomar decisões relativas ao acesso no caso de se tratar de documentos contendo informações pessoais, especialmente informações pessoais sensíveis.”
Com esse desafio em vista, a autora apresenta, no último capítulo do livro, as suas propostas de gestão do acesso às informações pessoais em arquivos públicos. “Parte do preço que pagamos para ser parte da comunidade é o sacrifício de algum grau de privacidade”, escreve MacNeil. “O problema torna-se, então, o de contrabalancear os seguintes fatores: a reivindicação do indivíduo à privacidade, a pretensão do Estado em regular a conduta para o bem coletivo, a reivindicação de outros indivíduos para exercer seus direitos legítimos e a necessidade do próprio indivíduo de participar de comunidades mais amplas”, conclui a autora
González-Solar, L. [e-Book] La biblioteca universitaria orientada a la investigación: propuesta de un modelo de servicio centrado en el usuario desde la perspectiva del marketing. Coruña, Universidad da Coruña, 2016
La tesis tiene como fin estudiar y valorar el papel de las bibliotecas universitarias en la consecución de la misión de la universidad respecto a la investigación. A este fin se analiza dicha función investigadora y su incidencia en los sistemas de evaluación competitiva, concretamente en los rankings. Se pone de relieve el cambio de paradigma en la gestión de las bibliotecas universitarias donde el eje de actuación se enfoca más a los servicios de apoyo a la investigación. Se caracterizan estos servicios bibliotecarios, contextualizando el estudio en la estrategia global de investigación de las universidades. Se investigan sobre dos grupos de universidades españolas desde un punto de vista estratégico y operativo. Se estudian los investigadores como el elemento clave en los servicios bibliotecarios de apoyo a la investigación, tanto desde la perspectiva informacional, incluyendo un estudio de gestión de identidad digital, como en su relación con la biblioteca, así como el papel de los bibliotecarios en este contexto. La tesis desarrolla un apartado práctico estudiando la realidad de la Universidade da Coruña, sus servicios, su Biblioteca y los rasgos característicos de sus investigadores. Se elabora una propuesta metodológica basada en los principios del marketing, siendo aplicable a otros contextos bibliotecarios, en la que se incide en la necesidad de una visión holística de los servicios a la investigación y se aplica la filosofía y la técnica del marketing tanto desde el punto de vista estratégico como operativo.
Revista do Núcleo de Estudos do Livro e da Edição da USP será lançada nesta terça-feira, na Livraria da Vila
Texto por Caio Santana
A Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) da USP é uma das instituições analisadas em artigos publicados no dossiê da nova edição da revista Livro – Foto: Marcos Santos/ USP Imagens
Um amplo e rico documento sobre a relevância dos museus e bibliotecas. Assim pode ser descrito o dossiê “Museus/Bibliotecas”, publicado na nova edição da revista Livro, que será lançada nesta terça-feira, dia 19, a partir das 18 horas, na Livraria da Vila, em São Paulo. Editada pelo Núcleo de Estudos do Livro e da Edição (Nele) da USP, em parceria com a Ateliê Editorial, Livro tem 450 páginas e chega ao público em edição dupla: é o número 7 e 8 da revista.
Ilustrado com fotos e imagens coloridas, o dossiê “Museus/Bibliotecas” é composto de nove artigos, que abordam diferentes aspectos ligados a esse tema. Um deles é assinado pelo professor Frédéric Barbier, da École Pratique des Hautes Études, em Paris, na França, um dos mais importantes historiadores do livro da atualidade, autor de História do Livro e de História das Bibliotecas, entre outras obras. Em seu artigo, intitulado “Bibliotecas e museus – Algumas reflexões sobre conjuntura histórica”, Barbier destaca que, atualmente, a história das bibliotecas passa por um renascimento, em razão de diversos fatores. “Em primeiro lugar, a renovação historiográfica leva em consideração a biblioteca sob uma perspectiva mais antropológica, concentrada no status e no papel das instituições na sociedade de seu tempo, nos hábitos do público e dos profissionais e nas representações da biblioteca dentro do modelo cultural global”, escreve o professor. “Por outro lado, ‘a terceira revolução do livro’, em que estamos empenhados, levanta a questão da biblioteca sob uma linguagem renovada. No mundo da informação partilhada, a biblioteca não pode mais funcionar sob o princípio tradicional de estocagem e precisa inventar novo papel.”
“A tradição italiana dos museus inserida nas bibliotecas” é o título do artigo de Andrea De Pasquale, diretor da Biblioteca Nacional Central de Roma, na Itália. Nele, Pasquale mostra como as bibliotecas italianas governamentais, a partir da primeira metade do século 19, criaram áreas permanentes de exposição de seus acervos, em busca de ampliar o atendimento ao público.
O Prêmio Amigo do Livro é representado por um troféu concebido pela artista plástica Maria Bonomi – Foto: Jorge Maruta / USP Imagens
A Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro e a Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) da USP também são temas de artigos publicados no dossiê, assinados, respectivamente, pela professora Marisa Midori, docente da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP e editora de Livro, ao lado de Plinio Martins Filho, e pelo historiador Carlos Zeron, diretor da BBM.
Outros artigos publicados no dossiê são “As Bibliotecas nos Itinera Erudita et Bibliothecaria”, de Fiammetta Sabba, “Propósitos museológicos da Real Biblioteca (1913-1980)”, de María Luisa López-Vidriero Abelló, “A Biblioteca-Museu Inguimbertina de Carpentras”, de Jean-François Delmas, e “Hibridismo, Fab Lab, Terceiro Lugar… Museal?”, de Christophe Didier.
A apresentação é de autoria dos organizadores do dossiê, Marisa Midori e Andrea De Pasquale. “Os estudos que compõem este dossiê apontam para reflexões inovadoras no campo da história das bibliotecas. Por exemplo, a percepção das coleções bibliográficas como artefatos museológicos e seus pontos de contato com a política, mas também com a própria cultura do livro, seja do ponto de vista da bibliofilia, seja em sua relação com a cultura de massas”, escrevem os organizadores. “Isso nos leva a refletir sobre as múltiplas formas de apropriação das bibliotecas, ontem e hoje, desde a percepção de que elas se inscrevem nos itinerários dos viajantes eruditos do passado até a sua adequação às visitas de um público bem mais abrangente de leitores e de frequentadores.”
Ilustração do poema O Aprendiz de Feiticeiro, de Goethe, feita por Ferdinand Barth – Wikimedia CommonsA nova edição da revista Livro – Foto: Reprodução
Outras seções da revista
Além do dossiê “Museus/Bibliotecas”, Livro traz também outras sessões fixas, como Almanaque, que inclui dois artigos: “Escritores e publicidade – Das origens da publicidade no Brasil à década de 1970”, de Ubiratan Machado, e “Machado e Garnier”, de Cláudio Giordano.
O professor José de Paula Ramos Jr., também da ECA, é responsável pela seção Letra e Arte. Foi ele que selecionou, para esta edição de Livro, uma tradução inédita de O Aprendiz de Feiticeiro, do poeta alemão Johann Wolfgang Goethe. Além de trazer o poema em versão bilíngue (alemão e português), em tradução de Roberto Oliveira, a seção traz artigos que contam a trajetória editorial do texto de Goethe, desde suas origens até quando ele se torna um desenho animado produzido pelos estúdios Disney.
Na seção Leitura, há uma pesquisa inédita da Ana Cláudia Suriani, professora da Universidade de Londres, na Inglaterra, que apresenta a fortuna editorial do escritor Machado de Assis. “Com seu levantamento empírico baseado em outros levantamentos existentes, creio que temos o último balanço do que Machado escreveu”, disse a professora Marisa Midori ao Jornal da USP.
Já na seção Debate estão publicados dois textos: “Os manuscritos de Georg Lukács”, de István Monok, e “A invasão das fake news nas democracias”, de Jaen-Yves Mollier.
Conversas de Livraria, Arquivo, Acervo, Memória, Bibliomania e Estante são outras seções da revista Livro.
Entrega do Prêmio Amigo do Livro
Durante o lançamento da nova edição da revista Livro, nesta terça-feira, dia 19, será entregue o Prêmio Amigo do Livro, na forma de uma escultura da artista plástica Maria Bonomi. Concedido pelo Nele, a honraria será destinada a quatro personalidades ligadas ao livro e à biblioteca: Antônio Agenor Briquet de Lemos, Geraldo Moreira Prado, conhecido como Mestre Alagoinha, Gustavo Piqueira e Ubiratan Machado.
A revista Livro, número 7/8, do Núcleo de Estudos do Livro e da Edição (Nele) da USP, será lançada nesta terça-feira, dia 19, às 18 horas, na Livraria da Vila (Rua Fradique Coutinho, 915, Pinheiros, em São Paulo).
Grupo formado por 24 especialistas lança livro sobre o valor educativo das narrativas
Por ANA ELIZABETH DINIZ
Autoras. Parte do grupo de mulheres que escreveram “Contos que Curam”, livro que será lançado com proposta terapêutica e educacional Foto: Ana Moreira/divulgação
Flávia Gama diz que contos narram situações por vezes complexas Foto: Ana Moreira/divulgação
“O ser humano é altamente simbólico e dá sua interpretação pessoal a cada conto” – Claudine Bernardes Foto: Ana Moreira/divulgação
Engana-se quem pensa que as fábulas, os contos e as histórias são narrativas infantis, dotadas apenas de intenção lúdica. Há muita força nesse universo capaz de auxiliar no desenvolvimento e em descobertas transformadoras.
Um exemplo é o da consultora Ludmila Leite, que rompeu uma relação abusiva ao se lembrar de um conto indiano. “Nele, Buda caminha com seus discípulos quando surge um sujeito destemperado à sua frente, gritando impropérios. Buda nada faz, escuta tudo calmamente. Desconcertado pela não reação de Buda, o homem atormentado vai embora. Assim eu fiz. Num episódio de agressão verbal, virei as costas e fui embora”, relata Ludmila.
Trabalhando efetivamente com a força dos contos em abordagens terapêuticas e educativas, um grupo de 24 especialistas vai lançar o livro “Contos que Curam” (ver agenda), que tem coordenação editorial de Claudine Bernardes e Flávia Gama e trata de temas relevantes, como: autoaceitação, resiliência, gratidão, ressignificação, amor, entre outros.
Segundo Flávia Gama, empreendedora, pesquisadora e especialista em storytelling, por trás da aparente simplicidade dos contos, muitas vezes desprezados pelos adultos, há assuntos complexos e negações que são impostas pela nossa cultura.
“No conforto de uma história há uma permissão para viver suas angústias e encarar suas dificuldades a partir de um lugar seguro. A narrativa não é sobre quem está lendo (diretamente), é sobre o personagem, então ele pode se permitir experimentar todos aqueles sentimentos conflitantes e que trazem desconforto. E ele faz isso porque é uma história”, analisa Flávia.
Os símbolos presentes nos contos de fadas, diz ela, são carregados de poderosas metáforas sobre questões profundas que, muitas vezes, crianças e adultos não conseguem identificar e nomear.
“Percebe-se ali algo que incomoda, mas, quando o indivíduo mergulha na história, ele consegue identificar. Quando a pessoa escuta ou lê um conto ou uma história, ela se conecta mais fácil e profundamente com a história”, comenta Flávia.
Ao se conectar com os elementos simbólicos da narrativa, diz Flávia, “ela consegue atingir um grau de empatia, acaba se colocando no lugar do outro e identifica o que está sentindo. Quando o personagem sente raiva, medo, inveja, não sou eu, é o personagem, mas começo a reconhecer esse sentimento também em mim”, diz a pesquisadora.
Um elemento sempre presente nos contos de fadas é o final feliz. “Isso é muito importante, principalmente para as crianças, porque traz esperança e as incentiva a buscar novos caminhos para conquistar seu próprio final feliz. Quando identifico no personagem o que ele pensa, sente e como se supera naquela história, encontro minhas próprias respostas, começo a me organizar internamente, a nomear minhas emoções e posso criar um novo final para minha própria história”, propõe a pesquisadora.
Quando idealizou esse projeto, Flávia pretendia que ele fosse um instrumento de desenvolvimento humano, de cura para sentimentos e emoções e um caminho de educação emocional.
“Quando as pessoas descobrem seu poder de criar os próprios finais felizes, de ressignificar suas histórias de dor, reescrever os capítulos da própria vida numa versão mais encantada e leve, elas encontram a cura para suas almas”, finaliza.
O ser humano é muito simbólico
Claudine Bernardes vive há 15 anos na Espanha, onde trabalha como professora de técnicas narrativas e contoexpressão, na Escuela de Terapia Psicoexpresiva Humanista del Instituto Iase. Essa trajetória só foi possível depois que passou a usar os contos para se comunicar melhor com seu filho que tem Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH).
“Sentia-me agoniada por não exercer a maternidade de forma efetiva. Até que, durante uma contação de história, percebi que consegui me comunicar com meu filho e que ele assimilou a mensagem mais facilmente”, relembra Claudine.
A educadora diz que trabalha com os contos sempre com a intenção de se comunicar com o interior da outra pessoa, com seus símbolos e provocar nela uma mudança, desde que ela deseje e que seja benéfica.
“Utilizamos os símbolos do inconsciente pessoal e coletivo e as metáforas, que são uma forma de nos comunicarmos com a outra pessoa a partir do que ela já conhece da vida. Os contos terapêuticos são construídos com essa função de comunicar-se com a outra pessoa, de convidá-la a iniciar uma jornada de mudança”, revela Claudine.
O conto se comunica com a outra pessoa na medida em que ela necessita mudar. “Cada conto será interpretado de forma diferente por cada pessoa, de acordo com sua experiência de vida. Isso porque o ser humano é altamente simbólico”, observa a educadora.
Dramas do protagonista incitam mudanças em quem escuta
A proposta do livro “Contos que Curam” é extrapolar a história. “Queremos ajudar os profissionais que trabalham com o desenvolvimento humano a explorar as emoções e as percepções, tanto pelo método socrático quanto pelas dinâmicas que propomos em cada capítulo do livro, que traz histórias poderosas capazes de despertar tudo isso. Após cada conto apresentado, há uma oficina proposta para educadores, psicólogos e contadores de histórias”, comenta Flávia Gama.
Para Claudine Bernardes, a ideia do livro é compartilhar o conhecimento de forma didática e ajudar as pessoas em seu crescimento pessoal e simbólico.
“A sociedade atual está cada vez mais racional e rasa simbolicamente, e isso é um problema, pois impossibilita nosso crescimento como seres humanos. Ao vivenciar os dramas do protagonista do conto, a pessoa identifica-se com suas lutas e dificuldades e faz a jornada do herói. O processo de crescimento e amadurecimento traz um conhecimento que leva a uma mudança de conduta”, finaliza.
Estímulo
Função. O conto é mágico ao estimular a imaginação; ético ao transmitir ensinamentos morais; e espiritual ao promoverem a compreensão de verdades metafísicas.
Agenda
O lançamento do livro “Contos que Curam” será nesta quarta (20), dia 20, às 19h30, no Ateliê Ananda Sette, na rua Conde de Linhares, 1.051, bairro Luxemburgo. Entrada gratuita. Informações: (31) 98571-8801.
Lançamento
“Contos que Curam”
Coordenação editorial de Claudine Bernardes e Flávia Gama
A nova publicação da investigadora algarvia Patrícia de Jesus Palma vem desconstruir “a ideia feita de um Algarve que, ao contrário das restantes regiões, não tinha tido uma rede de bibliotecas religiosas, como aconteceu no resto do país entre os séculos XVI e XVIII, que alimentasse a formação das elites locais”, constituídas pelos 18% de população alfabetizada.
A certeza foi deixada pela própria autora no passado sábado na Biblioteca Municipal de Faro, na apresentação da obra, intitulada ‘O Reyno das Letras: a cultura letrada no Algarve (1759-1910)’, que vem “contestar uma série de ideias estereotipadas, de mitos e de preconceitos” que “davam conta de um Algarve culturalmente ausente, isolado e desatualizado”.
Patrícia Palma garante que “o Algarve não esteve nem mais nem menos à frente, mas desenvolveu iniciativas e estratégias” com “pessoas e instituições que mantiveram a sincronia e a sintonia culturais com a restante sociedade portuguesa oitocentista”. “O que encontrei foi uma rede de instituições e de pessoas, tanto no foro privado como no foro público, que foram possibilitando e fortalecendo a integração da sociedade portuguesa (não só da sociedade algarvia) na cultura escrita”, afirmou.
A investigadora rejeitou assim “a imagem de uma região desprovida de cultura bibliográfica porque os seus conventos não teriam bibliotecas ou teriam pouco ou más bibliotecas”. “A investigação permitiu perceber que não foi assim e reconstituir essa rede no Algarve das bibliotecas religiosas, localizar os catálogos, os inventários, fazer uma análise da qualidade dos catálogos dessas bibliotecas, que não consente a ideia de desatualização cultural de bibliotecas paradas no tempo”, explicou.
Patrícia Palma acrescentou que o trabalho permitiu assim “comprovar realmente a importância das bibliotecas religiosas dos conventos como centros culturais de formação e de intervenção na sociedade com importante contributo para o desenvolvimento do livro e da leitura, tendo encontrado inclusivamente conventos que disponham dos seus próprios prelos tipográficos”. “Ou seja, o convento não era só um espaço de leitura, era também um espaço de produção”, acrescentou na sessão que contou com a presença da diretora regional de Cultura do Algarve, Adriana Nogueira, do presidente da Câmara de Faro, Rogério Bacalhau, de João Luís Lisboa, do Centro de História da Cultura da Universidade Nova de Lisboa e orientador do doutoramento do qual resultou a obra.
A autora – que rejeitou também a ideia de que com a expulsão dos jesuítas se extinguiu a formação letrada no Algarve porque “nem a Companhia de Jesus tinha o exclusivo do ensino, nem a região, por isso, ficou desprovida de bons mestres” – destacou ainda o papel relevante , na formação intelectual do bispo do Algarve que teve a “ideia da fundação” do Seminário de São José, D. José Maria de Melo, “um reformador no campo das letras”.
“Deve ser considerado nessa galeria do século XVIII ainda de protagonistas, tal como D. Frei Manuel do Cenáculo, um dos mais conhecidos e estudados que fundaram e financiaram bibliotecas portuguesas, que tinham como objetivo ainda no século XVIII o uso partilhado, a difusão e a utilidade do saber”.
Segundo a historiadora, o seu “programa episcopal era de tal forma pedagógico, assente no estudo e na partilha de leituras, que a primeira coisa que pensou quando foi nomeado bispo do Algarve foi enviar uma biblioteca devidamente preparada para capacitar o seu clero”.
A autora lembrou que “a Biblioteca Municipal de Faro é hoje a guardiã desta memória de bibliotecas, desde as conventuais de que o século XX já não tinha memória, à biblioteca do Seminário de São José e à biblioteca do Paço Episcopal”.
Patrícia Palma – que também recusou a opinião de “uma região cientificamente desatualizada” devido às “aulas de matemática e de cirurgia nos Regimentos de Infantaria de Tavira e de Lagos, assim como as bibliotecas de um cirurgião-mor do Hospital Militar de Lagos ou a do Regimento de Infantaria de Lagos” –, explicou ainda que a tipografia no Algarve foi reintroduzida logo em 1808, após as invasões francesas. “A imprensa por um lado, o teatro por outro e a música ainda, formam esse tripé da mundividência liberal de que o Teatro Lethes, inaugurado em 1845, um ano antes de D. Maria, é a síntese perfeita”, afirmou, lembrando que em 1860 havia 12 teatros disponíveis ao longo de toda a região e nenhum era de iniciativa estatal.
A publicação, com quase 700 páginas, é uma edição da Direção Regional de Cultura do Algarve e será também apresentada na próxima sexta-feira na Fnac de Faro.
Patrícia de Jesus Palma, natural de São Marcos da Serra, é licenciada em Línguas e Literaturas Modernas – variante de Estudos Portugueses pela Universidade do Algarve, com mestrado e doutoramento pela Universidade Nova de Lisboa, em Estudos Portugueses, respetivamente nas especialidades de Literatura Portuguesa Contemporânea e História do Livro e Crítica Textual.
Na atualidade, é investigadora integrada do CHAM – Centro de Humanidades da FCSH/UNL, onde desenvolve temas como a circulação cultural no espaço europeu e transatlântico, a história e património da imprensa, ou as relações entre a cultura e o desenvolvimento territorial. Em paralelo, desde 2018, atua no “Lugar Comum”, projeto que criou para investigação, consultadoria, ação cultural e ação educativa e que tem como principais objetivos fomentar o acesso ao conhecimento e à fruição cultural. Tem ainda sido uma das agentes impulsionadoras à criação de um núcleo museológico no espaço da sua antiga tipografia, encerrada em 2012, e da hemeroteca digital do Algarve.
A história em quadrinhos “Biblioteca: um lugar mágico” faz parte de um projeto de pesquisa da Escola de Comunicações e Artes
Texto por Maria Eduarda Nogueira
Para pesquisador, o incentivo à leitura nas crianças pode apresentar bons resultados a longo prazo – Reprodução / Biblioteca: um lugar mágico
Projeto desenvolvido na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP resultou no livro digital infantilBiblioteca: um lugar mágico, obra pensada para mostrar de forma didática e divertida a importância da conservação dos livros. Lançado no Portal de Livros Abertos da USP, o livro é parte do projeto de pesquisa do professor Francisco Paletta, do Departamento de Informação e Cultura (CBD) da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP.
A pesquisa contou com a ajuda do professor Waldomiro Vergueiro, também do CBD. “Numa conversa com o professor, a gente decidiu que ia ser em formato de história em quadrinhos, tentando transformar a ida da criança na biblioteca em uma aventura”, conta o professor Paletta.
O trabalho foi desenvolvido com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). O projetoBusca, recuperação e organização da informação e do conhecimento na web de dados procura entender como o usuário lida com as informações na internet. “Eu tenho avaliado várias faixas etárias para tentar entender o comportamento do usuário em relação ao livro”, comenta Paletta. Durante a pesquisa, que está em andamento, o professor viu a necessidade de olhar também a criança como usuária.
A ideia de começar pelas menores faixas etárias parte do princípio de que uma criança que aprende a gostar de livros saberá como melhor conservá-los ao longo da vida.
O livro procura ter um viés pedagógico. As crianças na história participam de uma oficina de restauro de um livro que está em péssimas condições. “O objetivo é mostrar para a criança que o livro precisa de cuidado.”
Ideia faz parte do projeto de pesquisa do professor Francisco Paletta, da Escola de Comunicações e Artes da USP – Reprodução / Biblioteca: um lugar mágico
Expansão do projeto
O livro foi lançado digitalmente, mas o professor conta que o objetivo é ter cópias impressas para trabalhar com crianças em escolas e bibliotecas públicas, promovendo atividades tais como as que os personagens do livro vivenciam. Isso faz parte do projeto Livro e Leitura, que almeja espalhar o gosto pela leitura entre as crianças brasileiras.
Em 2020, será lançado o segundo livro da coleção, com enfoque no livro digital e no uso da internet durante a infância. Francisco Paletta colabora com o instituto americanoBetter Internet for Kids, que luta por uma rede mais segura para as crianças.
O projeto terá ainda uma publicação final, de caráter acadêmico, relacionada diretamente ao projeto Fapesp, que lida com a preservação e conservação da informação digital.
“A ideia agora é encontrar professores e alunos que estejam interessados no projeto e inseri-los em um grande projeto de extensão”, comenta o professor Paletta. Os alunos não têm que ser necessariamente do CBD para atuarem como multiplicadores do projeto.
2,43 livros por ano
Uma pesquisa desenvolvida pelo Instituto Pró-Livro, em 2016, mostra que o brasileiro lê, em média, 2,43 livros por ano. Uma média baixa, em comparação, por exemplo, aos franceses, que atingem a marca de 21 livros anualmente.
As razões para esse fenômeno são muitas, mas uma delas pode ser a dificuldade de tomar gosto pela leitura desde a infância. Considerando o contexto atual, em que diversas telas competem pela atenção da criança, essa missão se torna mais difícil ainda.
Nesse sentido, iniciativas como o livro infantilBiblioteca: um lugar mágico se tornam promissoras em um país que luta para formar gerações de leitores.
A história de Frei Veloso, missionário, tipógrafo e cientista, é contada em novo livro da Editora da USP
Texto por LeilaKiyomura
Gravura em água forte de João José Jorge no livro impresso pela Tipografia do Arco do Cego, dirigida por Frei Veloso – Reprodução/livro Frei Veloso e a Tipografia do Arco do Cego
A importância do naturalista e franciscano José Mariano da Conceição Veloso na história luso-brasileira e das suas múltiplas funções no campo dos estudos científicos e editoriais em prol do estudo da botânica está no livro Frei Veloso e a Tipografia do Arco do Cego, lançamento da Editora da USP (Edusp). Organizado por Ermelinda Moutinho Pataca e Fernando José Luna, leva o leitor a conhecer as reflexões e o trabalho do mineiro de São João del-Rei, que nasceu em 1742. Passados 208 anos de sua morte, o leitor se depara com um pesquisador dos tempos de hoje, que transita por várias áreas do conhecimento para defender a conservação das “matas brasílicas” em um recado para o rei dom João VI.
“Frei José Mariano da Conceição Veloso é bastante conhecido por seus estudos botânicos, especialmente pela elaboração da Flora Fluminense e, nos últimos anos, também como diretor da Tipografia do Arco do Cego, em Lisboa”, explicam os organizadores Ermelinda e Luna na introdução do livro. “Além dessas funções, o frade franciscano exerceu diversas atividades a serviço do Estado, que revelam suas múltiplas habilidades e o importante papel político que exerceu junto à Corte de Lisboa.”
O projeto do livro surgiu de dois seminários e uma exposição, em 2011, para homenagear Frei Veloso nos 200 anos de sua morte. Uma programação que foi elaborada por grupos de pesquisadores do Rio de Janeiro e São Paulo na Pinacoteca do Estado de São Paulo e no Jardim Botânico do Rio de Janeiro. “Este livro apresenta os resultados desses eventos que divulgaram as diversas facetas do personagem, reveladas em diálogos interdisciplinares de pesquisadores estrangeiros e brasileiros que se dedicam ao entendimento das políticas econômicas e sociais associadas às artes, às ciências e à história editorial no período”, observam os organizadores.
Naturalista e pesquisador, Frei Veloso estudou as plantas das matas brasileiras – Reprodução/livro Frei Veloso e a Tipografia do Arco do Cego
“Sem livros não há instrução”, afirmou Frei Veloso
Duas espécies de falsas quinas, do livro Quinografia Portuguesa, de Frei Veloso – Reprodução/livro Frei Veloso e a Tipografia do Arco do Cego
“Frei Veloso e a Tipografia do Arco do Cego, que chega em boa hora, é um convite à leitura, em tempos de urgência de estudos sobre a identificação de plantas e sobre o futuro de nossas florestas”, observa Alda Heizer, pesquisadora convidada do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, que assina a orelha do livro. “Além disso, a publicação ressalta uma grande preocupação de Veloso: ‘Sem livros não há instrução’, afirmação que demonstra, de forma definitiva, a atualidade de sua obra e atuação.”
Dividido em quatro partes, os artigos compõem a trajetória do naturalista em suas diversas funções. Os organizadores Ermelinda Moutinho Pataca e Fernando José Luna esclarecem: “Na primeira parte, tratamos do contexto histórico e social, demarcando a complementaridade entre as políticas econômicas e a formação da elite ilustrada luso-brasileira. Em um segundo momento, pensamos na atuação de Frei Veloso nas ciências e no fomento às artes, demarcando aproximações entre a história da arte e da ciência. Em seguida, desvelamos o perfil do frei Veloso editor, especialmente por meio da criação da Tipografia Calcográfica, Tipoplástica e Livraria do Arco do Cego, e debatemos a história do livro e da imprensa. Por fim, abordamos a circulação dos saberes na atuação de Veloso como tradutor e mediador cultural.”
Recado ao rei dom João VI
“Mas eu, Senhor, que nasci no Brasil, e que nele estive mais de 40 anos, que vi e pisei três das suas mais notáveis capitanias, Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e o governo do Espírito Santo, não posso ser insensível à acertada resolução de Vossa Alteza, quando promove a conservação das brasílicas matas: portanto devo pôr na presença de Vossa Alteza as reflexões a que me obrigam as minhas viagens botânicas.”
Nessa epígrafe, que está em sua obra O Fazendeiro do Brazil, de 1798, frei José Mariano da Conceição Veloso se apresenta ao rei dom João VI. “Buscamos aqui compreender a formação e atuação de Frei Veloso como naturalista, viajante e missionário franciscano no período em que esteve no Brasil, de 1742 a 1790, quando formou seu imaginário brasileiro e criou novas concepções teóricas, metodologias de viagens científicas e técnicas de história natural”, esclarece Ermelinda Moutinho Pataca, que é professora da Faculdade de Educação da USP.
A professora ressalta que os interesses de Frei Veloso não se restringiam ao estudo das plantas. “Pesquisou também os animais, preparando coleções de insetos, conchas, peixes e animais marinhos, quando a expedição percorreu a costa da capitania. Essas coleções, dispostas em 70 caixas, permaneceram com o naturalista no Rio de Janeiro e só foram para Lisboa em sua companhia, em 1790, quando o frade se mudou para o reino acompanhando Luís de Vasconcelos e Souza.”
Uma tipografia que imprimia obras selecionadas
O livro sobre Frei Veloso lançado pela Editora da USP (Edusp) – Foto: Reprodução
A atuação editorial de Frei Veloso é destacada no título do livro. “Era tipografia, pois se tratava de uma gráfica que imprimia obras selecionadas”, esclarece a pesquisadora Edna Lúcia Oliveira da Cunha Lima em seu artigo. “Nela funcionava uma calcografia, ou seja, uma oficina de gravação em metal, na qual trabalhavam gravadores responsáveis pela ilustração dos livros e pela formação de outros gravadores. Completava o quadro de técnicas gráficas a fabricação de tipos móveis a cargo da tipoplastia, o último adendo ao já longo nome da oficina. Todos esses setores estavam a serviço da editora, que fazia traduções e editava textos literários, científicos e técnicos.”
Edna explica que o objetivo da editora era imprimir obras de divulgação técnica e científica. “Foi um projeto iluminista que promoveu em Portugal ações para ampliar o conhecimento de novos métodos e técnicas de exploração de minas, para plantio e aproveitamento de produtos naturais como o tabaco e o bicho-da-seda, tratamento de doenças tropicais, textos sobre matemática, filosofia, literatura, manuais de gravura em metal, enfim, uma plêiade de informações sobre os mais diversos assuntos, a maioria em traduções do francês e do inglês, abordados por estudantes e profissionais brasileiros residentes em Portugal.”
O diretor da tipografia era Frei Veloso e quase todos os colaboradores eram brasileiros de Minas Gerais. “Foi uma atividade extraordinária, pois conseguiu publicar mais de 80 títulos de 1799 a 1801, quando a casa foi incorporada à Imprensa Nacional lisboeta.”
Frei Veloso e a Tipografia do Arco do Cego, de Ermelinda Moutinho Pataca e Fernando José Luna (organizadores), Editora da USP (Edusp), 448 páginas, R$ 60,00.
Projeto de Daniela Chindler tem como objetivo estimular jovens a frequentar bibliotecas
A escritora Daniela Chindler lança o livro e o espetáculo Onde moram os livros – bibliotecas do Brasil. O objetivo é abrir as portas dessas bibliotecas para os jovens leitores. Dois escritores, um imperador, um monge, uma pequena escultura e uma senhorita de 1900 são os mestres cerimônias que conduzem os leitores. As ilustrações são de Bruna Assis Brasil, além de fotos atuais e registros da época.Dentre as 7 mil bibliotecas que o Brasil possui, a obra reúne seis: a Biblioteca Nacional e o Real Gabinete Português de Leitura, no Rio de Janeiro; a Biblioteca Pública do Amazonas, em Manaus; a Biblioteca Mário de Andrade, em São Paulo; a Biblioteca Pública do Estado do Rio Grande do Sul, de Porto Alegre; e a Biblioteca do Mosteiro de São Bento da Bahia, em Salvador.
O lançamento do livro vai ser no dia 14 de setembro, às 16h, na Livraria da Travessa de Ipanema. O espetáculo teatral “Onde moram os livros – bibliotecas do Brasil” terá sessões nos dias 21 e 22 de setembro, às 17h, na Sala Baden Powell. Entrada gratuita.
Clique no player e conheça mais sobre o projeto, na entrevista que Daniela concedeu ao Arte Clube:
Prédio do Museu Nacional do Rio de Janeiro após o incêndio, no dia 2 de setembro de 2018 – Foto: intervenções a partir de frames de vídeos na internet, arte de Giselle Beiguelman.
O livro Memória da Amnésia: Políticas do Esquecimento é lançado pela professora Giselle Beiguelman no momento em que a tragédia do incêndio do Museu Nacional do Rio de Janeiro completa um ano. A artista e professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP apresenta em livro publicado pelas Edições Sesc um projeto inusitado, propondo uma reflexão sobre o direito à memória, em contraposição às ações e políticas do apagamento do passado. “A cultura, e seus orçamentos ínfimos, são uma triste recorrência política. Desse ponto de vista, o incêndio do Museu Nacional é a triste metáfora dos nossos impasses”, escreve Giselle, que também é colunista da Rádio USP (93,7 MHz).
O livro reúne um conjunto de ensaios textuais e visuais no campo das estéticas da memória. “Todos os capítulos, com exceção do último, que é uma reflexão sobre o incêndio do Museu Nacional, orbitam em torno de projetos realizados por mim em diferentes contextos”, explica Beiguelman. “São trabalhos experimentais e de pesquisa que se desenvolvem por meio de intervenções artísticas no espaço público e nos espaços informais.”
O título Memória da Amnésia é também o nome de uma intervenção apresentada entre dezembro de 2015 e abril de 2016, que aborda as políticas públicas. “O foco principal da intervenção era o processo de mudança de monumentos de lugar, o que culmina no seu ‘desterro’ em depósitos, duas questões recorrentes da história urbana da cidade de São Paulo”, comenta.
O tsunami de informações tem o esquecimento como efeito colateral. Não é isso o que sentimos quando, na inspeção arqueológica de gavetas e armários, encontramos disquetes obscuros?”, escreve o professor Agnaldo Farias, na apresentação do livro
Na apresentação do livro, Agnaldo Farias, também professor da FAU, observa que hoje nem o tempo é mais o que era. “Antigamente, reconhecia-se o passado como algo que dizia respeito ao que havia acontecido, o presente ao que estava acontecendo e o futuro ao que iria acontecer”, argumenta. “A presumida linearidade do tempo explodiu, e a temporalidade parece estruturar-se numa nuvem de fragmentos com espessuras e velocidades distintas e em direções desencontradas. Sobre esse caráter essencialmente contraditório, a autora lembra que a mesma cidade onde foi inaugurado o Museu do Amanhã, instituição que quer nos fazer crer que o amanhã é hoje, transformou em cinzas o Museu Histórico Nacional, um patrimônio de 20 milhões de itens. Rasurou irreversivelmente uma parte significativa do passado não só brasileiro e português, mas da humanidade.”
.
Incêndio do Museu Nacional do Rio de Janeiro – Foto: intervenções a partir de frames de vídeos na internet, arte de Giselle BeiguelmanIncêndio no Museu Nacional – Foto: intervenções a partir de frames de vídeos na internet, arte de Giselle BeiguelmanDepósito em São Paulo onde estão armazenados figurinos e cenários do Teatro Municipal, além de equipamentos para descarte – Foto: Giselle BeiguelmanVista lateral do Arquivo Público do Estado da Bahia. Ao fundo, as ocupações do terreno – Foto: Giselle BeiguelmanAcervo do Arquivo Público do Estado da Bahia alocado em pequenos cômodos – Foto: Giselle Beiguelman
Farias assinala que, apesar da grande produção de registros, nunca foi tão difícil ter acesso ao passado recente. “O tsunami de informações tem o esquecimento como efeito colateral. Não é isso o que sentimos quando, na inspeção arqueológica de gavetas e armários, encontramos disquetes obscuros?”
O livro tem cinco capítulos. O primeiro, “Beleza compulsiva tropical”, traz uma intervenção feita na 3ª Bienal da Bahia, em 2014, no Arquivo Público da Bahia, criado em 16 de janeiro de 1890 e considerado o segundo mais importante do País. Nesse projeto, a autora mostra o casarão semiarruinado que guarda documentos que vão do século 17 ao 20. Conta que o intuito do projeto não foi adotar uma atitude de denúncia diante do abandono do patrimônio histórico. “O que procurei fazer foi tensionar não só as relações entre as artes e os lugares da memória, como também entre os sistemas públicos de memória. Contemplando a linha de cemitérios populares e as paredes de jazigos provisórios que se avistam do arquivo, uma pergunta se impunha: afinal, por que arquivos e cemitérios são tão parecidos?”
O segundo capítulo é “Memória da amnésia”. “Fruto de um trabalho feito ao longo de quase dois anos, incluiu o mapeamento dos monumentos nômades de São Paulo e o traslado de um conjunto de monumentos ocultados em depósitos municipais, alguns há 80 anos fora do espaço público, para o interior do Arquivo Histórico de São Paulo, onde ficaram expostos, deitados, por quatro meses.”
As coisas de hoje são produzidas em uma lógica de reprogramação constante, como dados para serem manipulados e não mais como objetos.”
O novo livro da professora Giselle Beiguelman – Foto: Reprodução
“Já é ontem?” é a questão do terceiro capítulo. Essa obra, segundo Giselle, resultou da videoinstalação Cinema Lascado-Perimetral, apresentada em 2016, e no ensaio visual que traz linguagens de corrupção de códigos de imagens. “Procuro dar conta de uma estética capaz de registrar um processo das transformações tão intensas pelas quais passaram o Rio de Janeiro e o Brasil nos últimos anos.”
O ensaio é um panorama multifacetado dessas transformações. “As coisas de hoje são produzidas em uma lógica de reprogramação constante, como dados para serem manipulados, e não mais como objetos, a fim de serem infinitamente consumidas e reconsumidas. Esse sistema responde bem a uma cultura incapaz de conviver com o envelhecimento, a corrosão dos materiais, as asperezas do que é natural.”
Em “Museus das perdas para nuvens de esquecimento” – o quarto capítulo -, o leitor se depara com O Livro Depois do Livro, uma das primeiras obras de net art, que incita discussões sobre o futuro da memória no tempo das nuvens computacionais.
O último capítulo lembra o incêndio do Museu Nacional. “O que se perdeu foi muito mais do que o prédio e seu acervo. Subtraiu-se um pedaço do conhecimento que estava reservado também às próximas gerações. Não só do Brasil e de Portugal, mas do mundo.”
Memória da Amnésia: Políticas do Esquecimento, de Giselle Beiguelman, Edições Sesc, 256 páginas, R$ 95,00. O lançamento do livro será no dia 12 de setembro, às 19h30, na Livraria da Vila (Rua Fradique Coutinho, 915, Vila Madalena, em São Paulo), que incluirá debate com a professora Giselle Beiguelman e o professor Márcio Seligmann Silva, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
O livro O negro nos quadrinhos do Brasil (formato 17 x 24 cm, 344 páginas), do professor e escritor Nobu Chinen, é um lançamento da Editora Peirópolis.
Texto por Marcelo Naranjo
A obra é fruto de minuciosa pesquisa, buscando compreender a construção da imagem do negro nas narrativas gráficas, desde as artes visuais em seus primeiros registros da presença dos africanos no Brasil, sequestrados e escravizados para servir ao propósito colonizador, até a produção atual, do mainstream às HQs autorais.
Ao mesmo tempo em que expõe, como o próprio autor diz, “a verdadeira face de um país preconceituoso e racista, mas que resiste em admitir essa característica”, Nobu promove um justo resgate de parte importante de nossa historiografia, em que a crescente, porém insuficiente, marca de autores negros vem influenciando positivamente a forma de representação do negro nessa mídia, restituindo-lhe o papel fundamental na formação de nosso país como nação política independente.
Dois eventos vão marcar a publicação deste estudo inédito sobre as mídias e a questão étnico-racial: uma sessão de autógrafos no dia 22 de agosto, às 19h, durante as 6as. Jornadas Internacionais de Histórias em Quadrinhos, evento que reúne cerca de 400 pesquisadores da área na Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo, e, no sábado, dia 31 de agosto, a partir das 16h, na Ugra Press (Rua Augusta, 1371 – Loja 116), em São Paulo/SP.
O livro está à venda nas versões impressa (R$ 72,00) e e-book (R$ 43,20). Confira outras informações no site da editora.
Cidade da garoa, que nunca dorme: São Paulo. Uma cidade tão antiga quanto moderna, que mistura todos os tipos de pessoas nas calçadas da Avenida Paulista.
Na literatura, a cidade consegue ser cenário e até personagem principal. Segue uma lista de 5 livros que mostram São Paulo em suas diversas facetas. Confira!
Das terras bárbaras | Editora Tordesilhas
O que pode ligar um jesuíta do século XVII a um jovem diplomata dos nossos dias? Muita coisa, sobretudo se o funcionário for descendente do padre. Das terras bárbaras conta o sofrimento do jesuíta Diogo Vaz de Aguiar, seus percalços e deleites no Novo Mundo. Entre seus fabulosos personagens, há vários históricos, e as pessoas verídicas daquele tempo emprestam realismo a uma narrativa de muitas guinadas. Das terras bárbaras não é apenas repleto de surpresas, mas tem cheiro, gosto, cores e sons do Brasil seiscentista, do Portugal barroco, da África colonial, da São Paulo metrópole, da Lisboa moderna e até de Brasília. É um romance sobre arrebatamentos e temores de todos os tamanhos.
A capital da solidão | Editora Objetiva
Numa narrativa envolvente e reveladora, o leitor é convidado a conhecer momentos cruciais da trajetória da cidade que, por mais de uma ocasião, esteve ameaçada de penosos retrocessos, senão de extinção, por motivo do abandono dos moradores, da precariedade de recursos e do que por vezes pareceu uma irremediável falta de futuro. O destino de São Paulo, ao longo dos três primeiros séculos de existência, foi de isolamento e de solidão. Em 1872, os primeiros sinais de prosperidade começavam a visitá-la, por conta da riqueza trazida pelo café, mas ainda assim a população de pouco mais de 30 mil habitantes a situava numa rabeira com relação às demais capitais brasileiras. Em 1890 já tinha dobrado de tamanho. O momento em que finalmente engrena é súbito como uma explosão – na passagem do século XIX para o XX, a cidade se transformou num aglomerado de gente vinda de diferentes partes do mundo e começou a virar a São Paulo que se conhece hoje.
As meninas | Companhia das Letras
Num pensionato de freiras paulistano, em 1973, três jovens universitárias começam sua vida adulta de maneiras bem diversas. A burguesa Lorena, filha de família quatrocentona, nutre veleidades artísticas e literárias. Namora um homem casado, mas permanece virgem. A drogada Ana Clara, linda como uma modelo, divide-se entre o noivo rico e o amante traficante. Lia, por fim, milita num grupo da esquerda armada e sofre pelo namorado preso. As meninas colhem essas três criaturas em pleno movimento, num momento de impasse em suas vidas. Transitando com notável desenvoltura da primeira pessoa narrativa para a terceira, assumindo ora o ponto de vista de uma ora de outra das protagonistas, Lygia Fagundes Telles constrói um romance pulsante e polifônico, que capta como poucos o espírito daquela época conturbada e de vertiginosas transformações, sobretudo comportamentais.
São Paulo nas alturas | Editora Três Estrelas
Nos anos 1950, uma grande transformação ocorreu em São Paulo: arquitetos modernos passaram a ser maismais requisitados por uma renovada indústria imobiliária. Em pouco mais de 10 anos, foram criados os mais icônicos edifícios da cidade, graças à aliança de arquitetos talentosos, como Niemeyer, David Libeskind Franz Heep, com empreendedores audazes, entre eles Artacho Jurado, Octavio Frias de Oliveira e José Tjurs. Em São Paulo nas alturas, Raul Juste Lores reconstitui esse importante período, apresentando a surpreendente trajetória de seus principais personagens, mulheres e homens que deram rumo novo à arquitetura, à construção e à vida urbana no Brasil. O livro traz também 98 fotos e um guia dos prédios em São Paulo.
Quando eu vim-me embora | Editora Leya Brasil
Entre as décadas de 1930 e 1980, milhares de pessoas abandonaram a terra onde nasceram e foram para outro estado – que, para elas, era como se pertencesse a outro país: São Paulo era outro mundo, tinha outra forma de organização, de lutas, de sociabilidade, de trabalho e até mesmo de falar o português. Com seu estilo coloquial e direto e uma narrativa envolvente, sem perder o rigor com os fatos, Marco Antonio Villa, autor dos best-sellers Mensalão, Ditadura à brasileira e Um país partido, oferece aos leitores a voz não do narrador, mas dos próprios migrantes: são eles que relatam a viagem no pau de arara, a chegada à capital paulista, a dificuldade de adaptação, os empregos, a melhoria de vida, a educação dos filhos, a construção da tão sonhada casa própria. Também estão presentes as reações, os exemplos de solidariedade, as angústias e as alegrias.
O lançamento contou com a presença de mulheres que viveram na Penitenciária Feminina da Capital e são autoras do livro; entre mais de mil textos produzidos, 101 foram selecionados para a obra
Texto por Amanda Stabile e Juliana Santoro
O lançamento do livro aconteceu na Biblioteca Mário de Andrade e a sul-africana Daphney Tukisi recitou o seu poema| Foto: Juliana Santoros/Ponte Jornalismo
“A todas as Rita’s, as Cristiane’s
às negras, às brancas ou às pardas
– se bem que pardo é um papel
A todas que viram e lembraram que, por fim,
é só rodar a baiana
e tirar o pijama
pular da cama
porque a caminhada quem faz
é nós”
Jaqueline Ferreira fez dessa dedicatória seu poema: à baiana, à paulista e à mineira. Para todas as mulheres que enfrentam barreiras diariamente, seja para vencer a fome, a violência ou o machismo. A jovem de 23 anos é uma das autoras do livro Mulheres Poetas: Penitenciária Feminina da Capital, lançado na Biblioteca Mário de Andrade, na última quinta (25/7), que reúne os poemas frutos do sarau Asas Abertas. O sarau acontece todas as quartas-feiras na capela da PFC (Penitenciária Feminina da Capital), localizada na zona norte de SP, e é organizado pelo Coletivo Poetas do Tietê.
Jaqueline Ferreira é uma das autoras do livro | Foto: Juliana Santoros/Ponte Jornalismo
Após passar 1 ano e 3 meses na PFC, Jaqueline, em liberdade, se orgulha de estudar Direito no Centro Universitário Central Paulista (UNICEP), em São Carlos, interior de São Paulo: “Faço direito porque já fiz muito errado e agora não me calo”. A jovem, que sempre nutriu o desejo de publicar um livro, escreve desde os 15 anos e conta que sua paixão por poesias começou cedo quando, na quinta série, ganhou de uma professora de português sua primeira antologia.
“Eu conheci o sarau quando estava na PFC há uns 6 meses. Eu me interessei primeiramente porque eu queria esquecer de onde eu estava”, explica Ferreira. A partir de então começou a levar várias amigas para a atividade. “O projeto ajuda a gente a manter uma disciplina. Gera um pensamento de liberdade, você pensa ‘fora da cachola’ e isso o sistema não quer”, conta a autora.
Da esquerda para a direita: Rafaela Maccari, Jaqueline Ferreira, Vanessa Ferrari, Lucas Verzola e Jaime Queiroga | Foto: Juliana Santoros/Ponte Jornalismo
Jaime Queiroga, o idealizador do Sarau Asas Abertas, explica que, para eles, o mais importante é elas acreditarem que podem seguir em frente estudando. “Nós temos vários casos de mulheres analfabetas ou analfabetas funcionais que começam a ler e ter curiosidade com a leitura”, conta.
Os principais temas abordados pelas mulheres nos poemas são saudade e perdão. “Nos poemas, eu peço pra elas enfrentarem seus medos, suas certezas, escreverem sobre isso. Nossa pegada é essa questão da autoestima através da poesia”, explica Jaime. Ele brinca que “se aqui fora, as pessoas tivessem a vontade de ler como tem lá dentro, nós seríamos o primeiro país do mundo em leitura”.
Jaime Queiroga é organizador do Sarau Asas Abertas | Foto: Juliana Santoros/Ponte Jornalismo
Além do sarau, Jaqueline também participava do Clube de Leitura Penguin-Companhia das Letras, um projeto que oferece remissão de pena por meio da leitura. Vanessa Ferrari, editora e coordenadora do projeto da Companhia das Letras de clubes de leitura, explica que a regra é simples: para cada livro lido, o preso pode remir 4 dias da sua pena.
“A gente empresta os livros e elas têm 30 dias para ler. Depois acontece uma roda de leitura, com mediador e eles produzem uma resenha que é o documento que vai para o juiz responsável para avaliar se a pena vai ser reduzida ou não”, diz Vanessa.
Vanessa Ferrari é editora e coordenadora do clube de leituras| Foto: Juliana Santoros/Ponte Jornalismo
“Primeiramente a gente faz o resumo pela remissão, mas depois do primeiro a gente faz só pelo prazer”, conta Rafaela Maccari. A jovem, hoje com 20 anos, confidencia que a paixão por Jorge Amado nasceu após resenhar ‘Capitães da Areia’ para o clube. “Depois de resumir eu nunca mais me esqueci do que falava o livro. Se eu escrever eu não esqueço mais”.
Os poemas de Rafaela também preenchem as páginas do livro recém-lançado. “Foi no sarau que eu comecei a escrever. Antes eu não escrevia, só escutava rap”, recorda. Em seu primeiro contato com o projeto, Maccari ainda não tinha o nome na lista para a atividade, mas voltou na semana seguinte já com 12 poesias prontas para compartilhar.
“Participando do sarau eu fiquei bem menos triste. Toda semana que minha mãe vinha me visitar eu mostrava as poesias para ela. Eu fiz muitas poesias pra ela”, conta Rafaela. Ela também chama a atenção para a visão da sociedade sobre as mulheres encarceradas e alerta: “é importante que as pessoas vejam que a gente também tem e precisa de cultura lá dentro”.
Há um ano, Rafaela deixou a penitenciária. Mas são os cinco meses dentro do sistema carcerário que impedem a reconstrução da sua vida. A ex-estudante de filosofia tentou retomar a faculdade, na Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), onde cursava o segundo ano, mas não conseguiu. “Eu sentia o preconceito dos professores. Eu larguei porque eu não aguentava mais”, recorda.
Rafaela Maccari e Jaqueline Ferreira | Foto: Juliana Santoros/Ponte Jornalismo
No mercado de trabalho não foi diferente. “Faz um ano já que eu estou na rua e não consegui o emprego. Duas entrevistas que eu fiz a mulher me disse que eu não me encaixava no perfil da empresa”, conta. “Então eu faço faxina, é o que eu faço pra sobreviver. Mas é difícil, por mais que eu tire o esmalte da minha unha, os piercings da minha cara, parece que está escrito na minha testa”.
Rafaela, que hoje mora em Maringá (PR), conta que, por conta do sarau, nunca mais parou de escrever. Ela confessa que, em um futuro próximo, pretende voltar para a sala de aula. “Agora em junho, eu participei do vestibular para a Universidade Estadual de Maringá [UEM]. Prestei o vestibular pra Biologia”, explica. “Em agosto sai o resultado, se eu passar vou continuar estudando. Hoje eu só faço faxina, mas a gente tem que comer, pagar água, luz, aluguel. A geladeira tá vazia, mas a gente tá na luta”, finaliza Rafaela.
O livro Mulheres Poetas: Penitenciária Feminina da Capital foi organizado pelo coletivo Poetas do Tietê e produzido por meio do Programa para a Valorização de Iniciativas Culturais (VAI), da Secretaria Municipal de Cultura e pela Edições Tietê (do próprio coletivo). O evento de lançamento em maio, organizado pelo coletivo e a prefeitura, foi restrito para convidados.
Aproxime-se do pensamento do professor Luiz Percival Leme Britto! Baixe gratuitamente o livro “No Lugar da Leitura: Biblioteca e Formação”.
Percival, como é conhecido o Professor Luiz Percival Leme Britto, é um intelectual inquieto e provocador. Linguista, escritor, professor doutor da Universidade Federal do Oeste Pará, integra a Campanha Eu Quero Minha Biblioteca. Atua há mais de 30 anos no campo da leitura e formação de educadores. Tem vários e imperdíveis livros publicados sobre o tema. #tododiaédiadeler #tododiaédiadebiblioteca #EuQueroMinhaBiblioteca
No lugar da leitura, por Percival Lemes Britto
Este livro traz quatro textos que, de forma mais ou menos direta, dissertam sobre leitura e biblioteca. Todos são fruto de intervenções a que fui chamado a realizar em diferentes fóruns de discussão sobre o tema. Refletem, para além de minhas percepções e concepções de leitura e formação, a aprendizagem que tive pela convivência com pessoas de pensamento agudo e extremamente comprometidas com a defesa e a promoção do direito de ler, especialmente Elizabeth Serra, Silvia Castrillón, Christine Fontelles, Glaucia Mollo e Fabíola Farias.
Em mais de uma ocasião, quando intervinha em algum seminário, às vezes contundentemente, contra o que me parece ser uma banalização do debate, tive nelas uma interlocução capaz de fazer-me ver a atualidade e a necessidade da biblioteca como possibilidade objetiva de produção e disseminação da cultura e do conhecimento, de formação intelectual e política, de experimentação estética e afirmação subjetiva.
Mas essa possibilidade, ressalte-se, implica a radical e intransigente crítica tanto ao pragmatismo ideológico que, compreendendo a promoção da leitura como adequação ao padrão produtivo, ao mundo da eficiência e da competitividade, trata de medi-la e justificá-la em termos de retorno de investimento, de valor agregado, de ordem estabelecida, quanto ao idealismo ingênuo que, crendo que as consciências se formam simplesmente pelo estímulo à livre leitura de textos cativantes, quer promover leitura como quem faz caridade ou propala sonhos.
Afirmar o valor e a necessidade da oferta pública e ampla de livros é obviedade e resulta do trivial reconhecimento de que o alfabetismo é condição de inserção na ordem social contemporânea, e que saber e poder interagir com desenvoltura a diversidade de objetos culturais que se oferecem por meio da escrita qualifica a pessoa profissional e politicamente.
Também é obviedade a afirmação de que a leitura, destacadamente a literária, é fonte ímpar de experiência estética, de expansão libidinosa e de afirmação subjetiva, e isso de uma maneira em certa medida distinta das muitas outras formas de interação com a cultura e com a arte.
Contudo, submetida à pedagogia da eficiência ou subsumida à indústria do entretenimento – reduzida, portanto, aos ditames do cálculo da produtividade e da adequação –, a lei- tura perde sua força criativa e heurística. Produto humano, ela sintetiza o esforço dos homens de, em sua lida cotidiana, em seus conflitos e interesses, produzir a própria existência: saber e poder ler é saber e poder dar conta desse processo, de suas causas, formas, consequências; é saber e poder indagar para além das aparências e reagir para além de estímulos.
Devo dizer que, assim como me incomoda isso de ficar propalando a ideia de que para ler basta querer, que ler é gostoso, divertido, instrutivo, incomoda-me a ideia de biblioteca em que se prevalece o gesto fácil, fruto do simples querer ler, o lugar de qualquer tempo e de aprendizagem automática pelo simples contágio. Conformado pelas formas de ser da cultura e da história, o sentido da leitura, assim como o sentido da arte, da ciência e da filosofia, não lhe é intrínseco nem brota de boas vontades: ele se põe pelo incômodo de existir que se insinua na gente, pela desordem do mundo, pelas tensões do tempo, pela miudeza de ser.
A biblioteca, percebida como lugar de encontro da gente com arte, com ciência, filosofia, história, lugar social, político, não é, de modo nenhum, um lugar neutro. É um lugar incomum, lugar que seleciona e exige, que pressupõe uma pessoa capaz de operar com discursos complexos e distante das formas e saberes aprendidos na vida prática; disposta a deixar-se estar sem tanta pressa, a compenetrar-se, a experimentar-se o silêncio. Há muitos lugares ruidosos e divertidos em que se pode estar para entreter-se, lugares de alegre dispersão e riso, em que a pessoa se despreocupa, brinca e esquece. É bom que haja também algum lugar em que se possa pensar, imaginar, indagar vagarosamente os modos do mundo, da vida, da gente.
E ser reflexivo é gesto que se aprende. Por isso mesmo, a biblioteca demanda formação permanente e deve ter como princípio formar o leitor, contribuindo para a contínua superação de seus limites. Sua medida de valor está, não no tamanho de seu acervo, na quantidade de atendimentos, na diversidade de promoções ou na modernidade dos recursos – mesmo que tudo isso seja desejável –, mas no quanto contribui para o adensamento da cultura, da disseminação do conhecimento e a afirmação da consciência individual e coletiva – enfim, para a formação do leitor.
Não se infira do que disse acima nenhum gosto nostálgico ou fixação em momento outro da história. Nada de construções vetustas, emadeiradas, revestidas de estantes sobre estantes; isso é a ordem de um outrora. A biblioteca moderna quer ser dinâmica, flexível, integrada, informatizada, conectada; quer ser democrática e assistir gente de toda estirpe; quer estar disponível e acessível. E, sendo diversas as possibilidades de leitura e diversos os públicos, ela se estruturará de forma a dar conta dessa diversidade, respeitando os tempos e dinâmicas de cada um e desdobrando os espaços e acervos. Mas sempre tendo como princípio a formação, o encontro com o conhecimento, a introspecção criativa.
Apesar do paradoxo, é necessário reconhecer que uma biblioteca que, para ser de todos, ignora o esforço que ler exige e concentre-se em fazer fácil e óbvia a leitura não será lugar de encontro com a cultura, a arte e o conhecimento. Não será uma biblioteca. Sei do incômodo que pode trazer tal posicionamento, principalmente porque sugere uma perspectiva excludente e elitista, ainda que não o seja. A inclusão está em a gente ter o poder de dizer, pensar, criar. A exclusão ocorre quando se mantém o mundo – e as pessoas que são nele – na distração, no engodo e na ignorância.
Para terminar, transcrevo as palavras que disse à campanha “Eu quero minha biblioteca”, quando indagado qual a biblioteca dos sonhos.
Eu me pergunto para que serve a biblioteca, o que é a biblioteca. Muitas vezes, as pessoas acham que a biblioteca tinha que ser um lugar que… como se fosse uma feira, uma festa, alegre, que atraísse todo mundo. Eu creio que a biblioteca precisa ser um lugar de recolhimento, um lugar bem-vindo, lugar agradável, onde vou para estar, vou para ler, vou para encontrar-me, recolher-me, refletir, silenciar, imaginar… um lugar que vou para, acima de tudo, me sentir bem comigo e poder perguntar sobre mim e sobre a vida, estudar… É um lugar que – se não todo ele, não precisa ser todo – tem também de ter o silêncio do encontro, o silêncio gostoso e agradável, em que alguém com o livro pode encontrar-se consigo, com o outro e pensar o mundo, a vida, e indagar a existência, sonhar, fantasiar – fantasia de que tanto falava Bartolomeu Campos de Queirós. Um lugar de ser, um lugar de estar.
“Epistemologias Negras: relações raciais na biblioteconomia” busca utilizar suas escritas e reflexões como forma de luta contra o que os autores têm chamado de “epistemicídio” dentro da biblioteconomia
A partir de pautas por visibilidade e reconhecimento como intelectuais e bibliotecárias/os negras/os, além da reflexão sobre o mercado de trabalho e acadêmico, o livro “Epistemologias Negras: relações raciais na biblioteconomia”, publicado pelo recém lançado Selo Nyota, busca utilizar suas escritas e reflexões como forma de luta contra o que os autores têm chamado de “epistemicídio” dentro da biblioteconomia e em outros espaços, trazendo para visibilização a existência de negros em lugares de construção do saber.
Conforme a apresentação do livro, foram reunidas “escritas potentes” sobre relações raciais interseccionadas a gênero, sexualidades, informação e comunicação buscando evidenciar a trajetória de pessoas negras “que não se curvam à formação acadêmica hegemonicamente branca”. Dividido em duas seções temáticas, o livro possui somente bibliotecárias e bibliotecários negros como autores dos capítulos.
Organizado pelas/os bibliotecárias/os negras/os Danielle Barroso, Elisângela Gomes, Erinaldo Dias Valério, Franciéle Carneiro Garcês da Silva e Graziela dos Santos Lima, a publicação será lançada no próximo dia 09 de julho durante “I Encontro Nacional de Bibliotecárias/os Negras/os”, que será realizado na Universidade do Estado de Santa Catarina, em Florianópolis.
“As questões raciais alicerçam as relações de poder existentes na nossa sociedade. Nessa hierarquia que se criou, o conhecimento que aprendemos na universidade está orientado por uma visão eurocêntrica que exclui do campo discursivo outras possibilidades de pensar a ciência, a informação e o conhecimento”, explicam os organizadores da obra nesta entrevista.
COMO SURGIU A IDEIA DO LIVRO E A QUE ELE SE PROPÕE?
A ideia surgiu a partir das reflexões sobre questões raciais dentro do Coletivo de Bibliotecárias/os Negras/os criado em 2018. O coletivo foi um ganho para nossa área, que surgiu por meio da experiência do livro “Bibliotecári@s Negr@s: ação, pesquisa e atuação política”. As discussões dentro do coletivo, proporcionaram novas visões e perspectivas por parte de bibliotecários/as negros/as.
Nesta ocasião, membros do Coletivo propuseram que fosse produzido um livro sobre a temática das relações raciais na área escrito a partir do lugar de fala dos próprios atores: bibliotecárias/os negras/os.
Neste sentido, o livro “Epistemologias negras: relações raciais na Biblioteconomia” propõe o recorte para os estudos epistemológicos dentro da área Biblioteconomia sob a perspectiva de pessoas negras bibliotecárias, buscando evidenciar reflexões e saberes plurais que fazem parte das populações negras e discutindo suas representações em diversos espaços da sociedade.
POR QUE TRAZER A DISCUSSÃO DA QUESTÃO RACIAL PARA A BIBLIOTECONOMIA?
As questões raciais alicerçam as relações de poder existentes na nossa sociedade. Nessa hierarquia que se criou, o conhecimento que aprendemos na universidade está orientado por uma visão eurocêntrica que exclui do campo discursivo outras possibilidades de pensar a ciência, a informação e o conhecimento.
A discussão sobre questão racial precisa ser refletida e discutida dentro da biblioteconomia, em especial, por meio do currículo, para que esta ação na formação bibliotecária seja refletida na prática. A Lei Federal nº 10.639 de 2003, que torna obrigatória a discussão sobre história e cultura afro-brasileira e africana na rede pública e privada de ensino fundamental e médio, aponta para a importância dessa formação também nos cursos de licenciatura e bacharelado.
Por um lado, para formar profissionais com consciência crítica e ético-política que fará com que pense aspectos importantes como desigualdades sociais, diversidade étnica e cultural, história e cultura afros, branquitude, assim como a sua responsabilidade para a construção de uma sociedade antirracista e equânime.
Por outro lado, 54% da população brasileira é negra (considerando pretos e pardos) e usuária de produtos e serviços de bibliotecas e unidades de informação, mas ainda há mínima representatividade negra dentro desses espaços quando se pensa o acervo, políticas e ações culturais. Pensar estes espaços para representatividade da diversidade étnico-racial e cultural existente em nosso país vai ao encontro da missão ético-política da profissão bibliotecária e esta/e profissional precisa estar atenta/o a essas demandas.
VOCÊS IDENTIFICARAM ENTRE OS BIBLIOTECÁRIOS DEMANDAS POR ESTE DEBATE?
O debate sobre questões étnico-raciais está há algum tempo sendo realizado dentro de cursos de biblioteconomia embora, em alguns casos, estes debates estivessem sendo feitos de forma local e por algumas pessoas específicas. Com o estabelecimento das leis federais 10.639/03 e 11.645/08 – que tratam da obrigatoriedade do ensino de histórias e culturas afro-brasileiras e indígenas em instituições de ensino brasileiras – a preocupação de quem estava dentro da biblioteconomia para as questões étnico-raciais tomaram maior visibilidade.
Docentes como Maria Aparecida Moura, Joselina da Silva, Mirian de Albuquerque Aquino, entre outras pessoas, auxiliaram na formação acadêmica crítica de uma gama de bibliotecárias/os negras/os que entenderam a necessidade de descolonizar o conhecimento realizado dentro da área e propor reflexões sobre diversos campos, instrumentos e epistemologias que a compõem.
QUAL O NÍVEL DE RESISTÊNCIA NA ACADEMIA PARA DISCUTIR AS QUESTÕES RACIAIS?
A resistência da academia aparece de diversas formas: racismo institucional, falta de abordagem do tema nos currículos de biblioteconomia enquanto disciplinas obrigatórias, falta de estímulo para pesquisa sobre a questão racial sob o discurso de ser um estudo considerado “militante”.
A invisibilidade perpassa o corpo docente, em sua maioria por não serem negros e não terem uma formação para discutir as relações raciais. Isso gera uma ruptura no processo de produção do conhecimento, em vista que as cotas na universidade proporcionaram maior acesso para estudantes negras e negros, mas o mesmo não ocorreu para a contratação de docentes.
Quando conseguimos propor pesquisas e ações no tocante às relações étnico-raciais esbarramos na falta ou escassez de acervo bibliográfico nas bibliotecas universitárias. Mais um indício de que essa discussão precisa avançar do ensino fundamental e médio alcançando a graduação e a pós-graduação.
COMO O LIVRO ESTÁ ORGANIZADO? (CAPÍTULOS, NÚMERO DE PÁGINAS ETC.)
Dividido em duas seções temáticas, 10 capítulos e 312 páginas, o livro possui somente bibliotecárias e bibliotecários negros como autores dos capítulos, entre os quais encontram-se: Bruno Almeida (UFBA), Nandia Letícia Freitas Rodrigues (UNESP), Graziela dos Santos Lima (UNESP), Lueci da Silva Silveira (UFRGS), Ana Claúdia Emidio da Silva (UFC), Dávila Maria Feitosa da Silva (UFCA), Elisângela Gomes (CFLB), Erinaldo Dias Valério (UFG), Franciéle Carneiro Garcês da Silva (UFMG), Luane Bento dos Santos (PUC-RJ) e Marcio Ferreira da Silva (UNESP).
FICHA TÉCNICA
Título: Epistemologias Negras: relações raciais na biblioteconomia
Organizadores: Danielle Barroso, Elisângela Gomes, Erinaldo Dias Valério, Franciéle Carneiro Garcês da Silva e Graziela dos Santos Lima
Recém-lançado no Brasil, “O Mundo da Escrita”, de Martin Puchner, é comentado pela professora Marisa Midori
Texto por Roberto C. G. Castro
O imperador macedônio Alexandre, o Grande (356-323 antes de Cristo), foi profundamente influenciado pela Ilíada, de Homero, que lhe dava o exemplo do líder grego Aquiles para inspirar suas conquistas. Antes dele, Assurbanípal (690-627, aproximadamente), rei da Assíria, teve como modelo a Epopeia de Gilgamesh, um poema épico sumério sobre o mitológico rei Gilgamesh. Mais recentemente, o Manifesto Comunista, de Marx e Engels, embalou milhões de mentes e corações em vários países e modelou a Revolução Russa de 1917.
Esses são alguns exemplos citados pelo crítico literário alemão Martin Puchner em seu livro O Mundo da Escrita – Como a Literatura Transformou a Civilização, lançado em maio passado pela Editora Companhia das Letras.
O livro foi comentado pela professora Marisa Midori em sua coluna Bibliomania, transmitida no dia 5 de julho de 2019 pela Rádio USP (93,7 MHz).
Embora saibamos o quanto é importante ler e levantemos estandartes fortes estimulando os pais a incentivarem a leitura e também os professores a usarem mais em sala de aula, na verdade, ela permanece uma espécie de incógnita na educação tanto domiciliar quanto escolar.
A leitura fica ali, escondida no cérebro, e é difícil de avaliar. A leitura em voz alta não é a mesma leitura que temos em silêncio. O nível de entendimento é diferente, porque cada tipo de leitura (e não há apenas essas duas, há muito mais!) precisa de um treinamento diferente.
Não é porque uma pessoa esteja alfabetizada, que ela saiba ler. Ler envolve muito mais do que codificar. Precisa de memória de trabalho, atenção, conhecimentos prévios, vocabulário e uma lista tão extensa de requisitos, que daria vários capítulos de escrita.
A leitura é algo abstrato e pessoal. Só conseguimos avaliar o que podemos observar e ela fica ali, escondidinha. Poucos são os professores e pais que conseguem desvendá-la com sinais que a criança dá, porque ainda não temos instrumentos próprios para estimular a leitura ou mesmo para avaliá-la. Isso, porque pouco se estuda sobre ela na área da educação.
No ano 2007, a pesquisadora Maryanne Wolf lançou seu livro sobre história e ciência por trás do cérebro que lê. Quando o fez, olhou ao seu redor e notou que algo faltou em sua edição. O mundo estava ficando cada vez mais digital, mas ela não tinha considerado o impacto do digital na leitura e uma nova jornada começou para ela.
Atualmente, Maryanne Wolf é uma das poucas especialistas no assunto de leitura que merecem a leitura. E não é porque o seja, que a leitura de seus livros é fácil! Ela entra fundo no assunto, inclusive do ponto de vista neurológico. Sua nova jornada para pesquisar sobre a leitura na era digital levou quase uma década e finalmente, em 2018, ela lançou seu livro sobre o assunto, que agora recebe traduções em vários idiomas, inclusive para o português.
O livro “O cérebro no mundo digital” (original “Reader, come home”: The Reading Brain in a Digital World) traz assuntos muitíssimo pertinentes como o que acontecerá com a geração nascida imersa em um mundo digital, o quanto a criança pode ser exposta aos aparelhos e o impacto do tempo que ela fica, o que muda na educação e muito mais. Destaque para o capítulo seis, que fala sobre o uso de aparelhos desde quando somos bebês até os cinco anos de idade e o que muda no cérebro por causa desta exposição ao eletrônico.
É uma obra de dois Cs: completa e complexa. Traz estudos que ela fez e considerações e exemplos pessoais bem interessantes e vale muito a leitura de quem se interessa pelo assunto.
Só para entender melhor, cada leitor é próprio e único. Quando uma pessoa lê, ela desenvolve circuitos novos de leitura em seu cérebro, que mexem com elementos como a multitarefa, a rapidez na leitura e o lidar com as distrações. Os aparelhos interferem no modo como a leitura era processada até antes de seus estímulos e, em um adulto, o efeito é diferente das crianças.
No período de infância, até os cinco ou seis anos, a criança sempre viveu em dois mundos: um real e um imaginário. Atualmente, ela lida com um terceiro mundo, que é o digital.
Segundo estudos, o uso de aparelhos em excesso pode interferir em um ou dois mundos da criança. O mais preocupante, do ponto de vista leitor, é que o uso exagerado de telas tenha o poder de inibir o desejo natural das crianças de explorar o mundo ao seu redor.
O mais preocupante em tudo isso, é que cria nelas um tipo diferente de aborrecimento que elas não tinham antes da era digital. Este novo aborrecimento, ainda em fase de pesquisas, por ser tão recente, inibe algo importante e que faz parte de nossa humanidade: a criatividade.
Criança que não brinca explorando mundos imaginários tem sua capacidade de criar comprometida. Nos aparelhos tudo já está pronto. Dá ideias às crianças sim, mas de modo superficial e o digital não é real: nem sempre aplicável à realidade.
A capacidade de criar impacta em várias áreas, mas no caso da leitura, ajuda com a profundidade. Há níveis dentro da leitura que são adquiridos ao longo da vida. Parte deles se dá devido ao poder que temos no cérebro de imaginar. O imaginar permite ir além do que se lê e criar estratégias leitoras como a inferência, por exemplo.
Segundo Maryanne Wolf, ainda há a necessidade de usar os livros impressos com os pequenos, porque eles causam experiências táteis importantes e que irão contribuir para eles como futuros leitores. Não é questão de tirar o aparelho dos pequenos, mas sim de saber dosar. Durante várias vezes no livro ela afirma que não é contra o uso das telas, mas é preciso saber as consequências e ter consciência do quanto pode prejudicar ou ajudar.
No Brasil temos dificuldades imensas já com a leitura impressa. Devemos nos voltar mais para a questão leitora, agregando também conhecimentos sobre a leitura na era digital, mas com moderação! A leitura digital engloba habilidades diferentes da analógica e, portanto, irá precisar de novas estratégias de intervenção das escolas. Esta é uma questão nossa, porque cada idioma tem suas necessidades e particularidades, inclusive, no quesito leitura.
Questões sobre como a leitura digital influencia na leitura analógica ou até na forma biológica de processar a leitura, sobre como estimular e avaliar a leitura nas escolas, sobre como balancear leituras de modo saudável para o cérebro leitor são importantes para desenvolver bons trabalhos em sala de aula. Também para um começo de questionamento das famílias sobre o quanto a criança fica exposta ao digital.
A leitura é uma espécie de ferramenta que desenvolvemos ao longo dos séculos entre os humanos. Embora pouco explorada, pode ter sua capacidade muito ampliada, inclusive, com o estímulo digital. O livro de Maryanne Wolf nos norteia para o assunto e traz, com certeza, questões que antes não eram consideradas.
Nos resta, agora, começar a virar o olhar mais para a leitura de nossas pequenas futuras grandes pessoas, em processo de aprendizagem em aula, e além de incentivar, pensar também na qualidade de estímulos que estão recebendo e o quanto estamos contribuindo para sua formação real.
Decodificar não é ler, passar os olhos não é entender. Antes pensávamos em letramento, que é a capacidade de ler interpretando socialmente os textos e imagens. Hoje, talvez, tenhamos um neologismo para esta capacidade, que é o biletramento, ou seja, a capacidade de ler analógica e digitalmente textos e imagens.
Neurocientista lançou livro ‘O cérebro no mundo digital: os desafios da leitura na nossa era’
Texto por Romar Beling
Foto: Divulgação
Que a internet e as ferramentas do universo digital mudaram o mundo – e, aliás, seguem mudando um tanto mais a cada dia – até um ponto absolutamente insuspeitado há poucos anos, ninguém mais desconhece. No entanto, até onde seguirá essa mudança, e até que ponto será mais positiva ou mais negativa, ainda é uma incógnita. O certo é que a rotina mudou e mudará, e tende a nunca mais ser como antes.
Se o processo de aquisição de conhecimento, as responsabilidades coletivas e a ética indispensável à própria subsistência da condição humana seguirão preservados, eis um debate que começa a se estabelecer entre especialistas. É o que revela um livro fundamental no processo de análise e de interpretação do estado das coisas atual, o volume O cérebro no mundo digital: os desafios da leitura na nossa era, da neurocientista cognitiva americana Maryanne Wolf, lançado no Brasil pela editora Contexto.
Como argumenta a autora, as novas gerações, as que surgem neste princípio de milênio e se alfabetizam e educam basicamente em ambiente digital, revelam cada vez menos capacidade, propensão e paciência para qualquer coisa que implique em profundidade intelectual e concentração. São públicos que vivem na superfície de um conteúdo imediatista e sempre prontamente substituído nas mídias sociais, fascinadas com telas de computadores, tablets, notebooks ou smartphones. A última coisa que de fato fazem é ler.
Essas plataformas ou esses dispositivos tornaram-se vias por excelência através das quais interagem com seus grupos, e com o mundo (próximo ou distante). Mais do que vias, quase se tornaram a razão de ser ou o mundo em si, retratos dos objetivos, das metas ou do alcance de raciocínio ou do horizonte de expectativa.
Até que ponto o cérebro treinado para o consumo de informação no ambiente online poderá, em algum momento, ainda estar preparado para assimilar conteúdos mais densos, mais aprofundados, e não estar por completo limitado a uma percepção imediatista ou fluida, eis campo fértil para as avaliações e os testes feitos por neurocientistas. Maryanne salienta que já está claro, junto aos especialistas, que o comportamento da cognição e o próprio cérebro se formam e respondem de maneira diferente a um texto em suporte digital e ao texto impresso.
Este, pela peculiaridade do manuseio do objetivo físico, está mais próximo do que é o mundo real em si, palpável, natural, mensurável. Ninguém vive no ar ou numa suposição, num ambiente fluido. Precisa de alimento real, sono real, interação real, e as gerações digitais demonstram cada vez menos capacidade para interagirem com naturalidade em sociedade, e apresentam uma propensão crescente a fobias, a afastamento do ambiente social, a isolamento e inatividade.
Paradoxo
Como só o tempo poderá deixar claro, com mais amplitude, quais serão os reais efeitos, positivos ou negativos (ou ambas as coisas) dos tempos digitais, visto que a própria internet ainda é uma adolescente, os temas levantados pelo livro tendem a ser, ao que tudo indica, assunto para todo o século 21.
O que é certo, porém, é que no que diz respeito a leitura nas entrelinhas, muita coisa escapa por entre os dedos quando alguém já não tem ânimo nem paciência, nem persistência, para a leitura propriamente dita – a leitura que, aliás, está na base do próprio conhecimento que forjou o digital. Até porque cada vez que alguém decide sair em defesa do digital, para que seu argumento seja considerado, sempre o faz em um… livro… impresso. Só com o digital,ele ainda nem se sustenta.
Ficha
O cérebro no mundo digital: os desafios da leitura na nossa era, de Maryanne Wolf. Trad. de Mayumi Ilari e Rodolfo Ilari. São Paulo: Contexto, 2019. 256 p. R$ 59,90.
A origem não natural e, sim, cultural do letramento – primeiro aspecto enganosamente simples a considerar sobre a leitura – significa que os jovens leitores não têm um programa de base genética para desenvolver esses circuitos. Os circuitos do cérebro leitor são formados e desenvolvidos por fatores tanto naturais como ambientais, incluindo a mídia em que a capacidade de ler é adquirida e desenvolvida. Cada mídia de leitura favorece certos processos cognitivos em detrimento de outros. Traduzindo: o jovem leitor tanto pode desenvolver todos os múltiplos processos de leitura profunda que estão atualmente corporificados no cérebro experiente, completamente elaborado; ou o cérebro leitor iniciante pode sofrer um “curto-circuito” em seu desenvolvimento; ou pode adquirir redes completamente novas em circuitos diferentes. Haverá profundas diferenças em como lemos e em como pensamos, dependendo dos processos que dominam a formação do circuito jovem de leitura das crianças.
A tarefa a que Martin Puchner, professor de literatura comparada da Universidade de Harvard, se propôs era ambiciosa: escrever uma história da escrita que mostrasse como ela transformou a civilização global. Tarefa que ele cumpriu com uma bibliografia enorme e viagens por várias partes do mundo, condensadas agora em O Mundo da Escrita (Companhia das Letras).
O livro vai da Epopeia de Gilgamesh, passa por Alexandre, O Grande, Sócrates, Buda, Jesus Cristo, pela narrativa árabe, dá um contorno pelos Maias e pela tradição oral africana, pela literatura europeia e soviética, passa pelo pós-colonialismo e chega a Hogwarts (o castelo de Harry Potter).
Ao mesmo tempo, desenha a história das tecnologias que deram suporte a esses trabalhos, da invenção à popularização da escrita, até a impressão em massa e o papel.
Sobre esses assuntos, Puchner respondeu a algumas questões por e-mail.
Você diz no livro que precisamos de uma interpretação sólida para entrar em contato com os textos “fundamentais”. Qual é o lugar para melhor fazer isso?
O “fundamentalismo textual” se tornou cada vez mais importante para mim. Eu estava, no livro, traçando a influência de textos como os primeiros épicos (Homero), religiosos (a Bíblia hebraica) ou políticos (Declaração de Independência dos EUA) e percebi o quanto nossas sociedades ainda dependem deles. Reverenciar textos antigos não é necessariamente ruim, mas as coisas ficam ruins se não nos permitirmos flexibilidade o suficiente para interpretá-los de acordo com nossas necessidades. Isso deve acontecer em todos os lugares, na universidade, na mídia, mas também em igrejas e instituições religiosas, escolas, tribunais.
Você encontrou na sua pesquisa casos de difusão de desinformação proposital, baseada em novas tecnologias?
Quando se quer que novas tecnologias apareçam e mudem o mundo da escrita, a autoridade de velhas instituições é desafiada. Veja a Reforma Protestante. A imprensa permitiu a Lutero enfrentar a instituição mais poderosa do mundo, a Igreja Católica. Esse desafio também significou que, repentinamente, outras regras para publicações foram criadas e, sim, muita desinformação foi espalhada pelas impressoras. Mas novas instituições emergem e adquirem autoridade e confiança – os jornais, por exemplo. Então, sim, sempre houve desinformação, mas também vejo um padrão na História que leva para a criação de novas instituições.
Você também diz acreditar que “é sempre melhor ter uma perspectiva global” sobre a literatura. Hoje em dia, líderes globais resistem à ideia em muitas áreas. Qual é o papel da literatura nesse contexto?
O termo “literatura universal” foi criado por Goethe em 1827, em meio a um momento nacionalista, mas Goethe resistiu a esse nacionalismo. Ele começou a ler literatura de outras culturas, China, Índia, Pérsia. Agora, estamos de volta num momento intensamente nacionalista em todo o mundo. É por isso que penso que promover a literatura universal é tão importante. Ela nos permite ver o mundo de diferentes perspectivas; e porque a literatura tem tanta importância na formação das sociedades, nos permite um entendimento mais profundo de outras culturas.
O Brasil está numa crise cultural e editorial, com livrarias falindo e investimentos governamentais na cultura caindo. Teoricamente, você pensa que o mundo da escrita precisa passar por novas crises para se reinventar?
Bem, não temos escolha. Estamos atravessando uma enorme transformação e temos que tirar o melhor dela. A mudança tecnológica tem lados bons e ruins. Mais está sendo escrito e lido por mais por mais pessoas do que em qualquer momento da história humana. As barreiras de acesso para pessoas comuns se tornarem autores e publicarem desapareceram. Essa é uma enorme democratização da literatura e da escrita. Por outro lado, há algumas coisas, como as fake news e as crises no mercado editorial. Não há soluções simples. No livro, quis olhar para trás nos momentos iniciais em que imensas transformações mudaram a maneira com que nos comunicamos por escrito. Cada transformação causou enormes ansiedades; as pessoas pensavam que suas sociedades estavam desmoronando. Às vezes, guerras religiosas aconteceram como resultado. A escrita é uma ferramenta poderosa. Mas no fim, sou otimista. No passado, aprendemos a manejar essa ferramenta. Acredito que vamos aprender de novo.
💡📚 Nesta edição do Boletim da Biblioteconomia, trazemos histórias de quem trabalha fora dos ambientes tradicionais da profissão, mas que segue trabalhando com informação.
Uma boa leitura.
As doações representam um componente importante das atividades de formação de coleções das bibliotecas.
É aconselhável que as bibliotecas desenvolvam processos claros para lidar e avaliar ofertas de doações (inclusive de itens eletrônicos) de acordo com as políticas da instituição.
Isso fornecerá clareza tanto à equipe da biblioteca quanto aos doadores, reduzirá a exposição ao risco e possíveis responsabilidades, e garantirá que as oportunidades futuras associadas a itens aceitos nas coleções da biblioteca possam ser plenamente exploradas.
Uma biblioteca pode aceitar doações ou solicitá-las. Para proteger a biblioteca no futuro, uma justificativa por escrito deve ser preparada, assim como um plano de custódia. Essas recomendações devem ser aprovadas por escrito pelo diretor da biblioteca. As bibliotecas podem aceitar doações não solicitadas, mas sem condições, para que a biblioteca possa decidir se realmente precisa do material doado. Muitas doações podem duplicar materiais já pertencentes à biblioteca, podem estar desatualizadas ou fora do escopo das coleções.
As bibliotecas são livres para rejeitar doações quando o processamento das coleções é muito trabalhoso. Nestas circunstâncias, o doador pode gostar de ser encaminhado para outra biblioteca apropriada.
Recomenda-se que as bibliotecas mantenham todos os registros relacionados a doações permanentemente. Estes registros incluem, mas não estão limitados a, correspondência, mensagens de e-mail, formulários de depósito e acordos formais de doadores.
Se for política da biblioteca incentivar as doações do público, é importante aconselhar potenciais doadores sobre como fazer doações para a biblioteca. Essas instruções podem ser postadas no site da biblioteca ou podem ser impressas em brochuras que descrevem as coleções da biblioteca.
Exemplo de Declaração
A Biblioteca [Nome] aceita doações que refletem os atuais interesses e necessidades da comunidade e complementa coleções, programas e metas atuais da Biblioteca em formato, cobertura de assunto, profundidade e filosofia para fornecer um equilíbrio de informações, pontos de vista e formatos. A Biblioteca aprecia essas doações como atos de coesão cívica.
A biblioteca deve divulgar claramente os termos sob os quais as doações serão tratadas. Isso deve incluir declarações sobre:
• Transferência do título completo, livre e desonerado para a instituição, uma vez doado.
• Nenhuma suposição de responsabilidade por qualquer perda ou dano à propriedade.
• Direito de exercer discrição ao aceitar doações, especialmente se eles duplicarem itens, estando fora da política de desenvolvimento de coleções da biblioteca, em más condições ou em desacordo com qualquer política de aquisições éticas em vigor na biblioteca.
• Esclarecimento sobre métodos de descarte de doações indesejadas.
• Políticas de retenção referentes a itens aceitos nas coleções, por exemplo, esclarecendo que podem ser considerados para eliminação no futuro e que a retenção não é garantida na perpetuidade.
Adicionar doações (solicitadas ou não solicitadas) a coleções de bibliotecas pode ser uma tarefa cara e as bibliotecas devem considerar cuidadosamente os custos do ciclo de vida antes de aceitar, observando também as condições que o doador queira anexar a um item(s), tais como acesso restrito, condições que envolvam a reprodução de material ou restrições à maneira como o material poderá ser usado. A biblioteca deve desencorajar o depósito de material não solicitado sem acompanhamento de informações do doador. É uma boa prática manter um processo documentado para lidar com tais itens. Ter uma política de doações totalmente documentada em vigor ajudará na avaliação de ofertas de doações.
Para alguns tipos de material, particularmente bens culturais, informações / evidências sobre a proveniência do item podem ser necessárias. As bibliotecas devem exercer a devida diligência e as mais altas práticas éticas em lidar com ofertas de materiais como:
• Material exclusivo, por exemplo, manuscritos, desenhos, pinturas ou outras obras de arte
• Impressões
• Material acima de um valor especificado
• Material impresso antes de 1900
• Todo material arqueológico
Para itens originários do exterior, evidências documentais devem ser buscadas em relação à exportação legítima do item(s). Se orientação adicional for necessária nesses assuntos, informações podem ser encontradas no Código de Ética para Museus – https://icom.museum/wp-content/uploads/2018/07/ICOM-code-En-web.pdf
É útil estabelecer a motivação do doador para oferecer o item à biblioteca e se o doador em potencial ofereceu o material em outro lugar. Também é importante determinar se existem restrições de tempo que podem ser aplicadas em termos de tomada de decisão e transferência / entrega da propriedade.
Para ajudar a determinar se o (s) item (ns) oferecido (s) é apropriado para as coleções da biblioteca e avaliar as possíveis implicações de aceitar um item, é necessário obter informações detalhadas sobre (a) tamanho da coleção; (b) dados bibliográficos; (c) tipo de material; (d) formato do material; (e) data; (f) assunto; (g) condições físicas; (h) propriedade intelectual.
Um Acordo formal de doação deve ser criado para a maioria das doações grandes, valiosas ou significativas, bem como doações que tenham restrições impostas pelo doador. Para escrever um contrato de doação, a biblioteca deve coletar informações essenciais com antecedência para inclusão no Acordo de Doadores.
Aceitando documentos eletrônicos nas coleções da biblioteca
Os passos necessários para a aquisição de documentos eletrônicos em sua maior parte se assemelham aos requeridos para documentos em formatos tradicionais. Alguns traços especiais devem ser mantidos em mente, contudo.
A aceitação de documentos eletrônicos nas coleções da biblioteca por meio de doação deve ser implementada de acordo com a declaração de política de doações.
É importante que a biblioteca estabeleça claramente quem é o proprietário do documento eletrônico e os direitos de propriedade intelectual e deve prospectar se o doador é o proprietário legal ou se está agindo em nome de outra pessoa que criou ou possui a propriedade do bem eletrônico. A biblioteca deve considerar quaisquer condições que o doador deseje anexar a um item (s), como acesso restrito, condições envolvendo a reprodução de material ou restrições sobre como o material pode ser usado. É importante entender a atitude do (s) doador (es) sobre a política de arquivamento da biblioteca. Publicações eletrônicas podem não ser mantidas.
É necessário considerar a capacidade da biblioteca de gerenciar o arquivamento e acesso no formato oferecido e aos recursos que podem ser perdidos em relação ao documento original.
A decisão de aceitar conteúdo eletrônico como doação pode ser obtida com base em: (a) conteúdo e nível intelectual; (b) assunto; (c) viabilidade técnica, por exemplo, compatibilidade e capacidade de hardware e software, armazenamento e manutenção, etc.; (d) sobreposição com coleções existentes; (e) formato, por exemplo, HTML, SGML, XML, PDF, epub, etc. e formatos de mídia, como JPEG, MPEG etc.; (f) licenciamento, por exemplo, no caso de aceitar um recurso eletrônico como uma doação, é necessário prestar atenção ao período de licença, definição de usuários autorizados, responsabilidade por uso não autorizado, conformidade com as leis vigentes na jurisdição legal da biblioteca (província, estado, país); (g) funcionalidade e confiabilidade; (h) segurança.
Deve ser incluída uma declaração de propriedade que leve em conta as leis nacionais. Uma declaração sobre a intenção do (s) doador (es) em relação à propriedade intelectual e/ou direitos autorais do material da coleção devem ser incluídos, bem como os direitos de acesso e reprodução. A biblioteca deve incentivar o (s) doador (es) a transferir direitos autorais e / ou direitos de propriedade intelectual do material doado para o domínio público, para que a biblioteca possa livremente administrar e fornecer acesso.
This work is licensed under the Creative Commons Attribution 4.0 International (CC BY 4.0) license. To view a copy of this license, visit: http://creativecommons.org/licenses/by/4.0
Na Aviação, na Ciência, na História. As mulheres podem mudar qualquer mundo, inclusive os considerados “masculinos”. Conheça “ABCDELAS”, de Janaina Tokitaka
da Redação
Você sabia que muitas áreas de atuação socialmente consideradas masculinas não seriam o que são hoje sem o trabalho das mulheres? Ou melhor: sua criança sabe disso? É o caso da ciência, da programação de computadores, da aviação, e por aí vai. Foi desse desejo de sensibilização sobre como as referências que observamos no dia a dia influenciam na construção do sujeito que nasceu o livro “ABCDELAS“, de autoria da escritora e ilustradora Janaina Tokitaka, lançamento da Companhia das Letrinhas. A literatura infantil pode ser uma janela para uma infância conectada com a diversidade, a igualdade e o respeito.
Para apresentar pioneiras de diversas profissões, o livro compõe um abecedário ilustrado do trabalho feminino – e feminista, afinal, no diálogo sobre representatividade da mulher está pressuposta a luta pela igualdade de direitos. O resultado é um divertido acervo afetivo de mulheres que transformaram realidades ao redor do mundo, e uma forma de transmitir às crianças o valor da História que foi escrita antes de nós.
No livro, mulheres como a aviadora Anésia Pinheiro Machado, a bióloga inglesa Margaret Elizabeth Fountaine, e a chef de cozinha francesa Eugénie Brazier ganham cada uma pequena biografia em forma de conto, com linguagem poética e bem-humorada.
Uma mistura de livro informativo com literatura autobiográfica, “ABCDELAS” convida meninas e meninos a reverenciar trajetórias profissionais historicamente invisibilizadas. Se tivermos sorte, as crianças sairão do livro sem ter dúvida nenhuma de que as mulheres mudaram, mudam e ainda mudarão o mundo.
“ABCDELAS”, de Janaina Tokitaka
A cada letra, o leitor vai conhecer histórias raras e valiosas de mulheres que revolucionaram seus campos de atuação. Foram essas heroínas do dia a dia que contribuíram para que as mulheres de hoje pudessem trabalhar em diferentes áreas, mesmo em profissões que um dia foram consideradas “masculinas”.
Empoderamento feminino é assunto de criança?
“Empoderamento feminino é até mais assunto de criança do que de adulto, porque o poder formativo da infância é imenso. Crianças absorvem tudo ao redor delas” – Janaina Tokitaka
Por ser indicado para o público infantil – apesar de não encantar somente às crianças – o livro preenche também uma lacuna histórica, que é a da quantidade reduzida de heroínas meninas, em comparação com a de heróis meninos. Ao mostrar mulheres transformadoras em sua área de atuação, a obra mostra às crianças que há outros jeitos de ser menina em uma história, e não só princesa ou mocinha.
“Muitas vezes as personagens femininas nos livros infantis só mostram um ideal de feminilidade e eu acho que isso é muito redutor”
A autora chama as referências que os adultos oferecem aos pequenos de “pecinhas de construir identidade”, e resgata sua experiência pessoal ao escrever histórias como essa. “ABCDELAS” não é o primeiro livro de Janaina a se preocupar com a representatividade feminina. O livro “Princesas guerreiras” – leia a matéria do Lunetas sobre – também trazia esse tema. Também escrito e ilustrado por Janaina, o livro “Pode pegar“, que também já apareceu por aqui, trabalha a questão dos papéis “de menina” e “de menino”, e como eles são construídos no nosso imaginário.
“Pensei na minha infância e como teria me sentido melhor se tivesse mais personagens me incentivando a ser independente e forte”.
Confira a entrevista com a autora:
Lunetas – Empoderamento feminino é assunto de criança? Por quê? Qual sua opinião sobre o termo em si?
Janaina Tokitaka – Acho que é até mais assunto de criança do que de adulto, porque o poder formativo da infância é imenso. Crianças absorvem tudo ao redor delas. Então acho muito importante que a gente redobre os cuidados no sentido de mostrar para as meninas que elas podem ser o que quiserem: astronautas, químicas, desenhistas. Muitas vezes as personagens femininas nos livros infantis só mostram um ideal de feminilidade e eu acho que isso é muito redutor.
Sobre a palavra “empoderamento”, eu acho a intenção do termo melhor do que o termo em si, porque relações de “poder” não são necessariamente uma utopia em que eu acredito. Acho também que é importante não usar o termo como uma hashtag sem sentido. O que eu entendo por “empoderamento” é ampliar a auto estima, o potencial e abrir os horizontes das meninas e mulheres.
Lunetas – Esse não é o seu primeiro livro nessa temática. No Princesas Guerreiras ele também aparece com força. Conta um pouco como esse assunto dialoga com seus interesses artísticos?
Janaina – Eu acho que esse interesse partiu da minha experiência com a maternidade. Depois que tive minha filha, comecei a prestar atenção redobrada em como os personagens e narrativas são levados muito a sério pelas crianças. Como tudo ao redor deles, são modelos, pecinhas que eles vão usar para montar suas próprias identidades. Pensei na minha infância e como teria me sentido melhor se tivesse mais personagens me incentivando a ser independente e forte, ou personagens asiáticas em papéis de protagonismo. Então, como escritora, comecei a me preocupar mais. Talvez seja verdade que a maternidade é um eterno “se preocupar”, mas talvez isso não seja uma coisa ruim.
Lunetas – Fiquei curiosa para saber qual critério você usou para escolher uma ou outra profissão. A falta de representatividade feminina em algumas áreas foi uma delas, por exemplo?
Janaina – Sim! Quis escolher trajetórias e áreas que a gente não imediatamente associa à mulheres, sempre buscando ser inclusiva. A programação de computadores, por exemplo, tem muitas pioneiras e pesquisadoras importantíssimas e no entanto até hoje é uma área em as mulheres sofrem muita discriminação.
“Essa educação para fazer as crianças pararem de ver área x ou y como ‘masculina’ ou ‘feminina’ é muito importante”
Lunetas – O que você gostaria que uma menina pensasse ao ler este livro e conhecer todas essas personalidades históricas? E um menino?
Janaina – Gostaria que esse livro funcionasse para elas, como todo bom livro, como uma espécie de janela. Através dessa janela, a leitora vai descobrir muitas possibilidades, muitas maneiras de ser e pensar. Eu gosto muito de biografias e de História no geral porque acho que quando a gente se vê como um ponto em uma linha temporal maior do nós mesmos, isso nos acalma e dá segurança.
Gosto muito de ler as histórias de autoras e ilustradoras que produziram antes de mim, me sinto menos sozinha. E acredito, mesmo, que os meninos vão empatizar e se identificar com as histórias deste livro, mesmo que elas sejam protagonizadas por personagens que não tem o mesmo gênero que eles.
“Para os meninos, é importante que eles tenham várias referências do que é ser uma mulher”
O livro Biblioteca de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Ceará: 70 anos foi oficialmente lançado, na tarde da última terça-feira (30), no Campus do Porangabuçu. O lançamento ocorreu no salão de leitura da biblioteca e reuniu bibliotecários, servidores técnico-administrativos, professores e autoridades universitárias.
A edição da obra foi realizada em parceria com o Memorial da UFC e a Imprensa Universitária, tendo sido produzida em conjunto com uma exposição fotográfica e um vídeo institucional no contexto dos 70 anos da Faculdade de Medicina, comemorados no ano passado. A publicação teve como organizadores Adeli Gomes Moreira, Rafael de Farias Vieira, Gislene Soares Guerra, Eliene Gomes Vieira Nascimento e Joaquim Melo de Albuquerque. A obra homenageia postumamente a primeira bibliotecária e diretora da BCS, Cleide Ancilon de Alencar Pereira (1934-2018), fundadora do Curso de Biblioteconomia da UFC e Professora Emérita da Instituição.
MEMÓRIA – Na abertura do evento, a diretora da Biblioteca de Ciências da Saúde (BCS), Nicácia Lina do Carmo, agradeceu a presença de todos e assumiu o compromisso de levar adiante o trabalho desenvolvido pelas gestões anteriores. “Quero continuar construindo a história dessa unidade de informação, e também fazer jus à obra de todas as bibliotecárias e de todos os funcionários que contribuíram com esta biblioteca”, afirmou.
Representando os organizadores da publicação, a ex-diretora da BCS Eliene Nascimento destacou a relevância do livro para a memória institucional da Universidade. “A obra traz uma visão geral da evolução da estrutura física da biblioteca, os serviços prestados ao seu usuário, e, o mais importante, registra um pouco da história das pessoas que deixaram suas impressões e contribuições, que constituem viva fonte de inspiração para outros profissionais e pesquisadores”, explicou.
A tarde foi histórica e memorável para o diretor do Sistema de Bibliotecas da UFC, Jonatan Soares, pois foi ali onde começou a trabalhar como bibliotecário e servidor técnico-administrativo. Como ex-aluno de Cleide Ancilon, ele ressaltou a didática extraordinária e a generosidade da homenageada. “A biblioteca é um dos baluartes do Campus do Porangabuçu. Sem a biblioteca, o campus não teria chegado ao êxito de hoje, e ela esteve sempre na vanguarda. Lembro quando cheguei aqui, não tinha Internet ainda, mas esta biblioteca já estava conectada aos melhores mecanismos da época para ajudar a salvar vidas”, compartilhou.
ACESSO AO SABER – “Constatamos que a Faculdade de Medicina e a Biblioteca de Ciências da Saúde estão intimamente ligadas, nasceram juntas e se ampliaram pari passu“. Assim, a diretora da Faculdade de Medicina (FAMED) da UFC, Valéria Góes, fez uma retrospectiva, assinalando fatos históricos desde a década de 1940, a partir do sonho de um grupo de pioneiros em estabelecer o ensino médico no Estado do Ceará. A diretora da FAMED reconheceu a função estratégica da biblioteca em facilitar o acesso da comunidade de usuários ao conhecimento científico, em particular estudantes, professores e profissionais da saúde. “Mesmo com todas as limitações financeiras impostas às universidades públicas, a biblioteca se mantém atualizada e ligada às principais bases de dados mundiais. Ocupa um lugar de destaque no coração do campus, com seu papel mediador do processo de ensino-aprendizagem, fornecendo valioso suporte de informações, através do acervo, dos serviços e do corpo técnico altamente qualificado e dedicado”, avaliou a Profª Valéria.
Nesse sentido, concordou a diretora da Faculdade de Farmácia, Odontologia e Enfermagem (FFOE) da UFC, Lidiany Karla Gerage, ao celebrar a história septuagenária da BCS. Em tempos de informação acelerada e de conteúdos digitais, para a diretora da FFOE, a biblioteca segue desempenhando uma importante missão de democratizar o acesso a livros e publicações especializadas no campo da saúde. “As bibliotecas das universidades possuem um caráter universal, como instâncias privilegiadas de preservação do saber. A biblioteca é o principal agente de construção sociocultural de um país, preservando a experiência dos livros, contando as nossas histórias. São lugares para as pessoas explorarem, interagirem, lerem e também apresentarem suas ideias”, ponderou a Profª Lidiany.
LEGADO – Ao final dos discursos, Arnóbio Machado Pereira agradeceu pelo tributo prestado à memória da homenageada. Bastante emocionado, definiu como “justa e merecida” a lembrança ao legado de Cleide Ancilon, expressando gratidão em nome de familiares e amigos. Além do livro, desde 2010 a sala de Obras Raras da BCS recebeu o nome de sua primeira bibliotecária e diretora. “Com a criação do Curso de Biblioteconomia, Cleide reuniu todo o conhecimento e sua experiência, e, como professora, participou da formação de várias gerações de bibliotecários no Ceará. Conquistou respeito e admiração de docentes, discentes e funcionários. Era uma profissional de excelência, e sua humildade e simplicidade faziam dela uma pessoa muito querida por todos aqueles que puderam conviver com ela”, declarou.
SAIBA MAIS – De 1948 a 1957, a Faculdade de Medicina funcionou em um prédio na Praça José de Alencar, no Centro de Fortaleza, hoje ocupado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). No final dos anos 1950, os cursos de saúde da recém-criada Universidade do Ceará foram transferidos para o Campus do Porangabuçu, e a biblioteca ocupou uma sala no então Instituto Evandro Chagas, atual Departamento de Patologia e Medicina Legal.
A sede da Biblioteca de Ciências da Saúde Prof. Jurandir Marães Picanço foi construída em 1970 e se localiza na Rua Alexandre Baraúna, nº 1019, no bairro Rodolfo Teófilo.
Marisa Midori comenta obra sobre Ramiz Galvão, célebre diretor da Biblioteca Nacional
Texto por Roberto C. G. Castro
O livro O Bibliotecário Perfeito, de Ana Paula Sampaio Caldeira, conta a vida e a obra do bibliotecário Ramiz Galvão (1846-1938), que foi diretor da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, além de médico e professor de Grego e de Literatura Brasileira no tradicional colégio Pedro II, também no Rio.
Em sua coluna Bibliomania, a professora Marisa Midori comentou o livro. A coluna foi transmitida no dia 26 de abril de 2019 pela Rádio USP (93,7 MHz).
Conheça a obra que indaga qual seria o destino de uma sociedade que, fascinada pelos avanços tecnológicos, abolisse os livros
Todos sabem que os livros são fundamentais e possuem uma grande importância no desenvolvimento da sociedade e para o crescimento intelectual do indivíduo. As obras literárias, sejam didáticas ou de ficção, também permitem que o ser humano registre fatos importantes, crie histórias e, assim, dão a oportunidade de repassar tudo isso às sociedades posteriores, atuando como portador de conhecimento e informação.
Além da enorme relevância de disseminar conhecimento de geração em geração, o livro abre portas para a liberdade criativa de cada novo autor que se lança no mercado editorial. A cada obra um universo completamente novo é apresentado ao leitor, sempre com novas histórias a serem descobertas.
O Dia Mundial do Livro
Nesse dia 23 de Abril, comemora-se o Dia Mundial do Livro e dos Direitos Autorais, a data criada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e a Cultura (Unesco) visa encorajar as pessoas, especialmente os jovens, a descobrirem os prazeres pela leitura e conhecerem a enorme contribuição dos autores através dos séculos.
A Unesco instituiu a comemoração no ano de 1995, em Paris, durante o XXVIII Congresso Geral. O dia 23 de Abril foi escolhido por ser a data da morte de três grandes escritores da história: William Shakespeare, Miguel de Cervantes e Inca Garcilaso de La Vega.
Fausto Panicacci
Como foi citado, os livros são verdadeiros companheiros, desde a infância até a fase adulta e, claro, agregam infinitamente. Mas o que você faria se os livros fossem terminantemente proibidos? Ao longo da história da humanidade, é possível identificar alguns períodos onde as obras literárias foram perseguidas e proibidas como, por exemplo, na Alemanha Nazista e na Ditadura Militar Brasileira. Poderia isso acontecer novamente?
A obra “O Silêncio dos Livros”, escrita pelo Doutor em Ciências Jurídicas, promotor e fotógrafo Fausto Luciano Panicacci, narra a história de um tempo futuro onde os livros são considerados “antidemocráticos”, e tê-los é considerado crime em diversos países!
Nesse novo cenário, não há espaço para leitores e muito menos escritores. Aqui, o leitor acompanha a chegada do misterioso Santiago Pena à Vila Nova de Gaia, em Portugal, onde conhecerá Alice, uma garota desprezada pelos pais. Sonhadora e apaixonada por histórias, a menina fica obcecada por um caderno de anotações que Santiago carrega e acidentalmente deixa cair. Curiosa, a garota passa e ficar mais e mais interessada pelas anotações do rapaz.
De maneira surpreendente, a história desse estrangeiro enigmático, da menina abandonada, de um editor corajoso e de uma fotógrafa inspirada se interligam. Juntos, eles arriscam a própria liberdade para manter um perigoso segredo. Em meio a suspense, resistência e aventura, o livro carrega profundas reflexões sobre os paradoxos da condição humana. Alternando-se entre a perspectiva de uma curiosa menina e a de um enigmático homem, O Silêncio dos Livros trata de amor, paixão, amizade, egos, dores latentes e cicatrizes, e é, sobretudo, uma autêntica declaração de amor à Literatura.
Ficha técnica: Título: O Silêncio dos Livros Autor: Fausto Luciano Panicacci ISBN: 978-85-8442-392-7 Páginas: 256 Formato: 16×23 cm Preço impresso: R$39,90 Preço e-book: R$29,90
Fausto Luciano Panicacci é Doutor em Ciências Jurídicas pela Universidade do Minho (Portugal). Formado em Direito (Largo São Francisco, USP), estudou Fotografia, História do Cinema e História da Arte. Além de O silêncio dos livros (romance), é autor de Naufrágios (coletânea de contos e poemas), e de obra jurídica. Promotor de Justiça e escritor, foi professor de pós-graduação no GVLaw da FGV/SP. Integra os grupos literários O que restou e Library.
Marisa Midori comenta o livro “História das Bibliotecas”, do historiador francês Frédéric Barbier
Além de exercer sua tradicional missão de preservação do acervo e de servir como espaço cultural, as bibliotecas hoje têm a função fundamental de organizar e sistematizar o conhecimento, porque não se pode encontrar o que não foi organizado ou sistematizado.
Foi o que disse a professora Marisa Midori em sua coluna Bibliomania, transmitida no dia 1º de março de 2019 pela Rádio USP (93,7 MHz), ao comentar o lançamento do livro História das Bibliotecas – De Alexandria às Bibliotecas Virtuais, do historiador francês Frédéric Barbier, recentemente publicado pela Editora da USP (Edusp). Leia matéria do Jornal da USP sobre o livro neste link.
Crédito: Divulgação | Publicação traz artigos sobre o papel dos centros de memória e relatos de experiências pedagógicas na preservação de coleções e acervos ligados à história do ensino profissional
O Centro Paula Souza (CPS), por intermédio do Grupo de Estudos e Pesquisas em Memórias e História da Educação Profissional, lançou o livro Coleções, Acervos e Centros de Memória. A publicação traz artigos sobre o papel dos centros de memória e relatos de experiências pedagógicas na preservação de coleções e acervos ligados à história do ensino profissional.
A obra reúne 25 trabalhos de professores de Escolas Técnicas (Etecs) e Faculdades de Tecnologia (Fatecs) estaduais, além de pesquisadores que atuam em centros de memória de outros institutos de ensino nacionais e internacionais. Os temas foram apresentados no 4º Encontro de Memórias e História da Educação Profissional, evento que marcou a comemoração dos 45 anos do Centro Paula Souza.
Coleção
Este é o terceiro livro da série Memórias e História da Educação Profissional. Lançada em 2011, a primeira publicação foi Cultura, Saberes e Práticas. A segunda obra foi publicada em 2013, sob o título Patrimônio, Currículos e Processos Formativos. As versões em pdf estão disponíveis gratuitamente para download.
Material pode ser baixado gratuitamente na internet. O processo de pesquisa e produção dos recursos contou com um apoio especial dos alunos
Foto: Divulgação
Com o objetivo de garantir a igualdade de condições aos alunos surdos matriculados na Rede Estadual de Ensino, a Secretaria de Estado de Educação e Qualidade de Ensino (Seduc-AM) disponibiliza para os estudantes surdos o e-book de história em formato acessível.
O material pode ser baixado gratuitamente na internet (baixe aqui) e foi desenvolvido pelo Centro de Mídias de Educação do Amazonas / Gerência de Mídias e Conteúdos Digitais (Cemeam/GEMCD), a Coordenação de Educação Especial (CEE) e a professora da rede Cristiane Alves, autora do livro. Ela contou que o ensino de História possui um vocabulário próprio (termos históricos) e que o aluno surdo se depara com a necessidade de sinais correspondentes em seu idioma à medida que se apropria desses conceitos.
“Foi assim que surgiu a necessidade da criação de um vocabulário em Língua Brasileira de Sinais (Libras) de termos históricos para os alunos da 6° e 7° série da Escola Augusto Carneiro, onde ministro aula. Ficou evidente a importância de elaborar um dicionário de termos históricos, contribuindo para que o processo de ensino-aprendizado ocorra de fato”, assinalou a professora, pós-graduada em Libras e docência em nível superior.
A iniciativa da professora marca também um pioneirismo no acesso a recursos inclusivos online. “O lançamento desse e-book é um primeiro passo que mostra o quanto temos possibilidades de trabalhar a inclusão dos nossos alunos com formação e informação de qualidade”, comenta o professor Raimundo Barradas, Secretário Executivo Adjunto Pedagógico.
Trabalho conjunto
O processo de pesquisa e produção dos recursos contou com um apoio especial dos alunos. Após a pesquisa, a elaboração dos sinais foi realizada pela autora com apoio dos alunos surdos, que participaram ainda das etapas de produção midiática com a gravação dos vídeos para o e-book. Ao todo, esse processo juntamente com a diagramação, revisão da obra, documentação legal e registro da obra na Biblioteca Nacional durou pouco mais de um ano.
O lançamento aconteceu na Abertura do Ano Letivo e contou com a presença do governador do Amazonas, Wilson Lima, o secretário da Seduc-AM, Luiz Castro, além dos demais secretários da pasta. “O sentimento é de gratidão por poder contribuir com a elaboração de um recurso específico pensado para estudantes surdos, mas que também atende estudantes ouvintes, valorizando o protagonismo do professor e dos alunos”, afirmou Sabrina Emanuela de Melo Araujo, Gerente de Mídias e Conteúdos Digitais.
Editora da USP lança “História das Bibliotecas”, do historiador francês Frédéric Barbier
Por Roberto C. G. Castro
A biblioteca de Khorsabad, na Mesopotâmia (atual Iraque): uma das mais antigas bibliotecas do mundo – Foto: F. Barbier (extraído do livro História das Bibliotecas, de Fréderic Barbier)
As primeiras bibliotecas conhecidas, datadas de meados do quarto milênio antes de Cristo e localizadas na Mesopotâmia (atual Iraque), reuniam algumas centenas de pequenas tábuas de argila, com sinais gravados em escrita cuneiforme. A mais famosa biblioteca do mundo antigo – a de Alexandria, ligada à “morada das musas”, o Museu, instituição fundada por Ptolomeu I no final do século 3 antes de Cristo – moldou a cultura livresca ocidental e impôs um modelo de biblioteca que perdura até hoje. Com o advento do cristianismo, igrejas espalhadas pela Grécia e pelo Oriente Próximo fundam suas próprias bibliotecas, embora se restrinjam a guardar manuscritos da Bíblia, livros litúrgicos, atas e correspondências.
Essas são algumas observações extraídas das primeiras páginas do livro História das Bibliotecas – De Alexandria às Bibliotecas Virtuais, do historiador francês Frédéric Barbier, que a Editora da USP (Edusp) acaba de lançar. Com 400 páginas, a obra percorre toda a história dessa instituição dedicada à conservação da cultura escrita. O livro é “um convite à reflexão sobre os muitos paradoxos que as revoluções nos sistemas de comunicação e sistematização da informação vêm sofrendo”, escreve na orelha do livro a professora Marisa Midori, docente do Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP e colunista da Rádio USP. “De um lado, como evitar o esvaziamento de antigas bibliotecas e de coleções inteiras de livros e de periódicos que são paulatinamente publicados na internet? De outro lado, como sistematizar e tornar inteligível um verdadeiro oceano de escritos que se renova a cada dia?”
O incêndio do Museu de Alexandria, xilogravura do Liber Chronicarum, Nurembergue, 1493 (à esquerda), e catálogo dos livros da Biblioteca Pública de Oxford, de 1605 – Foto: Reprodução (extraído do livro História das Bibliotecas, de Fréderic Barbier)
Como mostra o livro de Barbier, as bibliotecas têm uma longa história de conflitos, mas também de superação e de grandes serviços prestados à educação ocidental. A partir do século 4 depois de Cristo, uma série de acontecimentos marca profundamente o trabalho dessas instituições. Entre esses acontecimentos estão as recorrentes crises do Império Romano e a chegada ao Ocidente dos povos “bárbaros”, pouco ou não alfabetizados, que ocasionam a destruição de bibliotecas inteiras. Além disso, a substituição dos volumen de papiro pelo codex em pergaminho faz com que no novo suporte seja reproduzida apenas parte dos textos até então conservados, enquanto o restante é perdido.
Em meio a essa situação, a atuação de São Bento de Núrcia é decisiva, destaca Barbier. Em 529 – mesmo ano em que o imperador bizantino Justiniano, sob a acusação de “paganismo”, fecha a célebre Academia de Atenas, fundada nove séculos antes pelo filósofo grego Platão -, São Bento inaugura a Abadia de Monte Cassino, origem da ordem dos beneditinos, e institui a regra beneditina. Entre os preceitos dessa regra está a obrigação de ler regularmente os textos sagrados e estudá-los através dos comentários dos padres da Igreja. “O mosteiro deve, tanto quanto possível, ser capaz de viver como autarquia, de forma que os monges terão também, entre suas tarefas cotidianas, que copiar os textos para enriquecer a biblioteca”, escreve o historiador. Com isso, generaliza-se o princípio de estabelecer em cada mosteiro um scriptorium e uma biblioteca. A rápida propagação da ordem beneditina é acompanhada pela multiplicação das bibliotecas e dos ateliês dos copistas.
Consulta na Biblioteca de Leiden (1610) – Foto: F. Barbier (extraído do livro História das Bibliotecas, de Fréderic Barbier)
Um capítulo importante na história das bibliotecas se dá com a organização do império de Carlos Magno, na segunda metade do século 8. A política implantada pelo imperador se baseia na reforma da Igreja e na reorganização cultural do território sob seu domínio – o que tradicionalmente se denomina “Renascença carolíngia”. Essa reforma inclui a generalização da regra beneditina e a renovação do ensino, principalmente através das escolas catedrais e monásticas – que darão origem às primeiras universidades, no século 12. “Serão necessários textos, de modo que é lançado um programa geral de reprodução dos textos de base (a Bíblia e as obras de referência de teologia, mas também os clássicos da Antiguidade)”, nota Barbier. “Enfim, é o desenvolvimento das bibliotecas, dentre as quais algumas se tornam relativamente importantes, sobretudo na Germânia.”
O livro de Frédéric Barbier, lançado pela Editora da USP – Foto: Reprodução
Esse desenvolvimento recebeu forte apoio com a invenção da imprensa no Ocidente, em meados do século 15, pelo alemão Johannes Gutenberg. Barbier calcula que, entre 1452 e 1501, a produção impressa é superior a 30 mil títulos. “Com uma tiragem média de 500 exemplares por título, o que é plausível, não são menos de 15 milhões de unidades bibliográficas que são postas em circulação através da Europa em apenas meio século.” Porém, como cita o historiador, somente nas primeiras décadas do século 16 é que os impressos vão se impor definitivamente diante dos manuscritos nas coleções das principais bibliotecas.
Depois de expor a trajetória das bibliotecas nos séculos seguintes à invenção da imprensa, Barbier conclui seu livro analisando o papel dessas instituições no terceiro milênio. “A biblioteca e seu pessoal são uma estrutura de expertise e de construção de novos conhecimentos – particularmente no setor da história do livro e das mídias, e determinadas bibliotecas têm, aliás, com razão o status de equipe de pesquisa, ou são associadas a equipes de pesquisa reconhecidas”, escreve o historiador em suas conclusões. “Mais amplamente, a biblioteca deverá tornar inteligível a articulação entre o presente e o passado das mídias: em muitas bibliotecas que conservam coleções antigas e onde estas só são muito pouco solicitadas, a instituição deverá valorizá-las e deverá fazer com que sejam compreendidas por meio de determinado número de ações – em primeiro lugar, exposições.” Para Barbier, a tradição do pensamento ocidental está ligada ao livro há vários milênios e, portanto, é importante poder apropriar-se dela para perceber melhor as transformações em curso. “Hoje, ainda mais do que ontem, a biblioteca terá que se definir e se redefinir como o ‘espaço público do conhecimento’.”
História das Bibliotecas – De Alexandria às Bibliotecas Virtuais, de Frédéric Barbier, tradução de Regina Salgado Campos, Editora da USP (Edusp), 400 páginas, R$ 86,00.
“Escrevi-o para passar o tempo, para prosear sobre um assunto por que me apaixonei”, afirma Rubens Borba de Moraes no prefácio de O Bibliófilo Aprendiz – Foto: Acervo BBM
Essa frase de Rubens Borba de Moraes, escrita no prefácio de O Bibliófilo Aprendiz, retrata bem sua infinita paixão pelos livros. O volume sai agora em reedição de luxo pelas Publicações BBM, em homenagem aos 120 anos de nascimento do bibliófilo, bibliotecário, bibliógrafo, historiador e pesquisador brasileiro, nascido no dia 23 de janeiro de 1899. O selo já publicou outros dois títulos – Rubens Borba de Moraes: Anotações de um Bibliófilo e Cartas de Rubens Borba de Moraes ao Livreiro Português António Tavares de Carvalho (leia mais abaixo) – escritos a partir de pesquisas realizadas no arquivo de Moraes, deixado sob a guarda de seu grande amigo, o também bibliófilo José Mindlin, e que – fato que muitos desconhecem – está no acervo da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) da USP.
Edição de luxo de O Bibliófilo Aprendiz, um sonho que Rubens Borba de Moraes expressou em carta, agora concretizado pelas Publicações BBM
Livro de cabeceira do professor da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP Plinio Martins Filho, O Bibliófilo Aprendiz é um dos melhores títulos sobre a relação de livros sobre livros, como afirma. “O seu jeito de escrever é muito fácil, espirituoso.” Segundo o professor, que por mais de 26 anos dirigiu a Editora da USP (Edusp) e atualmente está à frente do setor de publicações da BBM, essa edição é uma homenagem à figura importante dos bibliófilos, “uma espécie de guardiões do livro”. Para ele, Moraes viveu intensamente a vida com os livros e, assim como José Mindlin, foi muito generoso em não revender as edições para bibliotecas internacionais, deixando seu legado na BBM, com acesso irrestrito a pesquisadores.
Organizador das correspondências entre Moraes e o livreiro português António Tavares de Carvalho, Martins Filho conta que encontrou em uma das cartas o desejo expresso do bibliófilo por uma edição de luxo de O Bibliófilo Aprendiz. “Não uma edição luxuosa, mas de luxo, com aparato crítico, papel nobre, índices e ilustrações, e foi o que tentamos fazer”, explica. A edição sai em capa dura e de tecido, com várias ilustrações dos livros raros e raríssimos, como o próprio Moraes definia. “Espero que tenhamos dado a devida importância e que a edição esteja à altura da personalidade do seu autor”, afirma.
Bibliographical and Historical Description of the Rarest Books, in the Oliveira Lima collection at the Catholic Universityh of America, uma das muitas obras brasileiras adquiridas fora do Brasil
Nascido em Araraquara, o bibliófilo foi muito jovem estudar na Europa, formando-se na Faculté des Lettres de l’Université de Genève e retornando ao Brasil somente em 1919. Ao lado de Mário de Andrade (seu amigo de infância), Oswald de Andrade, Di Cavalcanti e Guilherme de Almeida, foi um dos organizadores da Semana de Arte Moderna de 1922. Pioneiro da biblioteconomia no País, fundou a Escola Livre de Sociologia e Política (FESPSP). Além disso, assumiu a direção de Divisão de Bibliotecas do Departamento de Cultura, reorganizando a Biblioteca Municipal de São Paulo e, depois, a Biblioteca Nacional.
Sua atuação foi reconhecida internacionalmente e foi convidado a dirigir a biblioteca e o serviço de informações da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York e Paris, cargo que ocupou por mais de dez anos, até sua aposentadoria. Retornando ao Brasil, lecionou na Universidade de Brasília (UnB) e dali mudou-se para Bragança Paulista, falecendo em 2 de setembro de 1986, aos 87 anos, deixando seu rico acervo de obras raras, que colecionou ao longo da vida, ao amigo Mindlin.
Amor aos livros
Bibliografia Brasiliana reúne livros raros no Brasil de 1504 a 1900: “Verdadeiros monumentos de erudição”, afirmou José Mindlin
“Tivemos grande amizade pessoal, encontros frequentes e conversas infindáveis, mas (…) o que nos ligou fortemente foi o amor aos livros, ambos com a mesma compulsão patológica da garimpagem. Um curtia a biblioteca do outro, e ele é, na realidade, o interlocutor que me falta. Preocupado com o que fazer com os livros depois que passássemos desta vida para melhor (pergunto-me se será mesmo a melhor), resolvemos unir as bibliotecas, para evitar a dispersão”, escreveu Mindlin na comemoração do centenário de Moraes. E a sua biblioteca ficou na casa dos Mindlins, “intacta, arrumada, como estava na casa dele, e não se misturando com a nossa, pois uma biblioteca transmite a personalidade de quem a formou”. E agora, da mesma forma, na BBM.
Mindlin ainda ressalta que Moraes foi um homem de grande cultura, conhecedor e infatigável leitor dos mais diversos assuntos e profundo estudioso de temas brasileiros – daí a palavra Biblioteca Brasiliana, sua especialidade. “Apaixonado por livros, passou a lhes dedicar sua vida, não só como leitor, mas também como escritor e organizador da leitura” diz. E acrescenta que tinha pena de ainda ser criança na época das famosas reuniões noturnas em São Paulo, em que Moraes frequentava, ao lado de todo o grupo modernista, a casa de Olivia Guedes Penteado, “quando o ouvia contar o que eram os encontros dos jovens intelectuais”.
As anotações de Rubens Borba de Moraes geralmente eram feitas a lápis nas folhas de guarda dos livros como em O Uraguay, poema de José Basílio da Gama
Moraes dedicou-se especialmente a colecionar autores brasileiros do período colonial, como cita Cristina Antunes (pesquisadora e curadora da BBM) em seu livro Anotações de um Bibliófilo, informando que, de sua Bibliografia Brasileira do Período Colonial, possuía grande parte das obras que ali estavam. Segundo Cristina, sua biblioteca presente na BBM é composta de 1.752 títulos. O autor ainda publicou “verdadeiros monumentos de erudição”, como aponta Mindlin. Entre eles, Bibliografia Brasiliana, sobre livros raros no Brasil de 1504 a 1900, e Bibliografia da Imprensa Régia do Rio de Janeiro (1808-1822), que foi produzido ao lado da historiadora Ana Maria Camargo, professora do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, e publicado postumamente.
Já em O Bibliófilo Aprendiz, Moraes discorre sobre a arte de colecionar. O próprio autor diz, no prefácio, que escreveu o livro “para passar o tempo, para prosear sobre um assunto por que me apaixonei”. E ainda conta: “Desde menino coleciono livros, passei toda a minha vida no meio deles e grande parte de meus melhores anos dirigindo bibliotecas na minha terra e no estrangeiro. (…) cuido dos meus livros e nada mais”.
Publicações BBM
Cartas de Rubens Borba de Moraes ao Livreiro Português António Tavares de Carvalho, organizado por Martins Filho
Além de O Bibliófilo Aprendiz, o selo também lançou outros dois livros escritos a partir de pesquisas realizadas no acervo do bibliófilo. O primeiro deles, Rubens Borba de Moraes: Anotações de um Bibliófilo, da pesquisadora Cristina Antunes, foi publicado em 2017 e reúne o conjunto das notas manuscritas por ele nos livros que constituem sua biblioteca. A obra é fruto do levantamento, registro e transcrição das anotações feitas nos próprios livros, notas manuscritas em papéis avulsos, recortes de jornais, recortes de catálogos e notas de venda emitidas por livreiros.
Publicado em 2018, o segundo título, Cartas de Rubens Borba de Moraes ao Livreiro Português António Tavares de Carvalho, organizado por Martins Filho, traz um conjunto de cartas trocadas com o livreiro português, onde se acompanha parte significativa da formação da Biblioteca Brasiliana de Moraes. Nas cartas, o bibliófilo relata a importância de cada obra desejada, adquirida ou não, traçando um amplo painel dos interesses que nortearam o colecionador. A leitura da correspondência vai ainda além da bibliofilia, mostrando a relação de Moraes com outras pessoas e colecionadores e sua visão do Brasil.
Segundo Martins Filho, além de homenagear Moraes, os livros preservam seu legado e são uma forma de levar ao conhecimento do grande público a sua Biblioteca Brasiliana, já que a BBM é uma biblioteca de pesquisa, e não de consulta. “É importante que as pessoas possam conhecer esse trabalho e o acervo da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin.”
O Bibliófilo Aprendiz, de Rubens Borba de Moraes (294 págs., 80,00); Rubens Borba de Moraes: Anotações de um Bibliófilo, de Cristina Antunes (136 págs., R$ 78,00); e Cartas de Rubens Borba de Moraes ao Livreiro Português António Tavares de Carvalho, organização de Plinio Martins Filho (544 págs., R$ 79,00); todos editados pelas Publicações BBM. Mais informações no site.
Mafra, Coimbra, Rio de Janeiro. Uma biblioteca que começou por servir um convento, outra que é universitária mas parece palaciana, e por último, a que nasceu como gabinete de leitura a propósito de um poeta português. E estão as três em The World’s Most Beautiful Libraries, uma edição que dá primazia às fotografias do italiano Massimo Listri. Para folhear com cuidado, que o livro pesa.
Texto por Lucinda Canelas
A biblioteca do Convento de Mafra. MASSIMO LISTRI/TASCHENO Real Gabinete Português de Leitura, no Rio de Janeiro. MASSIMO LISTRI/TASCHENA Biblioteca Joanina da Universidade de Coimbra. MASSIMO LISTRI/TASCHENCapa desta edição trilingue da Taschen. TASCHEN
Primeiro plano da introdução, assinada pelo historiador Georg Ruppelt. TASCHEN
Biblioteca do mosteiro beneditino de Kresmünster, Áustria. MASSIMO LISTRI/TASCHEN
A mais antiga das bibliotecas fotografadas, a da abadia beneditina de São Galo, na Suiça. MASSIMO LISTRI/TASCHEN
Plano aberto na abadia de Metten, Alemanha. MASSIMO LISTRI/TASCHEN
A biblioteca do Convento de Mafra. MASSIMO LISTRI/TASCHEN
Sempre que os jornais internacionais publicam listas das mais belas bibliotecas do mundo, e fazem-no com frequência, é certo que nesse clube altamente exclusivo há pelo menos um membro português. E logo entre os primeiros. Desta vez, e ainda que o pretexto do mais recente ranking seja um livro — The World’s Most Beautiful Libraries (Taschen, 2018), um coffee table book que convida à viagem e que é em si mesmo um destino para bibliófilos — há três, e um deles “mora” no Brasil: o Real Gabinete Português de Leitura, no Rio de Janeiro, uma instituição que recentemente passou por grandes dificuldades e cuja actividade se deve hoje em boa parte a portugueses e lusodescendentes; a Biblioteca Joanina, em Coimbra; e a do palácio-convento de Mafra.
Este volume de 550 páginas é uma edição trilingue (inglês, alemão e francês) em que a fotografia do florentino Massimo Listri assume todo o protagonismo, relegando para segundo plano os textos de Georg Ruppelt, director de bibliotecas e autor de dezenas de monografias em torno da história do livro e da cultura, e de Elisabeth Sladek, uma académica que se especializou em arte e arquitectura do barroco.
Listri, que se tem vindo a dedicar à fotografia de arquitectura, sobretudo a que regista os interiores luxuosos de palácios e villas, e publicou já 70 livros, parece ter encontrado no universo das mais antigas e notáveis bibliotecas dos continentes europeu e americano um desafio à altura da sua experiência. O resultado do seu trabalho, associado aos textos breves de Ruppelt e Sladek (há um pequeno artigo para cada biblioteca), pode ver-se neste volume que apresenta ao leitor 55 espaços, alguns deles com áreas de acesso muitíssimo restrito, como a Biblioteca Apostólica Vaticana, na cidade dos Papas, fundada por volta de 1450 (o actual edifício é do final do século XVI) e paradigma da associação destas instituições à investigação e à produção de conhecimento ao longo dos séculos.
O artigo do ensaísta Davi Lago para o blog nesta semana
Por Davi Lago
O Dia do Leitor é comemorado no Brasil em 7 de janeiro. A 4ª edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil desenvolvida pelo Instituto Pró-Livro considera “leitor” aquele que leu pelo menos um livro nos últimos três meses – inteiro ou em partes. Os dados de 2016 revelam que o brasileiro lê em média 2,43 livros por ano. O baixo índice de leitura é uma de nossas mazelas históricas e aponta para o empobrecimento dos debates brasileiros. Por óbvio, o repertório amplo de leituras contribui para o amadurecimento do espírito crítico do cidadão. O que é a realidade senão a leitura que fazemos dela?
Conforme a pesquisa, entre as principais motivações que impulsionam os leitores brasileiros estão: o gosto pela leitura (25%), atualização cultural (19%), distração (15%), motivos religiosos (11%), crescimento pessoal (10%), exigência escolar (7%) e atualização profissional ou exigência do trabalho (7%). Todas essas motivações integram o papel civilizador da leitura. Já a primeira razão apresentada pelos leitores como obstáculo para o aumento da leitura é a falta de tempo (43%).
De fato, ler não é tão simples. Ler não é uma atividade passiva, estática, mas dinâmica. Do mesmo modo que uma biblioteca não é um mero depósito silencioso de livros. Na leitura há o cruzamento de dois mundos e a possibilidade de se perceber as coisas através de outro ponto de vista. Um livro é um mundo: o mundo de leituras de seu autor dialogando com o mundo do leitor. Por isso, a leitura nunca será igual para dois leitores. Este processo é, sobretudo, civilizador. Como afirmou Mario Vargas Llosa ao receber o prêmio Nobel de Literatura em 2010: “um mundo sem literatura se transformaria num mundo sem desejos, sem ideais, sem desobediência, um mundo de autômatos privados daquilo que torna humano um ser humano: a capacidade de sair de si mesmo e de se transformar em outro, em outros, modelados pela argila dos nossos sonhos”.
Sem dúvida, o Brasil avançou muito nos últimos trinta anos em termos de cidadania. A garantia dos direitos do cidadão foi uma preocupação central na elaboração da Constituição Federal de 1988. Nossa Carta Magna eliminou, por exemplo, um grande obstáculo à universalidade do voto, tornando-o facultativo aos analfabetos. Também conseguimos reduzir os números do analfabetismo: em 1991 a taxa de brasileiros com mais de 15 anos de idade analfabetos era de 19,7%, número reduzido para 7,2% em 2017 conforme dados do IBGE. Trinta anos depois da promulgação da Constituição temos muitos eleitores, mas ainda carecemos de leitores. Ler é viver e conviver, é um esforço em compreender o outro. Com mais leitura a sociedade brasileira tecerá sua multiplicidade mais civilizadamente. Feliz ano novo e boas leituras!
* Davi Lago é escritor, mestre em Filosofia do Direito e ativista humanitário. Colabora com o blog com textos sobre marcos civilizatórios e sociedade contemporânea.
Relançado pela BBM, “O bibliófilo aprendiz”, de Rubens Borba de Moraes é um tratado de clássico sobre a paixão inspirada pelos livros
Por Marcello Rollemberg
Encadernações com as Armas do Império do Brasil, pertencentes ao acervo BBM Foto: Reprodução/Acervo BBM
O paulista Rubens Borba de Moraes (1899-1986) era um homem multifacetado. Pesquisador, historiador, bibliotecário – foi diretor da Biblioteca das Nações Unidas em Nova York –, participante ativo do movimento modernista, só não participou da Semana de Arte Moderna de 1922 ao lado dos amigos Mário e Oswald de Andrade por estar doente. Mas o que ficou para o universo da cultura, seu grande epíteto, foi que Rubens Borba de Moraes era “bibliófilo”. Ou seja, mais do que um colecionador, o intelectual que também foi professor da Universidade de Brasília (UnB) era um homem que amava os livros.
Dessa sua paixão nasceu talvez a sua obra mais representativa, aquela que está definitivamente associada a seu nome: O bibliófilo aprendiz, originalmente publicado em 1965 pela então poderosa Companhia Editora Nacional.
Página de rosto de Relation Succinte et Sincere, de Martin Nantes, pertencente ao acervo BBM – Foto: Reprodução/Acervo BBM
Trabalho essencial para aqueles que querem mais do que livros sendo cobertos de poeira nas estantes, esse livro é uma espécie de manual de como achar as joias raras perdidas em prateleiras de alfarrabistas e de como conservá-las, de como se apaixonar para nunca mais por primeiras edições. Trata-se de um livro de bibliófilo para bibliófilos, aprendizes ou não. Como afirmou ele no prefácio à edição original, “não perca tempo em ler essa prosa fiada de um velho bibliófilo quem não gosta de conversar sobre livros raros, quem não dá a menor importância a uma primeira edição, quem não pretende colecionar”. Talvez um pouco ranheta, a frase faz todo o sentido.
Como faz todo o sentido que O bibliófilo aprendiztenha acabado de ganhar sua quinta reedição, dessa vez pela Publicações BBM, braço editorial da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM), justamente ela que leva o nome do maior bibliófilo que o Brasil já teve – e, não à toa, grande amigo de Borba de Moraes.
A edição – muito bem cuidada, a quatro cores e em bela capa dura vermelha – tem apresentação do editor (e também bibliófilo, claro) Cláudio Giordano. É Giordano, inclusive, que tira um pouco a ranhetice da frase de Borba de Moraes sobre possíveis leitores de seu livro e passa a atrair outros. “Recomendo encarecidamente que além dos aficionados ao livro, não percam a oportunidade de percorrer essas páginas sobretudo aqueles para os quais o livro não passa de objeto de leitura esporádica”, escreve o dublê de editor e apaixonado por livros. “Pois, o que se tem nele não é a apologia do livro feita por um colecionador obcecado, querendo provar que escolheu o melhor lazer do mundo e buscando por isso aliciar novos colecionadores e futuros bibliófilos”, continua ele, para concluir: “Em linguagem despojada, bem humorada, discorre o autor sobre a arte de colecionar como uma opção, entre muitas, de lazer divertido e apaixonante”.
Flor de sangue , obra de Valentim Magalhães, romance raro e procurado por bibliófilos em virtude de sua errata – Foto: Reprodução/Acervo BBM
Frontispício de Chronica da Companhia de Iesv na Provincia de Portugal…, de P.M. Balthazar Tellez, pertencente ao acervo BBM – Foto: Reprodução/Acervo BBM
Relação dos despachos publicados na Corte…, primeira das publicações da Impressão Régia, pertencente ao acervo BBM – Foto: Reprodução/Acervo BBM
Foto: Reprodução/BBM
É uma bela e importante sugestão, ainda mais nesse mundo de realidade e amizades virtuais, no qual o efêmero e o transitório estão a um toque na tela de LED, mas nunca ao alcance das mãos. A reedição de O bibliófilo aprendiz possibilita, para quem quiser, essa reconciliação com dois elementos que pareciam estar fadados a museus, mas estão cada vez mais presentes e importantes na vida de todos: o papel e o livro. E sua combinação mais luxuosa, o livro em papel – com toda a textura, cheiros e sensações que um objeto assim pode transbordar.
Neste livro, a autora busca explicar como os quadrinhos se comunicam e criam o significado, com destaque para dois aspectos da linguagem. Primeiro, sua qualidade pictórica, que recebe mais ênfase em relação aos elementos verbais-textuais. Em seguida, a autora enfoca a narrativa e suas características nos quadrinhos, assim como a análise literária proporcionada por eles.
A “estrutura narrativa” refere-se ao potencial das imagens, às funções narrativas dos quadros e à sua sequência, além dos conceitos narratológicos mais tradicionais.
Barbara apresenta uma fundamentação para a maneira como os quadrinhos estruturam suas narrativas. Em cada nível de significação, eles se apoiam em lacunas e ausências para construir sentido e guiar o leitor em uma experiência significativa.
O livro tem prefácio do professor e pesquisador Waldomiro Vergueiro e é publicado com o Observatório de Histórias em Quadrinhos da ECA-USP.
Marina Macambyra explica que, há alguns anos, os alunos passaram a procurar o serviço da Biblioteca para tirar dúvidas em relação a questões de normalização de documentos específicos. “As normas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) e as Diretrizes USP têm muitas orientações e exemplos de referências e de citações, mas têm poucos exemplos e poucas explicações a respeito de filmes, vídeos do Youtube, músicas, partituras”, afirma Marina. Documentos com que o aluno da ECA trabalha frequentemente.
Pensando nisso, além de criar um manual que contempla as referências e citações que não estão claras nas norma ABNT e nas Diretrizes USP, a Biblioteca também produziu um treinamento presencial para normalização.
“A gente fez uma apresentação para ser usada no treinamento presencial e, se a pessoa quiser, pode ver a apresentação que está disponível no site e depois tirar dúvidas com a gente, marcando uma hora”, explica a bibliotecária.
O Manual de Normalização da Biblioteca da ECA: complementar às Diretrizes USP (ABNT) apresenta sugestões para citar vídeos do Youtube, tweets, páginas do Facebook, séries, partituras, entre outros materiais, além de respostas para algumas dúvidas frequentes.
Organizado por Luísa Massarani e Eliane Monteiro de Santana Dias, a obra reúne textos em que José Reis, ícone da divulgação científica brasileira e um dos fundadores da SBPC, discute as formas e possibilidades de comunicar e popularizar a ciência
A SBPC disponibiliza para download gratuito o livro “José Reis: Reflexões sobre a divulgação científica”. A publicação foi lançada em julho, durante a 70ª Reunião Anual da SBPC, em Maceió, e faz parte das comemorações do septuagésimo aniversário da entidade. Organizado pela jornalista e pesquisadora do Núcleo de Estudos da Divulgação Científica do Museu da Vida, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Luísa Massarani, e Eliane Monteiro de Santana Dias, gestora da Biblioteca de História das Ciências e da Saúde – Casa de Oswaldo Cruz, o livro reúne textos em que o médico, pesquisador, jornalista e educador José Reis, ícone da divulgação científica brasileira e um dos fundadores da SBPC, discute as formas e possibilidades de comunicar e popularizar a ciência.
A obra baseia-se no acervo composto por cerca de 9500 itens, doado pela família de Reis à USP e posteriormente transferido para a Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz. Além de resgatar informações sobre o jornalista e cientista, o acervo resgata também a história da ciência brasileira e da divulgação científica nacional. Para o livro, foram selecionados 16 textos escritos entre 1954 e 1984, que o próprio José Reis havia guardado entre seus documentos pessoais.
Alguns desses artigos abordam questões específicas, como jornalismo científico, feiras de ciências e a relação entre divulgação científica, ensino e museus de ciência. As autoras destacam entre essas raridades, um documento histórico, pouco conhecido, com os estatutos de um museu de ciência que foi criado, no papel, em São Paulo, em 1954, cujo processo Reis participou, mas nunca chegou a funcionar.
“Chama a atenção o caráter contemporâneo das questões discutidas em seus textos, colocando em debate os objetivos da divulgação científica, porque divulgar ciência, a necessidade de os cientistas engajarem com a sociedade, o imaginário social da ciência e dos cientistas (baseados em estereótipos), entre outros tópicos. O tom pessoal permeia seus artigos, o que permite, a você, leitor e leitora, dialogar com Reis”, ressaltam as autoras, na apresentação da obra.
José Reis participou da criação da SBPC, em 1948, e foi seu primeiro secretário-geral. Foi ainda criador da revista Ciência e Cultura, em 1949. Teve também uma longa atuação de 55 anos no Grupo Folha – de 1947 (ainda na Folha da Manhã), até 2002, ano de sua morte, na Folha de S. Paulo. Em reconhecimento à importância de seu trabalho, o CNPq criou em 1978 um prêmio nacional que leva o seu nome, o Prêmio José Reis de Divulgação Científica, concedido a pessoas e instituições que contribuem significativamente para a divulgação científica no Brasil.
A obra é uma realização da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz, do Instituto Nacional de Comunicação Pública, da Ciência e Tecnologia e da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
Trabalho no câmpus Botucatu durou 5 meses e foi apresentado em encontro de bibliotecários
Por ACI Unesp
A história da reorganização do espaço físico da biblioteca do câmpus de Botucatu da Unesp virou o livreto eletrônico “Biblioteca no País das Mudanças”, em que os cinco meses de trabalho para a mudança do layout do espaço são resumidos de forma lúdica para que a comunidade entenda os conceitos que deram base ao trabalho.
Norteada pela nova diretriz de tornar a biblioteca um espaço aconchegante que promova o desenvolvimento do ensino, da aprendizagem, da investigação e da criatividade, a mudança do layout fez uma seleção criteriosa das publicações, trocou estantes e, ao final, abriu espaços para 50 novas mesas de estudo, além de tatame com almofadas e pufes para descanso dos estudantes.
A avaliação do acervo e a reorganização do espaço físico foram as primeiras iniciativas de uma série de ações necessárias para que a biblioteca do câmpus Botucatu fosse adequada ao novo conceito que está norteando as mudanças nesses espaços físicos da Unesp.
O trabalho realizado em Botucatu e a forma como ele foi relatado à comunidade da Unesp, por meio de um livreto eletrônico ilustrado, foram apresentados no 2º Encontro de Bibliotecários da Região Central do Estado de São Paulo (Enbiesp), realizado em maio em São Carlos.
A publicação foi produzido pela Divisão Técnica de Biblioteca e Documentação do câmpus de Botucatu, sob a direção de Sulamita Selma Clemente Colnago, e está disponível na internet.
Ex-diretor do Departamento de Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas do Ministério da Cultura – além de intelectual de vastíssima formação –, o autor faz provocações sobre o papel social dos bibliotecários como mediadores do saber A Biblioteca de Foucault já nasce como uma obra de referência, título indispensável para um novo entendimento da Biblioteconomia no Brasil. A imagem da biblioteca como lugar de silêncio, pontualidade e quietude pode parecer inquestionável, quase autoevidente. Mas, como foi demonstrado por Michel Foucault, toda atividade que faça a mediação entre saberes e sujeitos guarda atrás de si um sistema de relações de poder responsável por determinar a sua dinâmica. A Biblioteca de Foucault escancara as ambições de controle que animam parte da biblioteconomia tradicional: estabelecer quais livros merecem constar do cânone, que leitores podem ter acesso a eles, como as obras precisam ser lidas. Mas a revelação desse sistema não é em nada alarmista. Conhecer o dinamismo que subjaz à prática biblioteconômica implica, antes, assumir o compromisso ético-estético-político de tornar as bibliotecas espaços acessíveis, inclusivos, acolhedores, pluralistas, construtivos. Daí o livro constituir-se de “reflexões sobre ética, poder e informação” ou, mais concretamente, de 22 crônicas-manifestos que a um só tempo radiografam a condição da leitura e dos livros no Brasil atual e propõem medidas para enriquecer a produção e a disseminação de informação no país. A autoria de tais provocações é do bibliotecário Cristian Brayner, mestre em Biblioteconomia, doutor em Literatura, pós-doutorado em História e ex-diretor do Departamento de Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas do Ministério da Cultura.
Os capítulos da obra – à exceção do primeiro, que consiste em uma entrevista – têm seus assuntos-chave revelados já pelos títulos: liberdade, poder, neutralidade, cooperação, opressão, violência, ética, luta, felicidade, amargura, celebração, medo, beleza, coragem, ignorância, caráter, verdade, gratidão, respeito, progresso, empatia. Trata-se da adaptação de palestras, artigos e discursos recentes do autor, incrementados por alguns escritos inéditos. Se os temas parecem inesperadamente abstratos para um livro de ciência da informação, este espanto prova o êxito de uma das primeiras intenções de Brayner: colocar sob suspeita a premissa de que a biblioteconomia pode ser praticada como pura técnica, sem nenhum diálogo com a teoria social. A desmitificação mais urgente a se empreender é a do pressuposto segundo o qual a biblioteca é um lugar neutro. Bem ao contrário, a seleção e a disposição do acervo, a atitude dos bibliotecários ante os leitores, a aparência dos prédios e do mobiliário, todos esses elementos submetem os profissionais da informação ao constante risco de se portarem como censores. Ao mesmo tempo, a função concede a tais trabalhadores a oportunidade de serem disseminadores dos saberes plurais, e situa as instituições da cultura na posição estratégica de subversoras da ordem estabelecida, com as exclusões sistêmicas que esta institui e fomenta.
Cristian Brayner acredita no poder da leitura tradicional de libertar dos preconceitos. Ele reitera aquele clamor de Edson Nery da Fonseca – um dos fundadores da biblioteconomia no Brasil – para que houvesse “bibliotecários pós-graduados”, isto é, bem instruídos e de aguçada consciência crítica. Além de estar ele próprio entre os profissionais desse tipo (o que se reflete na erudição e beleza de sua prosa), Cristian atenta às implicações desse ideal: conclama por seu turno que os profissionais da informação se encarem como praticantes de uma vocação, mais que de um ofício. Vocação, diga-se de passagem, nem um pouco trivial: trata-se de mediar a sociedade e o conhecimento considerado canônico. O uso eticamente adequado desse poder consistirá em diversificar tanto um polo como o outro, e em tornar as bibliotecas algo mais do que locais de consumo e adestramento: fazê-las locais de encontro, descobertas, invenção. Locais que enriqueçam a formação dos sujeitos que compõem a democracia, num movimento inverso ao da burocracia, cuja natureza é bloquear o avanço democrático. Em plena era da informação, não é exagero dizer que o direito ao uso das bibliotecas integra o direito à cidadania; por outro lado, as bibliotecas não podem ignorar que só haverá a demanda por seu uso se elas se mostrarem acolhedoras. Como todas as instituições da sociedade, cada biblioteca é relevante, mas nenhuma é em si indispensável: necessita sempre criar e demonstrar o seu valor. A leitura d’A Biblioteca de Foucault é o início ideal para todos os profissionais empenhados em responder a esse desafio.
O bate-papo com o autor, seguido de sessão de autógrafos, acontecerá no dia 16 de agosto, a partir das 19h, na Biblioteca Mário de Andrade – uma das mais importantes bibliotecas de pesquisa do país, localizada no centro da cidade de São Paulo.
O autor
Cristian Brayner é graduado em Filosofia, Biblioteconomia, Tradução, Direito e Letras (Língua e Literatura Francesas). Venceu, com sua dissertação de mestrado em Ciência da Informação, o Concurso Latino Americano de Investigación em Bibliotecología, Documentación, Archivistica y Museología Fernando Báez (Eudeba, 2008). Ganhou o Prêmio Casa de las Américas com a obra Devotos e Devassos: representação dos padres e beatas na literatura anticlerical brasileira (Edusp, 2014), fruto de seu doutorado em literatura e práticas sociais. Foi bibliotecário do Superior Tribunal de Justiça e diretor do Departamento de Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas do Ministério da Cultura. Atualmente é bibliotecário da Câmara dos Deputados. Dedica-se ao estudo das políticas públicas de livro, leitura, literatura e bibliotecas.
Serviço:
Evento de lançamento do livro A Biblioteca de Foucault – Reflexões sobre ética, poder e informação, de Cristian Brayner: bate-papo com o autor, seguido de sessão de autógrafos.
Data: 16/08/2018
Horário: a partir das 19h
Local: Biblioteca Mário de Andrade – Saguão
Rua da Consolação, 94 – Consolação, São Paulo – SP
Professora da USP, autora analisa as representações de viajantes da América do Sul à Europa e Estados Unidos
Texto por Leila Kiyomura
Detalhe da capa do livro Viagens e Relatos, de Stella Maris Scatena Franco: The Tarascon Diligence, 1888, de Van Gogh – Imagem: via vincentvangogh.org
Viagens e Relatos – Representações e Materialidade nos Périplos de Latino-Americanos pela Europa e pelos Estados Unidos no Século XIX é o título de novo livro da coleção Entr(H)istória, da Editora Intermeios. A autora, Stella Maris Scatena Franco, aborda o tema apresentando uma reflexão pontual sobre o tema, que resulta de uma pesquisa iniciada em 2009 e concluída em 2017. É fruto de sua tese de livre-docência, realizada no Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP.
Cartão de visita de Soledad Acosta de Samper, uma das autoras de relatos de viagem destacadas no livro, que faz parte do Acervo Digital da Biblioteca Nacional de Colombia – Foto: Reprodução / Viagens e Relatos, de Stella Maris Scatena Franco
O grande mérito do trabalho, segundo aponta, no prefácio, a professora Mary Anne Junqueira, professora do Departamento de História da FFLCH e do Instituto de Relações Internacionais (IRI) da USP, é “reunir duas temáticas importantes que os relatos de viagens do passado ensejam e que nem sempre andam juntas nas investigações acadêmicas”. Explica: “Trata-se das articulações entre as condições materiais, concretas, da viagem e as representações dos lugares visitados”.
Mary Anne explica que, desde as rememorações dos 500 anos da chegada de Colombo às Américas, em 1992, e da discussão sobre a crise dos paradigmas, foi registrado um maior afluxo de trabalhos nas ciências humanas, em especial entre os historiadores. “Recentemente, autores retomaram os relatos de viagem como fontes privilegiadas para tratarem também das condições concretas que permitiram os deslocamentos do passado.”
Stella Maris, logo no primeiro capítulo, apresenta os relatos de viagem que explorou no trabalho. Ela analisou 12 relatos de viagem, escritos por homens e mulheres de diferentes origens. Entre esses relatos estão o Diario de Viaje a Estados Unidos de América, de José Miguel Carrera, Viajes en Europa, Africa i América, de Domingo Sarmiento, Diario de Viaje a Europa, de Rómulo José Yegros, No Paiz dos Yankees, de Adolpho Caminha, e Viaje a España en 1892, de Soledad Acosta de Samper.
“Do ponto de vista metodológico, também busquei conciliar tendências.”
Cópia da capa original do diário do chileno Izidoro Errázuris, edição de 1948 – Foto: Reprodução/ Viagens e Relatos, de Stella Maris Scatena Franco
A autora Stella Maris propõe, em seu trabalho, aliar a análise da materialidade das viagens à das representações e discursos produzidos pelos viajantes, devido à riqueza das fontes para ambos os âmbitos. “Os relatos, em grande parte, foram produzidos a partir de experiências de indivíduos deslocados de suas realidades de origem e que frequentaram a realidade de outrem”, argumenta. “Com isso, tornaram-se depositários de narrações sobre ocasiões e fatos históricos, muitas vezes, vistos e vivenciados efetivamente. No entanto, nenhuma narração, por mais objetiva que se pretenda, está livre da subjetividade do autor, que pode tanto vir a acrescentar impressões quanto a omitir detalhes.”
Capa do livro Viagens e Relatos, de Stella Maris Scatena Franco – Reprodução
A autora acredita que os relatos, pela experiência do viajante, mostram o cotidiano e suas práticas, proporcionando vantagensao estudo das visões de mundo daquele que empreende a viagem. “Do ponto de vista metodológico, também busquei conciliar tendências. Como já indicado, as análises voltadas mais exclusivamente para o âmbito discursivo parecem enfocar, em geral, poucos autores e obras, realizando um exame mais intensivo, em que se perscrutam intencionalidades, possibilidades de sentido que podem ser dadas a certas assertivas. Já uma análise mais focada no âmbito da história social costuma ser mais extensiva, propondo um trabalho quase seriado, efetuado a partir da leitura de vários relatos.”
Viagens e Relatos – Representações e Materialidade nos Périplos de Latino-Americanos pela Europa e pelos Estados Unidos no Século XIX, de Stella Maris Scatena Franco, Editora Intermeios, 296 páginas, R$ 40,00.
Falar, ouvir, ler e escrever são habilidades que permitem a socialização por meio da língua. Este livro trata das duas últimas. É destinado principalmente a estudantes dos cursos de Letras e de Pedagogia e a alunos de cursos superiores em que constam do currículo disciplinas como Língua Portuguesa, Práticas de Leitura e Escrita e Redação.
Para alcançar o objetivo proposto, que é fornecer subsídios para a formação de competentes leitores e produtores de texto, parto do princípio de que ler e escrever não devem ser trabalhados separadamente, pois são duas faces de uma mesma moeda. Escreve-se para ser lido e só se lê o que foi escrito, por isso este livro integra leitura e escrita. Procuro, por meio da leitura compreensiva, levar o estudante a identificar os procedimentos estratégicos usados em gêneros literários para aplicá-los na redação de textos próprios. A proposta é aprender a ler para aprender a escrever.
O livro foi escrito de forma a facilitar a leitura e a apreensão dos conteúdos. Como não é um livro para especialistas, mas para estudantes, muitos dos quais ainda não familiarizados com os conceitos dos estudos da linguagem, procurei manter uma escrita clara, sem rodeios e complicações, sem abrir mão do rigor conceitual.
Há uma regra simples, antiga e verdadeira que diz que para escrever bem é preciso ler muito. Mas ler o quê? Quando se quer aprender algo, deve-se procurar o melhor mestre, aquele que tem mais coisas para ensinar. Para a escrita e a leitura, não tenho a menor dúvida em afirmar que o mestre dos mestres é a literatura. Não é por acaso que essa disciplina é chamada de a arte da palavra. Os escritores de obras literárias são aqueles que com mais maestria trabalham a palavra, produzindo textos que sobrevivem ao tempo e se tornam modelos de boa escrita.
Uma das formas de aprender é por imitação. Aprende-se fazer observando como outros fazem. Nesta obra, apresento procedimentos adotados por bons autores literários para que se possa aplicá-los em produções escritas, produzindo textos bem formados. Por outro lado, embora considere a prática essencial para o aperfeiçoamento das habilidades de leitura e escrita, entendo que uma base teórica favorece o aprendizado, por isso exponho de maneira didática conceitos relevantes das teorias da linguagem e do discurso.
Neste livro, quatro são os gêneros literários usados como ponto de partida para a produção de textos diversos: a crônica, o conto, a poesia e o romance. De cada um deles, destaco características a serem transpostas na produção de textos.
Da crônica, indico o fato de ser um gênero que trata de temas atuais com leveza e brevidade. Por meio da leitura de crônicas, aprende-se a produzir textos pessoais. Do conto, destaco a concisão. Um bom texto deve ser objetivo, direto, não deve deixar nada sobrando ou faltando. O conto ensina como fazer isso. Quanto à poesia, ressalto o plano da expressão. Com esse gênero, aprende-se a explorar os recursos da língua que permitem produzir textos originais e criativos.
O romance é o mestre dos mestres, com ele aprende-se a produzir textos mais longos, a instalar várias vozes no texto e organizá-las, a ordenar os fatos temporalmente, a construir personagens, a caracterizar ambientes e muito mais.
A dificuldade que muitas pessoas têm de escrever, na maioria das vezes, não decorre da falta de ideias, mas de como transformá-las num texto que tenha sentido para quem lê. A literatura é a grande mestra que ensina o como dizer. Não é por acaso que os grandes escritores são, antes de tudo, leitores literários.
Um livro que se pretenda didático não pode ficar restrito à teoria, por isso ela se faz acompanhar de exemplos que possibilitam observar na prática os conceitos estudados. Em todos os capítulos, a teoria é aplicada no comentário a um texto. Informações objetivas e relevantes são destacadas em forma de boxes.
Todos os capítulos apresentam sugestões de atividades para que o leitor ponha em prática o que aprendeu. Encerrando cada capítulo, a seção “Sugestões de leituras” traz indicações de obras que permitem o aprofundamento do assunto estudado.
O livro está organizado em oito capítulos, além desta “Apresentação” e das “Considerações finais”, em que, a título de conclusão, se faz um balanço dos principais conteúdos discutidos. Há ainda um “Glossário”, em que se apresentam, em forma de verbetes, termos técnicos utilizados no livro e, por fim, a “Bibliografia”.
No capítulo “Ler e escrever: a especificidade do texto literário”, discuto as peculiaridades do texto literário, isto é, o que faz com que seja diferente dos demais. Esse capítulo ressalta, principalmente, o conceito de texto e a relação que os textos guardam entre si. O capítulo “A produção escrita” volta-se especificamente para a elaboração da escrita, apresentando os conceitos de linguagem e língua. Chamo especial atenção para o texto escrito e suas especificidades. Os gêneros literários e suas características são tratados nos capítulos “A crônica”, “O conto”, “A poesia” e “O romance”. Em “Tipologia textual”, trato dos tipos de texto: o descritivo, o narrativo, o argumentativo e o expositivo. O capítulo “Leitura e escrita e novas tecnologias” é todo dedicado à leitura e à escrita de textos na era digital. Nele, apresento a noção de hipertexto, suas características e orientações sobre textos que circulam por meio de novos suportes, como o e-mail, o WhatsApp e o Messenger.
Ernani Terra é doutor em Língua Portuguesa pela PUC-SP, onde defendeu tese sobre leituras de professores. Desenvolve pesquisas sobre leitura do texto literário e sobre estudos de linguagem para ensino de Português. Exerce o magistério desde 1974, lecionando nos ensinos fundamental, médio e superior as disciplinas Língua Portuguesa, Literaturas de Língua Portuguesa, Práticas de Leitura e Escrita e Metodologia do Trabalho Científico. É autor de obras didáticas, paradidáticas e artigos acadêmicos nas áreas de Língua Portuguesa, Literatura e Leitura e Produção de Textos. É coautor do livro Ensino de língua portuguesa: oralidade, escrita e leitura e autor de Leitura do texto literário, ambos publicados pela Editora Contexto.
EL PAÍS indica onze livros, entre clássicos e lançamentos, sobre o esporte nacional
Considerando a importância do futebol para a cultura brasileira, até que há poucos livros que tratam do tema no país. Por isso, o EL PAÍS preparou uma lista com o que há de melhor de novos e velhos clássicos que tratam do esporte nacional, seja em crônicas, quadrinhos, história, jornalismo, ensaios ou jornalismo. Aproveite em quanto é Copa do Mundo para ler alguns dos livros abaixo.
À Sombra das Chuteiras Imortais
Nelson Rodrigues (Companhia das Letras)Quando o assunto é futebol, talvez esse seja o livro mais importante já lançado no Brasil. Coletânea de crônicas publicadas por Nelson
entre 1955 e 1970, À Sombra das Chuteiras Imortais pega a transformação do Brasil no futebol, quando o país passa do trauma do Maracanazo de 1950, quando perdeu a final da Copa para o Uruguai em pleno Rio de Janeiro, para ser a seleção mais badalada do mundo, tricampeã com títulos em 1958, 1962 e 1970. É neste volume, que está, aliás, a famosa crônica que fala do “complexo de vira-lata” do brasileiro, expressão que transcendeu o futebol e ao longos dos anos foi lembrada para explicar uma série de comportamentos nacionais. Infelizmente, o livro está esgotado e sem reedições há alguns anos, contudo, é possível encontrá-lo em sebos sem muita dificuldade.
A Estrela Solitária
Ruy Castro (Companhia das Letras)
Verdadeiro clássico do jornalismo brasileiro, a biografia, publicada em 1996, refaz a trajetória de Garrincha, um dos maiores ídolos do futebol brasileiro. Enquanto jogou, entre os anos 1950 e 1960, o “anjo de pernas tortas” praticamente inventou o drible no futebol, criando jogadas que desconcertavam os adversários. Levou risos e aplausos para todas as arquibancadas em que jogava, mas desde que saiu a pequena cidade de Pau Grande, no Rio de Janeiro, onde foi descoberto, teve uma vida pessoal conturbada, marcada pelo alcoolismo. Ruy Castro reconstrói a trajetória única desse ídolo brasileiro que, ao lado do Pelé, foi um dos maiores que o futebol já viu.
O Drible
Sérgio Rodrigues (Companhia das Letras)
O livro começa com uma longa descrição de um dos lances mais memoráveis da história do futebol: na Copa de 1970, no México, Pelé arranca livre e, apenas usando o mudando a trajetória de sua corrida, engana o lendário goleiro uruguaio Mazurkiewicz. A bola vai para um lado, Pelé para o outro e o arqueiro permanece no meio, estatelado. Depois começa o reencontro. O jogador vai em busca da bola, chuta e ela sai triscando o travessão direito. O lance, um dos maiores da história de futebol, é uma verdadeira obsessão de Murilo Filho, um famoso cronista esportivo carioca que tem uma relação conflituosa com seu filho Neto, que não gosta de futebol. O romance, lançado em 2013, que tem a Copa do Mundo de 1970 e o esporte como pano de fundo, fala da relação entre pai e filho no ritmo de uma partida de futebol.
Dando Tratos à Bola
Hilário Franco Junior (Companhia das Letras)
Autor de outro livro acadêmico sobre futebol, o A Dança dos Deuses, Hilário Franco Junior reúne neste volume, publicado em 2017, sessenta ensaios que misturam usam da história, sociologia, economia, antropologia e psicologia para explicar o jogo e seus aspectos culturais. Os textos falam do uso político do futebol, da importância das torcidas para as sociedades e da construção feita ao redor de clubes como o Corinthians ou Flamengo, conhecidos como times da “massa”. Historiador e professor da Universidade São Paulo Franco Júnior obteve seu pós doutorado em história medieval, mas sua paixão pelo futebol está muito bem representada em Dando Tratos à Bola.
Ode a Mauro Shampoo e Outras Histórias da Várzea
Luiz Antonio Simas (Mórula)
Aqui não há lugar para os grandes feitos já conhecidos internacionalmente. Sai Pelé e entra Mauro Shampoo, o “craque” do pior time do mundo, o pernambucano Íbis. Durante a carreira de atacante, que dividia com o ofício de cabeleireiro nos anos 1980, Shampoo marcou apenas um gol, uma marca única que Luiz Antonio Simas faz questão de lembrar. Ao lado da ode ao atacante, o autor, que é historiador, traça o perfil de outros times pequenos, derrotas gloriosas e conquistas dos times de várzea espalhados por todo o Brasil. Publicado em 2017, é um retrato romântico do que, talvez, há de mais romântico no futebol brasileiro: o improviso e a vontade de jogar.
Os Beneditinos
José Trajano (Alfagura)
Terceiro romance do jornalista José Trajano, o divertido livro conta a história de Zezinho, um repórter desempregado que encontra no pequeno Juventus, de São Paulo, o outro pequeno América, do Rio de Janeiro, seu verdadeiro time de coração. Com evidente fundo autobiográfico, afinal, Trajano é possivelmente o torcedor mais conhecido e fanático do América, o livro começa na capital paulista, mas é na memória da época de ouro do Rio de Janeiro, entre as décadas de 1950 e 1960, que grande parte de sua ação se desenrola. O túnel do tempo é acessado a partir do dia em que o narrador, Zezinho, encontra no jornal uma notícia sobre walking football, futebol andando. É o que ele precisava para tentar reunir seu antigo time de um colégio no bairro da Tijuca, zona norte do Rio de Janeiro.
Gigantes do Futebol Brasileiro
João Máximo e Marcos de Castro (Civilização Brasileira)
Um compêndio de nada menos de 439 páginas que, de certa forma, começou a ser escrito em 1965 e só acabou recentemente. Lá atrás, nos anos 1960, os autores publicaram o livro com o perfil de 13 atletas, esquecendo-se de dois dos maiores craques brasileiros: Didi e Ademir. Acabaram virando alvo de críticas até de João Saldanha, o então técnico da seleção. Mais recentemente, em 2011, tiveram a chance de reparar a injustiça. Incluíram os dois jogadores e mais sete craques atuais. Os perfis contam tudo: os anos de formação, principais características, pontos altos e baixos da carreira. Ao todo, são 21 jogadores perfilados: Friedenreich, Fausto, Domingos da Guia, Leônidas, Tim, Romeu, Zizinho, Heleno, Ademir, Danilo, Nilton Santos, Didi, Garrincha, Pelé, Gerson, Rivelino, Tostão, Falcão, Zico, Romário e Ronaldo.
O Outro Lado da Bola
Álvaro Campos (Record)
O futebol continua sendo um ambiente extremamente conservador e preconceituoso contra homossexuais. Além dos gritos homofóbicos das torcidas brasileiras e estrangeiras, um dos indícios mais claro do tabu da homossexualidade no esporte é o fato de que nunca, nunca mesmo, nenhum jogador brasileiro se declarou homossexual. Por isso, a graphic novelO Outro Lado da Bola, recém-lançada é tão importante. O livro conta a história de Cris, um jogador, ídolo de torcedores fanáticos, que resolve se declarar gay depois do assassinato brutal de um ex-namorado. A partir desse ponto, sua vida pessoal e profissional é virada do avesso e ele, mesmo de luto, tem de enfrentar o preconceito da diretoria e torcida de seu clube. Nada distante da realidade não é mesmo?
Tempos Vividos, Sonhados e Perdidos
Tostão (Companhia das Letras)
Eduardo Gonçalves de Andrade, o Tostão, é um caso à parte no futebol. Um dos maiores jogadores brasileiros da história, ele foi campeão mundial em 1970 e, logo depois, aos 26 anos, encerrou sua carreira profissional precocemente. Depois, virou médico, professor de medicina, comentarista de TV, escritor e colunista de jornais. Leitor voraz, ele é um dos únicos futebolistas que se dedicou a pensar o futebol e neste livro de 2016, revê as últimas seis décadas do futebol brasileiro, misturando suas análises e ideias ao seu espírito de espectador, torcedor e fã.
O Futebol Explica o Brasil
Marcos Guterman (Contexto)
Da origem popular e operária do Corinthians, logo depois do desembarque do futebol via Inglaterra no Brasil, em 1910, a Fernando Collor, que estendia seu poder político em Alagoas ao CSA, clube em que foi dirigente antes de se tornar um ex-presidente impichado. É assim, entrelaçando a história do esporte e história do Brasil, que Guterman vai didaticamente explicando o país através do que aconteceu em campo nos últimos cem anos. No livro, além da relação entre política e futebol também há espaço para que o autor aborde a longa linhagem de craques brasileiros e suas derrotas, fracassos e peculiaridades.
Veneno Remédio
José Miguel Wisnik (Companhia das Letras)
Futebol cabeça. Neste grande ensaio sobre o futebol brasileiro, o músico e escritor José Miguel Wisnik fala do jogo reinventado pelos brasileiros entremeando temas como “democracia racial”, “homem cordial” e antropofagia cultural do estrangeiro. Bem ao estilo do autor, o texto lança mão da psicologia, filosofia e crítica estética ao lembrar craques como Domingos da Guia, Pelé, Garrincha, Romário e Ronaldo.
Está disponível on-line o novo número da revista “Bibliotecas Universitárias: pesquisas, experiências e perspectivas”, que tem como destaque o papel das bibliotecas na efetivação da Agenda 2030 da ONU, um pacto internacional em prol da valorização da dignidade humana e do desenvolvimento sustentável.
Nessa edição da revista, estão presentes artigos sobre o papel das bibliotecas no desenvolvimento de competências informacionais, sobre a cultura informacional e digital dos alunos residentes na moradia estudantil da UFMG e reflexões acerca da segurança da informação.
Além disso, estão disponibilizados relatos de experiência, entrevistas e resumos de pesquisas de doutorado e mestrado recentemente desenvolvidas por servidores do Sistema de Bibliotecas da UFMG.
Na seção de entrevistas, Wellington Marçal de Carvalho fala sobre sua trajetória acadêmica e atuação como gestor da Biblioteca Universitária da UFMG na gestão 2014-2018. E Julio Díaz Jatuf, professor de Biblioteconomia e Ciência da Informação da Universidade de Buenos Aires, apresenta o conceito de biblioteconomia social e suas interfaces com a Agenda 2030 da ONU, com destaque para o acesso aberto à informação.
Clique aqui para conferir o conteúdo da revista na íntegra.
Organizado pela Comissão da Verdade de São Paulo, volume traz depoimentos de 40 pessoas que hoje têm entre 40 e 60 anos
Crianças filhas de perseguidos pela ditadura militar no Brasil eram fichadas pelo Dops – Reprodução
Os cabelos acastanhados desciam pelas costas estreitas até a cintura. Eram a expressão de vaidade da menina Zuleide Aparecida do Nascimento, de quatro anos. E uma das poucas coisas — além de uma boneca de plástico — que Zuleide supunha lhe pertencer quando foi presa por agentes da ditadura militar, em 1970. Talvez por isso a lembrança do corte de cabelo forçado que sofreu no Juizado de Menores seja uma das mais marcantes memórias de Zuleide.
— Aquilo foi uma violência muito forte para mim — afirma ela, aos 49 anos, emocionada.
Zuleide e os irmãos de 2, 6 e 9 anos foram “capturados” no Vale do Ribeira, onde sua família se engajara na luta armada contra o regime. Ali, Carlos Lamarca comandava quadros da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). Quando o grupo foi preso, as crianças também o foram. Acabaram fotografadas (Zuleide, na imagem acima, à esquerda, já com o cabelo cortado), fichadas e tachadas como “miniterroristas” no temido Dops (Departamento de Ordem Política e Social). E foram banidas do Brasil. Ao lado de 40 presos políticos, embarcaram em um avião em direção à Argélia, e depois a Cuba, em uma negociação da esquerda com o governo militar que envolveu o sequestro do então embaixador alemão Ehrenfried von Holleben. O retorno de Zuleide ao Brasil só seria possível 16 anos mais tarde.
— Sou uma pessoa sem identidade. Fui alfabetizada em espanhol. Meus documentos foram cassados, nem sei que dia nasci. Me sinto mais cubana do que brasileira — diz.
A história de Zuleide e de outras 39 pessoas que hoje têm entre 40 e 60 anos e foram crianças durante o regime militar estão contadas no livro “Infância roubada”, recém-lançado pela Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva. O material é uma tentativa de rememorar, a partir dos relatos das vítimas, como o Estado militar tratou os filhos de seus inimigos. São narrativas inéditas de um dos trechos menos conhecidos da história nacional. Em pouco mais de 300 páginas, ilustradas com fotografias e documentos históricos, há depoimentos e contextualizações dos casos.
“Infância roubada” tem valor historiográfico por sugerir um certo padrão de tratamento dispensado pelos militares às crianças. Além de serem banidas, ficaram presas com os pais, participaram de sessões de tortura das mães, como espectadores ou como alvos das sevícias. E tiveram a própria existência ameaçada. É o que relata Paulo Fonteles Filho, nascido em 1972, em um hospital militar. Seus pais foram presos por atividades comunistas. Fonteles conta que o pai assistiu a torturas da mãe, Hecilda, grávida de cinco meses. Antes do nascimento da criança, os agentes teriam dito a ela que “filho dessa raça não deve nascer”. Depois do parto, os militares teriam demorado a entregar o bebê para a família de Hecilda porque não encontravam algemas que coubessem nos pulsos do recém-nascido. “Eles deviam me achar bastante perigoso!”, ironizou Fonteles em seu depoimento.
Zuleide partilha com Fonteles a mesma impressão:
— Tratavam-nos como se o comunismo fosse uma doença hereditária, sem cura. Como se fosse uma praga que pudesse se espalhar pela sociedade. Éramos um risco.
Apesar das semelhanças entre os regimes militares brasileiro e argentino, as narrativas sugerem uma diferença fundamental entre eles no tratamento dispensado às crianças. Se, na Argentina, os militares entendiam os filhos de inimigos como uma espécie de riqueza nacional, uma matéria bruta valiosa a ser moldada para a construção da sociedade que desejavam, no Brasil, o Estado, de inspiração fortemente positivista, foi para o lado oposto. As argentinas presas grávidas eram tratadas com cuidado até o nascimento da criança. Casos de aborto eram raros e acidentais. Depois de nascidos, os bebês eram entregues a famílias da elite militar ou a seus apoiadores. O resultado foi mais de 500 crianças sequestradas e adotadas ilegalmente.
Já as forças repressivas brasileiras parecem ter revivido uma inspiração lombrosiana. O cientista italiano Cesare Lombroso fez sucesso entre a polícia nacional nos séculos XIX e XX ao defender que características físicas hereditárias — tais como o formato da orelha — eram capazes de predizer se um sujeito era louco ou bandido. Ao tratar o comunismo quase como doença congênita, os militares parecem ter flertado com a estapafúrdia teoria. Esta hipótese, discutida por especialistas, ainda demanda estudos mais profundos para ser comprovada ou descartada. A tarefa deve ser facilitada quando forem publicados os relatórios das comissões da verdade em curso.
Eliana Paiva (em pé), com os pais Eunice e Rubens, a avó Acary e os irmãos Vera, Ana Lúcia, Maria Beatriz e Marcelo – Divulgação / Arquivo de Família
O segundo trunfo de “Infância roubada” é dar voz a pessoas cuja dor nunca havia sido abordada. Muitos dos que se dispuseram a falar jamais tinham revelado completamente seu passado. É o caso de Eliana Paiva, cujo pai, o ex-deputado Rubens Paiva, foi morto em tortura pela ditadura. Eliana passou 24 horas presa. Durante metade do tempo, teve que usar “um capuz fedorento” que a sufocava. Aos 15 anos, foi chamada de comunista, levou cascudos na cabeça, apertões nos seios.
— Conforme o tempo passava, os agentes diminuíram a agressividade no interrogatório. Intuí que meu pai já estava morto — conta.
Sua prisão, o desaparecimento do pai e o sofrimento contínuo da mãe marcaram sua vida:
— Nunca tinha conseguido contar tudo sobre a prisão. Nem para marido, nem para terapeuta. Mas, aos 59 anos, quero resolver algumas coisas. Falar pode ajudar.
A ideia de que a vida é um labirinto, assim como os jardins e as bibliotecas, faz pensar que os bons encontros são tão raros quanto preciosos, especialmente quando a interseção das linhas do tempo ocorre no meio das artes. Algumas epifanias surgem a partir daí. Um destes encontros aconteceu em 1964, quando o escritor argentino Jorge Luis Borges, já cego, em uma tarde, voltando da Biblioteca Nacional, entrou em uma famosa livraria de Buenos Aires e conheceu o então jovem livreiro Alberto Manguel. Borges perguntou se estaria disposto a ler para ele à noite. A mãe, Dona Leonor, que frequentemente o fazia, tinha 90 anos e estava cansada.
Começava naquele momento uma história que se desdobrou em muitas outras interseções. O rapaz se tornou ficcionista, ensaísta e, desde 2016, diretor da Biblioteca Nacional – a mesma onde trabalhou o escritor com o qual sua vida cruzou na juventude. As lembranças das noites de leitura estão no pequeno “Com Borges” (Editora Ayné), em que as curiosidades da vida e do trabalho do autor de “O Aleph” ganham o sabor do texto de Manguel (dele, a conferir também o belíssimo “A biblioteca à noite”, entre outros). São breves lampejos, memória sobre memória, que tornam ainda mais interessante a pessoa de um escritor que, por si mesmo, transformara-se em personagem de ficção, pois para ele vida real era de fato aquela que se vive entre (e dentro) dos livros.
A cegueira de Borges teve um lastro familiar e foi aumentando a partir dos 30 anos até que se firmou depois dos 58. Era uma tremenda ironia do destino para um homem que imaginava o universo como uma biblioteca. Lamentava não poder enxergar mais a cor preta na névoa que encobria seus dias, mas se alegrava em pensar no amarelo – a única cor que lhe restou, a mesma dos tão amados tigres: “Que pena não ter nascido um tigre”, confessou a Manguel nos intervalos das leituras.
O tamanho da biblioteca de Borges podia decepcionar a quem esperava conhecer uma enormidade. Mas as estantes continham, como reforça Manguel, a essência da leitura e do mundo do autor, que amava as enciclopédias e os dicionários e jamais se sentiu obrigado a ler o que não gostava. “Sou um leitor de prazer: nunca permiti que meu senso de dever influenciasse algo tão pessoal quanto a compra de livros” disse.
Nas estantes, ninguém encontrava as obras do próprio Borges. O que é bastante conciliável com a famosa afirmação de que ele se orgulhava muito mais dos livros que havia lido do que dos que havia escrito.
Algumas lembranças da infância percorrem o texto de Manguel aqui e ali. Quando criança, Borges costumava acompanhar o pai até a Biblioteca Nacional e, tímido demais para pedir um livro, pegava um dos volumes da “Brittanica” nas prateleiras e lia qualquer artigo que abrisse ao acaso. Daí o gosto de sempre pelas enciclopédias. O primeiro livro do qual se lembrava de ter lido era uma tradução inglesa dos contos dos irmãos Grimm.
Manguel relembra seu encontro com a palavra de Borges antes de o autor cruzar-lhe o caminho. Nos anos 1960, o escritor argentino ainda não tinha adquirido fama universal, mas seus labirintos poéticos eram estudados escrupulosamente: “Estudar a escrita de Borges em detalhes gramaticais (recebíamos parágrafos de suas histórias para fazer análise sintática) era um exercício misteriosamente fascinante, e foi quando me achei mais perto de compreender parte de como a sua imaginação verbal funcionava”.
Depois, a convivência direta com o autor nas noites de leitura trouxe a proximidade com uma forma muito particular de humor e, claro, de trabalhar nas invariáveis do fantástico, até mesmo nas situações cotidianas da vida. Uma advertência ao sobrinho, que tinha seus cinco ou seis anos: “Se você se comportar, eu lhe dou a permissão para pensar num urso”.
As obsessões, paradoxos, pensamentos, as principais amizades literárias, como com Bioy Casares e Silvina Ocampo, enfim, preciosas “lembranças das lembranças” espalham-se pelas páginas deste livro tão mínimo quanto luminoso. As memórias de um autor sobre outro autor montam uma espécie de jardim do tempo, metafísico, tortuoso, cheio de zigue-zagues.
Escreve Manguel, quase ao fim do texto: “Há escritores que tentam colocar o mundo num livro. Há outros, mais raros, para quem o mundo é um livro, que eles tentam ler para si mesmos e para os outros. Borges era um desses escritores. Ele acreditava, contra todas as probabilidades, que nosso dever moral era ser feliz, e que a felicidade podia ser encontrada nos livros, apesar de não conseguir explicar a razão disso”.
Para quem quiser se aprofundar no tema “noite e livros”, ou seja, a leitura para cegos, fica a dica de um trabalho que obviamente faz alusão a Alberto Manguel e à escuridão compartilhada de Borges: “Ler e escrever no escuro: a literatura através da cegueira” (Paz e Terra), da jornalista Denise Schittine. Uma extensa bibliografia sobre o tema é recuperada nesta belíssima pesquisa.
Livros sobre livros sobre livros… O labirinto é infinito. Afinal, qualquer livro contém a promessa de todos os outros, eis um dos legados filosóficos do genial autor de “A biblioteca de Babel”.
Obra foi comentada por Marisa Midori em sua coluna na Rádio USP
A biblioteca do rei Assurbanípal – o último grande rei da Assíria, que governou essa potência do mundo antigo entre 668 e 627 antes de Cristo – é um dos temas do livro Bibliotecas no Mundo Antigo, do professor de Literatura Clássica da Universidade de Nova York Lionel Casson (1914-2009), recentemente publicado pela Editora Vestígio. A obra tem tradução de Cristina Antunes, curadora da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) da USP.
O livro foi comentado pela professora Marisa Midori, em sua coluna Bibliomania, transmitida pela Rádio USP (93,7 MHz) no dia 25 de maio de 2018.
“Ainda no cais percebemos que a cidade havia sido impiedosamente bombardeada pelos americanos, pois dois dias antes estava ocupada pelos alemães. Os prédios estavam perfurados pela artilharia aliada”.
Os escritos são de Flávio Villaça Guimarães, que morreu aos 89 anos em uma manhã de agosto de 2012, como o último combatente da 2ª Guerra Mundial residente em Marília. Na época o herói mariliense foi sepultado com salva de tiros no Cemitério das Orquídeas, na zona Oeste.
Neste sábado (19), cinco anos, oito meses e 23 dias depois, seus filhos realizaram uma homenagem póstuma com o lançamento do livro baseado no diário de guerra feito por Guimarães quando serviu na Itália, onde escrevia todos todos os dias.
“Segunda Guerra Mundial – Memórias de um ex-combatente” conta com tiragem de 1,5 mil exemplares e teve a adaptação dos manuscritos originais feita pelo professor de História Marcelo Sampaio, que assina a apresentação do livro com o professor da Unesp Paulo Teixeira e contextualiza a participação brasileira no conflito na segunda parte da publicação.
O lançamento da obra reuniu familiares, amigos e imprensa no hotel Estoril, onde a reportagem conversou com dois dos sete filhos de Guimarães, o delegado aposentado e advogado Flávio Rino e o publicitário Carlos Alberto Rino Guimarães.
“Ele tinha um orgulho indisfarçável de ter participado da 2ª Guerra Mundial como soldado brasileiro das forças aliadas e contava na roda de família, na mesa, as passagens, o lado cômico também, não era só desgraça, desalento. Em meio a esse cotidiano tinham também coisas engraçadas, os namoros com as italianas”, relembra Flávio Rino.
Carlos Alberto, mais conhecido como Beto, e apontado pelo irmão como responsável por viabilizar a publicação, reforça que a obra retrata principalmente o cotidiano dos soldados, mas não tem propriamente a história dos combates, do campo de batalha. No entanto, também não ficaram de fora os relatos sobre apuros e tragédias de amigos que perderam a vida no front.
“Ele trabalhou em um posto de observação, ficava posicionado no alto para ver as tropas inimigas e fazia 25 graus abaixo de zero. Perdeu as unhas todas por causa disso, inclusive. Certa vez ele escapou de ser abatido porque escorregou e caiu do posto”, relata o publicitário.
Em uma das páginas de seu diário, o combatente anota: “Comando permitiu que passeássemos pela redondeza, sem nos distanciarmos muito do acampamento. As casas italianas eram rudes, não havendo comércio algum. O povo estava alimentando-se apenas com castanha que havia armazenado há seis meses, fim do ano de 1943. A miséria assolou quase toda a Itália”.
Guimarães ficou na Itália por um ano, até a rendição dos alemães. Ele voltou ao Brasil em 1945. Era natural de Caçapava, mas em 1950 se casou com a professora Eunice e mudou para Marília, onde viveu até seu falecimento. Foi professor, trabalhou como economista e advogou por muitos anos na cidade.
Ele recebeu a condecoração da medalha da Cruz de Combate de 2ª Classe, honraria conferida aos que na Segunda Guerra “praticaram atos de bravura ou revelaram espírito de sacrifício no desempenho de missões em combate”.
Familiares do ex-combatente (Foto: Leonardo Moreno)Lançamento do livro também reuniu amigos e imprensa (Foto: Leonardo Moreno)O publicitário Carlos Alberto Rino Guimarães, filho de Flávio Villaça Guimarães (Foto: Leonardo Moreno)Flávio Rino, filho de Flávio Villaça Guimarães(Foto: Leonardo Moreno)
Rubens Borba de Moraes retorna à cena em volume que cobre sua correspondência de 1961 a 1985
O bibliófilo Rubens Borba de Moraes (1899-1986) – Folhapress
Quando percorremos a magnífica Brasiliana Guita e José Mindlin, hoje abrigada na USP, nem sempre nos lembramos de que, para a edificação desse monumento, muitas pessoas puseram a mão na massa, além de Mindlin.
E, dentre todas, sem dúvida avulta Rubens Borba de Moraes (1899-1986) –que, após a morte , teve sua coleção incorporada ao acervo de Mindlin. Fascinante figura, partícipe (em segundo plano) da Semana de 1922, retorna à cena em volume que cobre sua correspondência de 1961 a 1985 com o livreiro luso António Tavares de Carvalho.
De que trata o livro? Basicamente, das encomendas que Rubens efetuou. A todo momento, fala-se de obras, dinheiro, transferência de valores. Temas que, convenhamos, não chegam a empolgar os leitores, mesmo, talvez, os poucos bibliófilos do país.
Porém o interesse da obra não se esgota nisso, pois questões paralelas, de natureza pessoal, social e política também comparecem.
Rubens, aliás, prefere ver-se menos como bibliófilo do que como bibliógrafo: elaborador de meticulosas descrições de obras pioneiras de nossas letras, com ênfase no período do Brasil Colônia e nos folhetos da Impressão Régia do Rio de Janeiro.
Nessa faixa temporal, o apetite de Rubens era onívoro: desejava amealhar rigorosamente tudo.
É curiosa, nas demandas ao livreiro português, certa fixação do bibliógrafo nos primeiros textos de nossa medicina –decerto como documento, não como terapêutica, caso contrário dificilmente ele teria atingido os 87 anos.
Rubens desenvolveu uma singular trajetória de vida. De origem abastada, educou-se na Suíça, onde, aos 20 anos, em 1919, chegou a publicar, em coautoria, peça de teatro em língua francesa. Em 1924, lançou “Domingo dos Séculos”, livro em que defendeu a arte moderna.
Foi autor de meticulosas obras de referência sobre a bibliografia do nosso período colonial, com títulos indispensáveis. Escreveu o delicioso “O Bibliófilo Aprendiz”.
Nesta muito bem cuidada edição da correspondência, organizada com apuro, registram-se pequenas omissões e alguns (poucos) equívocos facilmente sanáveis.
Pela própria natureza das cartas, o valor das obras é tópico recorrente. Assim, seria útil uma tabela de conversão: quanto, à época, valiam a moeda portuguesa e a brasileira em relação ao dólar?
Esporadicamente surge a informação, mas por iniciativa de Rubens, quando poderia constar em pé de página, por critério editorial.
Estão truncados (raros) títulos de obras, a exemplo, na página 35, de “Glama”, em vez de “Glaura”. Esparsos erros ortográficos, em palavras estrangeiras ou vernáculas, ainda que presentes no original, mereceriam correção (“caçar” por “cassar”, “trás” por “traz”, “mal” por “mau” etc).
Às vezes (página 271) a imagem reproduzida não corresponde a livro comentado nas páginas adjacentes.
Louve-se a opção editorial de não se efetuarem supressões de trechos reveladores de opiniões hoje indefensáveis, comentários de índole racista (págs. 12, 30 e 62) ou politicamente reacionários.
Felizmente tais juízos são marginais, bastante esporádicos, e atenuam-se ou desaparecem na progressão das centenas de cartas.
Resta a curiosidade de saber um pouco mais sobre esse prodigioso livreiro/bibliófilo António Tavares de Carvalho, que, para provável inveja dos colecionadores de então, conseguia, quase semanalmente, garimpar preciosidades e ofertá-las em prioridade às estantes de Rubens.
Se a Brasiliana de José Mindlin, para o bem da cultura do país, ostenta a solidez de uma imponente catedral de obras e documentos, este livro nos revela boa parte de sua laboriosa construção, folheto a folheto, pela mãos apaixonadas de Rubens Borba de Moraes.
Texto por Antonio Carlos Secchin: poeta, ensaísta e bibliófilo, é professor emérito da UFRJ e membro da ABL
Obra escrita por servidor da UFMG analisa como esses profissionais usam as ferramentas virtuais em livro
Acaba de ser lançado o livro O bibliotecário de referência e as novas tecnologias, de Josiel Machado dos Santos, bibliotecário do Instituto de Ciências Agrárias da UFMG. Na obra, Josiel promove reflexão sobre o papel do bibliotecário de referência como mediador da informação, face às tecnologias que lançam novos desafios à profissão.
No volume, ele também investiga como esse profissional – sobretudo os que atuam nas bibliotecas universitárias – vale-se de ferramentas virtuais para realizar um atendimento eficaz ao usuário.
Para Josiel, os bibliotecários têm o compromisso de produzir conhecimento e dar visibilidade ao trabalho que realizam. “Nós também somos educadores. Temos o dever de produzir, analisar e quantificar aquilo que nos rodeia”, afirma.
O bibliófilo Rubens Borba de Moraes (1899-1986) – Foto: Reprodução
A BBM Publicações acaba de lançar o livro Cartas de Rubens Borba de Moraes ao Livreiro Português António Tavares de Carvalho, organizado pelo professor Plinio Martins Filho, do Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP. Através dessas cartas – escritas entre 1961 e 1985 -, é possível acompanhar a formação da biblioteca brasiliana do bibliófilo, bibliotecário e ensaísta araraquarense Rubens Borba de Moraes (1899-1986), hoje integrada à Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) da USP.
Mas não é só. Suas cartas revelam também a visão de Borba de Moraes sobre a política brasileira ao longo das mais de duas décadas em que foram elaboradas. Na carta datada de 8 de abril de 1964 – a primeira escrita após o golpe militar de 31 de março daquele ano -, por exemplo, ele se refere assim ao movimento que tirou do poder o presidente João Goulart: “Recebi sua carta de 30 do mês passado. Não respondi logo pois ela me veio ter em plena revolução! Os jornais já lhe devem ter contato o que se passou. Escapamos por um triz da comunização do Brasil. O golpe comunista estava marcado e tudo pronto quando o Exército resolveu intervir. O extraordinário em todo esse movimento foram as manifestações populares democráticas que precederam o golpe militar. Foram comícios de centenas de milhares de pessoas organizadas por mulheres que saíram à rua pedindo a ação do Exército contra o comunismo! Foi de empolgar”.
Quatro meses depois, em nova missiva ao livreiro português, Borba de Moraes volta a se referir à situação do Brasil: “Acresce que o custo de vida tem subido constantemente e os impostos acabam de ser aumentados, sobretudo o imposto de renda. Não sei onde vão parar os burgueses aposentados como eu. Os comerciantes e industriais sempre se defendem, mas nós os rentiers? Se continuarem assim as coisas, não terei remédio senão voltar a trabalhar, procurar um emprego qualquer para me dar a manteiga que me tiram do pão de cada dia. A minha ‘manteiga’ são os livros que compro”.
“O cômico desta situação” – continua a carta – “é que não posso deixar de aplaudir a política financeira do governo. Os governos do Juscelino e do Goulart levaram este país às garras. Estamos arruinados e se não fizermos sacrifícios sérios não sairemos desta inflação. Teremos de pagar mais impostos, pagar mais caro tudo que se importa e pagar o dobro, como estou fazendo, esta luz elétrica que me ilumina, bem mal por sinal, pois estamos com eletricidade racionada.”
Para mudar de assunto e falar de livros, ele se interrompe: “Mas vamos a coisas mais alegres, que falar do Brasil entristece e não há consolo”.
O primeiro contato com António Tavares de Carvalho se deu por indicação de um amigo, o senhor Gropp, como Borba de Moraes observa na primeira carta escrita ao livreiro português, datada de 27 de março de 1961: “Prezado Senhor, meu amigo, o Sr. Gropp, recentemente chegado de uma viagem a Portugal, indicou-me seu nome como pessoa interessada em procurar livros raros para colecionadores e deu-me uma relação de obras que V.S. deseja vender”.
O livro, que não traz as respostas do livreiro português, é separado por ano. Não há nenhum registro de 1984, o que pode ser explicado por Borba de Moraes estar debilitado, já que na época tinha 85 anos. Mas a última carta do bibliófilo, de 16 de dezembro de 1985, não tem tom de despedida. Pelo contrário: “Espero vê-lo aqui no próximo ano. Seria uma festa para este seu velho amigo”. Borba de Moraes morreu em 2 de setembro de 1986.
Rubens Borba de Moraes foi um dos organizadores da Semana de Arte Moderna de 1922, dirigiu a hoje chamada Biblioteca Pública Municipal Mário de Andrade e fundou o Departamento de Cultura de São Paulo, atual Secretaria Municipal de Cultura. Na área acadêmica, atuou como professor e organizou o curso de Biblioteconomia da Prefeitura de São Paulo, em 1936, que contribuiu para a organização e a documentação do acervo do Departamento de Cultura. Borba de Moraes criou a Associação Paulista de Bibliotecários. Após estudar biblioteconomia nos Estados Unidos, tornou-se diretor da Biblioteca da Organização das Nações Unidas (ONU), até 1959. Anos depois, ao voltar ao Brasil, tornou-se docente na Universidade de Brasília (UnB)
O livro tem organização de Plinio Martins Filho e é uma edição da BBM Publicações – Foto: Reprodução
A versão digital de Cartas de Rubens Borba de Moraes ao Livreiro Português António Tavares de Carvalho está disponível gratuitamente aqui.
Além dessa obra, a BBM Publicações lançou no dia 13 passado o livro Rubens Borba de Moraes: Anotações de um Bibliófilo, da curadora da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin Cristina Antunes. Leia mais aqui.
Em O livreiro Pedro Herz o autor fala sobre o caminho trilhado ao longo dos anos de trabalho, com bom-humor e simpatia
Texto por Vera Lúcia Oliveira
Pedro Herz: histórias sobre a mais importante rede de livrarias da atualidade (foto: Rodrigo Braga/Revista da Cultura)
Eva, a mãe de todos nós, é também o nome da mãe do livreiro Pedro Herz e da Livraria Cultura, que nasceu em sua casa, de parto natural. Sem dor. Nasceu com uma pequena ninhada de rebentos: dez livros em alemão que ela importou para alugar. O negócio consistia no empréstimo pago por uma ninharia, já que os leitores eram todos imigrantes pobres como os Herz, judeus fugidos do nazismo de Hitler, o queimador de gente e livros.
A passo de formiguinha, Eva, filha de banqueiro em Berlim, dona de casa no Brasil, fez crescer a sua Biblioteca Circulante, o seu negócio de provedora de leitura e cultura na cidade de São Paulo, onde o casal Herz foi viver. O resultado se tornou visível quando a família foi expulsa da casa pelos livros. Na verdade, família e livros precisavam de novas acomodações, pois ambos haviam crescido. A família já tinha os dois filhos brasileiros, Pedro e Joaquim, e a livraria, milhares de rebentos de todas as nacionalidades…
Assim teve início a história da família Herz, que chegou ao Brasil em 1939 para mudar a sua história e a do país que a acolheu. Trabalharam duro, com entusiasmo e esperança. É isso que nos conta o boa-praça Pedro em O livreiro Pedro Herz (São Paulo: Ed. Planeta, 2017), com seu bom humor e simpatia de quem vive de bem com a vida. Uma vida bonita e de sucesso.
Aos dezoito anos, o paulistano Pedro foi ver o mundo. Sempre pela ótica dos livros: trabalhou em livraria na Basileia enquanto estudava – para livreiro. Conheceu o métier que o faria grande pela vida afora… E foi a Paris, onde lavou pratos um tempinho, depois foi a Londres, onde aprimorou o inglês e foi locutor da BBC, para voltar ao Brasil e, mais tarde, dar continuidade ao trabalho da família. Dois longos anos de formação, no sentido clássico da palavra, buscando o crescimento pessoal na jornada da vida.
Enfrentou todos os desafios, trabalhou duro em diversas atividades, até assumir definitivamente o negócio da família e torná-lo um sucesso absoluto e, mais que isso, orgulho de uma cidade, São Paulo, e depois de todo o Brasil, pois a sua Cultura se instalou nas principais capitais brasileiras levando requinte, bom-gosto e sofisticação ao ato de comprar livros, objetos-fetiche dos amantes da leitura. (A Cultura foi chamada de obra de arte por Saramago).
Pedro desbravou o mundo editorial dos grandes países, fez negócios e trouxe o que há de melhor para nós, leitores agradecidos. Casou e descasou, teve dois filhos. Perdeu a mãe em 2001, e elevou-lhe o nome, agora definitivamente gravado nos teatros de sua Cultura: Teatro Eva Herz. Não foi pouca coisa. Mãe e filho, que batalharam juntos desde a Biblioteca Circulante, tornaram-se, agora, marca registrada na história da cultura brasileira dos séculos 20 e 21.
A estrela de Eva continua a brilhar na capacidade de trabalho do filho, que nunca fugiu à luta. Mesmo nos anos de chumbo da ditadura militar, foi diplomata o suficiente para escapar às ameaças que rondavam a sua livraria paulistana todos os dias. Sempre correto, escapou de todos os cercos. E hoje, com a expansão dos negócios, administra um mundo de lojas e de gente, e, bom de marketing, está sempre atento aos desejos do leitor e aos rumos do vento dos negócios.
Com o filho Sérgio na condição de sucessor, já pensa em se retirar para o descanso da aposentadora. Será? Como é agitador cultural nato, com participação intensa na vida da cidade, é difícil imaginá-lo parado… E, como diz a canção do Milton: “Se muito vale o já feito, mais vale o que será (…) Nem vá dormir como pedra e esquecer o que foi feito de nós”. Não pare, Pedro!
Nesse livro de histórias deliciosas, Pedro mostra o caminho das pedras do seu sucesso e põe uma pedrinha no túmulo da mãe, Eva, a fundadora. E as pedras rolam. Para o filho Pedro, “Viver é passar e deixar passar”… E seguir em frente lendo livros.
Em 12 de março, celebramos o Dia do Bibliotecário. Em homenagem aos profissionais do paraíso dos livros, vamos falar sobre biblioterapia!
Quem chega no meio de uma conversa e escuta a palavra biblioterapia tem grandes chances de fazer várias interpretações aleatórias – e até equívocadas – do seu real significado. Esta comprovado: mergulhar na leitura como prática terapêutica traz mais benefícios do que a medicina poderia supor. E, embora muitos ainda não tenham ouvido falar, a técnica já tem sido estudada – pelo menos – desde os meados ou século 20. A pesquisa intitulada “A leitura como função terapêutica: biblioterapia” (1940), da professora Clarice Fortkamp Caldin, investigou uma série de definições de pesquisadores de diferentes gerações.
No último dia 1º de março, completou um ano que a clínica lisboteca The Therapist decolou com inúmeros tratamentos alternativos – entre eles, as sessões biblioterapêuticas. Cada sessão consulta custa, em média, 60 euros. No lugar de antibióticos, cirurgias e exames delicados, a proposta (genial) de tratamento é prescrita pelo o que mais amamos por aqui: leitura de livros!
Vamos descomplicar?
Os gêneros literários de poesia e ficção, em especial, são os maiores aliados aos tratamentos de doenças físicas e da alma, pois são obras que despertam a imaginação e a identificação com personagens. Isso renova o senso de realidade, de esperança e de vida. A biblioterapia é um método profundo e eficaz que acredita na cura nas feridas do corpo e da simples ato de ler. Mas, atenção: não é qualquer leitura “ao leo” . São bibliografias direcionadas – dependendo das faixas etárias, específicas aos diagnósticos e personalizadas para cada caso. O resultado agrega não apenas ao autoconhecimento, mas impulsiona nosso cérebro ao prazer pela leitura e busca respostas para as angústias.
Biblioterapia em casa!
Baseados na obra Farmácia Literária, de Ella Berthoud e Susan Elderkin, fizemos uma lista de 10 livros recomendados para a biblioterapia. Consultórios psicológicos, hospitais, asilos, penitenciárias e orfanatos já adotaram este método de leitura como um ingrediente imprescindível para um novo recomeço de vida. Confira!
Publicado em 1960, o clássico americano escrito por Harper Lee narra a história de Atticus – um correto e corajoso advogado – que assume um caso judiciário de um homem negro – acusado de estupro por uma mulher branca. O resultado é surpreendente. Aprendemos uma grande “lição de moral” – que tem atravessado as gerações e não é à toa que estima-se que a obra tenha vendido mais de 40 milhões de cópias em todo mundo desde o seu lançamento. Vale lembrar também que o título ganhou adaptação para o cinema com três prêmios Oscars, além do Pulitzer de Literatura para a autora em 1961. Veja também algumas curiosidades sobre a autora aqui! Receba uma dose de coragem após esta leitura sensacional!
Aqui você se depara com uma narrativa capaz de mudar sua perspectiva da vida como um clico maior. A história se passa na aldeia de Macondo. Trata-se da solitária família Buendía, na qual todos os membros (e todos as gerações) foram acompanhadas por Úrsula, uma personagem centenária e uma famosa matriarca da história da literatura latino-americana. Aprendemos com o clássico do autor colombiano que todos os personagens padecem de solidão – não só pelo isolamento, mas pelo estado de espírito o qual eles são submetidos. Mergulhe de corpo e alma na história!
Pressão de todos os lados, frustração e zero sentido na rotina. Clichês à parte, mas seu barco parece estar naufragando? Esta é a mesma sensação de Harry “Coelho” Agstrom. No passado, ele foi um astro do basquete juvenil, um grande herói admirado e requisitado. Hoje, porém, ele é um jovem adulto, 27 anos, casado, com um filho (e um bebê a caminho) e convive com a sensação de que o melhor da sua vida ficou pra trás. Diante das suas questões e insatisfações, o personagem apenas corre dos medos, riscos e “perigos” da vida. Tudo muda quando, diante de um frentista no posto de gasolina, Coelho chega a conclusão de que “o único jeito de chegar a algum lugar é pensar para onde você está indo antes de ir”.
Poucas episódios são tão traumáticos quanto um aborto. Um ambiente ensanguentado e a impotência de um médico diante da perda de um feto certamente é uma das piores dores da vida. Enquanto você se recupera, então, você precisa ler “A mulher viajante no tempo”. A história de amor entre Clare e Henry – que se conheceram quando ela tinha apenas 6 anos e ele 35. Calma, Henry não é um pedófilo, mas sim, um viajante no tempo. Quando os protagonistas finalmente se casam, começam a lidar com um grande problema: Clare não consegue engravidar. Foram cinco abortos espontâneos e a principal suspeita é a de que os fetos estejam herdando o “gene” da viagem no tempo – e deixando o útero antes do tempo. Um romance simplesmente inspirador!
O primeiro romance da autora australiana após um intervalo de 16 anos sem escrever. A autora narra a história de amizade entre Helen e Nicola. Helen se prepara para acolher sua amiga debilitada pelo câncer, que luta para não perder a fé e a esperança. O livro nos ensina sobre empatia, encorajamento e força quando nos deparamos com cenas – disfarçadas de tratamento – que estão levando uma das pessoas mais importantes da nossa vida irem embora gradativamente.
Se você convive com uma sensação de fuga constantemente, tem pavor de tudo o que te prende e sente que a estrada é seu lugar, encontramos uma bibliografia (perfeita) para você. Anne tem 12 anos e sofre de ansiedade por não ter uma residência fixa. Sua mãe, Adele, após romper do terceiro casamento entra num ciclo de mudanças de casa junto com a filha. O que faz a adolescente entrar em profunda crise consigo, pois ela compreende que precisa de estabilidade e uma rotina “normal” para se desenvolver como uma adolescente.
A história de Jack Torrance é arrepiante, mas dois grandes males acometem a sua vida: o consumo excessivo de álcool e seu temperamento explosivo. A combinação o levará a um hotel fantasmagórico onde, provavelmente, o personagem ficará isolado por vários dias até a neve cair. Até que ele entra em uma onda imaginária e de “espíritos” que lhe coloca diante de um legítimo gim – episódio que fará o leitor ir atrás de um suco de laranja em vez de um drinque (para sempre!).
Só quem é “agorafóbico” sabe o desconforto de se ver em um lugar novo. Talvez o personagem Jumperi Niki se sinta da mesma forma e por isso decide viajar para uma região deserta e costeira, procurando por uma nova espécie de insetos. O trajeto seguia bem, mas a leitura nos surpreende com um ponto de virada ao se deprar com casas alojadas no fundo de buracos com 15 metros de profundidade.
Todo dia você recebe notícias de coisas boas da vida que estão acontecendo na vida dos seus amigos, familiares, conhecidos e vizinhos? O que acaba despertando uma certa confusão sobre o que você realmente quer, já que se afundou em seus insucessos e fracassos. Talvez Michel Faber tenha algumas respostas satisfatórias com seu enredo. Uma jovem heroína começa sua história em um lugar totalmente improvável: em uma zona de prostituição. Forçada a vender o seu corpo, Sugar cresce acreditando que não existe outra possibilidade de “ser aquecida”. Aprendemos com o escritor uma lição muito além do que questões de sorte ou pontos de partida, mas sobre elevar-se à sabedoria e determinar seu próprio futuro – e não o dos outros.
A realidade de nunca mais rever alguém que amamos parece uma tragédia. Mas esse romance (um tanto triste, se prepare!) nos leva a refletir sobre o quanto vale a pena consertar uma amizade. Inicialmente, o livro conta a história de dois amigos vivem isolados nas vastas campinas, são únicos um para o outro. Cinquenta anos depois, o narrador muda o curso da história e nos ensina uma profunda lição sobre mágoas, ressentimentos, perdão e reconciliação. A maior premissa da obra é nos ensinar a nunca tratar um amigo de uma forma a qual você possa se arrepender no futuro.
Obra que será lançada no dia 13, na USP, reúne manuscritos de um dos maiores bibliófilos brasileiros
Texto por Vinicius Crevilari
Rubens Borba de Moraes (1899-1986): um dos maiores bibliófilos do Brasil – Foto: Prefeitura SP/Biblioteca Rubens Borba de Moraes
Parte dos mais de 32 mil títulos ou 60 mil volumes pertencentes à Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) da USP tem origem no acervo de Rubens Borba de Moraes, um dos maiores bibliógrafos, bibliófilos e historiadores do Brasil, que doou sua coleção ao casal Guita e José Mindlin antes de seu falecimento, em 1986.
Pensando na importância de Rubens Borba de Moraes para a concepção e a construção da BBM, a bibliotecária Cristina Antunes, da BBM, vai lançar no dia 13 de março, terça-feira, às 18 horas, o livro Rubens Borba de Moraes: Anotações de um Bibliófilo, pela BBM Publicações.
“Cogitei a possibilidade de realizar uma publicação que reunisse o conjunto das notas manuscritas por ele nos livros que constituem a sua biblioteca — hoje parte integrante da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin, na Universidade de São Paulo —, o que me levou a elaborar o levantamento, registro e reprodução de toda a marginália presente nas referidas obras”, escreve Cristina na Introdução da obra.
O livro de Cristina Antunes, lançado pela BBM Publicações – Foto: Reprodução
Cristina trabalhou no levantamento, registro e transcrição de notas manuscritas em papéis avulsos, recortes de jornais e de catálogos, notas de vendas emitidas por livreiros e anotações feitas pelo bibliófilo, especificamente relacionadas aos livros que constituíram sua biblioteca pessoal.
Essas anotações continham informações sobre os autores e suas obras, suas biografias e os contextos em que eles estavam inseridos. Geralmente, eram feitas a lápis nas folhas de guarda dos livros (página que une a capa ao corpo do livro) ou na página de rosto (folha que traz informações como título, subtítulo e autor do livro).
Mas, apesar de nos livros de Rubens Borba de Moraes haver inúmeras notas, uma grande parte informava “de forma bastante econômica” somente a referência bibliográfica dos autores, “acompanhada do número do verbete e/ou do número da página do mesmo. Eventualmente, essa informação é complementada com alguma expressão, como ‘raro’, ‘raríssimo’, ‘é a 1ª edição’ etc.”, escreve Cristina.
No que se refere aos recortes de artigos jornalísticos e às partes de páginas de catálogos, estas, também segundo Cristina, “representam informações complementares ao contexto bibliográfico”. Já as notas de vendas dos livros adquiridos por Rubens Borba de Moraes “são uma excelente fonte de informação sobre a procedência e os valores das obras na ocasião em que foram compradas, além de permitirem uma comparação com os valores atuais desses livros, geralmente presentes em catálogos de livreiros ou catálogos de leilões”. Quanto às notas manuscritas em folhas avulsas — ou seja, separadas dos livros —, embora raras, são “as que evidenciam maior interesse para o pesquisador em virtude da riqueza de informações que elas contêm”.
Foi esse aspecto que deu a certeza da importância de organizar um livro sobre os registros feitos pelo bibliófilo. “O conteúdo dessa empreitada que abrange o levantamento da totalidade das notas de Rubens Borba de Moraes que aqui se encontram devidamente organizadas e registradas, a meu ver, merece ser disponibilizado na forma de uma publicação impressa, que permitiria aos pesquisadores e interessados em bibliografia o acesso ao conjunto completo de informações que estão presentes nos livros de Rubens”, escreve Cristina.
À esquerda, capa de livro do acervo de Rubens Borba de Moraes, História da América Portugueza, de Sebastião da Rocha Pittta, a primeira história do Brasil a ser impressa, em 1730. À direita, imagem de nota de venda onde o livro foi adquirido
Um pouco da história de Rubens Borba de Moraes
Rubens Borba de Moraes nasceu em 1899, na cidade de Araraquara (SP), e morreu em Bragança Paulista (SP), em 1986.
Estudou na Faculdade de Letras de Genebra, na Suíça, onde lançou seu primeiro livro, Le Chevalier au Barizel (O Cavaleiro em Barizel, em português), uma peça de teatro encenada em fevereiro de 1919. No Brasil, manteve fortes laços com o grupo de artistas precursores do movimento modernista, que deu forma à Semana de Arte Moderna de 1922, como Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Guilherme de Almeida, Luís Aranha, Mário de Andrade, Menotti del Picchia e Oswald de Andrade. Em 1923, publicou seu primeiro livro de ensaios, Domingo dos Séculos, e, no mesmo ano, começou a colaborar na criação e lançamento de revistas vanguardistas, como a Terra Roxa & Outras Terras e a Revista de Antropofagia.
Rubens Borba de Moraes, em 1922, durante a Semana de Arte Moderna – Foto: Wikimedia Commons
Contribuiu na fundação da Escola Livre de Sociologia e Política — hoje Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo—, idealizou e concretizou a criação do Departamento de Cultura da Prefeitura de São Paulo, abrindo caminho para o desenvolvimento de bibliotecas públicas paulistanas, e fundou o primeiro curso de Biblioteconomia do Brasil, assumindo a direção da Divisão de Bibliotecas do Departamento de Cultura da Prefeitura de São Paulo e dedicando-se, a partir de então, aos livros e à biblioteconomia. Também foi diretor da Biblioteca Nacional durante os anos 1940 e, ao final daquela década, assumiu a direção da biblioteca e do centro de informações da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, nos Estados Unidos, cargo que ocupou por mais de dez anos.
Foi responsável pela organização de coleções e séries de livros, como a da Biblioteca Histórica Brasileira e a série Roteiro do Brasil, que inclui dois títulos: Cultura e Opulência do Brasil e Obras Econômicas.
“Rubens se dedicou especialmente a colecionar os autores brasileiros do período colonial”, afirma Cristina, lembrando que as coleções Bibliographia Brasiliana: Livros Raros Sobre o Brasil Publicados desde 1504 até 1900 e Obras de Autores Brasileiros do Período Colonial, que o bibliófilo organizou, são consideradas referências na pesquisa e nos estudos bibliográficos brasileiros.
“A importância da sua produção pode ser avaliada não só por sua qualidade, como pela preocupação de propagar a cultura brasileira”, escreve a bibliotecária da BBM. Ainda segundo ela, “Rubens era uma pessoa objetiva, prática e direta, que aproveitava todas as situações com que se deparasse para realizar pesquisas ligadas ao seu interesse bibliográfico”. Como um investigador, “seguia exaustivamente a pista dos livros que lhe interessavam, muitas vezes viajando a vários países para isso”.
O livro Rubens Borba de Moraes: Anotações de um Bibliófilo, de Cristina Antunes, será lançado no dia 13 de março, terça-feira, às 18 horas, na Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) da USP (Avenida Professor Luciano Gualberto, 78, Espaço Brasiliana, Cidade Universitária, em São Paulo, telefone 11 2648-0320).
Publicados os Anais do X EDICIC – Encontro da Associação de Educação e Pesquisa em Ciência da Informação da Ibero-América e Caribe, realizado pela Escola de Ciência da Informação – ECI/UFMG no ano de 2016.
O e-book completo e os textos individuais podem ser acessados por meio do seguinte endereço eletrônico: http://edicic2016.eci.ufmg.br/anais
Informamos ainda que os Anais foram registrados com o número de ISBN:
9788565609074
Intelectual separa amantes de livros entre viajantes, torres de marfim e traças em ‘O Leitor como Metáfora’
Numa situação hipotética, na qual o autor tivesse certeza absoluta de que nunca seria lido, será que escreveria uma vírgula que fosse? Salvo honrosas e kafkianas exceções, provavelmente não. Afinal, são dois lados da mesma moeda. Já Umberto Eco assinalava uma questão crucial: a cada leitor o escritor entrega uma mensagem privada. De fato, o escritor só escreve metade do livro – a outra metade quem escreve é o leitor. Daí que o crítico Edmund Wilson lacrou: “Nunca dois leitores leram o mesmo livro.”
Toda obra de ficção é um pacto tácito entre escritor e leitor: o primeiro finge que aquilo que está contando é verdade, e o segundo finge que acredita. É certo que a autoficção (ao equiparar autor, narrador e protagonista) e a metaficção (ao brandir seus códigos) proclamam repudiar esse pacto, mas no fundo só de mentirinha.
Na obra do escritor argentino Alberto Manguel a especialidade da casa é precisamente uma hermenêutica do leitor. Os Livros e os Dias, por exemplo, consiste em um diário da releitura de um romance por mês ao longo de um ano (de 2002 a 2003). E O Leitor Como Metáfora corresponde assumidamente a um puxadinho de uma obra anterior, Uma História da Leitura.
Na obra do escritor argentino Alberto Manguel a especialidade da casa é precisamente uma hermenêutica do leitor. Os Livros e os Dias, por exemplo, consiste em um diário da releitura de um romance por mês ao longo de um ano (de 2002 a 2003). E O Leitor Como Metáfora corresponde assumidamente a um puxadinho de uma obra anterior, Uma História da Leitura.
Manguel mobiliza três metáforas para classificar o leitor. A primeira é o viajante. É também a mais imanente à própria estrutura da narrativa de ficção, na qual um protagonista sai – literal ou simbolicamente – da sua zona de conforto, numa jornada que vai de A a B, culminando num novo status quo. Manguel disseca obras canônicas, como o épico mesopotâmico Gilgamesh, uma das narrativas mais antigas da literatura universal. Ou a Divina Comédia, cuja jornada já começa pelo meio (in medias res): “No meio caminho da minha vida, me encontrei perdido numa selva escura.” Dante escreveu-a quando era um exilado político, outra modalidade de errância muito praticada por autores de todas as épocas. Galileu Galilei, o primeiro paradigma do cientista moderno, chegou a dar duas palestras sobre a localização e o tamanho do Inferno de Dante.
Para Manguel, a leitura itinerante na globalização da internet é uma faca de dois gumes: “Parece não requerer deslocamento – tudo está aqui o tempo todo, ao toque de um dedo. Não precisamos viajar em direção a nada, porque tudo aparece de repente, não precisamos registrar nada na memória porque nossas memórias realizam essa tarefa por nós.” Mas só a memória pessoal, ontológica, é realmente inesquecível.
O leitor viajante pede carona, por exemplo, às “road novels”. Da Odisseia a On the Road. Não apenas os temas se deslocam, mas os autores – Kazuo Ishiguro é um romancista britânico nascido no Japão. O irlandês Samuel Beckett escrevia ora em inglês, ora em francês – e depois se traduzia para estas duas línguas. Um dia confessou que já não sabia qual era o original e qual era a versão. Autores criam geografias ficcionais, como as Cidades Invisíveis de Ítalo Calvino, ou o condado faulkneriano de Yoknapatawpha.
A segunda metáfora para o leitor é a da “torre de marfim”, expressão criada em 1837 pelo crítico francês Sainte-Beuve sem qualquer conotação pejorativa. Com o tempo, assumiu um sentido negativo, de sedentarismo esteticista, pedante e alienado, um amigo da arte pela arte e por isso inimigo do povo. Manguel desarma o reducionismo dos rótulos, indicando que uma das barbadas para maior personagem de todos os tempos – Hamlet, com sua relutância entre ser ou não ser – transfigurou a torre de marfim numa espécie de trailer.
O ensaísta nota que ensimesmamento pode significar profundidade. “Numa época em que os valores que a nossa sociedade apresenta como desejáveis são os da velocidade e da brevidade, o lento e reflexivo processo da leitura é visto como ineficiente e antiquado. A leitura eletrônica não parece encorajar sessões prolongadas com um único texto, mas incentivar um processo de lambiscar pequenos fragmentos.”
A última metáfora é a da traça, o rato de biblioteca, o leitor glutão, que mais se empanturra que se nutre. Também comporta o idólatra de best sellers – ainda hoje os Correios de Londres recebem cartas para Sherlock Holmes. E, por fim, o leitor que confunde vida e obra e acaba degenerando em personagem, por vezes bem (D. Quixote), por vezes mal (Emma Bovary).
Aliás, o aspecto mais fascinante deste pequeno (148 páginas) grande livro são as encruzilhadas e as bifurcações entre ficção e realidade. Que, memoravelmente, transparecem no paralelismo entre a vida e as viagens: acreditemos ou não que a jornada tem um destino, personagens e leitores e cidadãos, somos todos transeuntes.
Por isso a literatura é uma ponte entre duas irredutíveis solidões: a do autor que escreve, e a do leitor que lê. Ambos acabam customizando uma chegada, ainda que idiossincrática.
Por outras palavras: a literatura não é real, mas pode ser profundamente verdadeira – coisa que o real nem sempre é. Só que, ao contrário da existência empírica, ela é um dispositivo, uma engrenagem – por isso a ficção, de novo diferente da vida, precisa fazer sentido. Seja trágico ou cômico.
Em bibliotecas e museus, benefícios educacionais e de preservação da memória com versões on-line esbarram em questões jurídicas e financeiras
ARQUIVO NACIONAL, SITUADO NO RIO DE JANEIRO, INAUGUROU FERRAMENTA DE BUSCA PARA VERSÃO DIGITAL DE SEU ACERVO
Existem escritos raros de Guimarães Rosa que não podem aparecer na Brasiliana, a biblioteca digital da USP (Universidade de São Paulo), por questões legais de direitos autorais. Na Cinemateca Brasileira, o original do filme “A hora e a vez de Augusto Matraga” (1965), com Leonardo Villar, se deteriora porque os herdeiros do cineasta não conseguem chegar a um acordo a respeito de quanto cobrar para permitir a digitalização da obra.
São apenas dois exemplos dos entraves enfrentados por instituições de memória brasileiras quando tentam digitalizar seus acervos. Os casos foram citados em uma reportagem de 2010 do jornal O Estado de S. Paulo e aparecem no livro “Memórias digitais”, lançado em 2018 pelo CTS (Centro de Tecnologia e Sociedade) da FGV-Rio (Faculdade Getúlio Vargas).
O livro resultou de workshops realizados em 2014 pelo CTS com profissionais brasileiros e da América Latina da área (alguns dos quais contribuem com artigos). A coletânea de textos aborda aspectos como tecnologia, legislação, políticas institucionais e financiamento.
“Suponha que seja um livro que esteja corroendo na biblioteca. O bibliotecário fica numa sinuca, pois não tem certeza jurídica para agir” Bruna Castanheira de Freitas Pesquisadora do CTS (FGV-Rio) e organizadora do livro “Memórias Digitais”
Em paralelo, foi realizada uma pesquisa para tentar quantificar o estado de digitalização dos acervos brasileiros. Embora os dados ainda estejam sendo analisados, a organizadora do livro e pesquisadora do CTS, Bruna Castanheira de Freitas, explicou que os museus são as instituições com a digitalização em estado mais incipiente.
Já os acervos nacionais, locais como o Arquivo Histórico do Exército e o Arquivo Noronha Santos, ambos no Rio de Janeiro, são a categoria de instituição com o processo de digitalização mais adiantado. O próprio Arquivo Nacional inaugurou em setembro de 2017 uma nova ferramenta de busca para pesquisa em seu acervo.
Por que digitalizar
Para Castanheira, a digitalização atende a dois objetivos principais: a preservação de obras, que em estado físico original ficam sujeitas à ação do tempo, e a democratização do acesso aos acervos, ao torná-los disponíveis na internet.
A pesquisadora lembra que muitos brasileiros moram longe de museus ou não têm condições financeiras de comprar um ingresso. Segundo o levantamento do CTS, a maior parte dos museus fica nas regiões Sul e Sudeste do país.
“É obrigatório que museus, bibliotecas e arquivos se juntem a instituições educacionais para abraçar [a digitalização]”, disse Wayne Clough, em entrevista de 2013, quando era secretário do Instituto Smithsonian, nos Estados Unidos, entidade de pesquisa e museus administrada pelo governo americano.
Quais os obstáculos jurídicos
No Brasil, lacunas na Lei dos Direitos Autorais, de 1998, deixam administradores de acervos em situação de insegurança jurídica quando o assunto é digitalização. De acordo com a lei atual, apenas criar uma versão digital de uma obra sem a devida permissão do proprietário é proibido. “Seria entendido como pirataria na lei atual”, explicou Castanheira ao Nexo.
Em muitos casos, não é possível localizar o titular dos direitos de um livro ou foto antiga, gerando o que se chama de “obra órfã”. O livro cita dados de 2009 de que, apenas no Museu de História Nacional de Londres, 20% dos cerca de 1 milhão de livros e 25% dos cerca de 500 mil itens da coleção eram de propriedade desconhecida.
Para a pesquisadora, a lei deveria determinar procedimentos para os profissionais das instituições de memória nesses casos, “para provar que tentou encontrar o dono da obra, mas não conseguiu. Suponha que seja um livro que esteja corroendo na biblioteca. O bibliotecário fica numa sinuca, pois não tem certeza jurídica para agir”.
De acordo com o livro “Memórias digitais”, o custos de armazenamento de “matrizes” digitais de um filme chegam a ser 11 vezes maiores que os de manter originais em película
A legislação deveria ser modificada para contemplar a digitalização “para fins de conservação”, abrindo neste caso uma exceção nos direitos autorais, na opinião de Castanheira.
Para ela, não se vê no momento nenhuma iniciativa no legislativo federal de discussão destes temas. Ações do Ministério da Cultura de digitalização dos acervos culturais, como a plataforma Tainacan, que ajudaria na busca por obras, encontram-se paralisadas.
Dinheiro e tecnologia
A mão de obra, o tempo e a tecnologia que a digitalização de um grande acervo exige torna o processo custoso. Mas a manutenção também pode sair cara, às vezes mais do que a preservação do original físico. De acordo com o livro “Memórias digitais”, o custos de armazenamento de “matrizes” digitais de um filme chegam a ser 11 vezes maiores que os de manter originais em película.
Há também custos de atualização de plataforma e ferramentas de uso do público da internet, que podem ficar defasadas com o passar dos anos. Um exemplo evidente são sites pensados para a navegação em computador que não contemplaram o aumento ou navegação exclusiva por celular de muitos usuários brasileiros. Como resultado, sites mais antigos podem não funcionar na tela menor.
O livro defende o desenvolvimento de plataformas de software livre (programas que podem ser copiados, alterados e distribuídos gratuitamente), fáceis de serem adaptadas por diversas instituições e que favorecem a integração entre acervos digitais, inclusive facilitando a busca por obras. Como exemplo bem-sucedido, a coletânea cita o software Corisco, desenvolvido para a Biblioteca Brasiliana, que depois foi adaptado para o Instituto Hercule Florence (IHF), que gerencia acervos de imagens do início da fotografia no Brasil.
Manguel apresenta um instigante panorama da leitura e também dos leitores – até mesmo os ficcionais. “Para entender o mundo, ou para tentar compreendê-lo, a tradução da experiência em linguagem não basta”, escreve o autor
SAO PAULO 30/08/2016 COMPAINHA DAS LETRAS COM DEBATE ROBERT DARNTON E ALBERTO MANGUEL COM MEDIAÇÃO DE SERGIO RODRIGUES NO AUDITORIO DO SESC VILA MARIANA ALBERTO MANGUEL FOTO ALEX SILVA/ESTADAO
Mais que um escritor, o argentino Alberto Manguel é um leitor fervoroso. Diretor da Biblioteca Nacional da Argentina, cargo já ocupado por Jorge Luis Borges, ele é dono de uma coleção de livros que beira os 30 mil volumes. Mais que a quantidade, interessa a qualidade que Manguel extrai dali para escrever seus livros, seja de ficção como Todos os Homens São Mentirosos (Companhia das Letras), inspirado em fatos reais, seja em ensaios como O Leitor Como Metáfora, agora lançado pela Edições Sesc São Paulo.
Trata-se de um convite à reflexão sobre o ato da leitura que, desde a origem da escrita, há cerca de cinco mil anos, vem carregado de inúmeros significados práticos e simbólicos, dependendo da história de cada povo que habita o planeta.
“Analisando sua presença na própria literatura e em documentos de época (o que inclui representações plásticas como gravuras, pintura, escultura e monumentos), Manguelenfeixa em três metáforas principais as várias encarnações do sujeito que lê: o leitor como viajante, o leitor refugiado na torre de marfim e o leitor como ‘traça de livros’, o que no Brasil chamaríamos de ‘rato de biblioteca’”, observa o jornalista e tradutor da obra José Geraldo Couto.
De fato, estão ali as três metáforas delineadas por Manguel em sua estrutura narrativa e que inspiram também o subtítulo do livro: o viajante, a torre e a traça. Basicamente, traduzem a descoberta do mundo por meio da exploração da leitura, o afastamento do mundo motivado pelo ato de ler, e a voracidade com que muitos se entregam à leitura, o que os deixa “inflados de palavras”.
A partir daí, Manguel apresenta um instigante panorama da leitura e também dos leitores – até mesmo os ficcionais. “Para entender o mundo, ou para tentar compreendê-lo, a tradução da experiência em linguagem não basta”, escreve o autor argentino no prefácio do livro. “Para incrementar as possibilidades de entendimento mútuo e criar um espaço mais amplo de sentido, a linguagem recorre a metáforas que são, em última instância, uma confissão do insucesso da linguagem em comunicar diretamente.”
Manguel é um homem que já coleciona múltiplas vivências – nascido em Buenos Aires em 1948, viveu em Israel e no Taiti até se mudar, nos anos 1980, para Toronto, onde se tornou cidadão canadense. Aprendeu a ler por volta dos 3 anos e, desde então, descobriu-se um leitor voraz. Quando adolescente, leu em voz alta, durante anos, para Jorge Luis Borges, que ficara cego. Também morou em um presbitério construído no século 16, que comprou para instalar sua volumosa biblioteca. Tal intimidade com as palavras se revela na seguinte entrevista, realizada por e-mail.
Que diria o senhor da seguinte frase de Hermann Hesse: “Os inimigos dos bons livros, e do bom gosto em geral, não são os que os desprezam, mas os que os devoram”?
Não concordo. Leitores geniais – Oscar Wilde, Ralph Waldo Emerson – liam velozmente, “devorando” o texto. O mau leitor não sabe entrar no texto, o que é muito diferente.
É melhor ler qualquer coisa que não ler nada?
Que significa esse “qualquer coisa”? O que é banal para um leitor pode ser essencial para outro. Tolstoi considerava Rei Lear (de Shakespeare) má literatura. Nem todos são leitores. Há quem não sinta prazer na leitura, em procurar o livro que foi escrito para ele, como há quem não goste de mar e quem não tenha ouvido para música.
O público leitor está aumentando com o livro digital?
Não graças ao livro digital, mas está aumentando. Hoje, são vendidos mais livros que nunca, e são lidos no formato impresso e no digital. Mas talvez tenhamos chegado ao pico dessa tendência. As estatísticas mostram que a comunicação digital e audiovisual está substituindo, por exemplo, a leitura de jornais e revistas. Talvez voltemos a nos comunicar pela palavra oral e por imagens, como na Idade Média.
Como leitor assíduo, o senhor se reconhece em certos personagens? Quais seriam? E já se apropriou de frases de certos livros?
Certamente. Eu me reconheço em Chapeuzinho Vermelho, em Alice, em Judas, o Obscuro, de Hardy, em Brás Cubas… E todos os meus livros não passam de citações de outros: retocadas, traduzidas, reescritas.
O que é mais importante passar para seus leitores?
Um prazer compartilhado.
Qual seria a importância da linguagem na obtenção de conhecimento e na satisfação da curiosidade?
Ela é absolutamente essencial. Todo conhecimento nos chega através dos sentidos (aí incluída a intuição) e não podemos incorporá-lo realmente se não o transformarmos em palavras. Somos a língua que falamos.
O LEITOR COMO METÁFORA
Autor: Alberto Manguel
Tradução: José Geraldo Couto
Editora: Edições Sesc São Paulo (148 págs., R$ 45 impresso, R$ 22 digital)
Jornalista carioca é autor de “A Capa do Livro Brasileiro – 1820-1950”, recentemente publicado
Por Roberto C. G. Castro
A Capa do Livro Brasileiro – 1820-1950 (Ateliê Editorial e Sesi), do jornalista carioca Ubiratan Machado, foi o livro indicado pela professora Marisa Midori em sua coluna “Bibliomania”, transmitida no dia 9 de fevereiro de 2018 pela Rádio USP (93,7 MHz). Ela aproveitou para falar sobre outras obras do autor, um amante dos livros – entre elas, o Pequeno Guia Histórico das Livrarias Brasileiras, História das Livrarias Cariocas e A Etiqueta de Livros no Brasil . Sobre este último, Marisa disse que, por sua originalidade, é um marco na história do livro no Brasil.
O projeto Conservação Preventiva em Bibliotecas e Arquivos, em 1997, publicou 53 títulos sobre a conservação preventiva de livros e documentos, de filmes, fotografias e meios magnéticos na forma de 24 cadernos temáticos em formato A4.
O material data de 1997 e estava disponível no site do projeto, http://www.cbpa.net, que não existe mais. Felizmente ainda é possível baixá-los no site da Prefeitura de São Paulo:
Eu baixei todos os PDFs e, caso eles saiam do ar, darei um jeito de manter a possibilidade do download.
Creio que o título mais interessante é o de número 13, que ensina a fazer reparos em livros, uma das principais dúvidas que aqui recebo via comentários e email: como consertar livros.
Você também encontrará muitos cadernos com instruções de como guardar e conservar livros. Também são interessantes os cadernos que ensinam como secar livros, como defendê-los de fungos e pragas como traças.
Alguns, porém, são muito técnicos, no entanto e só vão interessar a bibliotecários.
Abaixo, listo os cadernos e seu conteúdo, também a título preventivo caso eles saiam do ar no site da prefeitura de São Paulo: assim já fica reservado o lugar onde colocarei os links para as obras caso necessário.
Acondicionamento
Caderno de 1 a 9 – Armazenamento e Manuseio: Métodos de armazenagem e práticas de manuseio; A limpeza de livros e de prateleiras; A escolha de invólucros de qualidade arquivística para armazenagem de livros e documentos; Invólucros de cartão para pequenos livros; A jaqueta de poliéster para livros; Suporte para livros: descrição e usos; Montagens e molduras para trabalhos artísticos e artefatos em papel; Mobiliário de armazenagem: um breve resumo das opções atuais; Soluções para armazenagem de artefatos de grandes dimensões.
Conservação
10 a 12- Caderno técnico : procedimentos de conservação: Planificação do papel por meio de umidificação; Como fazer o seu próprio passe-partout; Preservação de livros de recortes e álbuns.
13- Manual de pequenos reparos em livros
Meio Ambiente
14 a 17- Caderno técnico: meio ambiente: Temperatura, umidade relativa do ar, luz e qualidade do ar: diretrizes básicas de preservação; A proteção contra danos provocados pela luz; Monitoramento da temperatura e umidade relativa; A proteção de livros e papéis durante exposições.
18- Isopermas: uma ferramenta para o gerenciamento ambiental
19- Novas ferramentas para preservação – avaliando os efeitos ambientais a longo prazo sobre coleções de bibliotecas e arquivos
Emergências
20 a 25- Caderno técnico : administração de emergências: Planejamento para casos de emergência; Segurança contra perdas: danos provocados por água e fogo, agentes biológicos, roubo e vandalismo; Secagem de livros e documentos molhados; A proteção de coleções durante obras; Salvamento de fotografias em casos de emergência; Planilha para o delineamento de planos de emergência – ed. Sherelyn Ogden
26 a 29- Caderno técnico : emergências com pragas em arquivos e bibliotecas: Controle integrado de pragas; A proteção de livros e papel contra o mofo; Como lidar com uma invasão de mofo: instruções em resposta a uma situação de emergência; Controle de insetos por meio de gases inertes em arquivos e bibliotecas.
Planejamento
30 a 32- Caderno técnico : planejamento e prioridades: Planejamento para preservação; Políticas de desenvolvimento de coleção e preservação; Planejamento de um programa eficaz de manutenção de acervos
33 a 36- Caderno Planejamento de preservação e gerenciamento de programastécnico: Planejamento de preservação e gerenciamento de programas:Desenvolvimento, gerenciamento e preservação de coleções; Seleção para preservação: uma abordagem materialística; Considerações complementares sobre “Seleção para Preservação” : uma abordagem materialística; Implementando um programa de reparo e tratamento de livros
37- Programa de planejamento de preservação: um manual para auto-instrução de bibliotecas
38- Considerações sobre preservação na construção e reforma de bibliotecas: planejamento para preservação
Fotografias e filmes
39- Preservação de fotografias: métodos básicos de salvaguardar suas coleções
40- Guia do Image Permanence Institute (IPI) para armazenamento de filmes de acetato
41- Indicações para o cuidado e a identificação da base de filmes fotográficos – Monique C. Fischer e Andrew Robb
Registro sonoro e fitas magnéticas
42- Armazenamento e manuseio de fitas magnéticas – um guia para bibliotecas e arquivos
43- Guarda e manuseio de materiais de registro sonoro
Reformatação
44 a 47- Caderno técnico : reformatação: O básico sobre o processo de digitalizar imagens; Microfilme de preservação: plataforma para sistemas digitais de acesso; O processo decisório em presevação e fotocopiagem para arquivamento; Controle de qualidade em cópias eletrostáticas para arquivamento
48- Microfilmagem de preservação: um guia para bibliotecários e arquivistas
49- Do microfilme à imagem digital
50- Uma abordagem de sistemas híbridos para a preservação de materiais impressos
51- Requisitos de resolução digital para textos: métodos para o estabelecimento de critérios de qualidade de imagem